domingo, 27 de fevereiro de 2011

DESEJO - 03 -

- Isabelle Adjani -
- 03 -
O veículo de aluguel de Giba tomou rumo do sertão, após Canindé ter em mãos a sua maquina de filmagem de 16 mm. Por via das dúvidas ele achou por bem levar um equipamento de maior segurança, vez que as noticias vindas do interior não eram nada sossegadas. O vento frio sobrava mais forte na estrada e os primeiros pingos de água começaram a cair tão logo o carro se afastou da capital. Nesse momento, Canindé passou a mão no pescoço e fez cara feia como que declarava:
--- Isso é uma bosta. Vai chover mesmo. Meu pescoço não nega. – relataria Canindé um tanto confuso.
E o motorista do carro disse, por sua vez:
--- Vai chover mesmo. Se não chegarmos logo ao lugar estamos fritos. – reclamou Giba.
--- Tem outra estrada para se chegar a Sertânia? – indagou Armando se encolhendo no banco.
--- Tem. Mas leva um tempo danado. Não tem calçamento. É ruim demais. Esses putos não se deslocam nem de carro. – reclamou Giba com a cara amarrada e enxugando o pára-brisa por dentro, pois o calor dos que estavam já começava a empanar os vidros.
Armando Viana não disse mais coisa alguma para não esquentar mais o homem. Giba já estava colérico com o caos da chuva. E aumentava cada vez mais o aguaceiro fazendo com que o motorista e seus passageiros ficassem o tempo todo enervados. Uma borboleta bateu contra o vidro do pára-brisa. E depois outra e mais outra. Pássaros revoavam a todo instante passando de um lado para outro da estrada. Caminhões vinham do interior com seu carregamento de frutas e outras mercadorias. Os carros seguiam para a capital. Um cachorro estava morto na margem da estrada por conta talvez de atropelamento. As aves da rapina já deglutiam as entranhas do cão. Ao sentir a presença do carro, batiam em revoada para depois assentar. O carro seguia firme e deixava para trás os camponeses molhados pela chuva. Esses caminhavam talvez com destino certo. Uma mocinha se juntava ao grupo de camponeses toda encolhida de frio o de temor da chuva fina e constante.
--- Puta-merda!!! – reclamou com certeza o fotógrafo Canindé.
--- Que bicho te mordeu? – indagou alarmado o repórter.
--- Nada não. Eu me esqueci de deixar a chave do laboratório. – reclamou Canindé atarantado.
--- Pensei logo numa cobra! – relatou sorrindo o motorista Giba.
E Armando Viana também sorriu com a presepada do fotógrafo por ter se esquecido de deixar a chave do laboratório. Desse modo, os outros fotógrafos não podiam fazer os serviços do dia. Desse modo Armando lembrou não ter pautado os fotógrafos. Mesmo assim não deu maior importância. Talvez os fotógrafos mesmo se pautassem. E ele se lembrou de Mario, o outro rapaz da redação. Esse poderia pautar os fotógrafos. E as revelações os fotógrafos podiam fazer no laboratório do Palácio.
--- Tem o Palácio. – respondeu Armando.
--- Duvido que alguns deles tenham a cabeça de revelar em Palácio. – reclamou Canindé.
--- Estou pensando é na chuva. A Ribeira toda alagada. É o cume da desgraça. – reclamou ainda Armando Viana.
--- Tem o rio. – rebateu Canindé por se lembrar do alagamento.
--- É. – concluiu Armando meio entristecido.
Ainda não havia um aguaceiro no meio do caminho para Sertânia. As barragens, lagos e lagoas estavam mais ou menos com pouca água. Quem passasse pela estrada podia ver a sequidão tornada pelo tempo. Resultado de pouca chuva no interior do Estado. Todo ano era sempre a mesma tragédia. Isso levava o camponês para a capital em busca de trabalho. Quase sempre o homem do interior levava o seu matulão e as trochas de roupas dos meninos e da mulher. A mulher era tão magra de não poder está em pé. Na capital, o campônio beradeiro sempre não encontrava nada para fazer. Pois, afinal, na capital ele era bem estranho. No interior, o camponês era bem mais astuto. Capinava, roçava, arrancava toco, tangia boiada entre outras coisas mais. Na capital só havia trabalho para quem soubesse ler. E nem sempre isso permitia ao camponês uma vida melhor. Então, restava à religião protestante com a promessa de “Deus dará”.Esse tipo de comércio era o crucial destino para a mulher magra, seus filhos, uma filha já um tanto grávida de um vaqueiro de fazenda ou de um moleque qualquer e ele próprio.
