sábado, 9 de abril de 2011

DESEJO - 26 -

- Freida Pinto -
- 26 -
Ângela era moradora do sitio de Norma Vidigal. Quando meninas, as duas brincavam de toda sorte de adivinhar o futuro de alguém ou de alguma coisa. Por certo tempo, Ângela esteve ausente do convívio de Norma. Ela sabia cozinhar muito bem. E se tratando de peixe, ela era um esmero. Era neta de dona Carmozina, filha de um dos seus moços, cuja mãe morreu de parto logo ao nascer de Ângela. E assim, Ângela se criou ao deus dará. Por vezes, a moça aparecia na casa de Norma. Por outras, não. Na semana anterior, Ângela não apareceu nem mesmo na casa de sua avó. Se alguém perguntasse onde a moça estava, ela respondia.
--- Ali. – e sorria com seu modo triste.
Mesmo assim, Ângela nada relatava. E apenas saía do caminho e deixava todos os de casa atônitos. Foi de conversa em conversa onde Armando Viana foi tendo um despertar dos assuntos maltratados da jovem e bela moça nas suas andanças por aqui e acolá. À noite, quando era servido o jantar, Armando fez uma pergunta sem muitas pretensões para saber o quanto a moça sabia dizer ao certo. E foi assim que surgiram novas perspectivas de vida.
--- Ângela. Você vai há alguns campos dessa fazenda? – indagou Armando Viana.
--- Conheço muita coisa. Para os lados da serra. Eu conheço. – respondeu a moça.
--- E o que tem na serra? – perguntou Armando.
--- Além de mata braba tem até um campo parecendo para avião pousar. – declarou Ângela.
--- Você viu alguma coisa por lá? – indagou Armando preocupado.
--- Desde menina, quando eu ia tirar frutas no mato, eu via umas estradas muito estranhas. Eu tinha meus dez anos ou menos. Eu ia com uma tia minha e outras pessoas. As pessoas diziam que era ali que eles souberam pelos mais antigos dos Homens das Estrelas. Eu fiquei com isso matutando. E um dia enveredei pelo mato em busca de frutas e descobri umas aberturas nas rochas onde tinham inscrições de forma diferente. Eu olhava, olhava e não entendia de nada. Com ainda hoje não entendo. Porem as inscrições diz algo. Minha avó dizia ter ouvido dos mais antigos historias dos Homens das Estrelas. Eles tiveram aqui há muito tempo, bem antes dos descobridores dessas terras. Deixaram suas espécies de gente e levaram outros viventes da tribo de minha avó. Isso faz muito tempo. – relatou a moça Ângela.
--- E sua avó ainda lembra-se dos Homens das Estrelas? – indagou Armando de forma pouco a despertar algo de dúvida.
--- Falando com ela, é bem capaz de dizer. Mas faz muito tempo isso. Sei lá. – recomendou a moça.
--- E eu posso conversar com ela? – perguntou Armando já um tanto desesperado por saber de mais alguma coisa.
--- Eu creio que sim. Ela diz a mesma coisa que eu disse. Ela também viu as inscrições. – falou a moça servindo o jantar.
No dia seguinte, por volta das oito horas, estavam na tapera de Carmozina os dois amantes, Armando e Norma além da moça Ângela. Na oportunidade, além das bênçãos e troca de lembranças, como era o costume, Armando Viana indagou a anciã o que ela sabia sobre os Homens das Estrelas. A mulher, muito calma, cachimbo na boca, deitada na rede feita de cipó, apenas contou a versão da qual sabia muito bem, pelos os seus tempos vividos. Ela falou de um índio Cainã, já idoso, bem mais que ela. O índio, em noite de lua cheia, sentava-se no chão e começava a conversar com aqueles mais moços, homens, mulheres e crianças sobre tudo o que ouvira contar por seus ancestrais. Cainã dizia ter sido tudo aquilo verdadeiro. Era passado de ancião para os mais novos, vindo de tempos remotos muito antes dos invasores de suas terras. Ele afirmava ter ouvido de seu avô as historias. Esses também ouviam dos mais velhos. Homens “grandes” de pele alva, cabelos brancos, olhos como de cristal, mãos firmes. Todos eles eram sábios e entendiam de tudo. Os Homens das Estrelas viveram muito tempo nas serras e se casaram com as índias e os índios. Quando partiram, levaram consigo suas esposas e maridos e deixaram na terra descendentes de sua raça. Eles, os Homens das Estrelas, comiam frutas silvestres e nunca molestaram um índio. O casamento vinha de acordos entre as partes. Os seus filhos e filhas viveram muitos anos entre os povos da terra. Com o passar do tempo, nasceram outros dependentes dos Homens das Estrelas, todos de pele clara e cabelo lisos e brancos.  Ainda depois, no tempo de Cainã, havia gente vivendo nas tribos, pois todos se agrupavam como índios ou povos do mato.
