- Mariana Ximenes -
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TREMOR
A Terra tremeu
naquele instante afetando sobremaneira moradores de Natal. O médico Eurípedes
estava se dirigindo para o anfiteatro do Hospital quando sentiu abalo forte.
Por alguns segundos, não mais que oito, ele viu todo o edifício rodar e os
objetos a cair para todo canto. Natal estava numa época de sismo. Ninguém podia
prever o acontecido. O novo abalo ocorria no tempo quando o médico se dirigia
para fazer palestra aos novos estudantes tendo deixado sua noiva Nara em um
apartamento em recuperação de uma forte crise menstrual. O médico já receitara
medicamentos e esperava de momento o restabelecimento da moça. Não era nada de
risco, aventava o medico. Com o abalo, Nara estava a dormir e sua mãe seguia
para o jardim do Hospital após ter falado com o seu marido, Sisenando. O homem
ficou de estar no Hospital “Miguel Couto” antes de concluir o primeiro
expediente da repartição. Contudo, o tremor mudou o rumo das pessoas. O abalo,
de certa forma, foi tão forte que uma auxiliar de enfermagem derrapou no chão e
parou em um choque contra a parede de prédio. A própria mãe de Nara se aguentou
a segurar Neto, o seu protegido daquele instante e procurou apoio em qualquer
lugar temendo tudo a sua volta, pois o abalo Ceci já sentira outro um pouco
semelhante quando saiu na correria a buscar abrigo no Convento franciscano onde
outro pessoal também buscava. Do ultimo abalo, ou pelo menos o inicial, a Prefeitura
quase ou nada fez na recuperação dos estragos provocados nas partes de
repartições ou mesmo nas casas mais antigas da capital. A cidade vinha sofrendo
constantemente os efeitos dos sismos de um modo bem frequente. Desde o último
sismo, com repetição a vários outros, os homens do interior buscavam mesmo até
água para dar ao gado, pois as chuvas não ocorriam de modo algum. Sem chuva não
havia água das cabeceiras dos rios. E na capital do Estado eram os sismos a
ocorrer. O transporte de cargas por caminhão era de certa forma prejudicado
desde o primeiro sismo. E ainda se temia pelo poder dos tremores quando a terra
sacudiu novamente. De imediato alguém sentiu a terra a vibrar e já estava se
acostumando com esses terremotos regulares. Mesmo assim, o novo abalo ocasionou
problemas diversos tendo sido sentido em vasta área da cidade e em cidade
vizinhas. Até aquela data ainda estava em vigor o toque de recolher em certas
horas da noite. E em decorrência o novo sismo veio a afirmar serem tão
necessário como antes se alertar as pessoas e proteger a saúde das empresas do
comércio e da indústria. Mas isso era o dever posterior. O caso era o abalo
naquele instante. Por isso nem adiantava se referir ao que estava por vir. O
caso do Hospital era tão grave como os demais da Capital. Os médicos e
estudantes calouros do curso de Medicina entraram em polvorosa quando sentiram
seus pés abalarem. Formou-se uma correria para qualquer canto em busca de uma
saída onde os estudantes pudessem se proteger de algo anormal. Foi uma celeuma
atroz mesmo com alguém a gritar:
Alguém:
--- Calma
turma! Calma! – dizia um professor a sair do anfiteatro.
Mesmo assim,
não havia forma de se conter a fúria dos estudantes. Eles queriam era sair. E
com eles levaram carteiras, bancas e tudo mais. O negócio era sair do
anfiteatro para qualquer espaço. No apartamento onde estava desacordada a
paciente Nara, noiva do médico uma auxiliar de enfermagem foi ao solo como por
encanto pondo a moça ao desespero. Tudo balançava no interior do apartamento, desde
o lustre sobre a cama até mesmo as ampolas de injeção postas em uma mesa de
ferro em um canto de parede. A cama onde Nara conciliava o sono balançou com
ímpeto rodopiando em seus pés. O suporte e a bolsa de soro vieram ao solo. Caixas
de medicamentos voaram ao leu como a se escapar em derradeiro impacto. De
apartamentos em frente, vieram de imediato aos borbotões os outros objetos
guardados nos seus armários. A moça telefonista se agarrou com força ao sentir
o terremoto. As sirenes das ambulâncias alarmaram como se alguém mandasse
perpetrar aquele sinal. Era um verdadeiro tumulto no interior da casa de saúde.
Um clamor do Céu. A correria foi constante de um lado para outro com as
enfermeiras e auxiliares a esbarrar uma na outra sem saber de fato o mais ser
feito. Motoristas alarmados gritavam o poder e não poder. Doentes caíram de
seus leitos e a pedir amparo. Por fim, o médico Eurípedes, quase ao vir ao
solo, se aprumou de vez e caminhou para o apartamento de Nara passando de
imediato por sua futura sogra e o menino, ajudando-a a se soerguer de forma
pelo menos com muito esforço.
Eurípedes:
--- Vamos!
Segure-se em mim! Assim! Depressa! É um sismo e dos maiores! Siga-me! – falava
com vexame o médico.
A mulher a
segurar o garoto se aprumou e tentou seguir o seu futuro genro entre o meio de
muita gente a correr para um lado e outro e a gritar frenética com temor da
tragédia. E assim, os dois saíram a cambalear por entre rumas de estragos
vindos de qualquer ponto. Outro médico gritava às enfermeiras e auxiliares ter
cuidado com os pacientes, pois muitos estavam a cair dos seus leitos. Eram
médicos e enfermeiros a sair para qualquer canto com a terra a tremer em seus
pés. Essa tragédia durou por vários tempos onde não sabia quem era quem. Todos
estavam metidos num torvelinho de consequências imprevisíveis sem proteção
alguma. Entre o meio de toda gente Eurípedes conseguiu entrar no apartamento
onde foi encontrar a auxiliar totalmente estabanada a procura de repor a todo
custo em seu lugar à cama na qual Nara se encontrava. Nessa ocasião o médico
ajudou a repor a cama no seu devido lugar e dona Ceci ficou apenas a observar o
esforço dos dois sem poder ajudar em nada. O vento forte açoitou o tempo
provocando o maior desespero naqueles que ainda percorriam com macas ou não a
socorrer alguns doentes prostrados no chão dos quartos onde alguém colocou alí.
