- COPACABANA -
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Três meses, seis dias, cinco horas. Tudo
pronto. A partida para o Rio de Janeiro, capital. Nair estava alegre, vibrante,
extasiada da vida. Nunca viajara por avião, algo desconhecido de perto. Naquela
manhã estival o delírio cativou a ninfa. Cinema, teatro, restaurantes de prima
ordem, bares chiques da cidade, boates e clubes sociais ela então já conhecia
muito bem. Sabia dirigir automóveis e, por fim, sabia falar francês a qualquer
custo e de qualquer preço.
Nair:
---
bonjour, bonsoir, comment allez-vous, rien, mon ami, quelle heure. Je vais au bar. Combien coûte ce diamant? Je vous
remercie. Non pas parce qu'il est! Il suffit de demander!
Era tudo ou mais a necessitar ao chegar à
eterna e cativante Cidade Luz. A capital dos sonhos dourados, das mulheres
elegantes, dos passeios públicos, das feiras livres, de Notre Dame, Torre
Eiffel, bolevar Capucins, do rio Sena, dos cafés, do Museu de Louvre, do
Champs-Élysées, do Arco do Triunfo, do Bateau-mouche, do Panteão, do Museu de
Orsay, do Grand Palais, do Jardim de Luxemburgo, do Olympia, da Praça da
Concordia, dos Jardins, do Palácio Royal, do Palácio Eliseu, do Teatro de
Châtelet. Enfim! Do mundo ocidental aos seus belos e saltitantes pés. Carros
brilhantes, pontes maviosas, barcos a singrar, gente na rua a dançar, cantar,
falar, gritar da mais pura alegria do sonhar.
O avião pousou no aeroporto do Rio a
pouco menos do meio dia. Fazia sol na cidade, entre os demais passageiros
estavam Nair, Lenira, Edgar, o noivo, e por fim, o comandante Ricardo França o
pai de Lenira. O comandante solicitou alguns dias de licença para poder seguir
com o seu cunhado, Edgar, até Paris. Antes, porém, a turma ficaria em hotel de
luxo, em Copacabana. Nesse período, Nair estava admirada pela beleza do Rio
antigo e moderno. A sua indescritível ou bem inquieta movimentação desde o
aeroporto até a praia onde ficaria hospedada. Por um largo tempo de andanças ao
ar, ao mar, ao já, Lenira caminhou pelas calçadas da Praia do Flamengo até
entrar no magistral ornado edifício onde ficava o Hotel Copacabana Palace aonde
podiam se hospedar figuras importantes de todo o mundo, dentre os quais, André
Maurois, Nelson Rockfeller, John Wayne, Errol Flynn e tantos outros homens de
negócios e das artes cênicas, pintura, escultura entre os maiores expoentes da
construção civil. Copacabana era o imperioso Hotel de inebriante requinte. Presidentes,
autoridades, atores, cantores, estilistas entre Condes, Lordes, Príncipes,
compositores clássicos dentre os quais se hospedavam no soberbo local. E era de
se admirar um Hotel para magnatas, Reis, Rainhas, cantores de óperas e mesmo
atores do quilate de Henry Fonda e Douglas Fairbank, maestros como Arturo
Toscanini, escritores como Stefan Zweig e Arquiduques como Felipe da Áustria.
No Rio de antigas e inquietas tradições onde se podia antever o irrepreensível
futuro para a inquieta núbia.
Nair;
--- É luxo! – comentava com ânsia.
Era um verdadeiro palácio branco de
cristal a descortinar o mar, o ar, gaivota a chilrar, barulhar instalados na
Avenida Atlântica, onde as maiores e melhores estonteantes belezas transitavam
a todo instante na rua além dos morros dos ventos uivantes. O Golden Roon fazia
história na música. Golden Roon era A Cúpula de Ouro daquela soberba metrópole
e foi à primeira casa de espetáculos da América Latina. No local se
apresentavam vozes que marcaram o século. Pela Cúpula se expressaram nomes os
mais famosos entre todos os outros tais como Maurice Chevalier, Ray Charles,
Edith Piaf, Nat King Cole entre outros enfim. Afinal, o belo magistral e
ostentoso Hotel Copacabana Palace tornou-se patrimônio histórico do Rio. Do Rio
antigo de doces afetos e enlevos incertos. No eterno Rio era o céu, o mar, o
saltar dessa gente feliz. O Rio de amores mil, altaneiros senhores, de
instantes ao luar. O afável Rio era o modelo do cantar. Consciente ou não, em
seus trajes joviais a ninfa a delirar por quanto desses encantos.
Lenira:
--- Rio das eternas primaveras! –
gritava em instantes de braços em cruz a doce e frágil mulher.
