sexta-feira, 28 de outubro de 2011

CREPÚSCULO - 03 -

- Vivian Leigh -
- 03 -
O CORONEL
Aquele dia era um domingo. À noite, quando todo o pessoal chagava da Missa na Igreja local, tinha um encontro em família na casa do velho “Juca”, 80 anos, onde cada qual que argumentasse mais sobre os casos acontecidos na cidade ainda pequena. Casos de certa forma sem importância. As mocinhas eram as mais falantes. E prolatavam de tudo um pouco, principalmente os namoricos das filhas da “Caidinha”, coisa sem a menos importância. E todos sorriam ao falarem as endiabradas moças. Sem contar com a moça mais espertas, a qual namorava na varanda da casa. E foi assim que o velho “Juca” – seu nome era João Tenório de Alencastro, conhecido mais por Coronel Alencastro quando o homem era ainda novo de idade – falou sem sorrir, a dizer apenas que ninguém viu o sucedido da noite passada. O que ele falava ninguém dava a menor importância, não fora por acaso um bisneto do velho. Foi quando o velho falou em uma coisa enorme que passou no céu à noite do sábado.
--- Eu vi vô! – declarou alarmado o garoto.
--- Você viu? Pois é! Uma coisa enorme. Mais parecia um avião. Mas não era avião! Nem fazia barulho e era todo iluminado por baixo! Cheio de luzes! Eu estava cuidando do chiqueiro dos porcos quando avistei aquela coisa gigante. Os porcos se assustaram. Mas eu disse que aquilo, para mim era uma aeronave! Mesmo assim, a nave passou bem alta e numa velocidade incrível! O negócio seguiu em direção no sentido da fazenda “Mombaça” e depois, sumiu! – falou com altivez o velho Juca.
--- Ele parou na fazenda “Mombaça”!. Mas por algum tempo! Eu estava acordado quando aquela criatura passou! – relatou o menino querendo dar mais ênfase ao aparelho voador.
--- Que “criatura” seu bobo. Aquilo não era gente! Era um avião! – repreendeu uma de suas tias mais moças
--- Sei lá! Sei que eu vi! Você não viu! Então não se meta! – respondeu o menino um tanto zangado.
--- Venha para cá que eu lhe meto a chinela! – disse a moça com o intuito de jogar a chinela nas costas do garoto.
--- Deixa disso, Norma! – repreendeu a sua avó, esposa de seu Juca.
--- Obedeça a dona Rita menina! – falou com seriedade o pai de Norma.
Foi assim que Chiquito se meteu na conversa. Chiquito era Francisco de Assis. Mesmo assim todos o chamavam de Chiquito, dono de um armazém de vendas e cereais e algodão. Chiquito tinha fama de ser um homem rico por causa dos volumes de algodão em fardo. Ele vendia tudo isso para um exportador da capital. Naquela noite, antes de ir se deitar, Chiquito passou um tempo ouvindo o conversar das moças e dona Rita a repreender a sua neta, filha de Chiquito. Ele se intrometeu apenas para acalmar os ânimos da garota com o filho de Carmen, por sinal o seu neto. Norma era filha de outra irmã de Carmen.
Com essa repreensão, a moça, Norma, saiu da sala queimando fogo e entrou em seu quarto onde se meteu a chorar. E o velho Juca nem ligou para o fato. Apenas respondeu que na manhã daquele dia – um domingo – seu Orlando Martins esteve na cidade em busca do veterinário João Mota. Pelo que foi dito na calçada do mercado algumas vacas tinham aparecido mortas no interior da Fazenda ”Mombaça” e não se sabia a razão da mortandade.  Foi o que soube dizer o Coronel Alencastro.
--- Isso deve ser morte por conta do gado de ter comido ervas venenosas! – falou Chiquito coçando o pé que estava em cima do pau da cadeira de balanço onde ele costumava a descansar da luta diária.
--- Mas o doutor Orlando Martins toma cuidado para o gado não comer as eras daninhas. – relatou o velho Juca olhando o tempo para fora da janela e ao mesmo tempo ver se não percebia alguma nave assustadora
Dona Rita, um tanto cansada pelas quebradas da vida resolveu sair e ir para o seu quarto onde rezaria o seu oficio em intenção aos mortos de sua família e aos defuntos bem conhecidos da mulher. Dona Rita tinha 75 anos de idade. Era uma mulher ainda jovem para o seu tempo de vida, uma vez que a sua avó morrera quando completara 105 anos de vida. A mulher ainda tinha mãe – dona Maria Soledade – que estava aos 95 anos de vida. A velhinha nessa hora, já estava a dormir em seu quarto onde quase ninguém resolvia ir até ao leito da anciã, a não ser a própria dona Rita. O pai de dona Rita já morrera há alguns anos por causa de uma flatulência recolhida, conforme diagnóstico médico. A passar perto do coronel, este lhe perguntou:
--- Já vai minha santa? – indagou o velho Juca sem desaforo.
--- Já é tempo. Vocês estão conversando muita bobagem. Eu vou ver como está passando a minha mãe e aproveito para rezar o oficio de Nossa Senhora. – comentou um pouco baixo a dona Rita.
--- Pois é. Eu fico mais algum tempo. Não vai chover hoje. O céu está limpo de nuvens! – relatou o velho Juca olhando para a mulher já um pouco cansada da lida.
Os vaqueiros da Fazenda “Mombaça” comentavam àquela hora da noite a mortandade do gado naquele tempo de estio. Pudera ser devido à ingestão de alguma erva daninha onde o gado se enveredava para comer qualquer coisa que houvesse. Mas tal opinião não tinha o apoio de todos os homens do mato. Pois, conforme diziam se fosse desse jeito havia gado morto há mais tempo, uma vez não ter chovido há mais de um mês.
--- Tem vaca que morreu no sopé da serra. Lá em cima. – relatou José Jacó cheio de cisma nas cercanias de sua casa.
--- Tem muito nascendo pelo sertão. – informou outro vaqueiro meio descrente.
--- Nem vá com uma conversa dessa para cima do doutor! – repreendeu Jacó querendo dizer na dúvida do vaqueiro para os ouvidos de Orlando Martins.
--- É esperar pelo que vai dizer o veterinário. – retrucou outro vaqueiro querendo apaziguar os ânimos.
Naquele instante, já enveredando pela noite, apareceu em frente da casa dos vaqueiros o doutor Orlando para matar a hora de ir se deitar de vez.  Ele reclamava da dor sentida próximo ao ombro desde a noite passada quando estava a dormir ao volante do seu próprio carro. E fazia um esfregado para cima e para baixo com o braço afetado e quis puxar conversa com os vaqueiros.
--- Alguém de vocês foi ao mercado hoje? – indagou Orlando aos vaqueiros.
--- Eu fui ouvir as conversas dos homens. – relatou sem pressa um dos vaqueiros.
--- Ah bom. Eu estou cansado da luta. Hoje, o dia foi de comer brasa. – comentou Orlando a reclamar do braço.
--- Eu ainda estou lembrado daquele sujeito! – declarou Jacó ao se referir ao velho “Trapo”.
--- Que sujeito? O velho “Trapo”?. Aquele nem merece fé. – disse de vez Orlando Martins.
--- Amanhã tem feira. E ele já está abancado nas lonas das barracas. – relatou o Vaqueiro Dimas
--- Toda a semana é a mesma reza! – sorriu Jacó ao cuspir de lado uma gosma de fumo.
--- Ele diz que viu Jesus. Toda vida diz isso! –gargalhou Dimas vaqueiro.
--- Toda vida é a mesma conversa. E o povo gosta! – gargalhou o doutor Orlando.
E a conversa continuou por mais um bom tempo até a hora dos vaqueiros se recolherem, igual com a decisão de seu Orlando. Esse, por algum tempo, ficou a olhar o céu e suas estrelas e comentar não haver possibilidade de chover nos próximos dias. E de imediato, algo lhe fez recordar.
--- Agora me lembro! Tive a impressão de ter estado em uma estrela daquelas! – comentou o homem.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

