- Charlize Theron -
- 06 -
INVERNADA
A
enxurrada trazia os basculhos encontrados pelo caminho de ladeira a cima fazendo
uma perigosa agitação para os mecânicos. Esses suspenderam o trabalho que eles
faziam a frente das oficinas pelo cuidado com a sua própria segurança e nada
mais. A gritaria teve inicio nesse ponto com cada qual arrastando seu material
de serviço, fechando os carros e correndo para dentro das oficinas. Eram dez
oficinas e não se podia observar movimentação alguma para o recomeço das
atividades normais. A temperatura caiu vertiginosamente impedindo o trabalho
dos pintores e a ação dos lanterneiros. Era chuva muita, dessas que engrossam
cada vez mais a todo instante alagando ruas e calçadas a impedir a ação dos
próprios trabalhadores das lojas de artigos automotivos. Foi então a gritaria.
Mecânicos:
--- É
chuva muita. – diziam uns.
---
Engrossa o caldo Arnaldo! – alguém dia se referindo as bebidas.
--- O
negocio é cana! – outro falava a se esfregar todo com os seus próprios braços.
E foi
assim à tarde e noite daquele dia. Arnaldo era dono de um sujo boteco de
vender, principalmente bebidas. Ao escutar o seu nome se virava e torcia o
braço para cima como a quem dizer:
Arnaldo:
--- Vamos
dá-lhe! – e sorria eufórico a limpar o
balcão.
O
temporal veio com relâmpagos e trovões. Em determinado instante o céu
estremeceu por causa de um forte trovão. E tudo ficou escuro de repente. Apesar
da claridade da tarde, até mesmo as lâmpadas dos postes acenderam
inesperadamente. A chuva cada vez mais forte interrompeu até mesmo o
fornecimento da elétrica para certos pontos da cidade, caso só a conhecer no
dia seguinte ao se fazer um balanço dos estragos causados pela deficiência de
iluminação. Se nas ruas tinha luz essa mesma faltava na maior parte da capital
a deixar as donas de casa em polvorosa.
Já estava
a anoitecer quando Otília chegou toda envergada de braços unidos ao corpo a
gemer como quem padecia uma forte dor e passou por Isabel adiantando para sua
colega ter tirado o feto. E por tudo feito ela teria de ir se deitar, pois as dores eram lancinantes. Isabel ouviu
e nada comentou para não dar vazão à dona Marina de todo o saber. Isabel estava
servindo às mesas postas do lado de dentro da pensão, motivadas pela tempestade
de raios e trovões arrebatantes onde havia até mesmo falta de luz. E até na
pensão. Dona Marina usou o método antigo: lampião de gás. Embora se aquecesse no fogão à carvão, a
mulher sentia frio intenso a todo instante. Quando Otília voltou à mulher nem
chegou a prestar atenção. Foi nessa ocasião ter um senhor de nome Gonzaga a
indagar se a outra moça do serviço estava adoentada que dona Marina falou:
Marina;
--- Não
sei! Ela saiu. Com esse inverno..... Mas deve voltar ainda hoje. – respondeu
com a fala arrastada a mulher.
Gonzaga:
--- Mas a
moça já voltou. Estava toda encorujada. Pobre coitada. É essa chuva mesmo! –
deduziu seu Gonzaga.
Marina:
--- Ela
voltou? Eu nem vi. Essa menina, você viu Otília? – indagou um pouco displicente
a mulher.
Isabel:
--- Ela
está no quarto. – falou Isabel sem tecer comentário.
Marina:
--- Pois
chame a moça. Aqui só tem você. Chame a moça. – falou arrastada dona Marina.
E Isabel,
sem mais nem menos foi correndo ao quarto de Otília avisar ter dona Marina
tomado conhecimento ter a moça
retornado. E não podia dizer outra historia. Queria Isabel saber qual historia teria para
contar:
Otília:
--- Eu
estou muito doida. Diga a dona Marina que eu estou passando mal. Ela vai
entender. - ressaltou a moça toda se contorcendo de dor.
Isabel:
--- Ela
vai entender o que? Que você tirou a criança? – indagou assustada a moça.
Otília:
--- É.
Sim. Diga a ela! Eu não aguento mais! Ai que dor! – respondeu a moça a
lacrimejar com a dor terrível.
Isabel:
--- Meu
Deus! Você está cheia de sangue! Olha o colchão?! – falou alarmada Isabel
olhando para baixo da coberta de Otília! E pôs a mão da boca com os olhos bem
abertos.
E
finalmente saiu do quarto com imensa pressa assustada por demais e a chorar
também com a certeza de dona Marina entender a situação de Otília. E foi em um
minuto a contar para a mulher com respeito a situação da antiga domestica da
pensão. A chuva caia a píncaros sobre toda a cidade, No bairro onde ficava a
pensão à lama já atingia meio metro não permitindo o transito de carros
pequenos. Apenas caminhões e ônibus podiam transitar sem maior susto. Além do
mais havia falta de luz e não se sabia quando devia voltar à energia. Isabel
contou o que não queria e a senhora da pensão logo se alarmou:
Marina:
---
Morrer? Na minha casa? Nunca! Pode mandar a moça encher a mala! Ora mais! Eu tô
mole mesmo! Os outros fazem o serviço e vem morrer às minhas custas! Pode
mandar a moça procurar outra cova! Eu não estou dizendo! – fez ver a mulher
cheia de ira.
E nessa
ocasião os ânimos se aqueceram dos demais consumidores noturnos. E um foi o
próprio Gonzaga a indagar o estado de saúde da moça. Com isso Isabel falou:
Isabel:
--- Ela
está morrendo. Tá um monte de sangue assim! – relatou a moça fazendo gesto com
as mãos.
Gonzaga:
---Deixa-me
ir até o quarto, velha? – perguntou Gonzaga a dona Marina. O homem costumava
chamar a mulher de “velha”.
Marina:
--- Que
me importa! Vá morrer noutro terreiro! – comentou com muita ira a mulher.
Gonzaga
mais Isabel foram até o quarto de Otília. A turma quase toda foi ver a mulher.
Na ocasião, Gonzaga nada indagou. Apenas disse à moça:
Gonzaga:
--- É
melhor leva-la para o hospital. Eu peço a Meio Veio e ele leva agora. – relatou
Gonzaga falando com Isabel.
Isabel:
--- Quem
é esse homem? – perguntou assustada a nova domestica.
Gonzaga:
--- Meu
Veio? É um homem. Ele leva na hora. Vou buscar o carro. – falou Gonzaga e saiu
mais que depressa.
A mulher
se esvaia em sangue. Sua palidez era enorme. Quem a viu procurava correr do
local com bastante temor. A certa
altura, Otília já nem podia mais falar. Quase todo o sangue correu de vez.
Isabel não sabia o que fazer para contornar a situação grave por demais. A
hemorragia era provável de um rompimento de uma artéria. A mulher podia ter a
morte quase imediata por soltar todo o sangue em jatos fortes e rápido. Isabel
se lembrava de caso semelhante ocorrido onde morava. A mulher corria risco de
morte e, em vez de deixar a pessoa apenas deitada, procurava manter a pessoa um
pouco mais elevada do que seu próprio coração e fazer pressão por dez minutos
em cima do local do sangramento.
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