quarta-feira, 10 de abril de 2013

"NARA" - 37 -

- Natalie Portman -
- 37 -
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À noite, Eurípedes estava na residência de Nara a gargalhar sem tréguas pelas vibrantes matérias divulgadas na manhã-tarde daquele dia nos jornais da Cidade. Os jornais passavam de uma mãe e outra do médico e do seu Sisenando enquanto Nara ficou a balançar a criança em seu berço e a olhar bem para os dois homens sem querer dizer coisa alguma. Eurípedes nem se importava com o piano. Afinal, o instrumento era propriedade de Nara. Logo o médico lembrou um caso ocorrido em seu expediente daquele dia. Caso muito delicado e não se podia adiantar por nada. E o médico relatou:
Eurípedes:
--- Se a Imprensa soubesse de um caso delicado que está havendo no hospital?! – falou por alto o médico.
Sisenando:
--- Qual? Qual? Qual? – indagou inquieto o outro homem.
Eurípedes:
--- Eu vou te contar. Mas fica aqui. Não quero nem saber. Pois bem. Hoje, nós operamos um homem com três anus. Três! Ouviu bem? Três! – declarou o médico.
Sisenando:
--- Mas três cus? Como é pode? Três? – indagou perplexo sem saber o que dizer.
Eurípedes:
--- Três. Nós lacramos dois. Ele evacuava pelos três. – comentou o médico a olhar Nara que se manteve calada.
Nara:
--- Vocês já estão conversando besteira!. Vou embora!. Fiquem! – respondeu com voz altiva.
O pai da virgem ficou surpreso com a atitude de Nara e olhou para o vulto a sair da sala a toda pressa e pegar o corredor até o seu quarto de dormir. E falou um tanto preocupado:
Sisenando;
--- Mais tá! Nós estamos conversando sobre ciência e ela sai com disparate! Ora! Pois vá! – discutiu o seu pai um tanto aborrecido.
E os dois homens ficaram a conversar sobre desastres, acidentes, recuperação de defeitos e negócios ainda nem tanto conversados. Um exemplo foi dado pelo médico de um rapaz. Esse rapaz de mais ou menos vinte anos caiu de uma serra do interior do Estado ficando todo quebrado, apenas se salvando o crâneo. Ele foi levado para o Hospital e submetido às várias cirurgias. A demora foi por conta do tratamento prolongado. Pernas, braços, tórax, joelho e tudo que se pudesse imaginar. Apenas o crânio ficou intacto. Também o acidente com a queda vertiginosa de mais de cinta metros não afetou a visão,  fala e musculatura dos ouvidos.
Eurípedes:
--- Foram cinco meses de cirurgias e observação até quando tudo estava perfeito. O rapaz ainda assim puxa por uma perna. Mas está vivo. – sorriu contente o médico.
Deram-se as horas e o doutor Eurípedes observou já está tarde e era preferível partir, pois no dia seguinte, talvez não pudesse vir, uma vez haver aula para os novos estudantes e ele fôra escalado para ministrar palestra. E de imediato, o jovem retornou ao quarto de Nara, e esse estava fechado à chave. Eurípedes tocou duas vezes à porta e Nara não respondeu. Ele logo entendeu e disse apenas estar a sair. Tentou ouvir resposta e Nara não respondeu. De vagar, ele foi embora passando outra vez pelo seu futuro sogro e esse fez algo ter o rapaz entendido. A moça estava menstruada – naqueles dias – o velho apontou a barriga para ver se o rapaz entendera. Eurípedes sorriu e dialogou algo sem muita importância. Logo saiu.
