- Sophie Marceau -
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A sessão espírita não ocorreu como Silas havia pedido. Alguns dos presentes tiveram que sair pouco antes das quatro horas da tarde e para lembrar Racilva, fez-se uma prece para os espíritos de luz se encarregar de ter de encontrar modos de se saber onde Racilva foi posta e se desencarnou ou não. Com isso, terminou a propriamente dita sessão. Na segunda-feira, pela manhã logo cedo, Vera Muniz, seu marido Silas, a doméstica Otilia foram de carro ao cemitério da cidade onde foi posto o natimorto que se chamaria Fernando. A mãe da criança foi levar um ramalhete de flores de papoulas vermelhas para depositar no túmulo onde Silas sepultou uma semana antes o seu filho amado. Entre o ramalhete de papoulas vermelhas havia outra de acácia e rosas como crisântemos e orquídeas entre flores de cor branca. Tudo emplumado em arranjos de vaso dourado. Ao chegarem ao campo santo, às três pessoas desceram do carro e seguiram pelo cemitério, todo florido por várias rosas e pessoas que trabalhavam em arranjos e outros que estavam a descansar sentados conversando em baixo de uma frondosa mangueira de belas folhagens. A mulher, sentindo ainda dores por causa da formação de gases, chorou delirante ao chegar ao tumulo onde estava sepultado o seu amado e querido filho. Em túmulos visinhos havia pouca gente àquela hora da manhã. Talvez fosse mesmo por ser uma segunda feira onde havia pouco movimento de gente. Ao depositar o vaso com o ramalhete de papoulas, acácia dentre outras rosas, Vera Muniz avistou uma prece de alguém escrita a mão. Plenamente alarmada com a oração depositada, Vera voltou-se ao esposo e lhe perguntou:
--- De quem é essa prece? – perguntou Vera com os olhos presos ao papel laminado que embrulhava uma jóia rara para alguém que falecera.
--- Hum! Não sei! Provavelmente alguém que paga promessas. – relatou Silas preocupado com o que estava a ver.
--- Mas tem uma jóia! Um crucifixo parecido com ouro embrulhado no papel! – exclamou a mãe da criança mais alarmada ainda.
--- Confesso que não sei!! Eu depositei apenas um ramalhete de rosa que ainda está no local!!. – falou plenamente atemorizado o pai a criança.
Vendo-se então sem ter motivo algum para poder acreditar no que ouvira dizer, a mulher saiu a procura de uma das zeladoras de túmulos que estavam a regar os jardins de hortênsias entre outras flores plantados nos mausoléus então existentes ao longo do campo santo e de uma mulher ouviu dizer que tinha estado uma mulher de preto a depositar presentes no domingo passado em vários túmulos ali existentes.
--- É o que posso dizer. Só isso. – relatou à senhora dos mortos.
--- Mas túmulo do meu filho alguém depositou presentes? – indagou Vera Muniz plenamente amedrontada.
--- Quem pode responder melhor é Laura de Quincas. Ela é quem toma conta das catacumbas daquele lado. A senhora pergunte a ela. – respondeu a mulher já com muita pressa.
--- E onde ela está? – indagou Vera admirada até mesmo com o nome de Laura.
--- Está entrando, ó! – fez a mulher com o braço apontando para a esquina onde estava o túmulo de Fernando o filho que nasceu morto de Vera Muniz.
Com pressa, Vera Muniz regressou para ver se falava com Dona Laura de Quincas que já estava aguando os pés de rosas postos nos túmulos daquela rua do cemitério.
--- Quincas! Que horror! – falou vera de forma baixa com o nome da mulher.
Enquanto Vera Muniz procurava a mulher dos túmulos, Silas estava a ler o que a pessoa deixou escrito no papel laminado: “Filho! Tu és meu Mensageiro”. Era tão simples que o homem não soube poder acreditar. A não ser pela expressão “Filho” tudo era o mais completo de se dizer ou escrever. Mas do que surpreso Silas guardou aquela expressão em seu peito como forma de não mais esquecê-la jamais. Como se a pessoa conhecesse a razão do proceder de toda aquela vida segura e sagrada. Ele, de imediato supôs que não fosse Racilva quem esquecera aquela citação. E até lembrava que aquela elocução não podia ser de um desconhecido qualquer. Algo talvez que fosse uma amiga de Vera ou mesmo sua. Como por vislumbre, Silas teve em sua memória a presença da noviça. E indagou consigo.
--- Por que ela faria tal coisa? Ela não podia ser do modo algum. – relatou em seu pensar de forma resoluta o homem vencido por sua conjectura.
