terça-feira, 11 de janeiro de 2011

AMANTES - 50 -

- Nicole Kidman -
-  50 -

O barulho estrondoso foi de um cilindro de gás postado no interior do terreno do Hospital Pro Matre. O gás vazou de uma forma imperceptível, com seria mesmo e, ao se acender a lâmpada de visibilidade irrompeu um curto circuito com a majestosa explosão do gigantesco cilindro acorrendo para outras dependências do portentoso edifício que abrigava a majestosa casa de saúde da cidade. O impacto da explosão foi tão extremo que, por certo tempo, houve queda de energia em ampla parte do edifício. O pânico gerado com a explosão foi os funcionários e agentes femininas que cuidavam do setor. O caso durou bastante tempo. Os bombeiros que estavam no edifício, procuraram logo combater as chamas enquanto que outros funcionários do Hospital de imediato chamaram a guarda municipal dos Bombeiros o qual chegou de forma incontinente com muita presteza pouco menos de meia hora. Vidros estilhaçados dificultavam os bombeiros de trabalhar com cuidado. Foram três carros de bombeiros a assumir a direção dos trabalhos de forma constante ajudado pelos próprios bombeiros do Hospital. Um cerco se fez na rua impedindo o tráfego de veículos no setor.
A  explosão aconteceu pelo vazamento de gás com a combustão da fagulha elétrica no local de armazenamento de cilindros. Dois operários saíram feridos no acidente e outras pessoas do próprio hospital também se ferira levemente. Os funcionários trabalhavam com nenhuma carga inflamável que pudessem causar a explosão. Apenas a lâmpada que foi ligada provocou a combustão. O corpo de Bombeiro informou que os operários trabalhavam procedimento de rotina quando houve a explosão. O Corpo de Bombeiros tomou imediato providencia para evitar que o fogo se alastrasse. O tráfego na rua em que se situava o Hospital ficou interditado por três horas quando os Bombeiros deram por encerrado os seus trabalhos. Nesse meio tempo, Silas desceu ao andar térreo para ver o ocorrido e tomar algumas informações. Ele sendo uma pessoa ligada a agencia de propaganda era por demais necessários a incumbência de sua participação. A direção do estabelecimento hospitalar lhe forneceu um crachá de identificação e ele pode falar com o comandante do corpo de bombeiros e acompanhar todos os trabalhos efetuados.
Ainda pela manhã da quinta-feira, Silas trocou conversa com Vera Muniz, sua mulher, sobre a situação da empresa, uma vez que não tinha nem a presidente e tampouco a vice-presidente com o desaparecimento de Racilva, morta, conforme atestado médico, ficando os processos sendo todos acumulados a espera de alguma decisão a respeito. A mulher ficou sumamente preocupada com tal situação e declarou que o esposo deveria convocar reunião de todos os diretores para acolher algo a respeito. A Presidência da Agencia Pomar não poderia ficar vaga, mesmo porque se Vera Muniz estava ausente por modo de ter menino, caberia então à vice- presente assumir o lugar, como estava sendo feito há algum tempo. Contudo, o sumiço do corpo de Racilva deixava a empresa sem a vice devendo-se eleger outro para o cargo. Ela, Vera Muniz, pensou bastante no caso e advogou ser o novo presidente interino da Agencia Pomar o seu marido, Silas Albuquerque. Mesmo assim, tal fato deveria ser referendado pela equipe de Diretores o mais urgente possível. Concluído tal acordo o homem deixou a suíte onde Vera estava e seguiu firme para a Agência Pomar onde reuniria com urgência todos os diretores. O caso não demorou tanto tempo e Silas Albuquerque foi eleito o novo presidente da empresa até a volta de sua presidenta que, por motivos de saúde ficaria ausente por três meses, como era o atestado médico. O reaparecimento de Racilva, contudo, se ela de fato não morrera jamais afetaria a eleição do presidente interino. Era tudo uma questão de burocracia. Na verdade, Silas Albuquerque jamais supôs em ser presidente mesmo que fosse interino de uma Agencia como a Agência Pomar de cunho internacional. Daquele momento em diante, para o homem tudo era trabalho. Esquecera até mesmo das jangadas e atrelou-se ao tinha que ser feito, como os festivais de cinema de Brasília, São Paulo, Gramados, (Rio Grande do Sul) e do exterior, como os Festivais de Cuba, México, Espanha, Rússia, Veneza (Itália), além de Paris e Alemanha. Todo o setor de produção da empresa trabalharia dia e noite, o tempo necessário para cobrir tais festivais. Era um trabalho exaustivo de produtores, diretores, técnicos e outros mais tais como cinegrafistas, iluminadores o quanto mais fosse necessário.
