- Sally Field -
- 06 -
Ao final da tarde Silas Albuquerque entrou em sua casa. Sua mãe, Lindalva, estava uma fera. Quando o garoto chegou foi logo recebido a bofetes, gritos e puxavante de orelha. A mulher, desesperada, procurava saber o que o filho tinha feito na parte da manha que sumira da aula e do grupo escolar para ninguém mais poder vê-lo. O garoto não corria. Apenas esperava as pancadas de sua mãe. Com um azedo na boca a mulher reclamava pelos cotovelos a sorte que Deus lhe deu em ter um filho tão malvado como aquele. Silas nada respondia diante da ação intempestiva de sua mãe. Ele apanhou de tapa e por fim, de palmatória que a mulher guardava suspensa no interior da cozinha para o emprego em horas incertas. Três bolos de palmatória em cada uma de suas benditas mãos. A tagarelice de sua mãe infernizava muito mais ao garoto que os próprios bolos da famigerada palmatória, em pedaço de madeira de trinta centímetros de comprimento por uma espessura de duas polegadas feita especialmente para bater com força em preso nas cadeias da cidade.
--- Vai dizer ou não onde se escondeu???? – indagou a mulher com a maior valentia que podia ter em hora quase da Ave Maria.
--- Eu estava no mercado! – foi só isso o que o garoto Silas confessou, mais por medo da palmatória do que pela valentia de sua mãe.
--- E por que saiu da escola?? – perguntou a mãe Lindalva com a mão nos quartos, palmatória vibrando e olhos esbugalhados.
--- Eu saí para não levar castigo! – respondeu o garoto em boas intenções.
--- Castigo é??? E eu feito uma maluca respondendo a diretora o que não sabia!!! Vá já para o quarto!!! Está de castigo!!! – gritou a mãe de Silas desesperada com o sossego do garoto.
No dia seguinte bem cedo, sem pedir a bênção à mãe Silas saiu para o Grupo para assistir a aula. De Vera nem quis saber. Para o infante, Vera não passava de uma “doida” e ele não queria mais saber conversa com ela. Na metade do caminho ele viu de perto o “louco” que o povo chamava de Molambo. Apesar de tentar escapulir, ele não saiu do lugar em que estava. O “louco” olhou bem para Silas e depois, entre barbas espessas no rosto, cabelos da cabeça grande e retorcidos achatados por um chapéu de panamá todo roto, mas velho que nunca, sorriu como quem não queria formar um desafeto com o infante. Tenso por todos os meios, Silas não falou coisa alguma. Apenas olhava para o “louco” Molambo, postado a sua frente no caminhar da escola. O que pensava o infante era de que se fugir, o “monstro” pegava lhe na certa. Se tentasse passar, seria do mesmo jeito. Então, resolveu ficar parado como uma múmia dos tempos remotos. Silas em nada podia vislumbrar no que poderia Molambo está naquele momento a sorrir vagamente. O pessoal saía das suas casas para o trabalho ou para o Mercado Publico e mesmo para qualquer bodega da região. Ninguém notava o medo que sacudia Silas naquele terrível instante. Os garotos do Grupo passavam por Silas a chamar para a aula do dia, porém o garoto estava estático. Apenas ele estava a ver as longas barbas de Molambo, suas vestes rotas, encardidas, remendadas com pedaços diferentes de outros trapos, saco às costas que o velho segurava com a mão direita. Saco velho todo furado, mostrado os trapos que nele estavam. Mochila comprida para se possuir para levar qualquer caso. Apenas a sombra de um sorriso fazia o pavor ao garoto naquele momento. De repente, deu-se uma brecha ao velho olhar em torno e ver alguns garotos a chamar:
--- Molambo!!! – vozes dos meninos a gritar e a correr.
Aproveitando a volta de olhar que Molambo fez, então Silas pegou o caminho e partiu em vertiginosa disparada deixando para trás todos os colegas do Grupo. Com o coração a bater, quase a sair pela boca, o infante penetrou no terreno do Grupo e se escondeu na privada por um bom pedaço de tempo. Ao soar a sineta do velho Mousinho, então Silas partiu em direção a sala de aula, passado por entre todos para chegar a primeiro lugar. Assim, passou Silas por Vera e Ana e nem as duas cumprimentou.
--- Raça ruim! – foi o que pensou ao passar pelas duas alunas.
Quando a professora Margarida começou a fazer a chamada dos alunos presentes, Silas estava no mundo da lua a se lembrar da figura de Molambo por vezes inquietante. Ele deitou a cabeça na carteira como se quisesse chorar. O mundo aos seus pés se transformou em uma gigantesca pirâmide. Ele nem notou as lágrimas a descer pelo seu rosto. Em determinado instante, uma colega de escola o chamou, pois a professora acabara de recitar o seu nome.
--- Estás doente Silas? A professora está chamando você. – comentou a garota em voz baixa.