CREPUSCULO - 02 -

- Justin Bieber -
- 02 -
VACA MORTA
Ao saber da noticia o vaqueiro pensou ter sido uma cobra que havia picado o animal. Por isso mesmo não deu maior importância. E logo declarou que ao nascer do sol ele veria o animal. Boi morto era coisa corriqueira no sertão. E com o tempo ressequido pela falta de chuva, isso era muito comum no sertão do município de Panelas, nem tão distante assim da capital do Estado, muito embora serpentes não tivesse nada a ver com as estradas que levavam a cidade. De qualquer modo o vaqueiro Jacó agradeceu e mandou vasculhar o caminho de manhã logo cedo para ver se outras reses tinham morrido também. E nesse ponto, Jacó pegou o caminho dos seus aposentos onde havia de dormir. E ainda reclamou:
--- Essas serpentes são um caso serio. Não vejo a hora de se matar todo. – reclamou Jacó.
A casa de Jacó era bem feita, toda de tijolo, cobertas com telhas, como eram as casas dos vaqueiros da Fazenda Mombaça do senhor de terras Orlando Martins, fazendeiro rico e dono de amplos cercados, herdeiro do seu tataravô. O restante das propriedades estava dividido com os outros irmãos e a família de Orlando, inclusive o seu pai, Gaudêncio Martins, mais conhecido como o “Velho”. Nessa noite de estio, Orlando Martins não soube da morte do boi, coisa bem comum no sertão brabo das caatingas do velho interior. Ela apenas resmungava de uma picada sentida no braço direito próximo ao ombro. Mesmo assim, Orlando tomou banho e comeu um pouco de coalhada com queijo sem muito conversar com as criadas da cozinha. Apenas a menina Amanda apareceu junto à mesa com seu chambre, o consolo e o pano amarrado no consolo descendo para o chão.  O homem colocou a menina no colo e continuou a fazer a sua refeição. Laura, a sua esposa, foi que apareceu na porta a buscar a menina. A criança estava a dormir naquela hora e acordou com a zoada do carro, talvez. E ficou por alí fazendo suas estripulias até o pai chegar à mesa. A empregada ainda brincou com a garota antes da mesma se sentar ao colo do patrão. Laura não viu, porque estava no quarto ajeitando a cama para Orlando. Isso se deu instantes antes do homem sair do banheiro.
Após esse jantar ligeiro Orlando se levantou da mesa com a menina no colo com a sua mulher a tagarelar inevitavelmente querendo tomar a garota e o homem sem querer soltar a pequena dizendo:
--- Deixa que eu mesmo faça! – comentou sem raiva o senhor Orlando Martins.
E assim ele levou a garota até o seu leito onde a pôs para dormir acalentando a criança. A tagarelice da mulher não cessava e o homem fugiu do quarto para assistir um pouco a tevê enquanto o sono chegava.
Pela manhã, logo cedo, o vaqueiro Jacó chegou a varanda do casarão e nem precisou bater palmas para acordar Orlando, pois o mesmo já estava de pé, na porta, a admirar o horizonte. O vaqueiro tomou apenas a iniciativa de informar do gado morto que ele mesmo encontrou:
--- Um touro e cinco vacas. Uma delas estava amojada. Ainda tem dois bezerros. Foi o que encontrei na beira do rio, se senhor. - relatou acabrunhado o vaqueiro tendo ao lado mais dois trabalhadores da fazenda.
--- Mas será possível? Não tinha marca nenhuma? – indagou Orlando com ar de preocupado.
--- Não senhor. Eu sou na noite passada de um touro morto. Mas pensei que fosse mordida de cobra. Deixei para ver de manhã cedinho. E os outros vaqueiros acharam o gado morto bem separado um do outro. E até podia ser da água do rio. Mas outros animais beberam da mesma água. E nada aconteceu. – explicou o vaqueiro Jacó cuspindo ao lado a gosma de fumo.
--- Eu vou falar com o veterinário João Mota. Ninguém mexa no gado. Deixa como está. Vou à cidade falar com o veterinário. – alertou o homem com a cara preocupada.
--- Tá certo. Se o senhor quiser eu também vou com o senhor no carro. – retorquiu Jacó.
--- Tá bem. Vamos lá agora. – fez ver Orlando com o rosto bem angustiado.
--- Tenho a impressão que puseram negocio na água dos bichos. São apenas sete cabeças. Mas esse negócio pode ferver bem muito. – relatou Orlando ao caminhar ao seu carro.
--- Tem muita gente ruim por esse mundo a fora. Muita gente mesmo. – alertou José Jacó.
--- Se eu pego um corno desse eu ferro ele. – respondeu com raiva Orlando Martins.
Após o veterinário João Mota examinar todas as cabeça e recolher uma porção de material para exames laboratoriais disse apenas o seguinte:
--- Não vejo nada de mais. Eles morreram não por intoxicação da água ou alimento. Mas é bom esperar o resultado dos exames de laboratório. Deve demorar um pouco. – relatou um tanto preocupado o veterinário, pois o gado morreu simplesmente.
--- Patrão! Patrão! Eu encontrei mais três cabeças mortas na pedra do Mangará! Eles estavam todos encolhidos! Foram três. Patrão! – relatou esfogueado outro trabalhador que acabara de chegar montado a cavalo.
--- Pronto! Mais três! – relatou com fúria Orlando.
--- É. Vamos lá para ver. No grotão do Mangará? Vamos ver! – relatou com pressa o veterinário
E os homens saíram por mais uma légua até chegar ao grotão do Mangará, onde só se ouvia o chocalhar de cascavel em uma vereda intrincada de se passar por conta do mato brabo onde nem nambu tinha coragem de ir fazer seus ninhos. O carro de Orlando comeu fogo para chegar até o mateiro, perto de outro grotão existente da região. Em lá chegando, o veterinário João Mota e o fazendeiro Orlando Martins, já ao cair da tarde, encontraram as três cabeças de gado mortas por completo.
--- E aqui nem água tem para os bichos beber. – relatou João Mota.
--- É danado mesmo! – vez ver Orlando todo rasgado de ramas de mato.
--- É o mesmo sinal. Eles nem andaram para morrer. Morreram mesmo no canto onde estavam sem precisar correr. – argumentou Orlando Martins a coçar a cabeça.
Com poucos minutos após, quando o carro de Orlando  Martins já estava para sair com os seus ocupantes eis que chega ao local um homem bem conhecido do povo da região e que o chamavam de “Trapo” pelo trajar maltrapilho e por não dizer coisa com coisa. O pessoal o observa e logo dizia para gargalhar depois:
--- Isso é negócio de “Trapo”. – relatava que o ouvisse ou não falar.
Naquela hora, vindo do mato intrincado no sopé da serra, aparece o homem confuso e desnorteados a gritar entre seus trapos ter ele observado o sinal dos tempos.
--- Eu vi seu Doutor! Eu vi! Ontem à noite! Um sinal do céu! Era um gigante! Enorme! Ele veio do alto e falou algo que eu não entendi! Eu vi! Eu vi! – declarou muito rápido o valho chamado “Trapo” com a sua voz rouca como de um louco pregador das montanhas.
O doutor Orlando Martins pouca importância deu ao velho “Trapo”. E o mesmo fez o doutor João Mota, veterinário das fazendas do interior. Mas José Jacó, o vaqueiro e o quarto homem que encontrou às vacas mortas se prendeu para não sorrir ao tempo no qual dizia o velho que ainda haveria de sentir o sertão a força e o testemunho de Deus.
--- Ela não era Deus! Mas era o seu mensageiro! Eu vi o anjo do céu! – relatava com toda bravura o destemido velho “Trapo”.
--- Vamos embora antes que ele diga ser também enviado de Deus! – comentou o veterinário falando baixo.
Mas o homem gritava sem apelo com a sua voz rouca e desesperada.
--- Quem quiser ver o que eu digo que espere pelo tempo do juízo final. Vai ter fogo! Muito fogo! E o gado será levado para o céu! E os homens maus serão levados para o castigo eterno! Ouçam o que eu digo! Homens de pouca fé! O anjo veio me dizer o que eu estou agora a dizer! – comentava o velho “Trapo” enquanto o carro comia o mato a procura da estrada de barro da fazenda “Mombaça” de onde os homens haviam partido.
--- Tem louco nesse mundo! – recitou o doutor João Mota esfogueado.
--- Ele é assim mesmo. E vai terminar rezado para as vacas. – relatou com pressa de forma baixa Orlando Martins procurando parte de um melhor caminho.
Ao chegarem à fazenda “Mombaça” eles se despediram, pois o veterinário João Mota ainda queria examinar um pouco do material colhido do gado morto. Por isso mesmo dispensou o homem até o convite para entrar e tomar um pouco de café. Do seu canto, Orlando, após dispensar os vaqueiros entrou na sala e viu a sua menina a brincar com as suas bonecas. Ele não mediu tempo e foi para dentro da casa onde tomou um banho refrescante para tirar as murrinhas que ainda trazia no corpo. E nesse instante, um negócio estremeceu a saboneteira a qual estava fincada na parede do banheiro da casa. Ele ainda estava com os olhos tapados pela espuma do sabonete o qual esfregara no rosto molhado. O leve barulho fez o homem se voltar depressa. Porém nada viu. E ele pensou até na esposa e chamou:
--- Laura? Estais aí? – perguntou o cidadão alarmado.
Silencio foi dado como resposta. Nada ou ninguém falou de fora do banheiro.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

CREPUSCULO - 01 -

- Bruna Linzmeyer -
- 01 -
- O RÁPTO -
O carro rompeu o matagal em busca da sede da fazenda onde Orlando Martins tinha de chegar o mais depressa possível. Já era noite avançada e o homem estava inquieto porque desejava chegar bem antes. O mato intrincado quase não permitia ao homem ver qualquer coisa estando longe. A noite era sem lua parecendo noite de lua em quinto minguante. Nisso, Orlando nem pensava. O que ele queria era chegar à casa grande. Pelo visto era ainda muito longe da rodovia, apesar de Orlando está bem acostumado com aquele trajeto, pois, afinal era um canto da sua infância. De um momento para outro, tudo ficou escuro. O veículo que ele dirigia apagou de vez. Bastante assustado, Orlando Martins ficou desesperado procurando uma lanterna que ele sempre trazia na bolsa do carro bem ao lado do motorista. Ele sentiu o volume da lanterna e logo puxou e procurou ligar a luz do flash para ver o que acontecera no  quadro de luz do seu automóvel, pois tinha tudo apagado de uma inesperadamente. No entanto, a lanterna não deu sinal nenhum de refletir alguma luz. Orlando se desesperou mais ainda quando ouviu um som estranho vindo por trás do carro onde ele estava. Até pensou Orlando ser um alguém em algum carro e ele estava no intuito de chamar a pessoa para lhe prestar socorro. Em dado momento um enorme disco parou por sobre o capuz do seu veículo, a certa altura chega deixou Orlando desnorteado.
--- O que está ocorrendo aqui meu Deus. – foi o que pensou de forma alarmada o homem.
O homem abriu a porta do carro, mesmo no escuro, iluminado apenas por uma carreira de luz que fazia volta em torno do disco e olhou para cima e indagou amedrontado:
--- Disco! É um Disco? – indagou Orlando a olhar o enorme disco acima de sua cabeça, bem no alto do seu carro.
Na verdade, o homem ficou extasiado e de um momento para outro ele desmaiou de tanto horror e alarme. Passaram horas, Orlando despertou em uma sala coberta de branco onde estavam cinco homens altos, magros, porém aparentemente fortes peles brancas até demais e trajando vestes brancas. Ele olhou ao redor e então pensou:
--- Estou no céu? – pensou Orlando procurando se apalpar, porém notou que suas mãos estavam imobilizadas.
No pensamento seguinte veio a estória de ele saber com certeza:
--- Eu morri? – indagou Orlando a si mesmo.
Os homens do salão estavam de costas para Orlando e se falavam ele nada ouvia. Isso lhe reforçava a impressão de que, na verdade, ele era um morto. Com isso, Orlando se aperreou e ainda teve um temor ainda maior. E disse mais:
--- Tô lascado! E ninguém sabe que eu morri! – comentou consigo mesmo o homem,
Nesse momento três homens se aproximaram de Orlando e lhe aplicaram algo como se fosse uma injeção. Aliás, apenas um. Os outros dois acompanhavam o homem grande. E todos eram altos. Foi zapt-zupt. Imediatamente Orlando entrou em estado de sonolência.
Quando era quase meia noite, um vaqueiro de nome José Jacó, vinha pela estrada quando vislumbrou o veiculo do seu patrão com as luzes de trás acesas e achou por bem ir até ao carro para ver o que havia sucedido naquela ocasião. Ao chegar junto ao veiculo encontrou o seu patrão como se estivesse a dormir com a cabeça apoiada na direção do automóvel. Jacó bem atento como estava o seu patrão e logo a seguir chamou o homem como costumava fazer.
--- Noite, patrão! Está dormindo? – indagou o vaqueiro a Orlando.
Esse estava a dormir e por certo não ouviu Jacó falar. O vaqueiro se apeou da montaria e logo desceu olhando por certo o interior o carro vendo se havia mais alguém, o que em nada ficou comprovado. De vagar, Jacó se apoiou na porta do veiculo e viu o seu patrão adormecido como se nada o acordasse. O homem andou em torno do veiculo e viu as luzes da frente acessas em nada mais a comentar. Então Jacó voltou e persistiu em chamar o patrão para verse o homem estava a dormir aquela hora na mata densa e longe ainda do casarão. Por certo o homem teria tomado umas cachaças, e isso deu no sono, pensou o vaqueiro.
--- Patrão! O senhor está bem? – indagou com voz baixa o vaqueiro.
Nesse instante o homem retorceu a cabeça e olhou para fora vendo aquele gigante em forma de gente e gritou alarmado.
--- Quem é você? – perguntou exacerbado o homem Orlando.
--- Sou eu, patrão. Seu criado Jacó. – respondeu o vaqueiro com cautela.
--- Jacó? Você é Jacó mesmo? – perguntou Orlando meio tonto.
--- Sou. E o senhor está bem? – indagou ainda manco o vaqueiro.
O homem parecia sonolento e ainda assim se recuperava daquele mal e sem saber o que estava a fazer naquele local. Por isso perguntou ao vaqueiro.
--- Onde estou? Esse lugar? Que dia é hoje? A luz. Está tudo apagado! – reclamou Orlando torcendo o pescoço para um lado e para outro.
--- Luz? Que luz, patrão? – indagou meio confuso o vaqueiro.
--- Luz do carro. Eu parei para ver se ajeitava. Nem a lanterna funciona! – reclamou Orlando procurando a lanterna.
--- Lanterna? Mas o senhor está com ela nas mãos. E o carro está todo iluminado. Veja o senhor por si só. – relatou o vaqueiro Jacó.
O homem Orlando Martins se desesperou e no momento viu tudo aceso. Até a luz do carro estava iluminando a mata. E comentou:
--- Quem ajeitou essa luz? – balbuciou Orlando olhando a pilha em sua mão.
O vaqueiro ficou alerta e disse ao homem não saber. Talvez a luz faltasse por alguns instantes sem se saber a razão. Orlando ficou meio duvidoso e desligou a iluminação geral do auto para, em seguida ligar novamente. E Orlando ficou feliz por ter dado certo o que havia feito.
--- Deu certo. Mas, por que faltou luz naquela hora? – indagou um tanto esquisito o homem.
--- Não sei patrão. Eu não entendo desse negócio. Talvez o senhor tenha desligado sem querer. – disse meio desatento o vaqueiro Jacó.
--- É. Espere! Desatento eu não fiz. Ela apagou de vez. – respondeu o homem ao vaqueiro.
--- Bom. Eu só quis dizer. – disse ainda o vaqueiro meio encabulado.
E o homem tocou no arranco tendo o veiculo funcionado perfeitamente em ordem. Ele se alegrou e pediu para o vaqueiro lhe acompanhar, pois faria o trajeto bem devagar, pois o carro percorria mais que o cavalo se o homem pusesse fé no acelerador. O vaqueiro Jacó concordou e os dois seguiram direto para a fazenda com Orlando ainda desconfiado com seu carro. Ao chegar a casa grande o motorista alimentou o carro por mais alguns minutos e depois desligou a chave e apagou os faróis. Ao descer, ele comentou com o vaqueiro passando a mão no ombro como se uma fisgada lhe importunasse.
--- É danado. Pra você vê! O bicho veio igual uma lebre. Que coisa! – argumentou Orlando ainda desconfiado com o seu carro.
--- Isso acontece, patrão. Seu Virgulino vive apanhando com o carro dele. É assim mesmo. Cavalo também tem doença. – falou o vaqueiro Jacó querendo sorrir.
--- Ah. Mas o meu, não. Dá uma pane sem que nem mais? Vai-te! – reclamou Orlando.
Em frente do casarão tinham plantado duas enormes arvores: de um lado um coqueiro sem tamanha; do outro, uma palmeira que dava gosto de se vê. Eram duas maravilhas do mundo. O homem se escorou um pouco em baixo da palmeira, sustentado pela mão direita e a olhar por mais uma vez o carro. Nesse momento, apareceu na varanda a senhora dona Laura, esposa de Orlado e depois de certo tempo a mulher indagou:
--- Que foi que houve? – perguntou a esposa de Orlando.
--- Nada não. É que o carro deu o prego bem na porta de casa. – comentou Orlando ainda um tanto desconfiado com a sorte.
--- Entra. Vamos dormir que teu mal é sono. – argumentou Laura se voltando para entrar na casa.
Nesse instante, com um pano amarrando a chupeta e o resto caindo ao leu, apareceu a filha do casal, a menina Amanda, meio tonta de sono, vestindo um chambre e cabelos desalinhados como se estivesse a dormir até àquela hora. Laura ajeitou a filha nos braços e entrou a seguir. Orlando se desvaneceu da situação e, por sua vez, entrou se despedindo do vaqueiro Jacó. Com um instante surgiu outro homem de tanger boi e falou para Jacó.
--- Tem boi morto pra baixo do rio. – disse o homem a seu Jacó.



terça-feira, 25 de outubro de 2011

ANA LUNA - 26 -

- Regiane Alves -
- 26 -
Via-se na expressão de Luna, desobedecendo a seu próprio pai, a atitude de provocar o Barão de Itabira a tomar uma enérgica decisão para mostrar sua coragem de experimentar a troca de tiros entre ambos. Luna não sabia da destreza do Barão, pois poderia ser bem rápido em comparação a moça. Casso viesse a ser, ela estaria em terrível desvantagem. O seu pai era bastante rápido do sacar, mirar e atirar. Porém, ela não vira de fato o Barão em que condições ele estava. Ouvindo-o desacatar o coronel Ezequiel, o Barão poderia até ser mais rápido. Portanto Luna nem pensou nesse fato. Ela queria desafiá-lo para um duelo, pois assim estaria protegendo o seu próprio pai, episódio que Luna unicamente temia. Ao chamar o Barão por nomes tão desafiantes, a moça deixava o seu algoz em situação envergonhada. Tais palavras, ele jamais ouvira alguém dizer para com ele. Por isso, o Barão tinha que tomar uma decisão.
--- Cabras! Arrastem essa menina do caminho! – vociferou o Barão bastante irritado.
Nesse momento, uma voz a mais foi ouvida. A de Temístocles:
--- Barão! Não creio que o senhor faça uma coisa dessas, pois alguém morre primeiro. – falou Téo.
Temístocles pulou ao lado de Luna e o Barão, de imediato, retrocedeu fazendo com a mão abaixada que os dois capangas podiam parar um pouco.
--- Quem é você fedelho? – perguntou o Barão com mais raiva então.
--- Amigo de Luna, se quer saber! – falou alto Téo.
--- Esperem vocês. Deixa comigo. Enfrento o Barão! – falou o coronel com pavor de ver dois garotos em sua defesa.
--- Assim é que gosto de ver! – comentou o Barão entusiasmado.
--- Espere meu pai. Ainda tenho o que falar. Foi o Barão quem matou sua mulher. Esganou a coitada, cuspiu na cara dela e enterrou no próprio quarto em que dormia. Agora é a vez dele se defender. - falou Luna procurando uma brecha para fazer o Barão se enervar.
--- Desgraçada! Quem lhe falou tal coisa? – gritou enervado o Barão e empinou seu cavalo, com as patas dianteiras, puxou o revolver para atirar no momento em que Luna puxou seu 45 e atirou primeiro no homem atingindo mortalmente no peito.
Então se ouviu um segundo tiro. Téo disparou seu revolver contra um dos capangas que ameaçava atirar. E um terceiro. Guacira alvejou o terceiro capanga mortalmente. Foi tudo tão rápido que nem sequer se percebeu quem teria atirado primeiro. O coronel desceu do palanque e quis tomara arma da mão de Luna. A moça, de repente, olhou o Barão e gritou:
--- Cuidado meu pai! – e lhe deu um empurrão ao mesmo instante em que atirava em seu rival.
Foi então que o Barão sucumbiu. Não deu tempo a coisa alguma. O Monsenhor Bento que estava no coreto rezava para o Céu pedindo clemência a Deus. Pedia ao Senhor clemência por aquelas mortes. Homens que bem podiam viver em paz. O rezava o Monsenhor contrito. E pedia a Nosso Senhor clemência por aquelas almas. O pessoal que estava no coreto ficou de boca aberta com a precisão de Luna ao certar bem no peito o Barão de Itabira. Todos falavam a um só momento. O major Pontes de Mesquita era o mais vibrante com a atitude da moça:
--- Nunca vi uma coisa dessas! – dizia o major com euforia.
--- Imagine lá na fazenda! – replicava o capitão Zenóbio.
--- Ela é terrível! – dizia o Delegado Euclides.
--- Tem a quem puxar! – dizia Zenon.
A moça estava cercada nesse instante pelo pai, por Guacira e o seu marido Intendente Sebastião Sabugo, o rapaz Temístocles que ajudava a trazer para o Coreto enquanto que outras pessoas presentes vibravam com a morte do Barão de Itabira. O coronel Ezequiel perguntou a Luna que história era aquela da morte da esposa do Barão. Luna respondeu que ouvira de sua mãe há muito tempo.
--- Mas é verdade mesmo? – perguntou Guacira.
--- Você viu como ele reagiu? – indagou Luna ainda tremendo de medo por que passara.
--- É verdade, sim. – respondeu o coronel muito angustiado por causa da filha Luna.
A mulher do coronel, Maria Rosa, veio depressa para junto de Luna para lhe confortar. O mesmo ocorreu com as suas três irmãs, Vera, Olga e Eunice. Cada qual queria fazer o de melhor para Luna que se sentia sufocada por tantos abraços e carinhos. O Delegado Euclides ordenou que se levassem os cadáveres para o necrotério da Delegacia enquanto que o Intendente Sebastião Sabugo, já perto de sua mulher Guacira advertia que era preciso conversar sobre o necrotério com urgência. A Praça do Coreto ainda estava vazia de gente temerosa com o que viu ocorrer em poucos instantes. Lentamente o pessoal foi se acercado do local do crime para verde perto o Barão de Itabira, homem que era uma verdadeira lenda para os munícipes, pois não se via o Barão há muitos anos a passear pela Vila. Ele era uma verdadeira lenda. Todos falavam no Barão de Itabira. Porém ninguém costumava vê-lo nem por um instante. Alguém falou no caso da Baronesa que morreu misteriosamente. Mesmo assim, só se ouvia falar que o Barão tinha trucidado a esposa. Coisa que não se provava com consistência. Então, o delegado do novo município já estava com um mistério para desvendar, falou alguém do meio do pessoal assustado. Foi então que naquela hora o coronel Ezequiel Torres se assentou da poeira e disse sem mais conversa.
--- O Município Riacho das Pedras está inaugurado. Acabou a sessão. – falou com destemor o coronel aos presentes.
O povo ficou na praça vendo a remoção dos cadáveres dos mortos, a ação do Monsenhor Bento em encomendar os corpos e o delegado Euclides Castanheira seguir para a delegacia policial onde faria o documento da ocorrência. O Intendente Sebastião Sabugo foi até a sede de a Municipalidade fazer o relatório do ocorrido em companhia o Coronel Ezequiel que não deixava a sua filha Luna, a sua mulher Rosa que não se apartava da filha, as outras filhas do coronel, o Major Pontes, o capitão Zenóbio e todos os componentes do secretariado para que pudessem tomar posse nas suas pastas. O Monsenhor Bento, depois de algum tempo, também chegou à sede do Município. O até terminou por volta de 1 hora da tarde quando as damas pegaram as suas Liteiras para evitar sujar seus vestidos e por outras razões. Apenas Luna pegou o seu cavalo Branco, pois era assim que ela chamava o corcel e acompanhada do rapaz Temístocles a quem chamava de Téo rumou direto para a sua fazenda. Guacira vinha logo atrás com ordens de suspender o cerco em torno à fazenda, pois com a morte do Barão de Itabira não restava mais míngüem que mandasse ou desmandasse para fazer um novo atentado. A casa do Barão ficara sem proteção alguma. Os vaqueiros deviam debandar o feitor, desse nem se sabia ao certo e os negros escravos deveriam ter a sua liberdade prematura.
Na sala de visitas, encontraram-se os que estavam chegando, inclusive o feitor Rafael Zenon. Todos estavam ligeiramente compadecidos por tudo o que houvera. A moça Luna, num instante, sentada em uma poltrona, encostou sua cabeça no ombro de Temístocles e começou a chorar. Um choro triste e sem consolo. Lágrimas puras caíram dos seus mimosos olhos e ela não se conteve em abraçar o rapaz que lhe fazia carinhoso afeto sem dizer palavras. Rosa, a mãe de Luna também se ajoelhou aos pés da filha para poder lhe consolar. As irmãs ficaram ali como se pudesse fazem algo para consolar a irmã. Porém, Luna somente fazia chorar copiosa ao ombro de Temístocles como quem estivesse algo de proteção.
--- Por que Téo? Por quê? – foi o que se ouviu de Luna querendo ter um amargo carinho de quem pudesse dar.
--- Sossegue Luna. Sossegue. O que está feito, está feito! – disse o rapaz.
Ouviu-se um ruído que tomou forma maior. Um ruído ensurdecedor de homens eufóricos a cavalo que chegavam a Casa Grande vindos da cidade. Eram o coronel Ezequiel e os seus companheiros que chegavam para fazer a festa de emancipação do Município no cercado da residência. As três moças correram para fora e receber os novos mandatários do Município de Riacho das Pedras. Em canto, Luna ficou calada sempre ao ombro do seu amigo ao pedir um pouco de carinho. A sua mãe deitou a cabeça em suas pernas, pois era tudo que podia fazer.
No pátio interno da Fazenda Maxixe o sanfoneiro Felix com a sua concertina animava a festa para toda a freguesia que, animada, dançava, pulava, gritava e de todo modo festejava a inauguração do novo município. Eram as pessoas da Fazenda e de outras fazendas próximas ou afastadas, como a Fazenda “Lavrador”, do Major Pontes de Mesquita e a Fazenda “Arroio do Boi”, do capitão Zenóbio Manso e de outras fazendas mais distantes. Foi festança que durou não menos de três dias com o pessoal regozijado com a glória de emancipação ditada pelo Coronel Ezequiel Torres. Nesse instante de bravura o rapaz Temístocles teve a ação de pedir em casamento a moça Ana Luna, pois eles já estavam de namoro. O coronel Ezequiel, logo assumiu o desejo do rapaz tendo em vista que ele salvou da morte a sua filha e esta foi quem salvou o coronel Ezequiel no ato da extremada confusão imperante em praça pública.
Então, passados os meses, houve o proclama do feliz casamento entre os dois pombinhos: Ana Luna e Temístocles Mangabeira, pois esse era o seu nome completo. Eles foram morar na nova cidade e, com o tempo, Temístocles se tornou Intendente e Sebastião Sabugo foi ser Deputado. Sua esposa era assessora de deputado do seu marido. O Coronel Ezequiel continuou zelando pelo município de Riacho das Pedras até tempos infindos. Os de Nicácio Pereira fizeram as pazes com o coronel e não mais abriram confusão na cidade. Na administração de Temístocles Mangabeira aumentou-se o calçamento da cidade e se fez ampliação das luminárias a óleo e o esgotamento das partes mais sacrificadas pela chuva. Deu-se educação, saúde, cultura entre outros benefícios para a população carente. O Município tornou em um polo exportador de carne bovina, ovina e caprina para locais menos providos de tais alimentos.
--- Parece que estamos acertando, Luna! – disse certa vez Temístocles.
--- Parece, não! Estamos acertando! – respondeu Luna entusiasmada na sede da Prefeitura.


FIM


segunda-feira, 24 de outubro de 2011

ANA LUNA - 25 -

- Ava Gardner -
- 25 -
Quando Temístocles e Luna chegaram a Casa Grade da Fazenda toparam com um punhado de gente guarnecendo ampla extensão de terras. Gente armada de toda sorte de fuzis, pistolas, punhais e o que permitisse se defender ou matar. Era um verdadeiro campo de guerra a Fazenda Maxixe, coisa que nunca tinha visto em sua vida apesar de saber que todos os donos de terra teriam meios para fazer igual ou mais resistente. O sertão bravio do Nordeste brasileiro, naqueles tempos, tinha igual capacidade de enfrentar a morte quer na seca quer no inverno. Era o destemor do homem pela vida amarga que ele vivia. Dura era essa vida na área pobre do sertão. A cultura existente era distinta e única. O vaqueiro enfrentava a vegetação rasteira e espinhosa. Roupa de couro para andar no mato era a característica do vaqueiro. Calças, gibão de couro, jaquetas com mangas alongadas era o feitio do vaqueiro ou do jagunço e mesmo do capitão-do-mato o caçador de escravos fugidos. E na Casa Grande de Luna a característica era pior. Quando os dois atiradores se aproximaram ouviram apenas um grito:
--- ALTO!!! QUEM VEM LÁ? – perguntou a voz de quem não se podia ver.
Sabendo que ficar calada era sinal de morte, Luna respondeu descobrindo o chapéu que lhe cobria o rosto moreno tangido pelo sol.
Então um jagunço se aproximou por trás e conferiu o que a moça dissera. Ela falou a verdade. Mas o jagunço desconfiou do homem que estava com a moça, pois não o conhecia. Então Luna falou que o rapaz era amigo da moça. Eles estavam chegando da Fazenda Arroio do Boi. Mesmo desconfiado o bugre perguntou a alguém que estava por perto:
--- É verdade. Deixe passar. – disse uma voz de mulher.
Então Luna obteve permissão de passar adiante com o seu companheiro Temístocles que ela acostumou chamar apenas de Téo, pois o nome completo era muito complicado para se chamar. Foi isso que Luna falou a mulher que atendera ao seu chamado. A mulher vira então que na verdade era Luna e perguntou quem era o rapaz. Foi assim que Luna falou em Téo. A mulher que Luna falou era Guacira. Toda encapuzada, não havia quem dissesse ser na verdade Guacira. Tudo reparado ao entrar pela cancela da fazenda, Luna disse a Guacira, ao andar para a casa, que o combate se deu satisfatório e ela chegara um pouco mais cedo. Pelo tempo que se aventava, eram para mais das 9 horas da noite. Luna não sabia a que horas estaria vindo para sua casa o seu pai, conforme disse a Guacira.
--- Talvez deixe para vir amanhã. Hoje é muito difícil. Pode ter capitão-do-mato no meio do caminho e ele é muito precavido com isso. – falou Luna temerosa.
--- Também acho. Me conta como foi a encrenca por lá. – falou Guacira risonha da vida.
--- Normal. Eles ficaram bebendo na Casa Grande após a luta. Eu penso que matamos todos os bugres. Não foi Téo? – perguntou Luna ao seu companheiro.
--- Todos menos um. Eles eram todos do Barão. Tenho a impressão que o rapaz da mensagem não deu tempo a chegar da Fazenda dos Pereira. – respondeu Téo.
--- Deve ter sido isso. – respondeu Luna inquieta.
--- E Téo de onde você conhece? – perguntou Guacira, temerosa.
--- Ele é o capataz da fazenda do capitão Zenóbio. Foi ele quem me ajudou no tiroteio. Ele é bom de verdade. Muito bom mesmo. – respondeu Luna, orgulhosa do rapaz.
--- Que nada. É conversa dela. –sorrio o rapaz Téo querendo não se expor.
--- Ora não foi! Quer me desmentir? Ele acerta sem olhar, Guacira. – comentou Luna satisfeita.
E a conversa prosseguiu até que os três chegaram a Casa Grande e Luna chamou por Rosa, sua mãe procurando saber se tinha café feito, pois teria que dar como presente e recompensa ao jovem Téo. E conversaram eles três até altas horas da noite relembrando quando então foram dormir. Guacira teve que ir às trincheiras a recomendar ao seu sucessor que não dormisse no ponto. Queria todo que estivessem em ordem até o amanhecer. O Delegado Euclides Castanheira ficou acordado por toda a noite. Antes, porém ele foi notificado por Guacira que a guerra havia terminado a favor do coronel Ezequiel. Com isso O Delegado ficou tranqüilo. Porém sabia que se havia de redobrar a vigilância por toda a madrugada, pois o Barão de Itabira não deixaria a derrota sem marca.
Quando chegou as 7 horas da manhã, o grupo do coronel Ezequiel retornou à Fazenda tendo a frente o coronel seguido do Intendente Sebastião Sabugo e do feitor Rafael Zenon. Ao entrar no terreno da fazenda ele gritou com entusiasmo;
--- Viva os vaqueiros que lutaram nessa guerra! – gritou o coronel Ezequiel cheio de empáfia.
---- Viva!!! – gritaram os vaqueiros cheios de orgulho.
Daí em diante os vaqueiros tomaram o seu destino, cada qual procurando sua família ou mesmo um canto para repousar do cansaço da luta renhida. Na varanda da Casa Grande, estavam os dois garotos da luta: Luna e Temístocles. Logo depois podia se notar Guacira, o Delegado Euclides e a esposa do coronel, Maria Rosa e o seu filho menor, Euclides Luna e as três filhas do coronel Vera, Olga e Eunice Luna cheias de contentamento pela vitória do coronel Torres. Todos eles entraram na Casa Grande, uns abraçados aos outros e todos sorrindo a grande monta. Eles cantaram e dançaram ao som da concertina do velho Felix que não saia de perto da fuzarca.
No domingo seguinte, quando ainda era prudente se conservar os capangas em torno do cercado feito para proteger o ambiente da Casa Grande, a festa continuou na praça da matriz onde o Monsenhor Bento celebrou a missa para todos os presentes. Na rua, as liteiras que conduziam as senhoras damas e suas filhas se apinhavam em frente à matriz e ao coreto. A rua principal era toda calçada com lajes de pedras e arborizada com os pés de acácia. Os lampiões só eram acesos por dois lampioneiros quando era à noite. Após a Missa, foi feita a emancipação política da Vila que tornava Município. O seu Intendente continuava a ser o Doutor Sebastião Sabugo tendo como homem forte o Coronel Ezequiel Luna Pontes. Vários discursos foram feitos pelo Major Pontes de Mesquita, o capitão Zenóbio Manso, e o coronel Ezequiel Luna Torres. Quando estava discursando o coronel no coreto da praça publica perante toda a gente da vila, então Município Riacho das Pedras, gente vinda do interior mais distante para a nova cidade e ver suas bandeiras ornamentadas, inclusive a bandeira municipal eis que surge no meio da multidão a figura do Barão de Itabira. Ele era um homem agigantado, corpulento, vestindo roupas finas feitas para uma ocasião nobre. Ao seu lado, apenas dois vaqueiros. Ele, armado com trabuco. De cima de seu cavalo o Barão então falou:
--- A conversa é apenas com nós, coronel. Apenas com nós. – falou o Barão de forma arrogante.
A filha Luna olhou para o seu pai Ezequiel e notou que ele não trazia revolver. Estava desarmado. Porém, deu espaço ao tempo.
--- Que é que o senhor quer Barão? – indagou com altivez o coronel.
--- Arme-se e vamos duelar. Apenas nós dois. – respondeu o Barão de forma rude.
Nesse momento Luna pulou a frente do coronel Ezequiel e entre o Barão de Itabira e o convidou para duelar com ela, pois a moça queria duelar com o Barão.
--- Saia da frente moleca! Não sei quem você é! E não duelo como moleca! – respondeu o Barão.
--- Eu não sou moleca como o senhor pensa. Sou Luna! Ana Luna! – respondeu a garota de forma atrevida.
--- Saia da frente menina. Deixe que eu me ajuste com o Barão! – reclamou Ezequiel zangado.
--- Não, pai. Quero ver se ele tem coragem de duelar comigo! – disse Luna sem se virar com olhos tesos no Barão.
--- Caia fora garota. Aqui é luta do homem grande! – vociferou o Barão com raiva.
--- Saia do meio menina! - gritou o seu pai desaforado.
--- Não saiu. Quero ver se ele é homem agora. Se não tem capanga para lutar! Se não é frouxo! Covarde! Canalha! Puxe a arma Covarde! Puxe a arma! Ninguém se meta! – bradou Luna.
O Barão já estava impaciente por conta da desaforada garota. Espécie atrevida e com certeza, molenga como qualquer uma que aparecesse por ali. O povo que estava na Praça da Matriz saiu em debandada procurando um lugar para se esconder. Até mesmo um grupo formado por gente de outro Município próximo, que organizava uma banda de musica, caiu fora apavorado temendo o acontecimento vital.
--- Puxe a arma. Corno! Puxe! Covarde! Ladrão! – pronunciou Luna de olhos firmes chispantes e mão na cintura coçando o cabo de seu revolver 45 todo prateado, cabo de madrepérola, presente que o pai lhe dera.

domingo, 23 de outubro de 2011

ANA LUNA - 24 -

- Angelina Jolie -
- 24 -
O Coronel Ezequiel ficou então mais brabo que uma fera pela primeira vez enjaulada e quase não podia responder às perguntas de Zenon. Enfiou-se no gabinete e disse manso como uma ovelha como se nada tivesse acontecido. Falou o mais tranqüilo que podia ser. Apenas, isso na pura aparência, pois em seguida bradou igual uma onça. Vibrou sobre o birô e exigiu rapidez no que dizia, pois enfim a causa era de tamanha importância e o coronel queria rapidez no que havia dito.
--- Atiradores e dos bons. Quero juntos 150 homens. Entendeu? – falou bem alto e com muita raiva o coronel Ezequiel.
--- Sim senhor. Num instante. – respondeu Zenon como quem faz com medo.
Enquanto os atiradores – jagunços na sua maior parte – se reuniam para obedecer a extrema ordem do coronel esse ficou a conversar com Sabugo e o Delegado de forma atenta as respostas que ouvia de ambas as partes. Uma coisa era certa: a festa do próximo domingo estava cancelada. Disso o coronel nem queria mais saber. Era a vez de saber como se faria então na completa proteção do capitão Zenóbio Manso. O caso foi o seguinte. O capitão Zenóbio enviou carta para o delegado Euclides pedindo que ele fosse até a fazenda do coronel Ezequiel. Em lá chegando dissesse ao coronel que ele - o capitão – havia interceptado uma mensagem do Barão de Itabira para o fazendeiro Nicácio Pereira onde dizia que estava pronto para invadir a fazenda do capitão Zenóbio Manso do dia seguinte que era então aquele dia. A carta de aviso caiu do bolso do jagunço que a levava e, por tanto, era a vez de se arranjar defesa para enfrentar os jagunços do Barão e dos Pereira, pois na certa eles invadiriam logo depois a fazenda Maxixe, do coronel Ezequiel por conta da festa que estava programada para ocorrer no domingo, véspera de São João, padroeiro da vila que tornaria município de vez. Se o jagunço não entregasse a carta, não restavam duvidas que parte do pessoal se encontrava pronto para seguir de qualquer jeito. Dessa forma, o pessoal do Barão. O caso era proteger a terra do capitão Zenóbio que ficava próximo da fazenda do coronel e mais distante da fazenda Lavrador do Major Pontes de Mesquita. Por outro lado, o coronel teria que proteger a sua propriedade pondo homens armados e adestrados em torno de ampla margem do cercado.
Quando os jagunços do coronel estavam prontos para matar ou morrer, outro mensageiro do capitão chegou à fazenda do coronel pedindo socorro, pois toda a tropa do capitão estava sob fogo cerrado por um grupo armado de vários jagunços. Ele não sabia dizer de quem eram os atiradores. O grupo armado do Coronel Ezequiel Torres partiu em debandada sob ordens do coronel que seguia em frente e do Intendente Sebastião Sabugo com apoio do feitor Rafael Zenon. Ficaram para trás a mulher de Sabugo, dona Guacira, acostumada em se envolver em confusão armada, aguardando novas ordens e o Delegado Euclides Castanheira protegendo o cercado da fazenda Maxixe. Em contrapartida, Ana Luna seguiu por fora acompanhando de longe a tropa do coronel Ezequiel sem que ele suspeitasse. Esse era o primeiro combate de verdade em que se metia Ana Luna e ela não queria perder em nada nem por um instante sequer. Por isso, a moça preferiu distanciar para não ser repreendia pelo Coronel seu pai. Quando a tropa de 150 homens, sob o comando do feitor Rafael Zenon divisou a fazenda somente se ouvia o tiroteio travado entre os dois grupos. Nesse momento. O coronel Ezequiel ordenou que se seguisse pela parte de traz dos jagunços atacantes, pois dali se fazia melhor ângulo de tiro. E foi feito assim. Entrincheirados entre montes e troncos de pau, os jagunços do coronel abriram fogo contra a turma de atacantes. Foi fogo cerrado e a turma teve que se virar para outro lado e fazer fogo contra os rivais que acabavam de chegar. O pior era que não podiam os jagunços sair do local, pois seriam atacados pelas costas ou pela frente. A guerra era continua entre os grupos rivais. Foi nesse instante que apareceu uma amazona fazendo fogo contra os jagunços que tomaram o sitio do capitão. A moça corria desesperada, virando-se para trás, atirando mortalmente nos jagunços que estavam entrincheirados em um barranco onde nem mesmo o coronel Ezequiel podia alcançá-los. Foi uma refrega terrível aquela. Tiros e mais tiros desfechava Ana Luna contra os sequazes que foram tomados de surpresa com a ação da amazona. Em seguida, surgiu um outro rapaz bem moço, atirando sem parar fazendo com que os invasores se surpreendessem de monta. O coronel Ezequiel, cruelmente surpreso e desapontado, perguntou no meio do tiroteio:
--- Quem diabo é essa moça? – perguntou Ezequiel amedrontado em atingi-la com um tiro.
--- É sua filha, coronel. – respondeu Sebastião Sabugo, sorrindo.
--- Eu sei! Ora! Quer dizer a mim? – falou desesperado o coronel.
E Sabugo começou a sorrir em meio de aquele intenso tiroteio. O coronel não respondeu mais fazendo apenas:
--- Porras! – fez o coronel com raiva e precaução.
Quando atingiu o alto de um lajedo, Ana Luna viu logo de perto sob a luz do entardecer todos os jagunços. Ela então abriu fogo contra eles disparado doze tiros de rifle acertando em cada um mortalmente. Abaixou-se então para recarregara arma enquanto no outro extremo um rapaz fazia fogo de uma pequena distancia, contra os invasores. O coronel ordenou toque de avançar e pegou de surpresa o restante do bando que logo se entregou, pois não havia como revidar ao ataque. O coronel Ezequiel, sufocado pelo terror da morte perguntou aos jagunços:
--- De onde vocês são? – perguntou o coronel extenuado.
--- Da terra do Barão de Itabira, senhor. – confessou um dos jagunços.
--- E o resto dos que estão mortos? – indagou o coronel.
--- Também. Todos de lá. – respondeu o jagunço.
Nesse ponto já estavam juntos a moça Ana Luna, o rapaz Temístocles que ela não o reconhecera, o Intendente Sabugo, o feitor Zenon e o capitão Zenóbio. Foi então que o coronel ordenou com extremada violência.
--- Matem todos e deixe um para ir contar ao Barão de Itabira o que resultou do morticínio. – disse o coronel se afastando então em companhia de Zenóbio, Sabugo e vindo atrás a sua filha Luna.
No morticínio participaram os feitores Zenon, que escolheu o que tinha de escapar com vida, o feitor Temístocles e um bando de jagunços sanguinários do coronel Ezequiel e do capitão Zenóbio, homens destemidos para matar.
Ao chegar na Casa Grande do capitão Zenóbio, todos os presentes contavam eufóricos a valentia dos seus homens. No entanto, se esqueceu de falar em Luna, a jovem moça que decidiu a peleja com seu rifle de doze tiros. Também não se falou no destemor de Temístocles, que igualmente com Luna resolveu o impasse que estava correndo. Foi então que Luna se apresentou ao pai pedindo permissão para ir embora. Em tal momento, todos da casa olharam confusos para a moça, pois até aquele momento não se ouvira falar em Ana Luna. Então foi quando o coronel teve um estalo de memória e disse:
--- Essa é minha filha. E se não fosse a sua ação de destemor nós ainda estaríamos brigando ou talvez mortos. Ela é Ana Luma! – bradou o coronel Ezequiel Luna Torres.
E os presentes na sala contemplaram pela primeira vez a face de Ana Luna, a moça que em meio ao tiroteio enfrentou aos jagunços invasores. Foi ela e Temístocles quem decidiram à questão pondo fim a escaramuça que estava se prolongando há muitas horas. Então todos os presentes gritaram:
--- Viva Luna! Viva Luna! Viva Luna! – gritavam os presentes na euforia da vitoria.
Ela agradeceu a todo e quando já estava a partir, eis que chegou o feitor Temístocles, dando conta do que se fez e perguntou ao capitão Zenóbio onde enterraria os mortos. O capitão, eufórico, apenas disse ao rapaz:
--- Manda a cambada enterrar no riacho. Sacode lá. É gente que não serve pra nada. – comentou o capitão já entupido de cachaça que acabara de beber.
Luna olhou para o jovem Temístocles e voltou a pedir desculpas pelo que aconteceu naqueles dias. O rapaz disse o que já havia dito e tudo estava resolvido. Apenas ele disse que Luna cavalgava muito bem e que sabia atirar com precisão. E perguntou:
--- Quem te ensinou a atirar? – perguntou Temístocles.
--- O mundo. – respondeu a moça meio entristecia por conta das mortes que fizera.
--- O mundo? – indagou assustado o rapaz.
--- É. O mundo. Quer me acompanhar até o meu sitio? – perguntou Luna.
O rapaz olhou para o capitão e obteve permissão. Do mesmo jeito obteve do coronel, pai de Luna. Então, os dois saíram a cavalgar pela estrada a fora.

