ANSIEDADE
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Naquele momento a moça entrou
em terrível desespero. O temporal soltava urros como um urso e Vanesca tentava
correr do celeiro da casa em busca do pai amado. Não fora a ação de Otto, a
moça tinha corrido com pressa em busca do seu pai. E nem se lembrava de sua
mãe. Ela queria apenas o pai a quem tanto idolatrava. Era um verdadeiro brado
de ânsia aquele de um momento embriagador. Vanesca tentava escapulir das mãos
de Otto e esse não soltava temendo coisas mais sérias por ouvir os troncos de
arvores sendo arrastados de encosta abaixo a bater contra a parede do celeiro
cravado por trás da casa e abaixo do chão imundo. Para se seguir até o celeiro,
a pessoa tinha de passar por uma escada sempre coberta no chão por uma proteção
a disfarçar a entrada do local. Ao contrário de outros celeiros, sempre feito
para cima, esse era feito para baixo onde o homem cavou o chão de barro. E em
consequência por isso Eugenio ter chamado os dois amantes para descer ao galpão
não falando o nome de celeiro. Com o
zoar das árvores a romper ladeira abaixo, Otto evitou Vanesca de sair:
Otto:
--- Espera! Não estás vendo os
estrondos! Teu pai está bem! E lembre-se também da tua mãe! Eu tenho ainda a
minha família! Não vai! – fez ver o homem agarrando a moça.
Vanesca:
--- Eu quero! Eu quero! Solta!
Solta! – gritava a mulher a todo custo.
Otto:
--- Não solto! Fica aqui! E o
celeiro está trancado! – disse enfezado o rapaz.
A luta terrível dos dois
amantes prosseguiu por alguns instantes até a moça caminhar e chorar por vários
minutos e a sentar em um saco de feijão. Ali, Vanesca baixou a cabeça e
esmurrou os sacos próximos como sendo eles os culpados de todo o enredo. Fora,
os trovoes brandiam. E, por conseguinte as bolas de fogo continuavam a cair sobre
a mata no alto do monte. À noite caminho com toda a enxurrada a arrastar
madeiras apodrecidas e o ribombar dos trovões. Aquela foi uma noite insone para
os três albergados. Apenas o lampião continuava acesso, silente como igual
criatura a olhar os pensadores eternos. O sol parecia brilhar às cinco horas da manhã.
A chuva estava cessando. Porém, o desaguar ainda persistia. Eugenio subiu a
escada e abriu devagar para ver o ambiente fora, dentro da casa. A não ser as
goteiras, tudo parecia está em ordem. Ele fez um aceno para os dois amantes
como a chamar.
Em baixo, para aonde o rio de
lama corria, formava-se uma lagoa um tanto gigante. Junto estavam os troncos
das árvores arrastadas pela borrasca. Pouco se notava a principio. Vanesca pôs
a mão na boca e chamou apenas pelo pai.
Vanesca:
--- Meu pai! Coitado! Onde
estará? -lamentou a moça de forma pensativa.
Otto procurou confortar a sua
noiva alegando ele está àquela hora em local seguro.
Otto:
--- Eu acredito que ele esteja
em local seguro, no Monte pra onde pretendia caminhar. – relatou o rapaz.
Eugenio:
--- Aqui tem muitos locais.
Ninguém passa despercebido. E ele, principalmente. – comentou o ermitão.
Com toda essa conversa para
Vanesca nada importava. Ela apenas olhava o lago formado na descida do barranco,
muito abaixo. Era uma verdadeira lagoa como Vanesca nunca vira. Eugenio olhou
para a moça e findou por dizer:
Eugenio:
--- É comum essa lagoa. Quando
chove a água se junta. E corre o tempo para secar. Às vezes demora três meses.
Não desse tamanho. Um pouco menor. Eu nunca ouvi dizer de afogamento de
pessoas. Às vezes, um burro ou uma vaca. Animais menores. São as principais
vítimas. – relatou com tristeza o
ermitão.
E a lagoa continuava a crescer
por conta do despejo de muita lama proveniente das encostas da serra. O caso
era de impressionar. Em dado instante, um volume surgiu nas ondas. Parecia ser
o naufrágio de uma embarcação. Vanesca avistou a cobertura daquilo parecido com
uma carroça. A moça avistou com pressa e logo gritou:
Vanesca:
--- A carroça do meu pai! –
gritou assombrada a moça.
E fez finca pé para correr e
entrar na lama da lagoa. No mesmo instante o seu noivo ameaçou a moça com
impaciência. Queria ele deter a jovem na sua correria. O que Vanesca avistara
era apenas uma carroça e não podia identificar se era ou não do seu pai.
Otto:
--- Espera! – gritou aos brados
o rapaz.
