- 11 -
PANDEMÔNIO
No instante do estrondar na
fazenda de Severino Policarpo, toda uma região, as mais distantes possíveis,
ouviu o barulho ensurdecedor como se fosse muito e bem perto das casas grandes
ou pequenas. Era o mundo se acabando a todo custo e em troco de nada. De forma
aturdida o povo do mais longínquo recanto imaginava dizer ter sido um trovão inquietante
e assustador aquele pandemônio infernal. A correria se fez presente no povo da
vila da Lagoa e a qualquer preço a procurar refugio por baixo de mesas e camas.
O acalento das crianças era o mínimo a se fazer. Todos com o maior pavor da
tragédia anunciada. Nas acanhadas prateleiras das bodegas as estantes
estremeceram e as garrafas foram ao chão se partindo aos cacos. Era o terror
onde ninguém podia adivinhar o acontecido.
Alguém:
--- É o trovão! É mundo a se
acabar! – gritava a mulher a correr desenfreada.
Outra:
--- Vala-me São Francisco! –
gritava outra a procurar abrigo debaixo da cama.
--- Tamos lascados! – anunciava
um homem a correr desembestado a qualquer canto.
Vacas, bezerros, touros,
garrotes, ovelhas, cabras, bodes e ainda animais silvestres e mesmo o
galináceo, os veados, cotias e até mesmo os cães e gatos corriam a qualquer
preço para lugar nenhum. Os cavalos amarrados nas forquilhas se espantaram e
puxaram as rédeas e saíram amedrontados na correria desenfreada. Os animais
partiam para os lugares mais distantes em busca de algo onde pudessem se
esconder.
Bêbado:
--- É o mundo todo! – dizia um
bêbado anunciando o fim dos tempos, com uma garrafa em baixo do braço e um copo
na mão posto pra cima de sua cabeça.
E o estrondar acontecia a todo
instante com panelas, caldeirões, tachos a voar pelos ares na casa em chamas.
Não tinha fim o drama da morada para todo mundo poder ver a cena. No sitio ao
lado, porém distante, o coronel Marcolino Godinho dava um soco para o alto como
quem quisesse dizer algo:
Godinho:
--- Tome o troco! – respondia o
velho sem sorrir.
Na frente da casa grande do
coronel, o pistoleiro Renovato
Alvarenga, o Chulé, se levantou do seu assento com temor da tamanha explosão
ouvida há alguns quilômetros de distancia. A moça Lu correu para fora a
perguntar:
Ludmila:
--- O que foi isso? – perguntou a
moça desnorteadas com a explosão na casa bem longe.
E, com efeito, também chegou à
donzela Emília totalmente desnorteada a perguntar ao pistoleiro Renovato cheia
de pavor pelo qual ouvira naquele instante.
Emília:
--- Onde? Onde? Onde foi esse
estrondo? – indagou alarmada a moça.
Ninguém sabia responder ao certo
o efeito de tal explosão. O pistoleiro
Renovato caminhou até a soleira do alpendre e tentou advinha o fato acontecido
sem nada para falar. A fumaça branca se tornou escura e subiu aos ares na
distancia onde não se podia acreditar ser apenas o fogo da mata. Renovato
pressentiu de algo mais ocorrido. Porém nada reportou afinal. O velho Coronel
Godinho nada falava, mesmo assim se mostrava satisfeito com o acontecido. A
esposa de Godinho, senhora Isadora Marques chegou para frente do casarão e pôs
a mão na boca a refletir:
Isadora:
--- Meu Deus do Céu! O que é
isso? - indagou a mulher com muito susto
A capangada da Fazenda Guandu
ficou toda abismada com o acontecido apenas a olhar a fumaça a subir e nada
mais podia calcular.
Mulher com panelas:
--- Que foi isso? Incêndio? –
perguntava a mulher da cozinha com o tacho na mão a olhar a fumaça negra subir.
