- Amanda Seyfried -
- 71 -
RIO
Em um dia
qualquer a enfermeira Fabiana entrou na suíte hospitalar onde estava há mais de
um mês em recuperação o seu irmão Jonas. Na hora, Jonas estava quieto e só. A
outra enfermeira já havia feito o asseio e dado os medicamentos ao enfermo.
Sempre a sorrir, a moça se acercou da cama e se sentou em uma poltrona bem
perto e estirou as pernas de modo a repousar por inteiro. A beliscar com os
dentes as suas unhas, Fabiana olhou bem para o seu irmão antes de começar a
conversa. Ela verificou a sua temperatura e pode acreditar não ter havido mais recaído
no seu estado de saúde. Há vários dias, um mês por assim dizer, Jonas parecia
normal. Naquela ocasião, o homem estava calado e pensativo como a se lembrar do
acidente do qual vitimou a sua esposa. Os dois filhos do casal sempre o
visitavam logo após as aulas. A virgem Fabiana então indagou:
Fabiana:
--- Calado? –
indagou.
Jonas:
---
Lembranças. – respondeu.
A moça calou
por um instante. Lembranças: era uma mágoa da qual não se passava como a lua, o
sol, o vento. Fabiana notou uma lágrima escorrer na face de Jonas. Ele, na verdade,
estava tristonho do acidente fatal. Claudia Rizzo não teve tanta sorte. Essas
mágoas embutidas levavam o homem para um espaço melancólico. A irmã Milena, não
aparecera no dia passado. Nisso ele lembrava. E até quis perguntar. Mesmo assim
calou. A sua irmã notou e quis saber.
Fabiana:
--- Alguém
apareceu? – quis saber.
Jonas:
--- Minha mãe.
Ontem. Ninguém mais. Aliás. Você. –
disse o homem.
Fabiana ficou
calada pensando em como dizer ao irmão. Naquela hora ele já podia saber. Mas a
magoa o atormentava sobremaneira. Magoa da vida, da lida, de tudo enfim. Ele
apenas se ressentia da estrada, do caminho, de algo feito. De tudo afinal. Uma
lembrança atroz. Um grito aterrador. Um matagal, um galho seco e nada mais.
Lembranças, lembranças, lembranças. Tudo apenas lembranças. O caminhar, um
carro. Outro grito aterrador. Um choro de criança. Vento frio. A morte. A
morte. A morte. Ele não se lembrava de como foi encontrado nem por quem ou como
chegou ao hospital. Sua mulher. Sua mulher. De repente, um grito aterrador.
Jonas:
--- Claudia! Onde está você? – ele próprio
chamava com verdadeiro alarde.
Tudo isso
assustou Fabiana. Um susto incomum, pavoroso, tremendo! O homem quis se
soerguer, porém ele estava preso por ataduras à cama. Seus olhos soltavam
faísca de lágrimas coloridas de tamanho diverso. Da sua macilenta boca descia
uma saliva grossa igual aos loucos enraivecidos de ódio. Sua mão ainda vazia
increpava-se como afiadas garras. Parte do seu incontrolável corpo estremecia
com fúria homicida de alguém possesso. Loucura.
Turbilhão de insanidades. Um grito preso na garganta. Gente a acudir. Brados e
mais brados. Ele não parava de urrar. Apenas dizia o tal nome da sua amada
Claudia. Na cama todo atado, ele era o caso com um olhar extraordinário a todos
e a tudo. Bramidos do terror o homem soltava a todo e cruel instante. O desumano
momento era então diminuto para o seu bárbaro, frio, hediondo, repugnante,
aterrador clamor. O apartamento se encheu de pessoas. Alguém verificou os tubos
de soro. Fabiana era toda pressa. Gritava com outras pessoas.
Fabiana:
--- Acudam!
Acudam! Chame o médico! Ele entrou em crise! – dizia sem demora.
Alguém chegou
perto. Uma agulha. Um homem de branco. Jonas a gritar terrível como a estar
possesso. A chamar por sua esposa a todo o tempo. Ele queria ver a mulher que
tanto amava. Um segundo. O efeito. A dormência. O apartamento a rodar, rodar,
rodar. E tudo apagou de vez.
Passaram os
dias e Jonas estava totalmente desacordado por efeito do medicamento passado
pelo especialista. O movimento era intenso no apartamento naquele momento da
história. O homem estava sem sentidos. Proibidas as visitas a qualquer hora. O
especialista temia quando Jonas saísse do coma. Apenas Fabiana, enfermeira,
tinha acesso ao apartamento. Ela, apesar de ser irmã, era também enfermeira.
Medico:
--- Todo
cuidado é pouco. Não se devem deixar quaisquer objetos por perto. Eu não sei o
grau de torpor do paciente. Cuidado! – preveniu o especialista à Fabiana.
Fabiana:
--- Pode
deixar. Eu cuido do paciente a toda hora. – responde a moça.
Médico:
--- Nenhuma
visita. Nem a própria mãe. – alertou o medico.
No instante,
adentrou o médico Eurípedes para saber o estado de saúde do seu irmão. Ele
viajara em um vou com a maior rapidez possível para saber dos resultados dos
exames feitos no angustiante paciente. O medico atendente disse-lhe ter o
quatro de saúde de Jonas se agravado em um determinado instante.
Médico:
--- Ele estava
muito bem. Aconteceu o que se pode classificar como transtorno bipolar de
humor. O senhor sabe muito bem desse transtorno. É o tipo de ocorrência
psicótica um tanto desconhecida da Medicina. Espectro Bipolar. Sentimento de
irritabilidade. Ou até mesmo de impulsividade. Na prática, pouco ainda se
conhece. Parece-me até com a esquizofrenia. Uma forma degenerativa. É o que
podemos afirmar nessa ocasião. – falou o médico.
O irmão de
Jonas, doutor Eurípedes, abaixou a cabeça para pensar melhor. Uma vez ou outra
coçava a sua cabeça, ajeitava o seu penteado, e até mesmo coçava o ouvido. Um certo espaço de tempo Eurípedes se ajeitou
na cadeira e perguntou ao seu colega se estava sendo liberada a visita.
Eurípedes:
--- E visitas?
– indagou.
Médico:
--- É
recomendável apenas os que fazem limpeza. Assistente, enfermeiras. A irmã do
paciente está liberada para acompanhar o enfermo. Apesar de ser irmã, ela
também é enfermeira. – destacou o médico.
Euripedes:
--- A mãe do
enfermo? – indagou.
Médico:
--- Nós
preferimos não. A mãe não é enfermeira. E há o sentimento de posse. – explicou.
Após longa
conversa com o médico o doutor Eurípedes foi até o apartamento do seu irmão. A
sua irmã Fabiana não estava no momento. Apenas uma auxiliar de enfermagem. Ele
indagou pela enfermeira e recebeu por resposta ter a enfermeira de rápido saído
por alguns instantes, provavelmente para trocar de vestimenta ou coisa da
espécie. Eurípedes voltou a coçar a cabeça e teve de olhar com melhor atenção
como estava a passar o seu irmão. Ele pigarreou, pôs a mão no seu queixo e
passou a meditar sobre o futuro do seu irmão. Quando coçava seu ouvido ele
percebeu a volta de Fabiana. O doutor estava preocupado e perguntou sobre o
estado de saúde de Jonas. Teve a resposta imediata:
Fabiana:
--- Ele entrou
em convulsão e a equipe de enfermagem lhe fez um sedativo. De lá para cá apenas
dorme. - respondeu com sentimento.
Eurípedes:
--- Você? –
indagou.
Fabiana:
--- Como e
durmo aqui. É o jeito. - respondeu transtornada.
Eurípedes:
--- Nossa mãe
está incontrolável – explicou
Fabiana:
--- Ela não
pode entrar. – disse.
Eurípedes:
--- É o certo.
– completou.
Um tempo
depois, o doutor Eurípedes esteve a percorrer o Hospital verificando sala por
sala e encontrado pessoas dementes, vestidas com um mando de linho branco aberto
às costas e inteiramente despido. Uma mulher um pouco idosa apenas estenda-lhe
a mão a pedir uma esmola pelo “amor de Deus”. Uma enfermeira a levou de volta
para o seu cômodo com toda pressa possível a segurar-lhe as costas. Um doente a
gargalhar como um louco. Em um quarto, um homem a fiar em um tecido
inexistente. Um louco a formular discurso com a mão direita para cima. Um homem
a empurrar um carro de mão cheio de roupas usadas.
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