- Isabelle Adjani -
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VAQUEIRO
O homem cuspiu fumo para um
lado, olhou o sol quase a pino, procurou uma estaca. Não a encontrou por perto.
E se apoiou na sela de sua montaria. Olhou ele muito bem para a moça e voltou à
vista para o rapaz. Enfim, o vaqueiro retirou o chapéu de couro da cabeça e
olhou novamente para Vanesca. Ele fez um sorriso como quem não queria fazer, se
aprumou na sela e então falou olhando para a sela da montaria de Otto.
Vaqueiro;
--- Meu nome é Chagas. Eu não creio da senhora se lembrar.
Eu trabalhei de vaqueiro mais o velho Coronel e depois sai. Coronel Araújo.
Homem forte. É isso! – sorriu sem querer o homem e voltou a por seu chapéu na
cabeça.
Vanesca:
--- É verdade. Nem faço ideia. Tem muito vaqueiro
trabalhando na fazenda. – respondeu sem entusiasmo a jovem moça.
Chagas:
--- Essa égua é vossa, meu senhor? – voltou o vaqueiro a
indagar a Otto de sua montaria.
Otto:
--- É sim. A égua. – disse o rapaz de dizer a verdade.
Chagas:
--- Ah bom. E a sela? – indagou sem pressa o vaqueiro
cuspindo de lado uma gosma de fumo.
Otto quis olhar para Vanesca, mas não pode porque a moça
estava logo atrás do homem. Mesmo assim, ele respondeu:
Otto:
--- Não. A sela não. Eu a pedi por empréstimo a uma
mulher. – respondeu o rapaz com precaução.
Chagas:
--- Dona Nina? Eu pergunto por ver a marca na sela abaixo
de sua perna. – falou o homem com a suma certeza do que estava a falar.
Otto temeroso de algo errado no seu falar, respondeu o
certo.
Otto:
--- Sim. Dona Nina. Eu estava
em viagem pelo lugar. A égua servia para puxar carroça. Eu tenho um burro. Um
jegue. Esse eu deixei por garantia. Mas a minha família está passando um tempo
na casa de dona Nina. Eu me arranjei logo cedo a procura da fazenda do Coronel.
– falou sem pressa o rapaz.
Chagas:
--- Ah bom. Tá explicado. Sua família está na casa de dona
Nina? – voltou a querer saber o vaqueiro.
Otto:
--- Está. Está. O meu pai, velho doente, minha mãe. E tem
também a minha irmã. Tudo lá. – explicou
sem temor Otto ao vaqueiro.
Chagas:
--- Ah bom. Essa sela é
caprichosa. Ela é minha. Dona Nina é minha mulher. – falou o vaqueiro a retirar
novamente o chapéu talvez para falar o nome da mulher.
Otto:
--- Ah bom. Ela me falou no
senhor. Ela falou que o senhor estava tocando umas vacas. E não sabia quando o
senhor voltava. Talvez um. Talvez dois dias. Foi isso sim. – falou sem temor o
rapaz.
Chagas:
--- É verdade. Ela disse a
verdade. Pois bem. O senhor siga pela vereda e logo, logo estará nas terras do
Coronel. – relatou o vaqueiro olhando bem a sela para ter certeza do seu falar.
Otto:
--- Pode deixar. A sela eu
trago de volta quando vier busca a família. Talvez amanhã. – respondeu sem medo
o rapaz.
Chagas:
--- Não quer trocar essa égua? – indagou o vaqueiro com um
sorriso malicioso.
Otto:
--- É possível. A gente se acerta. - sorriu o rapaz ao dar
partida em sua montaria.
O vaqueiro olhou bem para a égua e disse consigo mesmo sem
despertar a curiosidade do seu dono.
Chagas:
--- “Tá amojada”. – refletiu o home com a cara de quem
sabia o dito.
E Otto enveredou pela touceira
de mata se aguentando como podia e reparando na sua noiva. A moça estava calada
por longo tempo. À sombra de um frondoso pé de Turco o rapaz apeou sua água
para dar repouso a montaria e mesmo a ele e Vanesca tomarem um pouco de fôlego. O rapaz teve de olhar como sempre vazia na viagem
a bússola para saber do canto certo. Após conferir o instrumento guardou o
mesmo na sacola de veludo vermelho e indagou a Vanesca se a moça estaria
cansada, pois notou por alguns instantes a jovem se esticar com exemplo de
dores lombares.
Otto:
--- Cansada? – indagou o rapaz.
Vanesca:
--- Um pouco. – respondeu a moça se apoiando no Turco.
Otto:
--- Viagem longa. – disse o rapaz a torcer o pescoço.
Vanesca:
--- Sabe aquele homem? Eu o
reconheci. Ele matou a mulher. Deu tantas facadas que não se podia contar. Foi
uma coisa horrenda. Ele, certa vez, chegou a sua casa e pegou a mulher com
outro homem. Disse ele não ter suportado tanto desespero. Partiu para cima e
golpeou a mulher por 90 vezes ou bem mais. – falou sem emoção a moça.
Otto:
--- NOSSA! E o homem? – perguntou alarmado o rapaz.
Vanesca:
--- Esse fugiu completamente despido. Nu. Sem um pingo de
roupa. E desapareceu no mundo. Não se ouviu mais falar do seu paradeiro. Creio
que os amigos de Chagas mataram o coitado. – relatou sem sentimento a moça.
Otto:
--- É provável. Mas e o vaqueiro anda solto? – indagou
perplexo o rapaz
Vanesca:
--- Faz tempo isso. Ele foi preso, pegou alguns anos de
cadeia. Mas depois, por influencia de políticos, ele foi posto em liberdade.
Tudo na vida é assim. A mulher foi quem perdeu a vida. Também. .... – reportou
a moça sem medir a culpa de homem.
Otto:
--- E ela tinha filhos? – perguntou assustado o homem.
Vanesca:
--- O povo diz ter ela deixado um filho. Eu mesma não sei.
– reportou a moça se espreguiçando.
Otto:
--- Ora que coisa. Esse filho deve estar adulto. Só pode.
– refletiu o homem.
Vanesca:
--- Eu não sei. E nem vou saber! – respondeu com certa
raiva a moça.
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