Era a palavra “Filho” que inquietava por mais dever fosse o pensamento do homem. Ele nem supunha de alguém de fora. Um estranho, talvez. Com o passar dos momentos e com Otilia do seu lado, Silas notou a aproximação da sua esposa depois de conversar de forma demorada com a mulher que a pessoa lhe indicara.
--- Como é o nome da mulher? – perguntou Silas a sua doméstica.
--- Laura. Laura de Quincas! – relatou a jovem criatura.
--- Quincas? Que horror! – fez o homem da forma como sua mulher tinha relatado.
--- Nem acho. Molambo é muito mais feio. – relatou Otília ao seu senhor.
O homem olhou para a cara da moça e sorriu.
--- Molambo! Faz tempo que ele se chama ou se chamava de Molambo. Era seu modo de trajar. Uma molambagem. Eu era pequeno e ele já era chamado por Molambo. – sorriu Silas para a jovem Otilia.
De qualquer modo ele sentiu na repreensão da mocinha uma forma de falar de outras coisas que lhe pareciam mais particulares. Afinal, Diomedes era seu tio. Em se chamar de Molambo, era patente que se estava a agravar igualmente a família do velho, que tão velho não era. Silas notou a observação a jovem moça e não mais teceu consideração para os tais apelidos. Que fosse Quincas ou Molambo, tudo era um só evento.
Vera Muniz voltava levemente decepcionada com o que foi saber da velha senhora Laura de Quincas. A mulher estava ocupada com o regar das rosas dos túmulos e disse nada saber quem colocou presente no túmulo onde foi sepultado o menino de Vera. Naquela hora, Vera apontou para o pai, dizendo a mulher que o menino foi sepultado em um túmulo da família. Mesmo assim, outra pessoa de sua família não teria vindo ao jazigo dos Muniz no domingo que passou para depositar um simples crucifixo. Dona Laura de Quicas disse que isso ela não sabia, pois aos domingos vinham várias pessoas para prestar homenagem aos seus mortos. Os vivos depositavam, principalmente, flores. Tinha gente que fazia peregrinação postando em cada jazigo uma lembrança ao bem amado filo, marido ou até mesmo sobrinho. Tinham casos de mulheres que faziam promessas para que os mortos descansassem em paz. Outros traziam presentes aos defuntos desconhecidos. Havia rezas, depósitos de terços, ladainhas, crucifixos, evangelhos e tantas outras coisas a qual se podia imaginar.
--- Minha filha, o cemitério é um local santo. Um ambiente sagrado. - disse a mulher a Vera.
--- É certo. Local santo. – respondeu Vera com a cabeça abaixada e as lágrimas descendo na alquebrada face de uma mulher a se recuperar de uma cirurgia de parto.
--- Tem uma velhinha que todos os domingos vêm pagar promessa nas catacumbas. – relatou a mulher com o seu aguador a fazer limpeza dos túmulos.
--- E essa mulher esteve no tumulo do meu filho? – apressou-se em saber Vera Muniz.
--- Eu não vi. Mas é bem capaz de ter sido a velha. – respondeu a mulher cuidando das rosas.
Nesse ponto, Vera se deu por satisfeita e voltou para onde estava o seu marido, com a cabeça abaixada, lágrimas nos olhos e decepção no andar. Ao chegar bem próximo foi logo dizendo a Silas que a mulher não soubera quem foi à pessoa a depositar o relicário no túmulo da criança. Talvez tivesse sido uma velha que sempre costumava rezar naqueles mausoléus sempre aos domingos pela manhã. Ela não tinha túmulo certo e qualquer um a ancião depositava agrados aos mortos que ali estavam sepultados. Foi isso que Vera conseguiu saber de dona Laura. Após esse tempo, vendo mais uma vez o túmulo onde estava guardado o seu tenro filho, Vera partiu em direção ao portão de saída, junto co o seu marido Silas e a domestica Otilia. Quando a família saía o campo santo, uma anciã já bastante idosa entrou da rua onde estava o tumulo do menino a depositar flores em outras sepulturas. A mocinha Otília notou a presença da mulher e ficou a olhar o que a anciã fazia em seu andar. Otília viu bem o que a mulher fazia no seu labor sagrado. E daí Otilia despertou a atenção de Vera para a mulher que estava a fazer.
--- Onde ela está? – perguntou Vera desesperada para conhecer a mulher.
--- Alí perto. Seguindo os túmulos antes do da sua família! – respondeu Otilia.
--- Deixa-me ver! Deixa-me ver! Depressa! – apressou-se em ver de perto a anciã que colocava presentes para os finados.
Vera, Silas e Otilia voltaram ao local onde estava a rua do cemitério a procura da anciã e não perceberam uma mulher vestida de negro que estava mais além, encoberta por um túmulo da necrópole.
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