- Bruna Marquezine -
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COITEIRO
Otelo Gonçalves Dias esperou a
licença dada pelo Deputado Marcolino Godinho para se sentar ao tempo em que
ficou de pé. O homem carrancudo e sério por algum tempo não notou estar Otelo
de pé em frente a ele e quase encostado ao birô. O deputado se conservava sereno a olhar os
papeis postos a sua mesa todos eles incriminando o prefeito de Alcântara, Jorge
Nepomuceno. Eram papeis com os dados de entrada e saída do Coronel da cidade ou
quando o mesmo ficava por longo período na fazenda. Dados sobre seus jagunços e
coiteiro; moradas dos coiteiros a casos seguros e fortes do Coronel Godinho. Estava
anotado também o seguir da campanha eleitoral e o nome de Otelo Gonçalves Dias
para suplente. O velho observou tudo com bastante cuidado e depois de alguns
minutos foi soerguendo a cabeça para onde estava o bandoleiro e viu naquela
hora estar o homem em pé e bastante quieto. Então, Godinho indagou do seu
ajudante:
Godinho:
--- O senhor viu isso aqui? –
indagou o homem com voz tranquila.
Otelo:
--- Não senhor. Tudo ficou com a
senhoria Ludmila. – respondeu Otelo com paciência.
Godinho:
--- E o coiteiro quem é? –
perguntou cismado o Coronel.
Otelo:
--- Quem sabe é a senhorita. Logo
depois de nós entramos na casa de Teodoro ela saiu. E depois foi embora. É
provável ter encontrado o coiteiro na estrada. – respondeu Otelo sem temor.
Godinho:
--- Na estrada! E Renovato estava
aonde? – indagou o Coronel um tanto desconfiado.
Otelo:
--- Bem! O pistoleiro,
provavelmente, estava com a senhorita. – respondeu Otelo um tanto temeroso.
O coronel ficou calado e mandou
Otelo sentar. E esse obedeceu. Em seguida o Coronel especulou para saber se o
pistoleiro não tinha visto o seu nome escrito nos papei. E o homem respondeu
que não:
Otelo:
--- Não vi não senhor! - respondeu o pistoleiro.
Godinho:
--- E o coiteiro? Nem isso o
senhor sabe? Pois vamos ver quem é o homem. Peço que chame o Renovato aqui. –
respondeu de vez o Coronel.
Otelo:
--- Sim senhor! – disse de vez o
pistoleiro e se levantou para ir até à frente da casa.
Foi e veio. Otelo e Renovato. O
rapaz estava tranquilo. Nada o assustava. Foi quando o Coronel indagou para
Renovato quem seria o coiteiro. O rapaz olhou para Otelo e de imediato
respondeu:
Renovato:
--- Manoel Quelé, meu senhor! –
respondeu sem titubear o pistoleiro.
Coronel:
--- Quelé? Quelé? Quelé? Filho de
uma puta! Aquele corno sabia de tudo! – reclamou exaltado o velho coronel.
Renovato:
--- Penso que não. Ele arranjou
uma arenga com o prefeito e, por isso, falou tudo o que ele sabia. Mas apenas a
senhorita Ludmila. Eu estava presente à conversa! – respondeu Renovato.
Coronel:
--- E onde ele foi posto agora? –
indagou perplexo o Coronel.
Renovato:
--- Aqui mesmo senhor! Espera
apenas que o chame! – respondeu azougado o pistoleiro.
Coronel:
--- Aqui? Nas minhas barbas? –
falou alto o coronel cheio de ira.
Nesse momento a porta se abriu e
a moça Ludmila entrou com o sujeito Manoel Quelé. Ele meio acanhado, já sem
forças para andar, a segurar um chapéu de palha nas mãos, roupas sujas e
rasgadas, um cinturão de cordas na cintura, sem armas de qualquer natureza.
Apenas pedindo a proteção do Coronel Godinho.
Ludmila:
--- Eis aqui o homem. Coronel. Já
velho por demais. Ele quer apenas um lugar para morrer. Foi ele quem falou tudo
o que eu sei. – reprovou a senhorita Ludmila.
O Coronel ficou abismado com aquele
traste velho. Antes, um homem corajoso, valente por sinal, coiteiro de fama. E
naquela hora um traste perdido no meio da selva.
Coronel:
--- Não acredito no que estou
vendo! Quelé é o senhor mesmo? – indagou perplexo o Coronel Godinho ao rever
aquele coiteiro.
Quelé:
--- Sou eu mesmo Coronel. É a
vida! A gente não sabe o dia do amanhã. Mas sou sim! - respondeu o coiteiro Quelé todo arrasado.
Coronel:
--- O que é feito da tua vida?
Como o senhor está acanhado? Velho e sujo! Eu tenho pena até. Um protetor de
jagunços e bandoleiros!...Francamente! Bem! Vamos ao que interessa! Onde o
senhor estava que eu nem ouvi falar? – perguntou de modo austero o Coronel.
Quelé:
--- Andando! Andando! Vez aqui.
Vez acolá! Não mais me meti com tropas de “macacos” e nem com jagunços. E mesmo
as autoridades. Tudo o que eu faço é andar! – disse Quelé com voz débil.
O coronel olhou Ludmila e se
voltou para Quelé.
Coronel:
--- E o que mais tem a dizer?
Como soube do caso de Teodoro? – indagou meio sem jeito o Coronel.
Quelé:
--- Teodoro era um pistoleiro de
aluguel. Era pago para matar! Mas não teve sorte dessa vez! O pistoleiro
Satanás foi mais ágil que ele e o matou sem dó nem piedade. A moça do senhor
também teve sorte. Ela chegou ao fim da luta e alvejou um capanga. Eu vi tudo!
A menina leva jeito com as armas! E, afinal, eu disse para a senhora. Quem
mandou foi o prefeito Jorge Nepomuceno. Agora ele está escondido fora daqui. É
o que eu sei! – reportou Quelé.
Coronel:
--- Mas o senhor sabe de tudo
isso e não me procurou? – relatou perturbado o Coronel.
Quelé:
--- O senhor não acreditaria no
que Quelé dissesse. – pontuou o guardador de bandidos.
Coronel:
--- Tem razão! Tem razão! Eu não
acreditaria! O senhor mesmo é quem o
diz! Mas, me diga uma coisa: para onde foi o prefeito? – indagou o Coronel
Godinho.
O impasse se deu para todos os
ouvintes de Quelé.
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