- TRAPEZIO =
- 06 -
CRIME
Um crime de morte ocorreu pela madrugada da terça feira em
frente a um quiosque existente na Rua São Pedro, nas Rocas. Um artista circense
golpeou até a morte a sua amante por causa de ciúmes. Após matar a mulher ainda
jovem, o mesmo homem cometeu suicídio, atirando com sua arma de fogo no próprio
peito. Houve correria das damas da noite todas atrapalhadas com a sina do
assassino. As damas gritavam por socorro para qualquer um. Houve cenas de
desmaio entre as damas. E os homens que ainda restavam no recinto foram logo para
frente do quiosque e viram a tragédia consumada. Uns poucos organizaram um
cerco enquanto ali chegava a Polícia do bairro muitas horas após. Os corpos
estendidos no chão molhado e frio ficaram por muitas horas da manha da terça
feira até a chegada dos peritos do Instituto Médico da capital. Esse foi um
assunto a correr o campo nas primeiras horas da manhã. Fotógrafos do Instituto
Médico estiveram no local fazendo as fotos dos corpos. Outros fotógrafos da
imprensa do mesmo modo bateram suas fotos para documentar a cena. Conhecido
trapezista, o homem Nicácio Arantes era nascido na Vila da Boca da Mata e
sempre vivia de cidades em cidades fazendo as artes do trapézio. Com os seus
desacertos ele vivia com a bela mundana Maria do Ó desde muito cedo, quando a
moça tinha apenas 16 anos de idade. As brigas entre os dois amantes eram
frequentes. E sempre Nicácio costumava falar ter qualquer dia o dever de por
termo à vida da mundana se a mulher ainda jovem não conseguisse dinheiro para o
homem. As mundanas pouco acreditavam nessa história e nem dava conselhos. A
dona da casa onde Maria do Ó fazia seus negócios chegou a dizer ter na sexta
feira ultima, o degenerado Nicácio ameaçado a sua amante com uma tesoura. A
mulher não deu por vencida e buscou um martelo e lhe disse se ele fosse para
cima ele levaria uma martelada. Essas querelas eram constantes e ninguém mais
dava importância.
Alguns:
--- São brigas de amantes. Depois eles resolvem. Tudo na boa.
– eram o que as amigas relatavam
Nos bares da rua apenas se ouviu o som de uma vitrola de
cabaré em meios às risadas das damas da noite. Alguém argumentava a gargalhar.
Mulher:
--- Já morreu tarde. Ela só tinha o “Ó” mesmo. – gargalhava a
mulher.
Entre gim, vermute, cachaça e cerveja a vida naquele ponto
continuava depois do desassossego da madrugada. Uma mulher gorda, toda
despenteada, com uma roupa sumária, deitava a sua cabeça na banca de um bar. A
mulher lamentava a sua sorte de qualquer coisa perdida na solidão. E então
começava a chorar. A dama clamava por mais um copo de gim para esquecer as suas
mágoas. As demais damas passavam ao largo e com seus acompanhantes deliravam
como loucas.
Outra:
--- Vamos nos amar querido? – se agrava a mulher a um ébrio.
Ébrio:
--- Você é a mais encantadora mulher que eu já tive! – dizia
o ébrio a tombar de um lado para outro
Dois soldados voltavam de dentro do cubículo arrastando outro
ébrio o qual não queria pagar a conta devida. E apenas reclamava com sua voz
intercalada.
Ébrio Dois.
--- Ela não cumpriu trato. Ela deve ir também – e soluçava
como todo embriagado faz.
No bar, se ouvia canções de antigamente nos gramofones cheia
de tristeza marcando o drama de cada qual. As lamentações de um Carlos Gardel
ou Nelson Gonçalves. Diziam as melancólicas canções do medo que temia o ébrio
em uma aventura qualquer depois de vinte anos. Amarguras sentidas, uma rosa sem
perfume já caída nos bolsos dos paletós. Angústias sentidas quando a noite se
olvidava. A bebida se envolvia no cérebro entorpecido dos embriagados. Uma
mulher a fazer ameaças ao ébrio preso por não ter pagado a conta feita. Nada
diziam as damas o drama esquecido à margem do terreno em frente ao quiosque.
Dois embriagados dormiam junto a uma coluna romana perdida no tempo. Pouca
gente procurava olhar de perto os dois cadáveres antes do amanhecer florido de
lama fétida levada até o rio a passar logo próximo. Essa era a história de dois
amantes vividos até pouco antes.