No saguão, estavam os ilustres homens a
negociar os seus aposentos. Em traje de Comandante o qual não prestava tanto
aos ilustres homens do Hotel estava enfim o senhor Ricardo França a indagar das
atrações das futuras noitadas no soberbo palácio. E as ninfas podiam admirar a
art déco de vertentes à escadaria central em mármore encimada por um painel
luxuriante com figuras ostensivamente estilizadas da música e da dança. Pilares
de entrada, detalhes em ouro, luminárias e até o inconfundível letreiro
externo. Era o decisivo marco referencial na cultura. Inaugurado em 1923, esse
impressionante prédio com sua imponente fachada era o hotel de luxo mais tradicional
do Rio. O inimaginável projeto arquitetônico do francês Joseph Gire foi
inspirado nos empreendimentos hoteleiros da Riviera Francesa. Ao seu exterior
foi-lhe conferido um aspecto exterior eclético, com linguagem estilística
inspirada na arquitetura sentenciaste da França. Do seu interior se podia
contemplar a Avenida Atlântica aberta ao oceano. A sala de música ostentava um
piano ocupando um local à diversão de visitantes ilustres entre reis, artistas,
chefes de Estado e celebridades mundiais. O portal do irresistível e imodesto
império ostentava árvores frondosas do Brasil colonial, como oitizeiros,
amendoeiras e algodoeiros, modelos típicos do País. O hall do hotel era em
mármore magnífico e lustroso, desenhado em cor sombria e amena. Fundamental
para o lançamento de muitos talentos da dramaturgia, o Teatro Copacabana tinha
em suas dependências instalado o Cassino. Ao se entrar pelo principal portal
notava-se luxuriante iluminação em derradeiro estilo. Havia ainda trabalhos
expostos em bolsas, colares, brincos, anéis, pingentes de prata, braceletes e
pulseiras. A riqueza e diversidade das peças agradavam sobremaneira aos
enigmáticos turistas,
Nair:
--- É arte que consegue reunir elegância
– recitou a donzela
Organização de joias ornava o Palácio
das Ilusões quiméricas. Um estilo de vida. A arquitetura eclética dava ao
recinto a maior quimera de enfeites. Um dos principais estilos da época na
augusta e preciosa arte. As estátuas em bronze marcavam o notável ambiente.
Refinados salões mostravam a história do hotel mais luxuoso da Capital da
República. O sistema de iluminação permitia a sua enorme fachada um leve e
brilhante sobressalto mais tanto à noite quanto à luz do dia. O espaço aberto
das piscinas era das maiores e mais ostensivas no então Novo Rio. O interior
remetia aos maiores templos de glória. O Palace era hotel igual aos de Paris,
Florença e então Veneza. A formosura esplendorosa em noite sem e com luar. Nada
além faltava na resplandecência daquele santuário. Lampejo eternal das
luminárias enfim a gotejar de certo encantos visuais no enternecer das
estonteantes quimeras. Cintilação alucinante do azul do céu a penetrar tranquilo por entre
ricas cobertas embranquecidas à luz tênue do abajur lilás. Era o temor, terror,
ardor, andar, andor, a dor dos mil e um sonhos atroz. Claros e brancos tapetes
permitiam se ouvir silêncio no branquear da vetusta escrivaninha em jacarandá
macio.
Batuque! Começa com essa cara que só
tara encara! “Pisar no Chão Devagar”! As Ilíadas, fato falado, cantadas nos
aedos das epopeias vis, escutavam na ânsia impacientemente do desejo sem beijo
das musas escusas escassas nos cantares de um bardo celta.
Nair:
--- Vês?! – indaga surpreendentemente.
Lenira:
--- Teatro? – cuidadosa! Olhares
inquietos!
Nair:
--- Oui! – de certo modo falou atenta.
A voz surpresa, miragem indagar,
sobrancelhas arqueadas, dedo em riste, para o alto!
Lenira:
--- Ici? - questiona temerosa. A mente
vaga. Teimosa forma aberta à mostra.
Sonhos! Em cantos malemolentes,
envolventes, inocentes, ambientes! As musas foram, viram, sentaram!
Nair:
--- Chic! - comentou sentada na cadeira
do espetáculo teatral
Lenira:
--- Ça va! – unhas lindas, limpas,
tentam dentes.
O bardo cantava sim. Batuque formado.
Gente delirar. Ar ambiente. Mente lugar! Pudera!
Nair:
--- Qui? – surpresa pergunta por alto
enfim.
Lenira:
--- Plèbe rude! – fala sem mostras
indigentes.
Nair:
--- Souvenez-vous! – relata
inconsequente. Mente abstrata.
Lotado ou quase, teatro apresentava um
cantor de estrada rara. Augusto Calheiros. Voz fina, firme, feia. A cantoria
prosseguia. Batuque, sanfona, gaita. Ele cantava como canta galo. ”Quem quer
ser mais do que é fica pior do que está. Quem andar na terra alheia pisa no chão
devagar.” Delírios insanos da gente toda do calvário bardo. História antiga.
Lendas, poemas. Recitação de repente. Ovação estridente, intermitente,
indolente, inclemente. Espetáculo fechado ao seleto público do influente hotel
faustoso. O bardo, turuna da mauricéia fazia enorme sucesso com a sua voz
estilo peculiar. Vindo das eras de Maceió, Augusto Calheiros teve estreia no
Recife e se projetava no Rio com imenso êxito. Era um cantor de quase elite.
Sagrado, sangrento, suado.
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