sábado, 27 de novembro de 2010

AMANTES - 07-

- Mariana Ximenes -
- 07 -
O tempo passou. Silas era um rapaz de seus vinte anos. Muita coisa aconteceu no roteiro de sua vida. Então, já bem disposto e fagueiro, presidente de um clube de cinema, certa vez teve oportunidade de ver aquela menina então senhorita acompanhada de um rapaz, com certeza o seu noivo ou namorado. Ele, de muito perto, notou a presença de Vera. Ela, por sua vez, nem notou a presença de Silas. Vera caminhava com seu noivo ou namorado para assistir ao filme exibido naquela manhã de domingo no Cinema de Arte, promoção do Cine Clube. Era tanta gente a entrar no recinto de projeção que Silas mal vislumbrava a presença de Vera. Para o rapaz foi um desacerto total por ver a sua amante aos braços de outro qualquer. Ele então pensava no que eles fizeram de estranho amor no tempo em que eram mais jovens. O mundo rodou em torno de sua mente ao relembrar todos aqueles ébrios instantes quando os dois passaram juntinhos ao bel prazer. Em lembrou de certa vez que os dois amantes (Silas e Vera) caminharam até o Morro da Torre, local ermo e sem habitação onde pudesse se notar alguém para ir buscar cajus e mangas. Foi um verdadeiro momento de terror. Ao chegarem ao Morro da Torre, eles colheram um cesto de cajus. As mandas, verdes por sinal, ele não colheram.
--- Estão verdes!  Olha! – fez ver a garota Vera ao seu amante.
--- Assim não presta! Têm outras mais lá adiante! – recomendou Silas.
--- Lá em baixo? – indagou Vera ao garoto.
--- É. Vamos depois buscar mangas nos pés! – respondeu aperreado Silas se livrando das moscas pequenas que zoavam por todo o caminhar.
A mocinha sorria de mais por conta do aperreio de Silas angustiado com as moscas pequenas que lhe azucrinavam a todo o momento. O garoto olhava a sua companheira e sorria para dizer que estava sendo comido pelas moscas.
--- Elas estão me comendo! – respondeu Silas entrechocado com as malditas moscas.
E a garota sorriu para se acabar. Era uma gargalhada só. E Silas também sorriu com seu cesto de cajus pendurado no braço esquerdo. Foi então que a garota de repente se assombrou ao notar a presença de uma cobra verde entre os galhos do arvoredo. Foi um grito só:
--- Olha a cobra!!! – gritou a garota pegando a estrada de volta para fugir da serpente.
--- Onde? – indagou alarmado, com um brutal temor o garoto Silas.
Não deu nem tempo de o infante se virar e ver a tamanha cobra que ele pensava. Era uma cobra e tanto, supunha o infante. E então correu também em busca da sua namorada. A menina se soltou na frente a gritar terrível temendo a ação da serpente a lhe alcançar. Apenas gritava para o garoto que estava bem aos seus pés.
--- Olha ela! Olha ela! Olha ela! No galho! Ela te pega! – gritava a garota correndo em direção a Torre. Aquele era o único local onde havia presença de um homem. O certo senhor bem moço ainda estava sentado em uma cadeira de vime em frente a um birô no interior de um quarto a consertar rádios.
Quando a garota entrou no quarto, espavorida, o homem se alarmou. Queria saber do que se tratava para tanto espanto. Em seguida, entrou o garoto Silas que vinha atrás da atabalhoada mocinha. Ele corria temeroso apenas. Mesmo assim, com as narinas soltando brasa. Apenas a garota Vera traduzia alarme em pânico.
--- É uma cobra! É uma cobra! É uma cobra! – gritava a garota se abraçando com o rapaz da Torre.
E o garoto, em seguida, acrescentou temeroso de receio que a enorme serpente estivesse aos seus pés e trancou a porta de entrada da casinha.
--- É uma cobrona enorme! – alarmou o garoto ainda com o seu cesto de cajus, à tira-colo.
O homem cujo estado era o de consertar rádios de seus donos, moradores em casas distantes, igualmente entrou em pânico a dizer aos garotos que tivesse calma. Ele, por sua vez, agarrou de uma espingarda de soca e evitou ser agarrado pela garota, desvencilhando por fim, e se levantou da cadeira de vime para poder sair do lugar com a sua atiradeira. Enfiou mais pólvora no cano da arma e perguntou aos dois infantes.
--- Onde está essa cobra? – indagou ao se levantar o homem que consertava rádio.
A menina, com seu vestido todo rasgado pelas estacas da porteira da casa, quando foi entrar, apenas disse:
--- Ali! Ali! Ali! No mato! – cheia de medo e de terror emendada pelo seu amante.
--- No mato! Tem uma ruma de cobra! – acrescentou o garoto Silas com o calção quase a cair.