Rio das Contas era o próximo filme a ser projetado pela Agencia Pomar e seus patrocinadores. Essa denominação ficou por conta da região onde se fez as filmagens. Era um ermo local, de difícil acesso onde a equipe levou três semanas locando paisagens as mais diversas. Alem desse filme já estavam em ritmo de produção três outros filmes com a participação de atores, filmando-se nos areais do Maranhão, Pernambuco e Goiás, cada um a seu modo. Os roteiros eram feitos e desfeitos a todo instante por causa da aclimatação ambiental. Um dos artistas teve que ser substituído por causa de uma doença sofrida na véspera da filmagem, em Pernambuco. Esse era um filme que deveria ficar pronto no mês de dezembro. Por isso, a Produção do filme achou por bem reverter situação para o mês de janeiro. Silas Albuquerque chegou a dizer que aquilo era um trabalho de louco e não sabia como a sua mulher trabalhava tanto em tão curto espaço de tempo.
No sábado, Vera Muniz teve alta da clínica médica. Silas estava ao lado de sua cama quando chegou o médico e dizendo que a mulher estava de alta logo após serem retirados os pontos de sua barriga. Na verdade a operação se deu acima da linha dos pelos púbicos. Uma cinta pós-parto foi recomendada à Vera para usar. Essa cinta ela já deixaria o hospital com ela. Outras novas precisariam ser postas. A recomendação médica era de que a recuperação da cesárea podia levar seis meses. No primeiro mês Vera não podia dirigir carro. Não levantar peso e exercícios físicos deveria ser evitado até oito semanas após a cirurgia. Após ser cicatrizada a cirurgia Vera poderia ter relações sexuais.  A mulher sorriu ao ver que após três dias a enfermeira segurou-lhe pelos braços para lhe dar banho. Após esse tempo, Vera já circulava devagar por toda a extensão do quarto, uma vez que estava proibida de andar longa distancia por causa do desaparecimento da vice-presidenta da firma, a jovem Racilva Pontes. Quando Vera deixou o Hospital, o carro dirigido por Diomedes tomou rumo diferente saindo por um portão de trás, para evitar a presença dos repórteres e cinegrafistas de plantão.
Dona Cora Muniz, mãe de Vera estava no apartamento em companhia da moça Otília a esperar a dona da casa. Foi uma festa a chegada de Vera, não sendo maior porque lhe faltava o filho amado que a parturiente havia perdido poucos dias antes do seu nascer verdadeiro. De um modo ou de outro tudo foi festa. Vera recebeu a vista de sua mãe no Hospital todos os dias em que esteve em repouso. Outra que fizera visita não tão constante como à senhora Cora foi dona Lindalva Albuquerque, mãe de Silas. Visita também fez o velho Diomedes. Esse foi mais para levar frutas para a sua patroa. Gente da empresa esteve apenas na portaria do Hospital  que, a conselho médico, a paciente não estava propensa a receber visitas por causa do desaparecimento de Racilva Pontes na última segunda-feira. Em primeira visita, as mães de Vera e de Silas entraram e saíram por uma porta solitária para despistar a reportagem.
