domingo, 16 de outubro de 2011

ANA LUNA - 17 -

- Jean-Paul Laurens -
(O Papa Formoso)
- Seu corpo foi exumado para ser julgado e condenado com as suas insígnias -
- 17 -


Tão logo o coronel Ezequiel Torres saiu do escritório, Martinez foi até a varanda para convidar cabo Moisés a entrar e começar a conversa em segredo que o ex-soldado dissera que tinha para contar. Apesar de está suje e magro Moisés não era tão velho como fazia crer. O capitão tinha seus 50 anos. Moisés era um pouco mais velho que ele. Nunca lera nem sabia escrever tão certo. Tudo o que sabia era assinar o seu nome com letras descompassadas. Não raro ele dizia não saber assinar o nome e colocava o próprio polegar como assinatura. Ele era um homem do campo, plantava feijão, milho e mandioca como ninguém no mundo. Podia dizer o que a terra produzia, mas não sabia nem mesmo ler. Carregar uma pistola, um fuzil, um rifle e até mesmo uma metralhadora, isso ele fazia como ninguém. No esquadrão onde ele ficou a prestar serviços era até chamado de armeiro pelos colegas de farda pelo jeito com que manejava armas. Porém, isso de nada lhe significava. Ele costumava dizer que era um soldado e por isso carregava arma ou mesmo consertava armamento. Outra coisa ele não pretendia ser. Moisés era uma pessoa tapada, burra por assim dizer. Todavia, quando era para falar, ele falava. Decorou uma Bíblia do principio ao fim e não sabia fazer um “O” com uma quenga. Era assim Moisés. Cuidava de gado, criava porcos e outros animais. Ele era pau para toda obra. Contudo, ler, ele não sabia. Mesmo assim, Moisés era prosaico com todas as pessoas com quem falava.

No dia em que chegou ao Rancho Maxixe Moises estava ofegante de tanto andar e quase correr, pois não era costume mais na idade de 52 anos de caminhar correndo ou mesmo às pressas. Porém naquele dia ele fez o possível para andar mais do que de costume. Com sua forma de “S”, da cabeça aos pés, de tanto trabalhar na roça, Moisés deixou de ser empertigado para ser um verdadeiro “S” na forma e no efeito. Quando o capitão Martinez voltou para lhe chamar para o escritório, Moises estava sentado no chão, com uma perna encolhida fazendo do joelho uma escora para as suas mãos e a outra perna estirada no assoalho do alpendre. Ele, ao ver o capitão se levantou e de pronto disse:

--- Pronto, meu capitão. – falou Moises com seu jeito meio acanhado de falar.

--- Vamos entrar. Pois não. – respondeu Martinez ao cabo Moises.

E os dois entraram no escritório do coronel com Martinez trancando a porta com chave para deixar a vontade o cabo velho. Quando eles já estavam sentados em poltronas confortáveis Moisés estirou-se como pode ao sentir a maciez do tecido daquele assento. Só após alguns instantes de prazer e satisfação é que ele começou a falar.

--- Capitão! É o seguinte: o senhor é um homem marcado para morrer. – relatou Moisés com temor.

--- Ora deixa disse, Todos nós estamos marcados para morrer. – frisou Martinez.

--- Não! Mas é verdade! Eu corri não sei quantas léguas para avisar ao senhor. – falou o homem quase engasgado.

E relatou que ele estava numa bodega quando entrou um sujeito de rosto feio e uma cicatriz na face para conversar com outro homem da fazenda do Barão de Itabira. Ele se fez de dormindo para poder ouvir a conversa. Ao final o homem pagou em dinheiro para ele vir até a Fazenda Maxixe liquidar o capitão Martinez que se encontrava escondido naquele local há uns dias. Quando o homem do Barão falou em Maxixe, ele decorou o nome e partiu para avisar ao capitão Martinez de que havia um homem com uma cicatriz no rosto a espera de matá-lo.

--- Besteira! Tem muita gente nessa mesma intenção. - falou Martinez.

--- Mas é verdade! O caso é serio meu capitão! – relatou com assombro o cabo velho.