O homem que consertava rádio e tomava conta dos aparelhos eletrônicos de uma radio que enviava o seu sinal de um bairro para o outro, pediu aos garotos que lhe deixassem ir ver tamanha cobra. E seguiu o homem a devassar o terreno até ao pé do morro procurando ver se tal cobrona existia de verdade. Pelo que dissera o menino, era mais de uma. Um monte. Com certeza era um ninho de cobras. Alí onde estava a Torre, sempre apareciam serpentes e vez por outra o homem dava cabo dessas cobras. Eram às vezes Coral, Caninana e mesmo papa-ovo, jararaca e cascavel. A Torre ficava em um terreno plano, porém era um cerco de mato ao redor vez que as serpentes habitavam aquele local de há muito. Os garotos – Vera e Silas – seguiram de longe o rádio-técnico temendo uma represália das cobras. O garoto perguntou a Vera um pouco baixinho:
--- Você viu o cobrão? – indagou Silas a Vera tremendo de medo com o seu cesto de cajus.
--- Eu vi! Ora! Era uma cobrona! – retratou a mocinha com todo o seu medo de cobra.
Enquanto isso, o homem vasculhou por todos os cantos no pé do Morro, já distante do local da Torre e nada ou nenhuma cobra ele pode observar. Com certeza a serpente já teria saído do seu local. O rádio-técnico vasculhou por ampla região a procura de ninhos de cobras e nada mais foi encontrado.  Para não perder a viagem o homem usufruiu de um caju tirado no pé. Era um caju doce e travoso, grande e suculento cuja emoção era de dar água na boca. Para afagar os desesperos dos dois garotos – Vera e Silas – o homem disparou a sua espingarda para cima do cajueiro e assim ele acabou com a fama da serpente para todo o sempre. Muito embora ele não tivesse visto nem sinal de cobra nos aceiros do local onde existiam melancólicos os cajueiros, mangueiras, umbuzeiros, pitombeiras e outros tantos. Para além do morro era mata virgem e apenas eram tomados pelos caçadores de cotias, veados, raposas e outros animais pequenos e apanhadores de lenha. Esse pessoal era acostumado em conhecer animais e repteis por onde passasse. Com o disparo, o rádio-técnico acreditava ter amedrontado o réptil que por ventura alarmou os dois amigos, infantes ainda, talvez irmãos, pois ele desconhecia o passado de Vera e Silas. Ao retornar a oficina, o homem preveniu aos dois garotos que aquele local era “assombrado” e só os homens que tiravam guarda por aquela região podiam ter acesso.
--- Mas tem um homem que mora dentro da mata! – respondeu Silas ao técnico em rádio.
--- É. Seu Heráclito. Ele vive nas matas. É conhecedor de toda aquela região. Mas eu recomendo a vocês não irem atrás dele. Dizem que ele é meio “maluco”! – sorriu o homem querendo fazer mais medo aos dois garotos.
Silas olhou para Vera e sorriu como quem dissesse.:
--- É para lá que nós iremos. Afinal. ... .- quis dizer Silas à mocinha.
Vera sorriu em troca compreendendo o que Silas quis informar naquele instante. Afinal, as cobras já haviam de se acabar, certamente.
Esse pensar Silas recordou ao ver Vera de braços com o seu noive a entrar na sala ampla do cinema naquela manhã de domingo. Aqueles braços dados um dia foram seus, apesar das brigas do Grupo Escolar e dos ciúmes de Ana sempre fazia aos dois amantes. Era uma luta constante entre Silas e Vera. Logo, Silas se lembrou do velho e louco Molambo cujas vezes o fazia temer. Silas tinha momentos de reflexão dos tempos mais remotos o qual passara ao lado de Vera. E se lembrou de Helena e de outra amiga de Vera de nome Racilva. Essas duas amigas eram alunas do período da tarde do mesmo Grupo Escolar que eles freqüentavam pela parte da manhã. Com o passar do tempo, Silas se encontrou com Racilva, na Universidade. Os dois estudavam em cursos diferentes. Quando havia festa e eventos, Silas sempre encontrava Racilva, já com um rapaz que talvez se dissesse ser o seu namorado. Racilva era alva, cabelos encaracolados. Era uma meiga senhorita naquela fase da vida.
Quando a sessão terminou Silas não viu nem sombra de Vera. Era gente demais para assistir a sessão de cinema. Ela e o noivo com certeza tinham seguidos outro rumo, da esquerda, pelo menos. Com certeza, Silas se lembrou do ancião Molambo cujo feitio era de um homem já velho, feito um traste e quase acabado. Roupas em trapos, iguais as que estavam a trajar os homens do filme que naquele dia foi projetado. Mesmo assim, Silas ainda procurou ver se encontrava Vera, a bela jovem irrequieta que um dia fora uma pequena travessa em buscas de seus amores juvenis. Por mais que antever a procurando, Silas enfim retornou a sua labuta. Era hora de conferir os ingressos da sessão matinal do Cinema Olímpia onde acabara de projetar o filme daquela manhã de setembro. Nesse instante, um rapaz chamou Silas apressado:
--- Silas! Tem alguém a tua procura! – orientou o rapaz apressado.

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