--- Não paga a pena. – lamentava-se um camponês largado a própria sorte.
--- Menino! Vai buscar água no riacho! – reclamava a mulher camponesa para o filho maior.
--- Só tem caramujo. E água fedorenta. – respondia o garoto de pouca idade.
--- Traga assim mesmo. – rezingava a mulher mal humorada.
O circo dos camponeses era armado no meio da rua. Uma rua de maior movimento da capital. No circo armado, com uma lona qualquer, dormia, vivia e comia o pouco que restava das casas nobres toda a população de camponeses desarrumados. Assim era a vida do homem do campo vindo para a capital de Estado.
--- Eu acho que já estamos pertos. – declarou Giba ao rapaz contratante.
--- Pergunte àquele camponês! – relatou Armando Viana um tanto preocupado.
E o carro seguia até encostar próximo ao campônio. O homem estava recolhido debaixo de um pé de algaroba se protegendo da chuva continua. E Giba foi logo perguntando.
--- Moço! Onde fica a cidade de Sertânia? – indagou Giba ao camponês.
--- Logo ali. – relatou o campônio estirando os lábios para frente.
--- Você sabe se o Governador está aqui? – voltou a indagar o homem Giba preocupado.
--- Homem! Se não me falha a memória, eu vi passar logo cedo o carro grande em direção a fazenda. E eu pensei: quem será? – respondeu o camponês.
--- Certo! Certo! É o governador. Obrigado. – respondeu o homem Giba.
--- Mas sendo o senhor, eu tomava tento com os camponeses revoltados. Eles estão armados de espingardas, carabinas, foice e enxada. – disse mais o homem de algaroba.
--- Puxa vida! E onde eles estão? – indagou alarmado o senhor Giba.
--- Homem! Tão logo na frente do cercado. E pelo lado de dentro tem os capangas do coronel. Eu acho que o tal do Governador não vai achar nem um pouquinho de graça com eles. – relatou com certa paciência o camponês.
--- Houve tiro? – indagou Armando ao camponês.
--- Não. Mas não tarda a haver. – disse o homem com pouco medo.
--- Mas só estão os camponeses? – voltou a indagar Armando meio temeroso.
--- Tem do outro lado também. E tem umas cabecinhas de gado que os camponeses querem passar com elas pelo meio da fazenda. – informou de qualquer jeito o camponês.
--- É longe daqui pra lá? – indagou Armando assustado.
--- É  nada. Se o senhor for pela estrada no instante chega! – sorriu o camponês.
E os agradecimentos foram feitos tendo o veículo a trafegar pela estrada até certo pondo onde não se ouvia coisa alguma de campônios ou de jagunços. E novamente o carro parou para saber de um menino onde era a tal fazenda dos jagunços armados e os camponeses. Pois nada havia de atropelos na estrada barrenta e escorregadia por conta da chuva caída naquele momento.
--- É logo ali. Ó. Mas cuidado com os jagunços. Eles são brabos. – relatou o menino sorrindo.
--- Tem gado pelo caminho? – indagou Armando sobressaltado.
--- Umas cabeças e muita gente. – sorriu o menino com alegria.
---Gabriel!!! Chega prá dentro!!! – gritou a mãe do menino com a cara feia para os passageiros do carro de praça.
Nesse ponto, Giba, Armando, Canindé sorriram por causa a mulher infernizada. E a mulher fechou a porta rezingando com o moleque de pouca idade. E de tudo que puderam ouvir pela a porta ainda aberta foi o desaforo:
--- Passa pra dentro moleque. Ora quem já  se viu! -  respondia a mulher enquanto fechava a porta de duas bandas.
Ainda assim, a mulher magra olhou por uma brecha da porta o carro que já seguia viagem com os seus ocupantes a sorrir. Um pouco mais e os ocupantes do carro de praça divisaram um punhado de gente armada com espingardas, escopetas e revolveres em contra partida com os jagunços do cercado com fuzis, mauser e rifles. Ao largo, no campo o gado a pastar. Os vaqueiros estavam prontos para a guerra.

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