- FANTASIA -
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VISAGEM
Na reunião dos médiuns da sexta feira à noite, quando se
passava em revista as principais questões enfrentadas pelo Centro Espírita, uma
voz se levantou para informar sobre um casarão existente na cidade, há muito ao
abandono depois da morte de seus habitantes. A mansão foi construída no século
XIX pelo Coronel Protásio Miller homem de tradição inglesa e muito ligado à
família real do seu país de origem. Sempre austero, no Brasil casou com uma
jovem moça prendada atendendo pelo nome de Evelyn herdeira de larga fortuna dos
seus pais. Ainda bem jovem, dona Evelyn teve a sua prole. Três belas filhas: Sophia,
Isabelle e Jessica. Trigêmeas. Foi uma
operação cesariana de muito cuidado. Desde novas, as três garotas passaram a
ser educadas no regime inglês e com aprendizado das línguas portuguesa,
francesa, italiana e alemã. Nos primeiros anos, o Coronel Protásio Miller fez
uma viagem transatlântica junto com sua grata família para a Inglaterra. Com as
cinco pessoas também seguiam uma governanta e uma criada. Ao todo, sete
pessoas. Era tempo de verão na Inglaterra e a família demorou dois meses nos
albores da civilização. Ao retorno a terra por ele adotada continuou com as
suas obrigações de um augusto fazendeiro. Quando não estava na capital do
Estado, era a vez de ele estar, junto com a sua família na granja onde havia
plantado quase tudo. Na volta a Capital, o Coronel já havia matriculado as suas
ternas filhas na Escola Doméstica a melhor instituição de ensino a existir no
País. As meninas ficaram internas junto com outras estudantes. Apenas, no fim
de um semestre havia férias e as garotas voltavam para o casarão onde ali
permaneciam por longo período. Apenas saíam com a sua mãe e uma governanta para
fazer compras nas lojas de tecidos e calçados. Essa era vida sossegada da
família Miller. Nada de namoricos na adolescência. E por vezes as três irmãs
escrivam para os seus parentes na Grã Bretanha e na Escócia, local amado de
sossego eterno.
Com o passar do tempo e as viagens constantes em um
transatlântico a vida dos Miller virou rotina. Guerras era um ponto crucial
para não fazer viagem. Mesmo assim, a família rodava o mundo indo para os
Estados Unidos e Canadá. Às vezes também visitava o restante do Brasil, como
Rio de Janeiro. As moças, distintas e elegantes com suas vestes soberbas
alegravam mesmo seus pais. Certa vez, as notícias dos embates onde a Grã
Bretanha viveu dias de horrores, a família decidiu não ir para os locais em
conflagração. Sendo assim, o melhor era visitar Porto Alegre, no sul do Brasil,
capital de um Estado bem pouco visitado por esses tempos. De malas prontas, a
família decidiu então visitar a capital gaúcha naquele ano de sombrias noticias
do além mar. A viagem seguia um rumo certo. Natal, Recife, Rio, e enfim o cais
mais próximo do mar. O frio já iniciava por aquelas alturas do ano. Um vento
forte sobrava do sul acompanhado de torrenciais chuvas. O navio seguia a rota
certa. Mesmo assim a visibilidade caiu a ZERO. O salão de baile estava repleto
na noite antes da chegada a Porto Alegre. Casais dançavam no maior delírio se
dar importância ao mar revolto. No tombadilho os moços de convés verificavam
todos os letais perigos. No salão de baile, a orquestra executava os recitais
da ocasião. Música americana por excelência. As máquinas do vapor corriam à
solta no momento. E o capitão do navio dava as ordens às quais se
prestavam. O escuro véu da noite
permanecia com a sua sinistra sombra. O imediato seguia as ordens recebidas. Do
mar nada se poderia enxercar dado à imensa escuridão. No salão de baile, a
orquestra tocada os mais sagrados blues, Charleston, jazz e eternas valsas.
Toda a classe de passageiros seguia animada apesar do gigantesco temporal. As
três filhas do Coronel Miller estavam radiantes com o inesquecível dança.
