terça-feira, 27 de novembro de 2012

O FIM DO MUNDO - 23 -

- Isabelle Adjani -
- 23 -
VAQUEIRO
 
O homem cuspiu fumo para um lado, olhou o sol quase a pino, procurou uma estaca. Não a encontrou por perto. E se apoiou na sela de sua montaria. Olhou ele muito bem para a moça e voltou à vista para o rapaz. Enfim, o vaqueiro retirou o chapéu de couro da cabeça e olhou novamente para Vanesca. Ele fez um sorriso como quem não queria fazer, se aprumou na sela e então falou olhando para a sela da montaria de Otto.
Vaqueiro;
--- Meu nome é Chagas. Eu não creio da senhora se lembrar. Eu trabalhei de vaqueiro mais o velho Coronel e depois sai. Coronel Araújo. Homem forte. É isso! – sorriu sem querer o homem e voltou a por seu chapéu na cabeça.
Vanesca:
--- É verdade. Nem faço ideia. Tem muito vaqueiro trabalhando na fazenda. – respondeu sem entusiasmo a jovem moça.
Chagas:
--- Essa égua é vossa, meu senhor? – voltou o vaqueiro a indagar a Otto de sua montaria.
Otto:
--- É sim. A égua. – disse o rapaz de dizer a verdade.
Chagas:
--- Ah bom. E a sela? – indagou sem pressa o vaqueiro cuspindo de lado uma gosma de fumo.
Otto quis olhar para Vanesca, mas não pode porque a moça estava logo atrás do homem. Mesmo assim, ele respondeu:
Otto:
--- Não. A sela não. Eu a pedi por empréstimo a uma mulher. – respondeu o rapaz com precaução.
Chagas:
--- Dona Nina? Eu pergunto por ver a marca na sela abaixo de sua perna. – falou o homem com a suma certeza do que estava a falar.
Otto temeroso de algo errado no seu falar, respondeu o certo.
Otto:
--- Sim. Dona Nina. Eu estava em viagem pelo lugar. A égua servia para puxar carroça. Eu tenho um burro. Um jegue. Esse eu deixei por garantia. Mas a minha família está passando um tempo na casa de dona Nina. Eu me arranjei logo cedo a procura da fazenda do Coronel. – falou sem pressa o rapaz.
Chagas:
--- Ah bom. Tá explicado. Sua família está na casa de dona Nina? – voltou a querer saber o vaqueiro.
Otto:
--- Está. Está. O meu pai, velho doente, minha mãe. E tem também a minha irmã. Tudo lá. – explicou  sem temor Otto ao vaqueiro.
Chagas:
--- Ah bom. Essa sela é caprichosa. Ela é minha. Dona Nina é minha mulher. – falou o vaqueiro a retirar novamente o chapéu talvez para falar o nome da mulher.
Otto:
--- Ah bom. Ela me falou no senhor. Ela falou que o senhor estava tocando umas vacas. E não sabia quando o senhor voltava. Talvez um. Talvez dois dias. Foi isso sim. – falou sem temor o rapaz.
Chagas:
--- É verdade. Ela disse a verdade. Pois bem. O senhor siga pela vereda e logo, logo estará nas terras do Coronel. – relatou o vaqueiro olhando bem a sela para ter certeza do seu falar.
Otto:
--- Pode deixar. A sela eu trago de volta quando vier busca a família. Talvez amanhã. – respondeu sem medo o rapaz.
Chagas:
--- Não quer trocar essa égua? – indagou o vaqueiro com um sorriso malicioso.
Otto:
--- É possível. A gente se acerta. - sorriu o rapaz ao dar partida em sua montaria.
O vaqueiro olhou bem para a égua e disse consigo mesmo sem despertar a curiosidade do seu dono.
Chagas:
--- “Tá amojada”. – refletiu o home com a cara de quem sabia o dito.
E Otto enveredou pela touceira de mata se aguentando como podia e reparando na sua noiva. A moça estava calada por longo tempo. À sombra de um frondoso pé de Turco o rapaz apeou sua água para dar repouso a montaria e mesmo a ele e Vanesca tomarem um pouco de fôlego.  O rapaz teve de olhar como sempre vazia na viagem a bússola para saber do canto certo. Após conferir o instrumento guardou o mesmo na sacola de veludo vermelho e indagou a Vanesca se a moça estaria cansada, pois notou por alguns instantes a jovem se esticar com exemplo de dores lombares.
Otto:
--- Cansada? – indagou o rapaz.
Vanesca:
--- Um pouco. – respondeu a moça se apoiando no Turco.
Otto:
--- Viagem longa. – disse o rapaz a torcer o pescoço.
Vanesca:
--- Sabe aquele homem? Eu o reconheci. Ele matou a mulher. Deu tantas facadas que não se podia contar. Foi uma coisa horrenda. Ele, certa vez, chegou a sua casa e pegou a mulher com outro homem. Disse ele não ter suportado tanto desespero. Partiu para cima e golpeou a mulher por 90 vezes ou bem mais. – falou sem emoção a moça.
Otto:
--- NOSSA! E o homem? – perguntou alarmado o rapaz.
Vanesca:
--- Esse fugiu completamente despido. Nu. Sem um pingo de roupa. E desapareceu no mundo. Não se ouviu mais falar do seu paradeiro. Creio que os amigos de Chagas mataram o coitado. – relatou sem sentimento a moça.
Otto:
--- É provável. Mas e o vaqueiro anda solto? – indagou perplexo o rapaz
Vanesca:
--- Faz tempo isso. Ele foi preso, pegou alguns anos de cadeia. Mas depois, por influencia de políticos, ele foi posto em liberdade. Tudo na vida é assim. A mulher foi quem perdeu a vida. Também. .... – reportou a moça sem medir a culpa de homem.
Otto:
--- E ela tinha filhos? – perguntou assustado o homem.
Vanesca:
--- O povo diz ter ela deixado um filho. Eu mesma não sei. – reportou a moça se espreguiçando.
Otto:
--- Ora que coisa. Esse filho deve estar adulto. Só pode. – refletiu o homem.
Vanesca:
--- Eu não sei. E nem vou saber! – respondeu com certa raiva a moça.
 



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