terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

AMANTES - 66 -

- Maureen O'Hara -
- 66 -
 Alguns dias após do encontro de fim de semana entre Silas e Diomedes para treinar tiro ao alvo com a pistola Luger nazista na beira-mar, um motorista de caminhão foi até ao seu esmerado escritório. O homem avisou que os serviços foram feitos. As jangadas já estavam terminadas. Silas Albuquerque ficou eufórico e entusiasmado com a breve informação:
--- As jangadas! As jangadas! Até que enfim! – gritava eufórico o homem.
E mesmo Diomedes se encheu de entusiasmo ao saber das jangadas. Elas estavam prontas. E com Silas Albuquerque o velho também comemorou a noticia. Tão logo depois da noticia, Silas, Diomedes e o motorista rumaram para o Mangue onde Silas encomendara o serviço de reparo das três jangadas até porque a quarta não prestava mais. Foi um entusiasmo total. O motorista do caminhão se prontificara em levar as barcas e Silas até teve a idéia de ir com ele para ver quando os barcos começariam a navegar novamente. E assim se fez. Pago todo o serviço e a promessa do homem do Mangue em verificar sempre que houvesse necessidade qualquer nas embarcações de pesca, Silas aguardou o rapaz a colocar no seu caminhão as três embarcações.
Foi um serviço imenso esse de colocar as jangadas na carroceria do caminhão. Três destemidos ajudantes foram no caminhão seguindo para a pouco conhecida praia dos Coqueiros. Silas Albuquerque e Diomedes Nogueira foram logo a seguir. O homem Silas conversava sem parar mostrando o contentamento de sentir as suas embarcações estarem concluídas. Foi viagem longa, por causa do transito naquele dia de semana. Na viagem, Silas indagou se Diomedes conhecia alguém de pura confiança para tomar responsabilidade com as jangadas e o velho apenas respondeu ser o homem o qual tinha essa função.
--- Tá bom! Tá bom! Perguntei só para saber se tinha alguém que você pudesse recomendar- - declarou o homem a Diomedes.
--- Não! Não! Para recomendar meu sobrinho é até perigoso. Ele bem que poderia tomar conta. Mas é muito novo para isso. – relatou Diomedes.
--- É. Mas eu vejo diferente. Ele quem é? – indagou Silas ao velho.
--- O irmão de Otilia. Chama-se ele de Tavinho. Seu nome é Otávio. – respondeu o velho.
--- Tavinho. Certo! Eu vou ver se o rapaz ainda quer. Se não, Tavinho é o próximo. Ou mesmo, Tavinho fica com uma jangada. É mais certo. Afinal são três embarcações para se tomar atenção. Não custa nada em Tavinho tomar conta de uma. – alegrou-se por demais o homem.
--- Isso é. Mas o moço tem mais experiência. Vive disso toda vida. Tavinho só quer saber de cana. – sorriu o velho Diomedes.
--- E o moço como se chama? – indagou Silas a Diomedes.
--- O nome dele é Francisco. Mas atende por Chico. – sorriu Diomedes.
--- Por que você achou graça? – logo perguntou com espanto o homem
--- Por nada. Por nada. – sorriu Diomedes e chegando a gargalhar.
--- Ah mais vai dizer. Acha graça por besteira? – averiguou o homem Silas.
--- Não é nada. O caso é que ele vem da família de Cila a moça que foi minha namorada. Só isso. – sorriu o velho novamente.
--- Ah bom. Assim tá certo. Cila. Ela se fosse viva, tinha seus sessenta anos. – pesquisou Silas.
--- Mais ou menos isso. Chico é bem mais jovem. Filho de uma irmã caçula de Cila. – respondeu Diomedes meio acabrunhado por se lembrar da moça Cila.
--- É. Na praia, todos os mais idosos têm família em comum. De pai pra filho. – argumentou Silas também a refletir.
Já era de tarde quando o caminhão chegou à praia dos Coqueiros. A maré estava enchendo. O rio aumentava seu volume de água. Era como quando a maré enchia e secava. O rio enchia ou secava. A ponte sempre era reparada pela Prefeitura. Quando não, pelos próprios moradores. Ponte feita de pau. Ela rangia toda quando um caminhão passava por cima talvez “pensando” em agüentar tanto peso. Os rapazes atravessavam o rio pela água mesmo. Os mais velhos caminhavam por entre os paus da ponte. Se havia uma cheia de maré, o atravessar de um lado para outro era de barcaça. No inicio de sua existência, a praia nem tinha condução motorizada. Para caminhar era em cima de jumento ou a pé. A vida na praia era de um sossego imenso. Foi não foi, havia uma briga. Às vezes, uma morte. Susto, bala e faca.
Para descarregar as jangadas não faltava mão de obra. Meninos e rapazes, todos estavam prontos para ajudar.
--- Chegou seu Oscar. Chegou seu Oscar! – gritava a meninada cheia de alegria.
