terça-feira, 27 de março de 2012

OS QUATRO CAVALEIROS - 14 -

- Audrey Hepburn -
- 14 -
ACERTO
O pistoleiro Renovato Chulé veio com calma e paciência para chegar até a porta fixando os olhos no seu comparsa e nada mais. Apenas ele estava calado. O pistoleiro Satanás estava impaciente e pedia pressa do homem quase desconhecido em suas andanças pelas veredas do sertão. Conhecedor profundo das artimanhas dos bravos incautos, homens de dizer ser sabido por nada, o pistoleiro Renovato era um desses tipos caladão e apenas a falar quando se perguntava algo. Na bodega da vila ele mostrou a sua destreza onde o dono empurrando a barriga teria de puxar o rifle e o pistoleiro meio rapaz, alto, franzino, cabelos ondulados, musculatura rígida, ligeiro no olhar e no fazer acercou-se e mandou deixar o rifle no seu lugar e, depois de desengatilhar a arma pôs em cima do balcão e se recostou na parede a espera do sucedido. Mas isso era normal para Renovato. Tudo ele fazia sem a menor preocupação. E nesse momento, era a vez de mostra ou de falar coisa de pouca importância, uma vez de só dizer aquilo o qual lhe dizia respeito. Ao chegar à porta o pistoleiro ainda olhou forte para o bandoleiro Satanás e entrou no recinto onde estava o coronel Marcolino Godinho a estudar o comportamento do rapaz como se nada houvesse de mais.  Renovato entrou na sala a passos lentos com rosto austero e retirou o seu chapéu ficando com o mesmo. Não se importando com o mesmo a segurar por entre as duas mãos à altura de sua barriga o bandido, de pernas ligeiramente abertas com seus coldres à mostra esperou a conversa. O coronel se levantou do estofado e veio para frente do birô. Olhos firmes sem combinar muito bem com seu porte atarracado de colete aberto aos peitos, uma camisa de linho, gravata borboleta, calças escuro parecendo brim, cinturão preso e um coldre sem arma. O homem, de cara séria, levou algum tempo para saber do nome de Renovato.
Godinho:
--- Então o senhor é o Chulé? – indagou com voz mansa o coronel.
O pistoleiro não se incomodou com o nome e respondeu.
Renovato;
--- Sim. Sou eu sim! – disse por sua vez o pistoleiro.
O coronel se aproximou de Renovato e com os seus olhos de lince viu as armas do bandoleiro, todas esculpidas com cabo de prata e cano longo também esculpidos com prata. E levou algum tempo para perguntar:
Godinho:
--- Essas armas servem para alguma coisa? – falou o coronel no ar de provocação.  
O  rapaz olhou bem forte com seus olhos frios e não querendo fazer a vez de injusto declarou:
Renovato:
--- Depende coronel. Eu sempre as tenho como companheiras! – falou sisudo o pistoleiro.
O coronel deu volta inteira em tono do pistoleiro sempre a perceber qualquer movimento e, quando retornou a frente, foi dizendo sem gracejos:
Godinho:
--- Eu não vejo sentido de se usar duas armas. Talvez alguém possa explicar de vez. Você, por exemplo, talvez possa. – lembrou o coronel.
Renovato então fechou a cara após um breve sorriso talvez de zombaria. Ele olhou para o coronel por alguns segundos e, de imediato puxou as armas deixando cair o seu chapéu ao chão e se curvando mais um pouco. Em seguida ele rodeou com os dedos as suas armas e as pôs nos coldres como eram enfim o seu lugar de repouso. O coronel Godinho não se assustou e nem fez cara de espanto. Apenas olhou o rapaz e voltou a se sentar em seu estofado a frente da escrivaninha. Ele cruzou as mãos a olhar Renovato tendo ao longe por traz do rapaz a figura do outro bandoleiro Otelo Gonçalves. Passaram-se os minutos e o coronel pediu licença ao pistoleiro, pois ele teria de pegar uma arma a estar depositada na gaveta da escrivaninha.
Godinho:
--- Cuidado com seus trabucos. Eu tenho uma arma aqui na gaveta. E quero mostrar para vocês um pouco da arte de fazer atirar. – e se curvou para tirar a provável arma e com um segundo já estava com o seu bendito 38 a mostrar aos dois cavaleiros.
Renovato não se espantou com o belo revolver. Nem tampouco Satanás a de postar atrás de Renovato.  Por esses segundos o pistoleiro aproveito para apanhar o seu chapéu e conserva-lo seguro a cintura preso com as duas mãos sem tirar os olhos do coronel.
