- Eva Mendes -
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Depois de longo e penoso depoimento do delegado Dagoberto procurando ensinar a Marta como se decifrava a prisão de Mustafá Bardhi e o que ele fizera em uma noite sombria golpeando a sua amante, Dalva de Alencar até a morte, a moça por fim se deu por satisfeita, pois conseguira aprender tudo o que as autoridades policiais fizeram. Mustafá, naquele momento, era um preso e nada mais. Concluído o sermão de Dagoberto para a moça foca ainda, o repórter fotógrafo viu todo o suor que escorria na pela de Marta e disse:
--- Satisfeita, moça? – indagou o fotógrafo quase se acabado também de suor.
--- É. Parece que sim. Podemos ir? – perguntou Marta Rocha.
--- Só se for agora. – respondeu Canindé com muita pressa.
E os dois saíram às pressas pela rua. Marta Rocha olhava o movimento do bairro àquela hora. Era intenso. Agências Bancárias abertas; casas de comercio a cerrar sua porta pela hora do almoço dos operários; carros passando; Bondes trafegando. Um apito! Era o trem de carga a chegar aos armazéns de rua próxima. O buzinaço infernal dos automóveis de praça; o sino da Igreja a bater onze horas; as gargalhadas homéricas dos freqüentadores dos bares; as lanchas da travessia do rio a chegar; os barcos apinhados de gente; os carregadores de compras a andar apressado pelas ruas com seus pacotes na cabeça; um menino a pedir esmola; um relojoeiro a escutar a batida do relógio do conserto; Era tudo isso e mais alguma coisa. O fotógrafo Canindé, apressado, chamava a moça a seguir como se eles fossem os últimos da fila. Marta Rocha, quase a correr, apenas dizia:
--- Espere! Espere! A caneta caiu! – e ela se abaixou para apanhar a caneta.
--- Ora caneta! Compra outra! – respondia o fotografo com ímpeto.
A moça observou o fotografo como a dizer: “Não tenho dinheiro!”.
Após alguns minutos de correria pelas ruas do bairro, o fotógrafo e a repórter chegaram, por fim, ao escritório do Jornal “A IMPRENSA”. Tão logo entrou no escritório, o fotógrafo ali batendo noticias a repórter Cione Damásio e foi logo a perguntar por Armando Viana. A moça então teve um susto e respondeu:
--- Que susto, desgraçado. Eu quase morro. Sei lá. Tá na Secretaria! Vou beber água. Vem sem a gente nem esperar. Ave! – declarou a moça tremendo de susto.
E se levantou para tomar um gole de água. Marta Rocha sorriu com o susto levado por Cione. Era a primeira vez ter avistado. E mesmo assim sorriu com o seu jeito de quem não que sorrir. Cione passou por Marta e indagou de momento.
--- É a nova repórter? – indagou Cione procurando o bebedouro para retirar um pouco de água
--- Sou. – respondeu Marta mais alegre por encontrar outra repórter na sala. O homem, Humberto, já havia saído com certeza, pois o rádio estava desligado.
--- É bom. A gente se diverte. Se bem não se ganhar muito, mas se diverte. – respondeu Cione.
--- Estou começando hoje. – sorriu a moça meio acanhada.
--- Jura? Isso é bom! – respondeu Cione tomando um pouco de água.
--- (Eu) peguei uma ruma de coisa e vou ver o que faço! – sorriu Marta.
--- Polícia? – indagou Cione Damásio.
--- É. Eu estava sozinha aqui e o rapaz de levou com ele. – relatou Marta.
--- Polícia é muito bom para se começar. Você desarna. Depois vem o mais pesado. Eu comecei com policia. – fez ver Cione.
--- Foi? Então eu acho que vou precisar de você? – relatou Marta acabrunhada.
--- Não tenhas duvidas. Nós estamos aqui para isso. – sorriu Cione voltando a sua maquina.
--- Onde se faz xixi? – indagou Marta com certo acanhamento.
--- Alí atrás. No corredor. Tem banheiro lá. – sorriu Cione apontando com o braço.
Após algum tempo, a moça Marta Rocha acabara de bater três laudas da matéria do Turco pensado no seu desempenho como repórter policial. E perguntou a sua colega de profissão já de saída o que ela achava do escrito. Cione olhou mais atenta e no final relatou estar bom. Faltava alguma coisa com respeito à mulher vítima: o nome completo, profissão, há quando tempo vivia com o turco, se ela fazia o “mundo”, há quando tempo. Coisas de menor interesse, porém necessárias.