Garçons serviam as mesas, mulheres de fartas gorduras apenas observavam os
pares, seus esposos se ajeitavam para ver o final da festa, em alguns
apartamentos cenas de amores incontidos e as máquinas a trabalhar sem parar. No
navio transatlântico, o imediato demonstrava precaução com o intenso temporal.
E nada se conseguia enxergar a um palmo do nariz. Apenas os instrumentos de
bordo advertiam sobre o risco de uma colisão iminente com um tenebroso iceberg
a seguir a igual rota. O imediato, com sua destreza, evitou a colisão
arrastando a embarcação para um pouco mais distante. Enquanto a festa
prosseguia no salão de baile, os homens marujos de bordo se aventuravam em
salvar o seu transatlântico de um derradeiro fim. Um barulho terrível foi ouvido em toda a
embarcação. Vitrines caíram como brinquedos deixando o grande transatlântico
“Concordia” a deriva por igual instante. O salão de baile se viu a cair para um
lado levando todos os passageiros para o os seus acostamentos, Não havia ordem
que obedecesse de forma alguma. Em questões de segundos o gigante e colossal
navio inclinou totalmente para a esquerda. Em desespero, os passageiros pediam
socorro sem ninguém ouvir, pois o barulho era intenso em todo o transatlântico.
Pedidos de socorro foram emitidos da
embarcação de todo imediato enquanto o tempo permitia. Não se podiam conter os
passageiros, uma vez de que todos correram arrastados para o imenso mar. Era,
na verdade, um pânico generalizado. A embarcação tinha a bordo mais de 3.500
passageiros e tripulantes no momento do trágico naufrágio. Os botes salva-vidas
eram atirados ao mar para que pudesse pegar. A água invadiu a embarcação em um
instante e o barco naufragou em duas horas e quarenta minutos. Com vários
passageiros machucados ou levando crianças tudo tornou um verdadeiro tormento.
Com o naufrágio ninguém conseguia com certeza se segurar em qualquer objeto. Os
primeiros socorros demoraram a chegar por mais de duas horas. Já estava
amanhecendo quando alguns passageiros agarrados em embarcações salva vida foram
então recolhidos. Do trágico acidente, morreram vários passageiros, inclusive
as três irmãs e o seu pai Protásio Miller. A sua mulher, Evelyn conseguiu ser
salva. A senhora Miller não mais voltou a Natal. E o casarão ficou ao abandono.
Em alguns anos se ouviu falar em assombros no casarão.
Dizia-se de gargalhadas ou sombras. Alguém avistou uma mulher com véu no seu
rosto e logo desapareceu. Era uma jovem moça dos seus 20 anos de idade com um
vestido de renda. A sua face era de esmerada beleza e falava com alguém do
outro lado do local. Esse fato durou apenas um minuto e a sombra de imediato
desapareceu. Em outras ocasiões ouvia-se falar de gargalhadas como se mais de
uma pessoa estivesse a pilheriar. A Polícia foi chamada até o local, mas em
nada identificou. Apenas os moveis cobertos já há algum tempo era a marca de
alguma pessoa. O casarão era abandonado por todos esses longos tempos. Apenas
uma mulher chegava uma vez por semana para averiguar todos os cômodos. Mas isso
foi há um bom tempo. A mesma mulher já não fazia mais a real visita costumeira.
Falou-se de ter morrido ou estar paralítica. E não se sabia dar o seu
paradeiro. Nesse momento, alguém bateu a porta de um médio. Esse foi ver de
quem se tratava e apenas encontrou um bilhete pedindo para que o homem fosse
libertar as três moças ainda perdida no mar gaúcho.
Médium:
--- Eu não acredito muito em que espíritos mandem recados.
Mesmo assim, temos assim um caso de dúvidas. – relatou o médium
Edgar:
--- Eu já ouvi falar na casa do Coronel Miller. Por algumas
vezes eu fiquei a observar o palacete. Confesso que, eu, pessoalmente, nada vi
de concreto. Porém uma doméstica de falou de ter se assombrado ao passar em
frente ao casarão. A mulher falou de ter visto uma moça encostada a um limoeiro
lendo um livro em plena noite de escuro. Por esse motivo eu fiz várias visitas
ao local. – falou reticente o advogado.