O drama dos amantes da casa de enamorados tomou conta da
cidade logo cedo do dia. A voz dos gazeteiros a gritar a caso da madrugada,
homens a tomar seus cafés da manhã em uma taverna do bairro da Ribeira, nos
escritórios os serventes comentavam a tragédia, nas pensões e hotéis a caso
também era contado. Entre uma conversa e outra veio logo à lembrança de casos
mais angustiosos. Casos deixados à população da cidade em pânico totalmente
estarrecida. Era um fato acontecido com a participação de uma moça, filha de um
casal. A moça encomendou o assassinato dos seus pais para ficar com a fortuna
deixada em seu próprio nome. A moça contratou dois rapazes para que fizessem o
perpetrado crime. E assim foi feito. Mas a Polícia desvendou a questão e
prendeu a desventurada moça tão imediata. Houve um clamor da cidade. O povo fez
vigília a buscar o castigo merecido. Alguns até clamavam pela pena de morte.
Político
--- Esse caso requer pena de morte! Um crime nefasto. Sedição
do povo ainda é pouco! – clamava o parlamentar da tribuna da Assembleia
Legislativa. – falava altivo o deputado.
Mas houve tempo. Tudo se acalmou por ter sido as vítimas uma
prostituta e um cafetão. E ninguém seria preso e punido porque ambos tiveram as
mortes devidas. Na sociedade nem se ouvia falar nesse crime. E ao se perguntar,
as matronas tecendo lã e casaquinhos apenas relatavam.
Matronas:
--- Nem ouvi falar? Quando? – indagava uma matrona
Matrona – 2
--- Parece ter sido ontem. Foi no meretrício. – falava a
outra.
Matrona – 1
--- Mulheres pecaminosas. – era o que a mulher respondia a
tecer sua lã.
Com óculos perdidos no nariz e um longo totó na cabeça, corpo
obeso, vestido comprido até o beirar do chão era esse o mostruário das matronas
com seus trajes estampados de escuro. Elas jamais estavam expostas ao sol para
não se enegrecer.
Matrona:
--- É um mal terrível se expor ao sol. Apenas de manhã logo
cedo. Olhar as rosas. É isso. – logo dizia.
As demais concordavam com plena quietude.
Na sala de servir café, almoço e jantar, o caso da mundana
tomou conta do ambiente. No Hotel onde o doutor Edgar Penteado estava a tomar
seu café com munguzá e tapioca molhada ouvia apenas o conversar dos hóspedes
sobre o cruel assassinato da madrugada daquele dia. Cada um soubesse dizer mais
alguma coisa. Os corpos estavam estendidos do frio chão a espera do médico
legista. Outros maldiziam os cabarés
existentes no meio da feira livre do bairro. Alguém indagou se o criminoso de
qual lugar, pois não ouvira bem a conversa.
Hospede:
--- Ele era trapezista. Ao que eu soube, ele era da Vila da
Boca da Mata. Um lugar para os lados de Ceará Mirim ou coisa assim.
Outro:
--- É para de quem vai à estrada? – indagou outro.
Hospede - 4
--- Não sei. Não conheço o lugar. – respondeu o distinto
hospede.
Nesse pondo dona Almerinda se aproximou de Edgar Penteado e
argumentou a meia voz olhando para os confrades da mesa.
Almerinda:
--- A moça sumiu. – falou murmurando a mulher.
Edgar:
--- Ela veio para cá? – indagou disfarçado seu envolvimento.
Almerinda:
--- Não. E vou perguntar a lavadeira o que é feito da moça. –
falou murmurando.
Edgar:
--- Faça isso. Faça isso. – comentou Edgar sem querer se
envolver mais.
A mulher deu meia volta levando os pratos servidos e
despejando no lavabo da cozinha para se assear de pronto. Edgar se levantou e
saiu de manso buscando os seus objetos de uso, enfim de preparou e logo saiu do
hotel com destino ignorado.
Às 08,00 da manhã de terça feira, Aderbal Macedo chegou, em
companhia de Moacir, seu auxiliar, para dar início a sua habitual faina. Logo
Aderbal entregou as chaves para Moacir abrir a porta de entrada. Na verdade, no
lugar somente havia uma porta: entrada e saída. Sem muita pressa Moacir abriu o
cadeado da porta e passou a chave na fechadura. Tal foi o espanto para ele ao
abrir a porta. Se tivesse passado um furacão não teria tanto impacto quando
aquele que Moacir notou. Em seguida, o rapaz olhou para o seu chefe a procura
de falar, mas sem poder, pois a sala estava um caos. Papeis jogados por toda a
parte. Moacir ainda quis entrar, mas se deteve quando o seu chefe lhe ordenou:
Aderbal:
--- Não entre! Talvez tenha sido um ladrão! Chame a polícia!
– falou ofegante o doutor Aderbal.
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