--- E ainda hoje tem descendentes dos Homens das Estrelas? – pesquisou Armando um tanto quieto.
--- Ainda. Ainda. Eles são mais claros do que o nosso povo da mata. – relatou a anciã dando suas baforadas no cachimbo.
--- Interessante! Mas como se chegam às cavernas onde estão inscritas as figuras que os Homens das Estrelas fizeram? – indagou Armando a anciã.
--- Indo com alguém que conheça. – fez um sorriso a anciã.
--- Ângela pode ser? – indagou Armando Viana.
--- Se ela quiser pode ir com ela. – sorriu a anciã a apagar seu cachimbo.
--- Está bem. Vou tratar agora com Ângela para nós irmos às cavernas. – sorriu Armando à anciã.
Desse modo, o namorado de Norma procurou saber quando Ângela poderia ir com ele e a sua namorada até as cavernas das inscrições. A moça ficou a pensar e disse:
--- É bom sair mais cedo. É muito longe. Longe demais a serra. Uma hora dessa não deve ser mais adequado para se ir. Pode ser no sábado que vem. Se não chover. Tem mais isso. Por mim, eu vou. Tudo bem. – sorriu a moça olhando de repente para a cara da anciã Carmozina.
E assim ficou combinado para seguirem no próximo final de semana. No caminho da mansão, Ângela falou mais. Os Homens das Estrelas desceram à Terra em pratos voadores – Discos ou OVNS, como são conhecidos os aparelhos de transportes – e chegaram ao local onde fizeram um traçado para ter melhor visão das alturas. O local era de tamanho colossal e é possível avistar bem ao longe. Os Homens das Estrelas fizeram figuras nas cavernas. Já então era difícil de entrar, pois o mato tomou conta do lugar. Ela enfatizou ter encontrado a boca da caverna por um acaso. Ângela era menina de doze anos e andava a procura de frutas por esses locais quando, de repente, topou com a caverna. Ela mergulhou para dentro, com muita cisma, temendo algo de mais e viu então as figuras pintadas nas paredes da caverna. Com isso, ela se assombrou e saiu correndo do local. Na roda dos anciãos ela relatou o que encontrou. O mais velho de todos disse apenas:
--- Foram os Homens das Estrelas. Isso está ali há muito tempo. Talvez oito mil anos. Nosso povo já sabia de tudo isso. – relatou o ancião mais velho de todos.
E então Armando Viana indagou da moça se ela já conhecia de perto o aeroporto quando notou a semelhança entre os dois. A moça disse não.
--- Não conhecia o aeroporto. Eu vi quando estava com meus quinze anos. Uma vez que fui à capital. A gente passou por um terreno que ficava por trás do aeroporto e eu então olhei bem para o local, pois na hora vinha a pousar um avião. Então eu senti a semelhança entre o aeroporto e o campo de pouso dos Homens das Estrelas. – relatou a moça acanhada.
--- Mas vocês nunca disseram de existir um aeroporto na chapada da serra? – indagou o moço.
--- A gente não diz por que não tem serventia nenhuma em dizer. – confessou Ângela com os braços encruzados por cima dos seios.
--- Ah bom. Eu imagino. Eu vou ver o que se pode fazer na próxima semana. Sábado, é o caso. Nós iremos ao aeroporto da serra. Esta bem assim? – perguntou Armando Viana a jovem.
--- Está. sim. Mas tem uma coisa: o senhor não traga mais ninguém. É um segredo da tribo do povo Cariri. Só eles sabem das historias dos Homens das Estrelas. – relatou a moça.
Armando Viana olhou para a sua noiva e calou de vez, a não ser quando declarou:
--- Está bem. Só nós mesmos. – declarou o homem já então a desprezar da vinda de Canindé.
O almoço foi servido, tendo Ângela enfatizado por fim não saber por qual motivo disse tudo o que houve a declarar, pois o muito era levado em absoluto segredo. O rapaz enfim em nada respondeu. Apenas declarou estar muito bem feito o assado de peixe. Peixe fresco apanhado no mar onde sempre dava os pescados mais saborosos daquele meio ambiente. Quando a hora já atingia pela ordem das quatro, a moça Norma tomou a corrida para a capital, tendo ao lado o seu namorado, Armando. Para trás, eles deixaram Ângela. Essa ainda ficou a fazer a faxina derradeira daquele dia. O carro corria célere pela estrada principal e Armando chegou a adormecer enquanto a moça apenas corria sem parar. Já era noite quando Norma tocou no ombro de Armando para se esse acordava. E de fato, o rapaz se refez do sono, pois o carro já estava estacionado em frente ao seu kitnet. Então, ele apenas declarou:
--- Chegamos? – perguntou Armando atormentado pelo sono.
--- Há uma hora! – sorriu Norma Vidigal.

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