terça-feira, 4 de janeiro de 2011

AMANTES - 42 -

- Simone Signoret -
- 42 -
Após longo período de espera para a recuperação total de Racilva, a moça recobrou a plena consciência e teve por Silas verdadeira admiração porquanto esteve com ela aquele imenso tempo todo até que a jovem retorna-se ao equilíbrio ainda que não fosse total. Então, Racilva não podia mais falar na casa que ela avistara no seu temor, pois aquilo era algo que apenas a moça cabia a propriedade de ver. Quando Silas voltou a perguntar sobre a mansão que ela tivera ocasião de ver e falar, Racilva nada confirmou:
--- Foi apenas um desmaio. Talvez por que não tive vontade de comer algo. – respondeu Racilva procurando se reanimar de vez.
--- Você tem sempre essas coisas? – indagou Silas a Racilva.
--- Não que eu me lembre. Uma vez, no tempo do colégio, se bem me lembro. – declarou Racilva ainda tonta pelo temor que lhe fizera a pessoa desencarnada a chamar para entrar no solar abandonado.
--- Você precisa se cuidar. Prepare algo para comer. – falou Silas atarefado.
--- Vou cuidar disso. Dê-me um pouco de tempo. – respondeu a moça a Silas.
Após meia hora de eterno repouso, a moça relatou que talvez não fosse possível mais, pelo menos por enquanto, ela ficar com Silas apesar de sentir um forte amor pelo companheiro de trabalho e esposo da amiga Vera Muniz. O homem ficou atônito com a decisão tão apressada da jovem e ainda perguntou a razão de tal decisão. Ela respondeu que com um tempo depois lhe explicaria a razão do que assumira naquela ocasião. Silas cismou do que ocorreu nos degraus da escada e perguntou a Racilva se o desmaio foi extemporâneo. E ela respondeu que sim, mas não podia replicar mais alguma coisa a esse respeito.
No Mangue. Silas procurou um moço que sabia lidar com embarcações tipo jangada. Não foi difícil, vez que no local tinham vários carpinteiros que operavam na construção de batelões, botes e também jangadas. Ele acertou com um rapaz cujo nome era Soares de ir com ele ao canto da praia dos Coqueiros para verificar o estado de suas jangadas, pois, pelo menos tinha uma que estava totalmente desmanchada. Os dois acertaram de ir no domingo pela manhã. Instantes depois Silas voltara à seu apartamento e ali repousou por a tarde e noite inteiras até a manha do domingo. Ao chegar o dia aprazado, Silas perguntou a Vera se ela desejava ir com ele para a praia dos Coqueiros e a mulher descartou tal hipótese, pois estava bastante cansada e aquele menino não lhe dava sossego. Silas sorriu e advertiu a mulher:
--- Cuidado. Qualquer coisa vá de imediato para o Hospital. – falou serio o marido.
Vera então sorriu se retorcendo na cama a procura de um local melhor para se acomodar com cuidado. Então, logo após, Silas seguiu para o Mangue e ali apanhou Soares, homem de seus trinta anos e pegou rumo da praia dos Coqueiros. A distância era pouco longo e por volta das dez horas já estavam os dois homens a verificar o estado das embarcações. A pior, era a que estava completamente desmanchada. O homem Soares fez cara feia ao encontrar o estado da embarcação.
--- Eu não quero saber quanto vou gastar. Quero que você conserte. – sorriu Silas para Soares.
Esse também sorriu com a cabeça abaixada a procura do que fazer. Depois de longo período, o homem declarou que a jangada que estava quase que desmanchada pouco podia ser feito. O melhor era aproveitar os troncos para fazer assento nas casas da gente pobre ali residente. O jovem Silas caiu numa verdadeira gargalhada. E logo afirmou:
--- E quanto eu paguei por essa tralha! – afirmou pensativo o homem Silas.
--- É assim. Quando não se entende muito bem do que se faz, o melhor é perguntar a alguém que trabalhe com esse material e assim possa comprar o que é de melhor. – respondeu Soares
--- Mas o dono estava à beira da morte. E morreu pela madrugada. Eu paguei ao embarcadiço que toma conta das jangadas. – reclamou Silas
--- Foram de Orlando essas jangadas? – perguntou Soares ao comprador de meia viagem.
--- Sim. Você conhecia Orlando? – indagou também Silas.
--- Conhecia, sim. Ele fez muito serviço com a gente. – sorriu meio acanhado Soares.
--- Ele morreu no inicio do mês. – respondeu Silas.
--- Parece que a mulher dele queria vender as embarcações. – lembrou Soares.