Na cidade de Alcântara foi ouvida
a explosão pelo povo do lugar e da roça. A gente toda olhava para o céu a
observar a fumaça e perguntar onde poderia ter sido o drama total. Prefeitos,
vereadores, até mesmo a polícia se acercava para ver mais de perto o terror
incondicional havido em algum local bem distante da sede do município. Cada
qual no seu cavalo rumou para o local da tragédia temendo com certeza de chegar
tarde demais. Era fogo muito o havido no casarão onde nada restou. Apenas os
moradores da fazenda do Policarpo, atordoados por demais choravam o
desassossego havido nas suas vidas. O
lamento era sem quietação com moças, mulheres, rapazes, vaqueiros e mesmo
jagunços a chorar suas mágoas. O corpo
do velho Policarpo jazia no chão coberto de cinzas bem ao longe da casa grande
apenas com algumas pessoas a rezar e seu filho Deodato a lamentar.
Deodato:
--- Meu pai! Meu paizinho! Por
que isso foi acontecer com o senhor? – era tudo a dizer o rapaz ajoelhado ante
o cadáver.
Ao chegar ao local o pessoal da
cidade, viu-se ter nada mais a fazer, pois os estragos eram totais na valiosa
fazenda de Policarpo. O pessoal ao redor a fazer penitencia e outro a buscar
algo em qualquer chão era tudo o haver desnorteado dos moradores. E o prefeito
então afirmava não haver mais nada a ser feito.
Prefeito:
--- Tudo acabado! Nada mais se
pode fazer! – lamentou o prefeito vendo a devastação da casa.
Duas horas depois da estrondosa
explosão o coronel Godinho viu chegar os seus comandados tendo à frente o
destemido bandoleiro Otelo Gonçalves Dias, o senhor Satanás. Esse apeou bem
como os seus companheiros de viagem e a olhar o coronel, nada demais o homem
falou. Apenas adentrou na sala e foi buscar um pouco de água para beber. Os
três companheiros também fizeram o mesmo. O coronel veio para quarto de
reuniões e nada mais falou com a turma de atiradores. Ele esteve até àquela
hora no alpendre acompanhando a fumaça negra a sair bem longe da casa de
Severino Policarpo. Os pistoleiros foram até a cozinha da casa grande do
coronel e buscaram um pouco de comida. Enquanto isso o jagunço Bem-te-vi
caminhou para sua casa de gente pobre. Nesse momento, Renovato Alvarenga, o
Chulé, se aproximou do bando e nada indagou. Apenas olhou para Satanás, em
olhar inquisidor para saber de algo. Satanás nada sabia dizer. Chulé então falou:
Chulé:
--- O Prefeito passou para o
lugar. – disse apenas Chulé sem maiores comentários.
Satanás estava já na mesa para
comer munguzá e nada respondeu. Apenas olhou para Chulé querendo saber mais
alguma coisa. Esse nada falou, pois não sabia o sucedido. O rapaz do punhal,
Antero Soares, o Foguetão, chutou um tamborete para sentar. E olhou bem os
olhos de Chulé. E Chulé olhou bem para o seu companheiro de empreitada. E nada
falou. Então, Chulé se levantou para ir ao seu serviço. Nesse instante, um
jagunço chegou e procurou pelo coronel Godinho:
Jagunço:
--- Onde está o coronel? –
perguntou desaforado o jagunço.
Satanás:
--- Que você tem a dizer? –
indagou Satanás bem serio.
Jagunço:
--- O fazendeiro Policarpo
morreu! Um fogo devorador consumiu sua casa! – respondeu o jagunço um pouco
desnorteado.
Satanás:
--- Quem disse a você? –perguntou
Satanás.
Jagunço:
--- Eu vim de lá! Toda gente está
apavorada! – respondeu o jagunço a tremer de medo.
Satanás saiu e foi até o
escritório do coronel relatar o ocorrido. Afinal tinha saído tudo nos
conformes. Era agora apenas pagar pelo feito, pois desta forma o serviço estava
completo. Nada mais restava fazer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário