- JAPONESA -
- 34 -
- QUADRO -
As duas jovens a conversar assuntos sem
causa. De súbito Lenira chamou a atenção de Nair para um retrato na parede. O
quadro ostentava uma semideusa a mostrar em roupas de balé algo como
encantamento oriental. A sua cabeça
moldada em enfeites a lhe descer pelo rosto e atar até o busto e mais em baixo,
enfim. Assim era a Deusa ou menos. Roupas de cetim (vermelho) ambientadas por gola
marrom em tom a estreitar todo o senhoril. Um manto por baixo da capa
encarnada. Quadro tecido nobre e incolor a ser chamado de branco. Por baixo: manta
cor suave branda, ambiental. Tal qual. Descendo o busto legado carmim, enfim. Sua ingênua mão esquerda um gigantesco pacote
adornado com fitas douradas, deitadas a cair por cima de outro artificio
igualmente níveo. Puro alívio. Olhos negros matizados com mais elegante vívida
cor púrpura. Sobrancelhas: arqueadas! Forma augusta tonalidade marrom. Rosas
magistrais a descer de cima do alto de sua ingênua sinagoga em três tiras de
cores negras ambientadas por formas azuis. Açucenas. Enfim, tudo o que se podia
chamar a magia de: semideusa.
Lenira:
--- Vês? Não é ninguém! Apenas um
retrato. O que eu posso chamar de uma dama, não sei se casta. Ela é apenas um
retrato. Para não falar em uma simples dama de um salão de óperas. – decretou
com ênfase a moça.
Nair piscou os olhos e procurou notar a
figura de retrato pregada na parede da sala ao largo e pode pressentir todo o
natural da ingênua nipônica delicadamente a descrever em certo pela núbia Lenira,
apenas de costa para o enigmático quadro dito por detalhes a apontar com o dedo
indicador da mão direita para trás.
Nair:
--- Eu ainda não entendo nada disso. O
que é nipônica? – perguntou a estranhar.
Lenira:
--- Japonesa. Que nasce no Japão.
Lembra-se da Guerra? – perguntou lhe a atraente moça.
Nair:
--- Ah! Os homens maus. Olhos estreitos.
– sorriu a verificar bem a foto.
Lenira:
--- Nem tão maus assim. Ainda nem sei
por que houve essa Guerra. Hitler, Mussolini, Hirohito. Ele assinou o pacto de
paz. (Ele) era é moço. A assinatura foi em 1945. A Marinha Imperial Japonesa
estava sem recursos. Os Estados Unidos lançaram duas bombas atômicas sobre o
Japão. A primeira em Hiroshima. A segunda em Nagasaki. “Buuummm”. Nos dias 6 e
9 de agosto. Desgosto! O Imperador
Hirohito ordenou ao Conselho de Guerra a tentar negociar uma paz minimante
honrosa com os aliados. Nossos! Pronto! – declarou a moça a conversar e tomar
café com pães novos, leite e queijo.
Nair:
--- Guerra! O mundo só fala em Guerra! –
articula desenganada a nova princesa da casa.
Após o café da manhã Lenira convidou
Nair para as duas jovens terem que ir à praia distante de Natal, conhecida como
Pirangí. Naquele recanto de encanto não existiam ladrões de bolsas e o máximo
eram as jangadas a pescar camarões e lagostas. Por Pirangí, também se podia
estrear os novos maiôs Catalina, raridade no Brasil colonial e tal. Quando
certo: Natal. E tudo aquilo em termos de maiôs era apenas chique da moda para
Lenira. Antes das nove (horas) as simpáticas amigas divinas saíram de casa, em
Petrópolis rumo a direção de Pirangí passando antes por Capim Macio depois da
“Corrente” da cidade, um posto aduaneiro onde caminhões estavam encostados a
espera da inspeção do carregamento natural. Ao atingir Capim Macio, Lenira
alegou ter naquele trecho apenas mato. Fruteiras, como caju, manga e jaca. Mas,
era tudo mato.
Lenira:
--- Eita! Quando progresso! O dono das
terras disse que aqui estava o “futuro de Natal”. Pudera porque aqui só tem
mato!