Ao chegar a sua residência Eurípedes ouviu algo deveras singular. Rócia, sua irmã, estava a tocar acorde violino. Ele sorriu e bateu palmas para a donzela. Em seguida começou ao piano a acompanhar Rócia até o momento de executar um choro intitulado “Apanhei-te Cavaquinho”, composição feita para piano por Ernesto Nazaréth, em 1930. A jovem moça acompanhava ao violino e ele executava ao piano. Foi um verdadeiro êxito aquela apresentação. Logo após, ambos aplaudiram a si mesmos. Ou um ao outro por sua vez. E o desafio continuou por horas a fio com cada qual fazendo a sua vez. Eles jogaram músicas ao vento, pois o sol não tardaria a despontar. Na verdade, os sabiás cantavam nos pés de laranja e as andorinhas faziam a caça das suas sementes aos primeiros eventos do dia seguinte. A moça sorria. O rapaz chorava. Era o desafio patente entre os dois mestres da música. Os galhos da mangueira pareciam sentir todo aquele refugio de prazer. As cortinas de veludo da sala abriam de par a par para os derradeiros afetos dos belos músicos. Na rua, o padeiro passou:
Padeiro:
--- Pão! Olha o pão! Pão! – falava o padeiro em surdina.
Dona Nazaré já acordara e nessa instante punha o que tinha de ser feito na mesa ornada. O padeiro encostou-se ao muro da casa de seu Amaro Borba  e ficou a espera da doméstica para despachar os pães. Outras domésticas sacudiam milho às galinhas ou apanhavam roupas no varal. Nesse ponto, Eurípedes notou ser o tempo bastante tarde para ele e a sua irmã estarem acordados e resolveram encostar seus instrumentos e procurarem o banheiro. O velho Borba já estava desperto e entrou primeiro no banheiro a reclamar ter que ir naquela manhã a fazenda, pois Tomaz telefonara da cidade de Santa Cruz a chama-lo com urgência.
Euripedes:
--- E o que é que está havendo? – indagou o filho.
Borba:
--- Vaca morta! Sei lá! Eu disse só poder ir no sábado. O vaqueiro disse que o caso é grave! Bosta! Lá vou eu! – falou meio perturbado.
Eurípedes:
--- E ele não resolve? – indagou o rapaz um pouco atento.
Borba:
--- Tem caso que não! – respondeu o velho meio desconfiado.
Eurípedes:
--- E eu tenho de estar bem cedo no Hospital. A turma de jovens. Eu tenho de fazer palestra. – disse o rapaz meio acanhado.
Borba:
--- E você vai hoje? E o Consultório? – indagou o velho.
Eurípedes:
--- Trancado! Trancado! Não tenho tempo! – respondeu.
Na residência de Nara, a sua mãe não dormira a noite toda. A moça estava incomodada por ser tudo naqueles dias e não dormira um só instante. Dona Ceci preparou chá, mesmo assim nada resolveu. Quando amanheceu, o pai de Nara recomendou levar a filha a um médico. Nara dizia não ser preciso,  pois já sentira esse incomodo de outras vezes.
Sisenando:
--- Mas é preciso sim! E o seu noivo não é médico? – indagou vexado
Nara:
--- Nem ponha ele no costume! Eu não vou! Isso passa! – discutiu a moça ao sentir de momento fortes dores.
Sisenando:
--- Ora não ponha? Então vá a doutor José Ivo! Ele é tiro e queda! – argumentou o pai.
Nara;
--- Não vou a nenhum! Isso passa! – reclamou a moça.
Ceci:
--- Eu já disse: É melhor ir a um médico. Ele sabe! Estudou! Sabe! – falou irritada.
A essa altura Ceci vinha no aposento da filha e saia com seu corpo forte até a cozinha para ver se o chá fervera
Nara:
--- Ora mãe! A senhora entende disso! - respondia a moça se torcendo em dores.
Ceci:
--- No meu tempo era diferente!. Um chazinho e pronto!. Agora como tudo! E preveni! Não coma goiaba! Isso é ruim! Mas não ouve! Come o que der na telha! – reclamou a mulher
Nara:
--- Que goiaba? Eu lá comi goiaba? – dizia a moça se contorcendo em dor.
Sisenando:
--- Goiaba? É um purgante! – respondeu o velho.
 

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