Era mais os indigentes uma vez que os em melhores condições financeiras tinham
ao lado sempre uma auxiliar a proteger. Nesse ponto, as Freiras a prestar
assistência aos doentes corriam cada qual como podia e se apressavam em cuidar
de algum enfermo. Na verdade, tinha doente no final da vida esperando tão
somente o dia de sua morte. Alguns desses enfermos nem sequer tinham roupa
usando tão somente os trajes rotos do Hospital. As Irmãs cuidavam do setor, de
modo especial, da capela e de forma geral dos acamados e das mulheres a dar à
luz aos seus rebentos. Essas Irmãs se dividiam entre o Hospital e a Maternidade
“Januário Cicco”. Na hora do tremor de terra eram as Irmãs as mais sofridas a
se deslocar de um lado a outro. Não foi com muita graça que algumas dessas
Irmãs chegaram a cair ao solo por conta do habito a usar. Traje longo, todo
preto a cobrir das Freiras da cabeça aos pés. Freiras tinham novas, de idade
variada entre vinte e mais de setenta anos. As mais idosas ficavam sempre no
Retiro. Mesmo assim, o tremor abalou todos os setores do Hospital bem como de
outros locais da Cidade. A estação de telefonia ficou muda com o abalo. Na
capela houve Imagens de Santos jogados ao piso. Na verdade, foi um verdadeiro
terror sofrido por toda a gente daquele nosocômio.
Operário:
--- É o fim do mundo! – gritou um operário
a correr desenfreado para se esconder em algum canto qualquer.
Gritos,
lamúrias, expressões de medo e tudo o que se podia imaginar ocorria a um só
tempo naquele hospital. Uma mulher que estava a esperar a hora pôs a criança
para fora da barriga pelo terror formado naquele instante. E nem esperou por
qualquer parturiente. Foi de um só instante. Macas caídas, berços aos montes,
tudo empilhado ou desempilhado em algum canto de parede. Foi um horror tudo
aquilo a se poder notar. Choros e lágrimas, gritos de dor e de desespero.
Correria às tontas. Era um hospital em alvoroço. É bom lembrar: tudo isso em um
só minuto. O homem da casa funerária caiu dentro da urna como um molambo e foi
ao barro com urna e tudo. Flore se grinaldas se amontoaram em cima do
caixão. De tanto terror a ficar o homem
nem saiu de dentro da urna nos seus primeiros instantes. Ouviu-se um baque surdo
e abafado para os lados do necrotério. Era o de um cadáver. O defunto de
imediato rolou ao chão arrastando consigo tudo o existente no local. Água
turbilhoava pela calçada aos montes. Era de um cano rompido naquele instante.
A água entrou pelo necrotério formando
imenso lago e arrastando o cadáver para fora. Homens passavam de um lado para
outro e nem dava fé no cadáver. E se dava nada importava. Cada qual pensasse
depressa;
Um:
--- Terremoto?
Ai meu Deus! Meus filhos! – fala alguém com muita tormenta.
Dois;
--- Minha mãe!
Pelo amor de Deus! – alarmava outro.
Três;
--- A casa vai
desabar! – falava ao desespero um terceiro lembrando-se da tapera.
E todos assim
corriam de um lado para outro com o chão a tremer nas suas bases. De repente, um
estrondo. Uma imensa adutora a abastecer a Caixa de Água da Avenida Atlântica
se rompeu de imediato e transbordou para as moradas de baixo com imensa
turbulência e seguindo para o local onde se erguia o Hospital e dali para a
Maternidade a ficar embaixo da rua. Um Bonde foi tragado pela força das águas e
desencarrilhou se virando como se fosse um brinquedo. Poucos carros a circular
pela rua ficaram emborcados devido ao transbordamento da adutora. A parte da
balaustrada suportou a imensidão das águas, porém serviu para despejar para a
Rua do Motor tudo o podia ser feito.
Enquanto isso,
no apartamento onde Nara estava o médico Eurípedes auscultava mais uma vez o
ritmo cardíaco da paciente enquanto a auxiliar removia todos os entulhos para
um canto de parede. Dona Ceci, preocupada com seu neto. O menino não parava de
chorar enquanto a algazarra continuava pelo lado de fora. Um médico, espantado,
estirou a cabeça para dentro do apartamento e logo retirou. A mulher fazia todo
esforço para confortar o seu neto. O medico a olhava e depois ainda preocupado
com a saúde de Nara dizia algo por ninguém entendido. Nesse instante entrou no
apartamento uma enfermeira a solicitar ajuda para um enfermo. O homem a olhou e
não disse nada. A calamidade implantada era enfim absurda. Doutor Eurípedes
recolheu o material e seguiu de imediato a enfermeira alertando enfim a sua
futura sogra.
Eurípedes:
--- Volto já!
– disse o médico angustiado.
A auxiliar
procurou algo e não encontrou. Cruzou as mãos nas ancas e prognosticou:
Auxiliar:
--- Pronto! E
agora? – falou sobressaltada a moça.
Um moço
penetrou no apartamento e indagou:
Moço:
--- Onde está
o médico? – perguntou alarmado.
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