sábado, 22 de outubro de 2011

ANA LUNA - 23 -

- Judy Garland -
- 23 -
Após amplas risadas da moça Luna, ela voltou se comportar como devia estar. O nome Temístocles pode soar estranho para a mocinha, pois na época nomes eram coisas muito raras. Ao terminar de sorrir, ela voltou a perguntar ao gracioso rapaz que já fazia tanta corte como no início. Tendo dito o seu nome, o rapaz tratou de por seu cavalo em marcha, pois estava desiludido com tão jovem e esbelta criatura. Sequer quis saber do seu nome e açoitou a sua montaria. Vendo que o rapaz estava indo embora, Ana Luna se apressou em chamar para pedir desculpas, coisa rara nos seus tempos de mocinha. Temístocles aceitou o pedido feito e reclamou de como foi tratado pela moça. Afinal, Temístocles era um nome como outro qualquer.
--- Mas é porque é um nome tão estranho. Desculpe-me. – voltou a dizer Luna constrangida.
--- Está bem. Não se fala mais nisso. Pode até me chamar de outro nome qualquer. – respondeu o jovem mancebo.
--- Você não fica raiva porque eu sorri de você? – falou Luna ainda forçada.
--- Já te disse que não se fala mais em meu nome. – voltou o rapaz a dizer.
--- Meu nome é Luna. – disse a jovem moça.
--- Luna não é nome. É sobrenome. Qual o seu primeiro nome? – perguntou o rapaz reatando a amizade por um tempo rompida.
--- Na verdade é Ana. De fato. Luna é sobrenome, ou seja, lá o que for. – reclamou a moça.
--- Com certeza você é da família do coronel Ezequiel Luna. – respondeu o rapaz.
--- Sou filha dele. – proferiu a moça.
--- Ah bom. Nesse caso tenho que ir embora. Falar com você é morte certa! – contestou o rapaz.
---Espere. Não faça isso. Não posso nem conversar com você? – perguntou Luna.
--- Pode. Mas eu temo em perder a vida. – contrapôs Temístocles.
--- Chato. Você é chato mesmo. Se não quer falar, pode ir à frente. Não me importo por isso. – reclamou Luna contrariada.
--- Sei de um homem que perdeu a vida por sua causa. – orientou Temístocles.
--- Sabe que você é burro? Você não sabe de nada. Burro! – gritou a moça para o rapaz.
E Ana Luna montou em Branco, o seu cavalo, açoitou o animal, fez finca pé e passou a frente de Temístocles em carreira disparada. O rapaz não ligou para o ato da moça e seguiu vagaroso apenas a pensar.
Com pouco tempo Temístocles chegou à vila que estava toda embandeirada por todos os pontos. A luz era de candeeiro pregado nos postes encurvados para baixo no seu ponto alto. Ainda era cedo da manhã, por isso os empregados da vila não tinham acendido as lâmpadas, coisa que só aconteceria a noite, depois das seis horas. Na vila um cardume de gente festejava a cerimônia que estava para acontecer dentro de mais alguns dias. A chegar a Vila, o rapaz notou apeado o cavalo de Luna na trave de pau da municipalidade. Era o canto reservado para se amarrar cavalos e jegues. Ele passou e foi até a delegacia de polícia para entregar o recado do capitão Zenóbio Manso. Era um papel dobrado e ele tinha instruções de não abrir o envelope. Ao chegar à delegacia topou de cara com o Intendente da Vila e não disse nada a não ser os cumprimentos de quem chega.
--- Bom dia, senhor. O delegado está? – perguntou Temístocles ao Intendente Sabugo.
--- Parece que está. De que se trata? – perguntou o Intendente Sabugo desconfiado.
--- Um recado para ele. E só ele pode ler. – respondeu Temístocles de forma abusada.
--- Então espere. Ele já vem. – definiu o Intendente Sabugo de modo curioso.
Então o rapaz puxou uma cadeira e nela sentou a espera do tal delegado que se chamava Euclides Castanheira, homem que o rapaz desconhecia por completo. O Intendente Sebastião Sabugo se ausentou, entrando para a Delegacia como se fosse chamar alguém. Nesse ínterim apareceu a porta da rua a jovem Luna com um ar como se fosse de desespero. E logo perguntou a Temístocles.
--- O delegado está? – perguntou Luna não reconhecendo Temístocles.
--- Estou esperando por ele. – respondeu Temístocles tranquilamente.
--- Você é aquele que esbarrei no caminho? – perguntou Luna arrebitada.
--- Sou é mesmo, dona Luna. – disse Temístocles sem reclamar.
--- Ah sei. Aqui já prestou. Tem toda sorte de gente. – reclamou Luna de modo atrevido.
--- É uma pura verdade. Estou com a senhora. – respondeu Temístocles de forma alegre.
--- Pois volto mais tarde. – disse Luna, dando as costas como quem sairia.
--- Espere um pouco. Ele não demora. Sinhá chata! – respondeu o rapaz em cima do ato.
--- É comigo, é? É comigo, é? Rum. – a moça saiu desesperada com o insulto.
Então, Temístocles caiu na risada no instante em que o delegado Euclides chegava à sala de audiência acompanhado do Intendente Sebastião Sabugo. Logo o homem perguntou o que ele o rapaz queria.
--- Trago mensagem para o senhor de parte do capitão Zenóbio Manso. – declarou Temístocles entregando-lhe o envelope um pouco amassado.
O Delegado abriu o envelope e leu a mensagem chamando para um lado o Intendente Sabugo para que ele pudesse ler também.
--- Está entregue. Diga ao capitão Zenóbio que eu estou ciente. Pode ir. – disse o Delegado.
O rapaz, nesse ponto saiu da Delegacia e os homens que ficaram passaram a conversar em surdina sobre o que deveria ser feito. O documento era seguro nas informações. E nesse momento, entrou depressa no Distrito a filha do coronel Ezequiel a procura do Interventor Doutor Sabugo. Esse, logo se fez presente. Ela falou com o Intendente que seu pai precisava lhe falar.
--- Ótimo. Porque nós estamos indo para a fazenda nesse momento. E se quiser a senhorita pode nos acompanhar. – relatou Sabugo sorridente.
Então os três companheiros seguiram viagem para a Casa Grande sem demora. Em lá chegando o Delegado Euclides Castanheira foi logo dizendo que tinha uma mensagem para que ele tomasse conhecimento.
--- Não quer saber de mensagem alguma! – disse o coronel meio brabo.
--- É importante, coronel. Talvez mais importante do que o senhor quer saber. – relatou o delegado.
O Coronel Ezequiel olhou bem para a cara do delegado. Passou um silencio de alguns segundos e afinal o coronel foi dizendo.
--- Que mensagem é essa. Me diga. Vamos! – resmungou o coronel inquieto.
--- Esta aqui nesse envelope. – e o delegado estirou o envelope para o coronel.
O coronel Ezequiel leu a mensagem, meditou e sacudiu o papel levemente amassado em cima do birô. Perguntou a seguir.
--- Que diabo é isso? Por que você não me disse logo? Me acha com cara de adivinho? – gritou o coronel perdendo as estribeiras.
--- Se eu disse o senhor não teria creditado. Por isso mostrei a carta. – falou o delegado acanhado.
--- Que está esperando? Pegue os homens. Cinqüenta cem ou mais! – gritou o coronel.
--- Se senhor. Mande Zenon, que é quem pode conhecer o pessoal. – disse o delegado.
--- Isso é uma merda. Zenooooon! – gritou o coronel saindo do seu assento e indo para a porta do escritório.
Em instante o feitor chegou ao escritório perguntando que estava havendo para tanto grito.
--- Não está havendo nada. Mas vai haver. Reúna 150 homens. Imediato! - gritou o coronel.
--- Sim senhor. Mas pra que? – respondeu o feitor.-