quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

O FIM DO MUNDO - 29 -

- Bianca Bin -
- 29 -
CINZA
 
O dia prosseguiu enevoado com de cinza como se o Manto Sagrado tivesse caído sobre aquele pobre remoto lugar. Os pássaros não trinavam mais e o vento, esse nem mais soprava. Tudo estava quieto. Até o cão não ladrava mesmo tendo a presença de estranhos. Não havia peixes no rio para se fisgar e a carne do boi morto secava nas bancas do mercado. Alguém levava para a sua casa um pouco de frutas, coisa não tão rara no local. Havia silencio entre todos. Os pedreiros do cemitério faziam os últimos retoques no tumulo do ex-prefeito sob um derradeiro lamentoso silencio. A iluminação das casas continuava a faltar. Apesar de tudo, as pessoas vagavam como se fossem mortos vivos a passar de um lado para outro. Os homens tiravam o chapéu para cumprimentar alguém e as mulheres prendiam o véu em suas bocas como modo de guardar silêncio. Uma menina brincava com um garoto da mesma idade apenas a sorrir como se nada houvesse para se lamentar. Um homem montado a cavalo seguia para algum lugar sem falar com alguém. Era um cavalo manco, por sinal. O novo Prefeito decretou luto oficial por três dias e fechou a porta de seu gabinete saindo logo em seguida com destino a sua fazenda sem nada a falar. Em uma casa ouvia-se um som. Era um rádio a pilha. Um noticiário fora de hora. O locutor informava haver trinta mil corpos postos no Instituto Médico da cidade destroçada pelas ondas do mar e pelo temeroso sismo, segundo as últimas informações recebidas. Era de fato de uma estação de outro Estado. Na sequencia o locutor informava ter havido desastres em outras regiões, conformes informes recebidos àquela hora. Uma ponte entre um Estado e outro veio totalmente ao chão interrompendo o transito de veículos e pessoas por completo. Porém essas eram noticias vagas e passadas por muito tempo atrás apesar do noticiário ser da ocasião. O vaqueiro Ernesto ficou a escutar para depois informar ao Coronel Araújo.
Em seguida, um cavaleiro chegava de munícipios mais distanciados com a informação de haver sido destroçado grande parte das moradias da região, algumas com mais de três andares. E mais o homem dizia haver falta de força elétrica nas casas, lojas e indústrias. O povo estava temeroso com a real situação dos seus pertences. Havia falta de gêneros alimentícios por toda a região do oeste e alto oeste e regiões litorâneas. Apenas os moradores em sítios tinham garantidos a sua nutrição por colher os frutos plantados em seus próprios terrenos. Com relação ao tempo, pelo dito do cavaleiro, o sol estava bem e as noites eram frias, como era costume. Rodovias permitiam o tráfego de veículo em certos pontos da estrada. Nas rodovias vicinais havia estragos das estradas em diversos pontos.
Em outro caminhão vindo do extremo sul do Estado, as notícias não eram tão boas. Um motorista chegou a levar três dias de viagem para alcançar o município por conta das estradas totalmente danificadas por causa dos recentes tremores de terra dos últimos dias. Completamente sujo de poeira, o profissional desceu do veículo, espreguiçou-se por completo para ajeita a sua coluna e procurou o bar do posto de combustíveis onde outros profissionais do volante estavam a conversar das estradas por onde trafegaram nos recentes dias. Entrando na conversa, com um copo de cerveja na mão, apesar da bebida não estar gelada, o homem deu a entender ser aquele bar a ter cerveja mesmo quente, o que não era fato comum. E de onde estava a vir, a situação era de perigo.
Motorista:
--- Eu ouvi falar das vacas espantadas. Foi na fazenda de um criador. Os animais correram em debandada quando a Terra tremeu. E o pior: o prédio da Prefeitura rachou ao meio. Foi um caso muito sério. Outros acidentes ocorreram em diversos prédios da Municipalidade. Em outras regiões a situação é igual ou parecida. É isso. – declarou o motorista um tanto alarmado.
OUTRO:
--- Eu ouvi dizer que para o norte já não tem mais ninguém! – relatou outro motorista
MOTORISTA 2
--- E pra onde foi esse povo? – quis saber o motorista dois.
OUTRO:
--- Quem sabe? Enfurnou-se mata adentro. Quando as casas começaram a rachar, o povo tremeu. É o fim – vez ver o outro.
Bêbado:
--- Isso tudo é castigo do céu! O Homem já afirmava: “Não escapa ninguém da morte. Os bons virão comigo. E os maus serão enterrados vivos!”. – fez ver o bêbado com sua voz imponente e a afirmar com os braços levantados para o alto em suas roupas rotas.
E essa preleção acabou com a conversa. Os motoristas rumaram para a cabine dos seus veículos ou para outros locais. Um deles conseguiu encontrar uma meretriz e saiu para o cubículo da mulher onde havia outras meretrizes, algumas cansadas do oficio de qualquer hora. No cubículo, quando se entrava, o motorista olhou bem e viu uma rachadura na parede da casa pobre. O homem ficou inquieto com aquele rasgo na parede. Porem nada ele disse e foi seguir para o quarto dos amores. Mesmo assim no quarto apertado, o rapaz notou vários rachões nas paredes. Alarmado, ele perguntou:
Motorista.
--- Há quanto tempo tem rachaduras nessas paredes? – indagou alarmado o homem.
Meretriz:
--- Não sei. Pouco venho nesse bereu. Talvez esteja rajado desde o primeiro estrondo. – disse a mundana a retirar suas poucas roupas do corpo franzino.
Motorista:
--- Eu nunca vi coisa igual a essa! Rachões! – reclamou o homem.
Meretriz:
--- Onde eu moro foi bem pior. Tudo ficou rachado. É por isso que eu venho para a cidade. – reclamou a mundana.
Motorista:
--- Você tem marido? – perguntou o motorista.
Meretriz:
--- Um velho acamado. Ele não pode mais trabalhar. Eu sustento a ele e aos meus filhos. – respondeu a mundana.
Motorista:
--- Dessa forma? – indagou inquieto o homem.
Meretriz:
--- E tem outra? – respondeu abusada a mulher.
O motorista se entristeceu e tirou do bolso uma nota e deu para a mulher, pois já não tinha vontade de fazer coisa alguma. A mulher olhou o homem tanto desconsolado e disse para o motorista ser aquele jeito de se ganhar a vida.
Meretriz:
--- Moço! Eu não faço isso por querer. É meu meio de vida. Enquanto sou jovem, tem mais. – falou a mulher um tanto ressentida.
O motorista se vestiu como pode e saiu do quarto balançado a cabeça para um lado e outro como a pensar em tanta tristeza acudida aquele trapo de mulher. Em seguida, vinha atrás a mulher acochado o cinto da saia com vontade de saber se o homem desistira por qual motivo. O motorista pediu uma dose de vermute e nada mais contou a mulher. Após beber seguiu para o seu caminhão encostado próximo ao posto de serviço. Por lá ele entrou e procurou repousar por alguns momentos. Com poucos minutos o homem, quase a dormir, levantou do volante assustado por demais. Um estrondo rasgou o chão de norte a sul e abriu uma fenda colossal por toda a pista. Dentro da fenda, um rio caudaloso tragava para o interior os corpos das vítimas. O povo em volta correu alarmado por onde podia correr. Havia gritos de toda a sorte e o estrondo prosseguia com o gigante e brumoso arroio. O motorista ligou o motor do seu caminhão, porém ficou alarmado com a fenda a se dirigir para o seu lado. E nesse momento o homem gritou de dentro do caminhão:
Motorista:
--- Socorro! O mundo está se rompendo! – gritou o motorista em um clamou arrebatado.
E o homem notou o povo ao desespero a correr como se o assustador tremor estivesse a tragar toda a gente. O carrilhão da Igreja veio ao solo provocando um tremendo estrondo a ecoar por longa distância. A enorme fenda cheia de lama se abriu passando ao lado do caminhão a faltar alguns metros para soterrar o veículo. Outros caminhos parados junto ao posto de combustível foram tragados irremediavelmente pela enorme fenda. Mulheres alarmadas gritavam ao desespero igual aos assustados homens a correr para todo lado de forma irremediável. E o romper do quente chão enlameado prosseguia em direção sul parecendo um animal feroz a abocanhar a sua presa indefesa. Gritos de terror eram o que se prestava atenção. Em determinado instante a Igreja teve parte de seu andar a rachar terrivelmente. O muro de um campo de futebol veio ao chão parecendo um pano velho descartável.  Casas de mais de um andar se romperam como se fosse um traste. No mercado público, o pânico gerou tormento. As bancas de pedras onde se guardava a carne de gado foram ao chão. As bodegas sofreram terríveis danos como as lojas de tecido e de roupa. Tudo enfim foi sacudido pelo ribombar do abalo sem piedade. Muito além, no casarão do coronel Araújo, o pessoal foi pego de surpresa. Ouvia-se clamor e piedade por parte das senhoras. O coronel tentava por ordem no desespero das mulheres e Otto, ao desespero, segurava a noiva para evitar maior calamidade.
Otto:
--- Tenha calma! Tenha calma! Esse terremoto passa! Não entre em desespero! – gritava o jovem a sua noiva.
 Eleanor se agrava com custo a mesa grande para não cair. Sua mãe, Luiza, corria como uma tonta para segurar o velho marido Homero em sua cama. A dona da casa, Matilde clamava pela proteção divina. Todo era por demais assustador. E o pessoal nem sequer observou a lacuna aberta no chão da cidade. Esse prosseguia em direção à casa do homem Chagas, marido de Nina e pai dos seus três filhos. Quando o chão se abriu frente à casa de Chagas esse foi tragado para seu interior. A sua mulher, alarmada, gritava por socorro assim como seus filhos.
 

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