Foi aí que uma porta que dava para outro compartimento se abriu e uma moça entrou vagarosa para dizer que esteve ouvindo a conversar. Na verdade, ela notara um homem com uma cicatriz na face quando entrava no estábulo da fazenda o por lá ficou não saindo mais.

--- Não disse Capitão? – perguntou ofegante o cabo velho.

Então o capitão ficou cismado e perguntou quem era a moça que estava a falar naquele momento depois de ouvir a conversa secreta do cabo Moisés.

--- Sou Ana Luna, filha do coronel Ezequiel Luna. – respondeu a moça.

--- Certo. Agora não diga a ninguém que ouviu ou sabe da conversa. Eu vou sair pela porta de entrada do escritório e deixarei o cabo do lado de fora. Silencio, ouviu? – perguntou o capitão Martinez.

--- Pode deixar capitão! – falou Ana Luna com bastante certeza.

Em determinado momento o capitão saiu pela porta principal do escritório levando consigo o cabo Moises. Após sair, agradeceu ao coronel Ezequiel pela cortesia dada aos dois amigos e chamou para um lado os seus companheiros, deixando de lado o cabo velho para se refazer da caminhada. Após alguns instantes, os companheiros estavam reunidos em certo lugar com o capitão dizendo que se esperasse ficar de noite para então os três cercarem o estábulo e deixassem que ele entrasse sozinho no local. O dia estava quase a terminar e toda a turma não tinha muito que esperar. O capitão aproveitou para conversar sobre amenidades, criação de gado e exportação para o mercado português de carne bovina dentre outras coisas que importasse. A conversa prosseguiu até o anoitecer quando o coronel Ezequiel os chamou para o jantar. O capitão aceitou o convite pedindo licença enquanto teria que se banhar. Foi nesse momento que os companheiros do capitão cercaram o estábulo deixando a porta principal aberta para que ele entrasse. Em poucos instantes, o capitão entrou no estábulo topando por querer com um balde que estava no caminho.

--- Merda. Esse pessoal não sabe onde deixar as coisas? – falou o capitão prevenindo aos seus e à Cicatriz que estava entrando para não deixar duvidas ao matador.

Quando acabar ele entrou no estábulo e escolheu um local onde armou com troncos de madeira uma porção que parecia um homem deitado a dormir. Com meia hora Cicatriz levantou devagar e alvejou com três tiros “o homem que dormia” a sono solto. Nesse instante, ao se virar para sair, Cicatriz encontrou um revólver encostado em suas costas. Apavorado então Cicatriz gritou:

--- Você aqui? – falou Cicatriz.

--- Não restam duvidas! – respondeu o capitão com um sorriso na face.

--- Mas atirei em você! – reclamou Cicatriz, amedrontado.

--- Atirou em um troco de madeira! – disse o capitão Martinez com arma apontada para Cicatriz.

Cicatriz a suar pergunta o que o homem tenciona fazer. Nesse instante um tiro se ouve atingindo Cicatriz na cabeça. Um outro quase em cima da hora foi ouvido desferido pelo companheiro Satanás atingindo o homem que caiu de cima de um madeirame gritando um berro mortal. Por fim, um tropel de cavalo quase no mesmo instante levava para longe outro bandoleiro. Um tiro de rifle foi ouvido de um companheiro de Martinez causando a morte do homem que fugia. Tudo se deu em um só instante. Em seguida, entrou no estábulo o coronel perguntando o que tinha havido do seu modo assustado.

--- Nada não. Só uns corpos. – falou Martinez sorridente.

--- Puta merda. Mas você faz isso sem me prevenir? – falou o coronel alarmado.





--- É....É sinal de que devo partir logo cedo. Não posso mais ficar aqui. Esse bandido foi a mando do Barão. Uma vez ele erra. Da outra pode acertar. Tenho que ir embora. – falou o capitão Martinez de forma pensativa.

O Juiz Mardoqueu estava na varanda olhando o que se passara. O feitor Zenon estava perto do coronel. Ele e um bando de capangas. Outros entraram para apanhar o cadáver de Cicatriz. Outros foram buscar os do segundo e terceiro bandoleiros. Alguém dizia se arrepiando todo.

--- Que tiro certeiro de longe. O homem já caiu morto. – disse um capanga alarmado.


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