Hermógenes:
--- Eu admito poder haver algo no local. Mas, trazer para o
Centro, isso é um pouco difícil. Sabemos ter guardiões que nos protegem. E
nenhum ente pode entrar em uma sala sem ter a permissão de algum guardião. Para
podermos ir até o casarão, seria mais provável. Então teríamos que em insistir
uma autorização a um Juiz. – falou por sua vez o médico
Melchiardes:
--- Tenho a impressão existir um mistério no plano
espiritual. Há informações confiáveis e detalhadas sobre esse assunto cheio de
dúvidas. Quando se desliga do nosso corpo, a alma se torna a sermos nós mesmos.
Hoje, achamos que nós somos apenas nós. Mas, depois que se morrer, a nossa alma
revive em nós. Acontece, porém, ter entre outros os que chamamos de criminosos.
Pessoas que matam, estupram, roubam. E eles têm almas? Tem! E quando morrem?
Ah. Quando morrem tem muitas vezes que ficar presos ao corpo em desgaste.
Porque eles não sentem a liberdade do desencarne. E isso é castigo? Não! Ele
não sofre de castigo. Apenas não se desligam de sua matéria. Houve um caso de
um jornalista que matou a sua noiva. E ele ficou vivo! Pois quando ele se for,
tenha ou não religião católica ou evangélica, porém ele fica atrelado a seu
corpo presente, pois seu crime não foi atenuado. Ele fica o tempo que for
necessário para então se libertar. Isso se prende as três moças do casarão.
Elas não tiveram tempo de se desvincular da sua matéria. E é até ser prudente
não se questionar a sua presença pós-morte.
Edgar.
--- Então, com relação às três virgens: elas não retomaram a
consciência desta ou de outras vidas? – indagou por saber o advogado.
Melchiardes:
--- É bom entender o que é desencarnação. Esse é o ato de
espirito deixar definitivamente o corpo físico. Outra parte é que os espíritos
de nossos amigos já estão em nosso meio. Esses entes nos procuram para nos
receber. Agora, tem outro caso. O espirito de um morto por assassinato que
levou dez tiros, ele é um espírito bom ou mau? Se for um bom homem, ele
continua a ser bom. Se ele for um mau homem, ele vai continuar sendo mau. Nas
sessões espíritas, os maus espíritos não podem entrar por uma ação da guarda
protetora espiritual existente no local. Eu já estou nessa doutrina há setenta
anos. E sempre vejo espíritos maus desencarnados prostrados na frente de o
Centro a espera de poder ter ingresso. Eles são elementos maus, perversos e
procuram pessoas sem proteção para poder viver como se ainda fossem vivos.
Edgar:
--- Mas a vida no mundo espiritual, ela é contínua. Se eu
tenho um períspirito eu continuo no mundo espiritual. = rebateu o advogado.
Melchiardes:
--- Mas há um espírito sem qualificação que não acessam as suas
vidas passadas por causa da sua própria ignorância de modo físico enquanto
esteve vivendo no seu recente corpo. Ela não se relembra de outras vidas onde
ela responde por crimes, onde foi um mau caráter ou pessoa que abusou dos seus
parentes, que causou alguns danos a sociedade. Aqueles erros estão registrados
no seu inconsciente. Se a cada emoção vinda, pode fazer esse espirito perder
novo equilíbrio. E assim vai depender mais do grau da evolução da pessoa.
Acontece caso de espíritos se lembrarem de fatos cometidos em existências passadas
e vai servir como guia de se conduzir na vida espiritual. Esse é um fato de
muitas vezes nós nos lembrarmos de nossa vida corpórea.
Edgar:
--- Então há uma separação gradual do espirito? – indagou o
advogado.
Melchiardes:
--- O normal é um desprendimento gradativo. – respondeu o
ancião.
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