O homem deitado à sombra de um cajueiro
com uma estaca enfiada na barriga! Era um morto de morte matada. Nem arquejava nem
nada. Nair se apavorou e gritou para a amiga a dirigir seu carro.
Nair:
--- Tem um homem morto ali! – falou com
exatidão.
Lenira;
--- E tem as testemunhas! – mostrou com
simplicidade a moça. Os urubus esperando a hora de trinchar a carcaça do
desumano homem errante.
Nair:
--- E a gente não vai chamar a polícia?
– indagou alarmada.
Lenira:
--- Você é besta?! Eu vou lá me meter
com defunto! Eles que venham! – respondeu de modo truculento ao falar polícia.
Nair:
--- Mas o homem está morto! – alegou
apavorada a noiva.
Lenira:
--- E vai ficar por muitas horas! –
respondeu com raiva a jovem.
Nair começou a chorar e a moça a dirigir
seu carro a toda pressa. Ao atingir a vila de Ponta Negra Lenira dobrou em
direção a Pirangí percorrendo uma estrada de sulcos fundos, profundos por onde
rodavam caminhões, tratores, automóveis (alguns) e jericos puxando suas
carroças com o seu dono sempre a chicotear os mansos animais vegetais. Tais
quais. Pé no mato, pé no caminho, o veiculou passou por um mal encarado trator
de esteira a ser conduzido por seu único tratorista. Com certeza um rapaz de
menor idade.
Nair:
--- Aquele menino não tem quinze anos! –
comentou a moça com muito assombro.
Lenira:
--- Era do pai, com certeza! – respondeu
a moça que o tratorista fazia a vez do seu pai.
Mais a frente, Lenira passou por um
caminhão. Esse estava encostado à beira do cercado. O seu proprietário,
certamente, estava a consertar algo no motor, pois o caminhão mantinha o capuz aberto.
Um macaco esteira suspendia pela frente o monstro dorminhoco. O motorista
estava dentro do cercado a conduzir umas peças do motor, talvez. Lenira sorriu
como a disfarçar com todo o avistado.
Nair:
--- Mais um. – relatou a moça.
O seu automóvel corria célere como
podia. À frente um caminhão de cargas de coco. Ela puxou seu carro para a
direita, tirando da reta do percurso e o motorista do carro grande a estar
desavisado continuou com o seu “brabo” pelo mesmo sulco confuso. Da carroceria
caíram uns poucos cocos na estrada. O motorista freou, e veio buscar a restante
da carga. Lenira intrigada se revoltou e parrou. Deu-lhe uma “banana” depois seguiu toda atrapalhada. Azucrinada!
Lenira:
--- Bruto! Ignorante! Pau d’água! – esgoelava
a moça.
E após um tempo e tanto de corrida e
tanto sem parar, Lenira alcançou uns poucos casebres. Moças e rapazes
conversavam bastante animados. Um menino defecava à beira da caída cerca e
olhava para baixo a verificar se já estava concluído o serviço. Nair quase
morria de rir tampando a boca com a mão direita.
Nair:
--- Não dá pra esquecer! – dizia a moça
de forma hilária.
Lenira:
--- É o mau do mundo! – dizia a moça a
dar arranco no automóvel.
Nair:
--- Que é isso? – indagou preocupada.
Lenira:
--- Cotovelo. Só tem gente pobre. Os
ricaços ficam para longe da estrada. – respondeu
Nair:
--- Quanta miséria. – reclamou a noiva.
Lenira:
--- Isso, talvez, um dia acabe. Depois
da Guerra vem o progresso – adiantou a virgem.
Nair ficou a pensar em seus vizinhos da
Rua do Motor, onde as crianças também defecavam no oitão da casa. Logo após
gritavam.
Crianças:
--- Mãe! Vem me limpar! – e saiam
devagar, de pernas abertas, para um tanque onde a mãe já esperava o rebento.
Após passar por Cotovelo, Lenira ainda
encontrou uma casa perdida pelo tempo, onde morava um senhor de meia idade.
Ela, de imediato, avistou o homem. Então indagou:
Lenira:
--- Zé. Qual a melhor estrada para Pirangí?
– indagou ao homem.
Zé:
--- Siga em frente. – sorriu o homem
elevando seu braço.
Nenhum comentário:
Postar um comentário