--- O que é fazer “o mundo”? – perguntou Marta assustada.
--- Puta. Mulher da Vida. Esses que fazem a vida a qualquer preço. Puta mesmo. – disse Cione a enrolar com o dedo o cabelo sem que nem mais.
--- Nossa! E como eu vou colocar isso aqui? – relatou Marta assustada.
--- Assim, ó. Deixa-me ver o texto que eu faço para você. – disse Cione Damásio.
Com a maestria de anos passados Cione Damásio reescreveu o que já estava escrito e pôs um pouco de malicia na noticia pondo sal nas palavras do delegado para ficar mais ardente e de bom gosto para o público leitor. Ao final ela pôs no texto um título da auspiciosa notícia para salvaguardar a matéria de Marta Rocha.
--- É assim que se faz. Agora ponha na mesa do Chefe de Reportagem e caia fora. – relatou Cione Damásio a sorrir.
--- Mas eu volto ainda hoje? – indagou Marta a sua colega de oficio.
--- Se quiser, volte. Ainda você tem de acertar o seu horário de trabalho. Eu trabalho pela tarde. Hoje, eu vim pela manhã somente porque o Governador tinha o que fazer. – proferiu Cione as artimanhas do oficio.
--- Ah! É assim, é? – perguntou Marta a sua colega.
--- É. Se não o chefe manda você de tarde e de noite. A Polícia tem só um expediente. Você pega tudo de uma só vez. E tem mais: escute radio. Ele tem repórter da rua. – relatou Cione.
--- É. Mas eu venho mais tarde para acertar o meu horário. – comentou sem jeito a nova foca.
Cione sorriu e as duas desceram as escadas tomando o rumo de suas casas. Mesmo assim, Cione ainda foi para o Bar de Augusta se despedindo da foca. A moça ainda fez uma pergunta:
--- Você vai para onde? – indagou meio assustada a moça Marta Rocha.
--- Cair na “vida”! – respondeu Cione com uma larga risada.
--- Nossa! Cair na “vida”? – desconfiou Marta do que disse a colega.
--- Quer ir também? - Cione fez a pergunta enquanto andava depressa.
--- Eu não. Cair na “vida”? – suspeitou Marta do que dissera Cione.
À tarde, no escritório, Marta Rocha esperava pelo chefe de Reportagem para ouvir as suas impressões com respeito as suas matérias do Turco. O Chefe era o mesmo secretário do Governador, o jornalista Armando Viana. Ao cabo de algum tempo, de reler as matérias. Ele chamou a moça ao seu gabinete e lhe fez a tradicional pergunta:
--- Você fez essa matéria? – indagou Armando de olhos bem abertos e de cabeça abaixada.
A moça Marta Rocha ficou assombrada com o que terá de dizer a verdade e alguém por trás da sua cadeira foi logo dizendo.
--- Diz que fez! Não foi você mesma! Ora! Esse homem só pensa em derrubar. Tome as fotos do artista. – declarou Canindé com seu corpo um pouco gordo.
--- Fiz. Sim senhor. Eu fiz. – declarou Marta Rocha.
--- Muito boa a matéria. Parece. ... – e Armando calou. Em seguida veio a combinar os horários de trabalho da moça.
Desse modo, Marta Rocha se sentiu empregada de vez no Jornal “A IMPRENSA”, não sendo mais preciso outros requisitos de plena necessidade para seguir em frente. Apenas a Carteira de Trabalho e o Registro eram ponto a ponderar. Com relação ao Registro, esse só teria validade se houvesse uma inspeção no jornal, órgão do Governo ou quase do Governo. De qualquer forma, se poderia justificar ter a moça Marta Rocha começado como aprendiz. E tal fato era o bastante. E, no dia seguinte, Marta Rocha já estava no balcão do delegado para saber das novidades. Ela acompanhada de Canindé fotógrafo, homem profissional na arte a foto apesar de sua sisudez e pouca conversa. Na sexta-feira, Armando estava no mercado da Cidade ouvindo o que os outros companheiros da manhã tinham a dizer certamente com relação às últimas ocorrências da noite e madrugada. Canindé também estava no local, com sua câmera a postos para toda e qualquer eventualidade. As conversas dos marmanjos giravam em torno do preço do açúcar, o qual não parava de subir constantemente.
--- É um horror!!! O preço está na hora da morte!!! – declarou um senhor de meia idade.
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