Oscar era morador da vila dos Coqueiros. Fazia frete. Era pau pra toda obra. Chegava e partia. Não raro estava bebericando na bodega da praia quando nada havia para ser feito a qualquer momento. Se estivesse na capital, Oscar pegava frete no Mercado. Ou mesmo ele levava mercadorias de feira em feira. Ele cumpria suas obrigações ao verificar se um trabalho estava terminado para ser embarcado para um lugar ou outro. Pai de não sabe quantos filhos e mais alguns. Quando nada havia para fazer, ele estava na estrada da vila nos bares daquele local. Mesmo assim, isso era muito raro. O caminhão pegava no tranco. A buzina era ligada por dois fios geralmente soltos. O caminhão pulava de terceira. Ele segurava na alavanca para não sair. Dizia-se até que o caminhão de seu Oscar queimava óleo cru, pois a fumaça que o caminhão soltava dava-se ver a quilômetros de distancia. À vezes quando pegava frete no cais do porto, o caminhão conduzia linhas de até dezoito metros de cumprimentos. E se fosse numa descida, Oscar desligava o motor para aproveitar a gasolina. O freio era a varão. E para frear, o homem dava três pedaladas até sentir o freio ter pegado. Certa vez, um guarda de transito quis multar Oscar por oferecer perigo. Porém, veio outro guarda e conversou com o que estava aplicando a multa e lhe disse:
--- Esse é Oscar. O carro dele é assim mesmo. Um patrimônio da estrada. – o sorriu o guarda.
O outro guarda bem moço, ficou a ver navios em plena cidade. E não multou o carro do velho Oscar por ser um “patrimônio” da estrada. Era assim o caminhão de Oscar.
Silas Albuquerque viu as suas jangadas singrarem o mar após terem sido desembarcadas e postas a serviço. De início, não navegaram longe. Fizeram as jangadas apenas uma meia volta para depois encostar-se à praia. Estava nas embarcações o homem Tavinho, o jovem Chico e mais outro parente de Tavinho. Oscar orgulhoso costumava a dizer:
--- Isso é que é jangada. Não pau que boia. – e gargalhava a contento.
Diomedes também sorria em companhia do seu chefe, Silas.  O velho, quando chegou à praia, foi chamar o seu sobrinho Chico, pois sabia até demais que o rapaz tomava conta de jangadas. O rapaz atendeu o apelo do tio e foi falar com seu Silas e então ficou com a guarda de uma das jangadas. O moço Tavinho, antigo guardador das jangadas, nada falou sobre a vinda de Chico. Ele simplesmente obedeceu às ordens do novo chefe a prestar contas todo final de semana do pescado que apanhasse durante os dias em mar aberto. Dias melhores. Dias mais fracos. Era assim a pesca em alto mar. Desse dia em diante Silas Albuquerque na verdade era o novo dono de jangadas na praia de Coqueiros. Ele até pensou em fazer um filme sobre pesca e jangadas aproveitando ter embarcações como as tais.
--- Jangadas! Que você acha velho? – indagou Silas a Diomedes com algo de serio.
--- Eu não entendo bem desse negocio. Mas acho que vale a pena. – respondeu o velho.
--- E vou combinar com a turma da produção e ver como se faz. Eu vi, certa vez, uma produção de pesca de caranguejo. Em outras vezes vi sobre pesca em alto mar. Na Suécia, parece-me, alguém fez algo sobre pesca. Tem também na Itália, França, Espanha. Esse tema é muito bem procurado. – relatou Silas ao velho.
De volta ao seu escritório, Silas já encontrou tudo fechado, pois terminada o expediente do dia. O vigia do edifício era o único a ficar, por a casa de fazer almoço já estava fechada. Um jornal da tarde era a única novidade em termos de noticias. O impresso trazia a foto em sua primeira página do governador do Estado. Carlos Louzada morrera em acidente de aviação. O avião no qual viajava o Governador caíra numa região de montanhas o interior do País. Foi um trágico acidente, pois além do Governador Louzada também estavam outros secretários de Estado. O Corpo de Bombeiros tinha sido enviado para a região, local de mata densa. Aviões do Exercito com patrulheiros já estavam na região montanhosa procurando local para pousar ou fazer descer os salva-vidas. As noticias eram breves e contraditórias e muito fragmentadas. Silas viu o que trazia de notícia o jornal da tarde e procurou ouvir alguma nota através da imprensa falada. Tudo era muito vago. Silas temia a sua produção, uma vez que grande parte das verbas advinha de poderes públicos.
--- Puta merda! Essa eu não esperava! – relatou Silas com o suor descendo a face.
--- Essa também eu não esperava. A que horas foi à tragédia? – indagou Diomedes.
--- Aqui diz; três horas da tarde. – falou Silas Albuquerque.
--- Na certa a televisão está no local. – respondeu o velho.
--- Certamente! Vamos pra casa! – relatou constrangido o homem de negócios.


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