--- Ela? Está é louca! Eu comprei horas antes de Orlando morrer. Ora comprar! – cuspiu para um lado o moço Silas.
--- Parece. Eu não sabia que o senhor tinha comprado. – cuspiu o homem Soares para outro lado.
--- Comprei. Está aqui o documento. Agora é cinza. – sorriu Silas.
--- É. O senhor está garantido. Mas tenha cuidado, pois Orlando tinha filho advogado. – rolou a conversa o homem Soares.
--- Deixa ele vir pra cima. O homem estava desprezado no hospital. Eu fui quem agüentou e transferi o velho para um apartamento. Ninguém da família foi ao enterro. Eu fiz tudo só. Essa é boa! Vender uma conversa! – relatou com raiva o jovem Silas.
--- É... Mas vamos nós. O que eu faço agora? – indagou Soares levantando a cabeça.
--- Se você tem meios de fazer o reparo aqui, está bem. Se não, é levar para o Mangue. E ali você trabalha mais sossegado. – sorriu Silas para Soares.
--- Para levar só pelo mar. O senhor tem alguém? – perguntou Soares ao jovem Silas.
--- Aqui tem um rapaz que toma conta das embarcações. Mas vai precisar de mais gente pra levar as outras duas. – sorriu Silas ao dizer tal assunto.
--- É. Tem. – complementou Soares.
--- Eu levo! – disse uma voz por trás de Silas um pouco afastada.
Então, Silas e Soares se voltaram para ver quem estava a falar naquele instante, na conversa entre os dois parceiros. E então, Silas perguntou quem estava a falar. O homem respondeu de pronto a Silas de forma meio sorrindo.
--- Adamastor, seu criado. Eu quem falou. Eu levo as três jangadas no meu velho caminhão. – respondeu Adamastor.
--- E você tem caminhão? – indagou surpreso o  rapaz Silas Albuquerque.
--- Tenho sim. Está parado ali atrás. Eu acho melhor levar as jangadas de caminhão do que pelo mar. Eu conduzo e trago de volta. Quando estiverem prontas. – sorriu Adamastor.
Então a conversa tomou novo rumo. Preço, gente para levar as jangadas, quando podia ser o trabalho e tudo mais que se prendia a condução das embarcações. Tão logo ficou resolvido o impasse, Silas resolveu sair, deixando o seu companheiro de viagem já com as jangadas, pois o homem Adamastor teria que levar naquele dia mesmo. Para tanto, o motorista formou a sua tropa, com três homens a embarcar as jangadas e, por fim, Soares, ajudante também, se pôs à frente do veículo para então começar a longa viagem de ida.
Enquanto isso, Silas caminhou ate a construção de sua mansão para ver como estavam a seguir as obras. O trabalho prosseguia firme e com a previsão de terminar com três meses. Para Silas, era pouco tempo. Mesmo assim, nada falou. Nem que sim. Nem que não. No seu passar, Silas verificou todo o andamento do trabalho, vendo o que havia sido feito e o muito que estava por fazer. O vigia da construção seguia os passos de Silas apontado coisa aqui, coisa ali. E o que faltava também por estar por fazer. Nesse instante aproximou-se de ambos o velho Diomedes. Ele cumprimentou a todos, e seguiu a olhar o que se estava a fazer e o que já tinha sido feito na mansão de Silas Albuquerque. Na verdade, era um enorme casarão aquele que Diomedes visitava naquele instante. O velho se pôs em frente ao que seria mais tarde um janelão e ficou a apreciar o mar azul salpicado de brancas espumas deixadas por suas imensas ondas. Era um verdadeiro encantamento onde se tecia além do horizonte o seu deslumbrar disforme.
--- É um encanto! – recitou o velho ao ver se aproximando o senhor Silas.
--- Encanto o que, Diomedes? – indagou sorrindo o seu patrão.
--- Esse mar imenso. Não tem fim. Não tem começo. É a vastidão do mar sob um sol de primavera onde os pássaros albatroz fazem festa em seus ninhos. – cantou o velho.
--- Mas você está um poeta! – exclamou o jovem atilado Silas.
O velho pôs-se a sorrir como um menino. E por fim lembrou a estória que ouvira a muito tempo de algum nauta, sobre as mulheres que viviam em pleno mar bravio. Virgens damas. As verdadeiras imaculadas do cantar embriagador a seduzir os alcoolizados nautas de além mar com seu enigma de sereias. E a lua do verde mar na areia a se enrolar. O velho contava essas sombrias e mirabolantes estórias como se então fossem verdadeiras. E o seu patrão não se conteve e pôs-se a sorrir extasiado.

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