Na manhã do domingo, logo cedo, Diomedes já estava inspecionando as obras de construção de sua formosa casa na praia dos Coqueiros. Após visitar a sua mãe, abençoar os garotos, ver como estava a sua irmã, dá noticia de Otilia, a garota que foi para a cidade a convite de Vera Muniz, ele seguiu para a sua residência, uma moradia de soberbas fachadas. E assim, Diomedes esteve a ver os cômodos já prontos: sala de visita, três quartos, sala de jantar, cozinha, gabinete sanitário, outras dependências e o quintal. No quintal forma preservados duas mangueiras e um cajueiro de boa carga. O cajueiro brotava duas vezes ao ano cajus amarelos e deliciosos. Seu tamanho era descomunal e havia gente a dizer que outro cajueiro existente em um sitia vizinho era uma rama do cajueiro de Diomedes. E o homem até pensou em bater fotos do seu cajueiro para divulgá-lo nos meios da capital. Havia plantação de bananeiras, cana e outras fruteiras no quintal de Diomedes. Tudo isso bem conservado da forma como o homem fez questão. Um pé de araçá era a fofura do homem. Diomedes era capaz de tudo. Menos de cortar o araçazeiro. Na verdade, o araçá era uma fruta de pouca resistência para o futuro daquela praia. Podia-se encontrar o pé de araçá percorrendo-se a mata virgem do lugar, onde havia um sem numero de frutas. Às vezes, os garotos da praia costumavam ir caçar passarinhos e recolher frutas em mata fechada. Os passarinhos eram para criar em gaiolas ou apenas dar ou vender por pouco preço. Trocar os pássaros era o mais comum. Quem tinha um trocava por outro que ainda não pegara no seu alçapão.  E assim era a vida da criançada da vila dos Coqueiros. Quando os garotos não estavam a pescar na beira mar, na certa que iam buscar frutas e caçar passarinhos. Vida monótona dos filhos da vila.
E dessas coisas, Diomedes também um dia fizera no seu tempo de criança. Há cinqüenta anos ou mais a vida era mais tranqüila nos Coqueiros, pois naquela época não havia luz elétrica e nem água encanada. O mesmo era buscar água no cacimbão de seu Nestor ou mesmo cavar buraco na beira da praia onde se tirava água. Quando não, ia-se as “pedras” buscar galões de água. Negocio para os filhos mais velhos fazer. E Diomedes lembrava muito bem de tudo isso: luz de lamparina, lampião ou candeeiro. Para que pudesse, tinha também luz de carbureto, coisa só usada, e às vezes, pelas jangadas. Zé dos Burros e seu Nicácio eram os homens mais opulentos no tempo em que era menino o velho Diomedes. Esses homens carregavam água em galões nas costas dos burros para vender no lugarejo dos Coqueiros. Eles também faziam carrego de madeira, barro e cal para os mestres fazer suas casas. Burros, tinham de monte. Para mais de duzentos animais. Quando alguém lhe perguntava sobre as construções das casas paupérrimas do lugar, Diomedes logo pegava a contar historias de longas datas. E sempre dizia quando ele não tinha nada nos miolos:
--- Isso é historia seu moço. História! Escreva! – relatava o ainda jovem Diomedes.
E apenas a pessoa ficava a sorrir com aquela lambança, pois ninguém acreditava no que se ouvia dizer naqueles anos de solidão e tristeza onde o burro ainda era um animal de grande valia. Essa a historia de Diomedes Nogueira, então um homem ainda moço, porém tido como velho. A sua idade era de um homem de sessenta anos. Ele apenas conhecia o interior e sertão quando muito. Só depois que veio a ser funcionário da Agencia Pomar é que o velho homem conheceu o mundo levado por dona Vera Muniz. Antes disso ele era apenas o velho Molambo. Coisas da vida mesmo. Após inspecionar toda a obra e dá como pronta, pois o cheiro da tinta ainda era vigorosa, Diomedes sentou em um toco e pôs-se a pensar.


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