- Adriana Birolli -
- 26 -
Era manhã de domingo. Às 9 horas, o velho Diomedes pediu autorização ao seu chefe, Silas Albuquerque, para visitar a sua mãe. Esse concedeu de imediato desde que ele – Silas - e sua mulher também pudessem ir. Já fazia alguns poucos dias que o grupo regressara da viagem que fizera ao velho mundo. Ainda pairava na memória de Molambo o que o homem vira nos passeios que dera pela Itália e Turquia. Casos impressionantes que ele nunca imaginara poder ver. Desde o tempo em que perdera a sua noiva, Cila, morta quando seguia para o altar de casamento, Molambo se desatinou da sorte e virou um mendigo. Suas roupas sujas e um saco nas costas era o presente de um verdadeiro molambo a ficar pelas ruas da capital. Foi assim que os amantes conheceram o homem. Tempos depois, os amantes viram Molambo quando ainda não tivera o propósito de mudar de roupa. E um caso ou outro, o velho tirou os trapos de seu corpo e então, após tantos anos de mendicância virou um soberbo homem. E no momento, o velho Diomedes estava querendo ir ao vilarejo dos Coqueiros para pedir a bênção a sua mãe já bastante idosa após ele retornar de sua longa, porém alegre viagem. Quando esteve na Itália, Diomedes adquiriu presentes para a sua velha mãe, Maria, para a irmã Luiza, para as sobrinhas e filhos das sobrinhas. Ele faria uma verdadeira festa ao chegar da viagem exaustiva que havia feito. Por tal motivo foi que ele pediu a autorização ao seu chefe para poder visitar a sua mãe, irmã, sobrinhas e filhos das sobrinhas.
Muito alegre por ter que ir com Molambo a vila dos Coqueiros, Silas de imediato se arranjou e fez o mesmo com a sua amante. A senhora Vera Muniz casara com Silas muito antes de viajar para a Itália. Alegres e satisfeitos, os três seguiram viajem para o interior do Estado, uma região de praia onde havia paz e sossego para os visitantes. A senhora Vera Muniz já estava no quinto mês de gravidez e sua barriga incomodava. É tanto que a senhor sempre seguia com o apoio das mãos em seu ventre. Quando os três começaram a viajem, Silas ainda perguntou a sua mulher:
--- Não falta nada? – indagou Silas a mulher. Por surpresa essa declarou.
--- Ah. Os presentes. Eu já se esquecera de colocar do automóvel. – disse Vera Muniz.
E assim, sorrindo, desceu do carro para ir buscar os tais presentes que ela e o seu marido também arranjaram para dar a família de Diomedes. Ao entrar em seu apartamento, notou uma janela ainda aberta. Com o vento que soprava aquela altura, no décimo andar, objetos foram postos ao chão pela força da ventania. A mulher procurou fechar a cortina e a janela para em seguida apanhar os presentes guardados em cima da cama de casal no quarto onde ela e o marido dormiam. A porta do quarto estava aberta. Isso não faria suspeita a Vera. Porem, ao entrar no quarto onde apanharia os presentes, um vento forte açoitou o quarto, e a porta abruptamente se fechou. A mulher estremeceu de susto. Algo inusitado. E ela viu que a outra janela, a que havia no quarto, também estava destrancada. Ela olhou para um lado e para o outro e, por fim, partiu para o vão da janela. Pôs a cabeça para o lado de fora e viu seu marido a conversar com Diomedes. De cima do apartamento, Vera indagou:
--- Tudo bem aí? – gritou a mulher achando graça para o seu marido.
--- Como? Tudo! – pôs a mão no ouvido o marido e respondeu alegre.
A mulher sorriu e disse.
--- Estou chegando! – sorriu a mulher para o seu marido.
Vera Muniz trancou a janela, puxou a cortina e foi apanhar os presentes que tinha posto em cima da cama. Ali passou a mão no lençol e de repente sentiu a presença de algo estranho em sua sala de jantar. Ela se virou e nada viu. Um frio açoitou o seu corpo. Ela estremeceu. E correu para a porta vendo se havia alguém ou algo. Vera já a essa altura tremia de medo. Porém ao olhar em derredor, nada pode enxergar que desse sinal de invasão. Pé diante pé a mulher seguiu para sair do apartamento quando, de repente, algo estremeceu a suas costas. Vera se voltou de imediato. Nada vira com certeza. Apenas a porta do banheiro estava aberta.
--- Estranho! Aberta?! – indagou a mulher ao ver a porta aberta.