Vanesca:
--- Larga meu braço. Eu conheço
a carroça! – gritava a moça sem sossego.
O rapaz se agarrou com a moça e
a colocou no chão comum baque terrível. Era um por cima do outro e o rapaz a
todo custo procurando dominar aquela fera em desastre. Quanto mais o rapaz
fazia força para brecar Vanesca, essa lutava com a finco para se soltar. Era
uma luta cruel cheia de total desespero. E num brado de gigante, a moça se
desvencilhou das garras do seu noivo e correu para as águas da lagoa onde se
atirou febril a nadar com desatino em busca do destruído carroção. O noivo
correu atrás a nada com toda força para ver se atingia Vanesca. Ao largo, o
homem Eugenio reclamava como um louco para os dois parassem de tal guerra. Nem por isso o casal ouvia o dito do eremita.
As águas turbulentas da imensa lagoa continuavam a crescer entre galhos e
troncos de árvores arrancadas das encostas da serra. Parecia até mesmo uma
lagoa natural e não um lado formado apenas com águas de chuva. Otto se esquivava de um tronco de árvore a
passar e Vanesca chegava mais próximo do carroção. Era uma batalha dura de
fazer entre a mulher e o rapaz. Aos brados, Otto tentava parar de vez à sua
noiva:
Otto:
--- Vanesca! Vanesca! Vanesca!
Cuidado! Espere por mim! – gritava o rapaz como um louco.
Um tronco de árvores passou por
perto de Otto, quase batendo com o rapaz. Mesmo assim, ele continuava a nadar
enquanto a moça nadava sem o menor cuidado. Roupas de pessoas passavam a todo
custo de um lado para outro. O corpo de um cão morto. Um bode, uma vaca. Tudo
já consumido pela tormenta. E por fim a
moça chegou ao carroção. E com ligeira pressa gritou:
Vanesca:
--- Meu pai!!! – gritou a
desnorteada moça.
Tão logo chegou ao carroção,
Otto fez força e conseguiu subir e pular para dentro. A sua roupa estava
totalmente encharcada pela lama da lagoa e o frio se fazia presente. Mesmo
assim, ele nem sentia. Estava naquele instante a embarcar no carroção, já quase
meio naufragado. A correnteza das águas puxava para o meio do lago a velha
carruagem de tempos remotos. Num instante a embarcação estalou e adernou para o
lado direito. Otto cambaleou e se segurou para não cair. Por breves momentos
ele procurou a sua noiva. Ela estava mais a frente a procura do seu pai ou de
parentes. Porém nada encontrou a não serem uns trapos amontoados entre
cadeiras, panelas e outros utensílios domésticos. Quando a gerigonça adernou,
Vanesca também levou um tombo e por pouco não caiu. Ouviu quando Otto lhe
chamou, porém não deu atenção. Contudo, o rapaz se fez de forte e reclamou:
Otto:
--- Está vendo. Não tem ninguém
aqui. Esse é a carroça do seu pai? – indagou o rapaz procurando se assentar
melhor dentro da carroça.
Vanesca:
--- E o burro? – indagou
perplexa a moça.
O rapaz se espantou o voltou a
perguntar.
Otto:
--- Que burro? Que burro? Não
nada aqui! – disse o rapaz cambaleando por dentro da diligência.
Tudo isso acontecia no meio de
muita revolta por parte de Otto. Ele estava exausto de poder nadar até à
diligencia e já não tinha coragem de voltar para a margem da lagoa. Seu queixo
bateu. Foi então ter ele sentido frio. E se agasalhou como pode com as mãos
encruzadas nos peitos
Vanesca:
--- Mas essa é a carroça! Estou
vendo a mobília. – falou exaltada a moça.
Do outro lado do lago, Eugenio
empurrava sua canoa para seguir até a carroça já um tanto pensa. Ele
movimentava a canoa ao mesmo tempo a olhar para a geringonça sendo arrastada
para o meio do lago. E ouviu um grito. Era de outra canoa. Um homem gritava.
Ele remava com o auxilio de outro homem. Eram dois a remar. Eugenio olhou fixo
para o lado da canoa e fomentou.
Eugenio:
--- O coronel! Só pode ser!
Todo encharcado de lama! – relatou o radio amador.
Na verdade, era o Coronel
Araújo a navegar pelo lamaçal a procura da sua carroça. O homem vislumbrou de
imediato a presença de sua filha e a chamou com certeza. A moça, quase a cair,
se voltava para a canoa do seu pai e relatou com pressa.
Vanesca:
--- Pai? Meu pai? Meu paizinho?
– gritou alegre por demais a moça.
Coronel:
--- Saia daí. A carroça vai
emborcar! – gritou o velho coronel.
E não teve outra. Com pouco
tempo a carroça emborcou de vez.
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