Godinho:
--- Aquiete-se. Não vai acontecer nada! – disse o coronel a Renovato.
Renovato Alvarenga fez de conta que estava a entender o caso do Coronel Godinho e ficou  logo moderado em seu canto a espera de um acerto por vir. O seu companheiro de acerto veio de lá e buscou a arma do coronel. Sorriu e a deixou na mesa de trabalho. De passagem, ele alertou para Chulé apenas com os olhos. Era um alerta de modo a falar algo sem necessitar dizer. Chulé fez de conta ter entendido e saiu do meio da sala ficando ao lado a espera do Coronel. De momento, Godinho saiu da sua escrivaninha e andou para sair em busca de um lugar mais distante fora de casa. E feito isso o coronel os chamou:
Godinho:
--- Vamos até o local de tiro. – relatou o coronel e seguiu com pressa.
Satanás e Chulé acompanharam o coronel para o caminho de tiro no outro lado da casa bem mais distante onde se podia ficar e atirar com segurança de não se acertar um alvo, como uma pessoa a passar. Por isso, o local era marcado como de Tiro ao Alvo tendo alí um cercado bem amplo para se manejar armas de fogo. O sol era de rachar o crânio aquela do meio dia ou coisa mais. Os três homens caminhavam sem parar tentando chegar o mais breve possível ao terreno amplo. Podiam-se verão longe um coelho se aparecesse. Mas não eram caças, afinal. O velho tinha o seu terreno com estande com bonecos, patos e coelhos de ficção apenas para se acertar no alvo além de modalidade esportiva com teste de precisão e velocidade no manejo de uma arma. Na verdade, era uma prática dessa modalidade requerendo treinamento e disciplina. O coronel Godinho buscou um alvo móvel para experimentar a sua pontaria. Os outros dois atiradores ficaram cada qual, com suas partes escolhidas para ver se de fato eles estavam com a pontaria segura. O velho manejava com esmero a sua arma. Satanás, algumas vezes, atirava fora do alvo a uma distancia de vinte metros. E mais novo de todos, Chulé, acertava todos os disparos com seu revolver Magnum 45 ou coisa parecida. A arma era simples no seu carrego e de disparo eficiente como poucos. A trinca de atiradores permanecia no seu ponto há meia hora quando alguém disparou por cima do pistoleiro Renovato Alvarenga de causar espanto aos demais. Era então a moça Ludmila. Ela acabara de chegar sutilmente e olhou o mais certeiro dos pistoleiros e fez a mira por cima de sua cabeça. E quando acabou de fazer o disparo Ludmila pediu desculpas.
Ludmila:
--- Desculpa! Foi só para experimentar a arma. Ela está em ordem! – sorriu Ludmila a guardar o seu Colt.
Renovato:
--- Você é doida? Chega tirou fogo dos meus ouvidos! – reclamou o pistoleiro Renovato.
Ludmila:
--- Que nada! O senhor já teve tempo de metralhar até mesmo os bandoleiros na mata! – relatou a moça a sorrir.
E Renovato ficou a apertar os ouvidos, a bocejar como quem quer botar para fora algo. Enfim, a sacudir os ouvidos quase moucos. Ludmila a sorrir integralmente e a pedir desculpas por mais uma vez pelo susto causado. O seu pai, Marcolino Godinho, de surpresa, teve de explicar ter Ludmila puxada ao seu avô, homem robusto e exímio atirador pelos rincões dos sertões.
Godinho:
--- Isso é de raça! Acerta em um alvo há 300 metros de distancia. Eu duvido quem tenha maior destreza do que a minha filha. – argumentou o velho Godinho.
Renovato:
--- É de raça ruim! Ainda estou mouco. Ora mais! – dizia o pistoleiro enquanto sacudia os ouvidos para verse destampava tudo.
E o tira-teima continuou até bem duas horas ou mais enquanto munição houvesse. Ludmila mostrou a sua exuberante destreza a competir de par a par com o seu protetor Renovato Alvarenga. Após esse tira teima o grupo deixou o parque, cada um contando vantagem. Mesmo assim foi Ludmila a eximia atiradora daquela tarde. A sua mãe, já um tanto angustiada gritava para os companheiros:
Cantídia:
--- Almoço gente! Deixa de tiro! – reclamava Cantídia de cima da calçada do solar.

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