Ela quis fechar, mas aproveitou para chamar o seu marido que estava embaixo a conversar com o velho Diomedes. Foi até a janela do apartamento. Tentou abrir e essa não obedeceu. O tranco estava duro. Isso era devido à intensa maresia. Tais efeitos em suma afetavam todas as embalagens feitas de ferro como eram os ferrolhos. A mulher desistiu. Temerosa com a porta, ela puxou o trinco e fechou deixando o banheiro totalmente lacrado. Vera olhou em volta, no quarto e a porta do banheiro e nada se mexeu. Por fim, a mulher, com a sua barriga já bem crescida, ela seguiu viajem para abrir e fechar a porta principal do apartamento e pegar o elevador que parava em frente ao seu domicilio. Um homem que vinha no elevador era um morador do último andar. Ela estremeceu de susto. O homem todo de fraque ficou parado no canto do elevador. Vera Muniz entrou no elevador e cumprimentou o homem. Esse a olhou sombrio como não querendo receber cumprimentos.
--- Bom dia senhor. Tive um susto! – reclamou a mulher.
--- Bom dia. – respondeu o homem com voz carregada após longo tempo.
Vera Muniz se postou no outro canto da cabina pedido a Deus que aquele ascensor o vácuo de uma vez por todas já descesse. Apenas ela olhava o homem de fraque que estava sombrio a olhar em outra direção. Após alguns segundos um leve estremecer. O ascensor chegou ao fim do seu trajeto. A mulher se apressou em sair da cabine, quase que correndo, com o coração a bater fortemente e nem olhando mais para o tal homem. A chegar ao automóvel do seu marido ela ainda pensou comentar sobre os acontecimentos pelo qual passara. Porém se conteve e nada preferiu. Apenas juntou os seus presentes arrumados em um canto do banco de trás. Ainda sorriu para Diomedes que estava pronto a esperar que a mulher se desocupasse do seu trabalho. A barriga de Vera um pouco a incomodava. Ela, ao sair do assento da parte de trás do carro, ainda comentou:
--- Essa barriga!! – explanou Vera e sorriu.
--- Pronto? – indagou o Silas a sorrir.
--- Tudo. – respondeu Vera a enxugar a testa molhada de suor.
--- Então vamos nós. – sorriu o homem entrado em seu assento de direção.
--- Pronto? – indagou a mulher ao velho Diomedes.
--- Tudo bem. – respondeu Diomedes a Vera.
Ao chegar à casa de Diomedes, o velho, o casal desceu e logo foi cumprimentado por Luiza, irmã de Diomedes, suas filhas e a meninada. Luiza trajava roupa que fora dada por Vera. Os meninos estavam alegres pensando apenas nos pacotes, pois ali deviam estar os maravilhosos confeitos de hortelã. As moças eram as mais tímidas. Um rapaz postou-se a levar os pacotes para o interior da choupana. A mulher, Maria, mãe de Diomedes, ficava dentro da casa a apenas perguntar:
--- Quem é que está lá fora? – indagou à anciã querendo adivinhar quem podia ser.
O rapaz pouco informava e só dizia.
--- Seu filho e os patrões. – comentou o rapaz.
Dona Maria, a anciã, quis se levantar da rede, mas preferiu ficar sentada, descansando, com as pernas estiradas para fora do descanso, utensílio doméstico de origem indígena. Dona Maria ainda era do tempo que se chamava redes de “hamaca”, mas já enfeitadas com varandas e franjas. Com isso, ela sempre estava a pedir à filha que pusesse a sua “hamaca” de dormir, coisa que nem precisava, pois sempre a sua hamaca estava pronto para a anciã se deitar e não raro dormir. Naquele dia a situação era bem mais diversa. Diomedes entrou casa adentro e foi pedir a bênção a sua mãe. Essa estranhou a figura do homem vestindo calças de gabardine. E de imediato perguntou:
--- Quem é esse homem? – indagou a anciã a sua filha Luiza envolta de netos, bisnetos e do casal de amantes.
--- Não é Dió, velha. Nem conhece mais o teu filho? – reclamou a Irma Luiza estarrecida.
--- Dió? E eu tenho filho Dió? Os que eu tive já morreram. – comentou a anciã.
--- Mas esse é Diomedes, velha! - fazer crítica a irmã de Diomedes.
--- Diomedes? Mas é meu filho. Mas ele está diferente. Ele nunca foi assim desse jeito. – resmungou a anciã desconfiada.
--- Mas ela agora está assim. E pronto. Ô velha renitente! - reclamou a filha Luiza
--- Meu filho? É você mesmo? Como está bonito! Que roupa é essa de você veste? – indagou à anciã se arrebatando em choro.
--- É roupa minha mãe. Quero a sua bênção. – chorou Diomedes ao pedir a bênção.
Vera que estava ao lado também chorou de ver tanta alegria e emoção sentida pela anciã ao rever o filho trajando vestes limpas e de gabardine. E Diomedes adotava camisa e calça de gabardine, tecido antigo e durável feito de algodão com belas e distintas nervuras. A anciã não mais lembrava que tantas vezes lavou esses tecidos nos domicílios de gente rica da capital quando Diomedes era menino. Por isso mesmo o velho menino chorou.
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