O infante então se levantou da cadeira e respondeu que estava presente. A mestra vislumbrou o seu rosto e teve compaixão do garoto por causa do dia anterior. E lhe perguntou:
--- Você está bem? – indagou dona Margarida olhando por cima dos óculos.
--- Sim senhora. – respondeu o infante à professora enxugando as lágrimas.
--- Venha até aqui que eu quero você de perto. – foi o que disse a mestra.
O infante deixou os livros na mesa da carteira e seguiu até ao birô da professora com seu jeito todo desarticulado de andar. Ao passar pelos os colegas de aula nem reparou os olhares que lhe lançaram naquele momento de desacerto. Apenas ele seguiu de modo firme e resoluto até onde estava a mestra. Ao chegar ao local à mestra olhou o garoto de cima abaixo. E ela notou as mãozinhas do infante todas as duas inchadas. A mestra chamou o meigo e inquieto garoto até onde ela estava. Pegou-o no colo e lhe perguntou baixinho:
--- O que foi isso em suas mãos? – indagou a professora o acalentado.
--- Nada não. – respondeu o aluno ainda a chorar.
A professora passou a mão nos seus macios cabelos e o olhou de frente enternecida. Nesse momento ela chamou o infante para ir com ela até a diretoria e recomendou calma em toda a classe, pois voltaria em um instante. Margarida, a mestra, seguiu com o garoto até a diretoria e chegando lá mostrou à diretora como as mãos de menino estavam deliberadamente inchadas, pois ele, apesar do silencio, teria levado uma sova de palmatória porque não assistira freqüentar a escola no recente dia passado. A diretora, dona Eunice se lacrimejou como uma mãe ao ver as mãos do infante todas intumescida. Após assuar o nariz pediu ao garoto que dissesse o que levara a fazer tal agrura.
--- Foi só uma brincadeira de mau gosto! – explicou o menino chorando.
--- Que brincadeira foi essa? – indagou a diretora Eunice.
--- Eu disse que a aluna Vera não estava porque tinha sofrido dor de barriga. – comentou o garoto.
--- E ela faltou mesmo? – averiguou a diretora a olhar as mãos inchadas do infante.
--- Não. Ela estava presente. Mas a minha professora disse que me punha de castigo. Então eu fugi da escola. – chorou o garoto Silas.
Dona Eunice novamente assuou o nariz e depois pegou o menino e pôs ao colo a tecer palavras de carinho a lhe dizer que ele não faria outra vez brincadeira desse estilo. E que ele fosse pedir desculpas a sua colega Vera por ter posto em humilhação perante a classe. O garoto ouviu tudo o que recomendou a diretora e se comprometeu em pedir desculpas. De volta à sala de aula, ele e a professora Margarida foram tomar o seu assento. De imediato, a professora fez ver a ele que havia de pedir desculpas a sua colega de classe pelo vexame que ele fez. O garoto então seguiu até a carteira de Vera e apresentou seu pedido de desculpas. A menina aceitou embora tenha ouvido de Vera uma demonstração de que para ela não tinha desculpas ao proferir a palavra:
--- Monstro! Asqueroso! Palerma! – foi o que disse baixinho a aluna Vera.
O infante então voltou para a sua carteira sob os olhares de dona Margarida, a professora.
O período letivo encerrou no final daquele ano com a conclusão da aula para todos os alunos da quinta série. Nesse ponto concluíram o curso todos os alunos ali matriculados, inclusive Vera, Silas e Ana. Houve festa entre os estudantes e quase todos participaram. Foi uma festa realizada na parte matutina com atrações bem diversas. Cantos, recitais, negócios do gênero da cultura de onde os garotos moravam ou viviam. Foi mesmo uma manhã de muita alegria e contentamento. Silas foi um dos que participaram de brinquedo animado onde todos os alunos gostaram dos esquetes apresentados, inclusive Ana e Vera, extasiadas com o popular da garotada, as duas de modo a sorrir. Os trajes dos garotos eram típicos de pescadores e eles entoavam cantos alusivos à pescaria. Quando terminou a festa foi servido um almoço para a garotada. Eram mais de cem alunos a presenciara festa. As senhoras professoras eram as que mais entusiasmo sentia. A alegria da garotada foi mais tempo que a previsão do que esperava da a direção do estabelecimento de ensino. O Secretario de Educação esteve presente à jovial formatura dos novos alunos concluintes. A debandada se deu em meio ao tumultuoso fervor de brilhante entusiasmo com cada qual se despedindo com abraços dos amigos e professoras cuja presença sentiria a falta para os anos seguintes. Em determinado instante, Vera se aproximou de Silas dizendo que tudo que ele fez foi por demais espirituosos. E sorriu com ele. Ana, por sua vez, trouxe um ramalhete de rosas para dar de presente a Silas agradecendo pelas belas risadas tidas durante toda a festa de encerramento. O garoto sorriu também agradecendo a Ana pelas rosas ofertadas.
--- Nem precisava. Bondade sua. – sorriu Silas delirante de contentamento.
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