sexta-feira, 8 de junho de 2012

ISABEL - 10 -

- Rita Hayworth -
- 10 -
A LUTA
O movimento do bar era forte. Pela manhã, logo cedo, havia café, cuscuz, tapioca, bolo, pão e coisas mais. No decorrer do dia, a farra continuava. Era cigarro para um, cachaça para outro e a freguesia cada vez aumentava. Principalmente das damas da noite. Essas faziam seu desjejum logo cedo da manhã. E ainda havia os fregueses o Cais do Porto, estivadores, comerciários e gente mais. Isso na parte da manhã, logo cedo. De nove horas para frente havia os costumeiros mecânicos das oficinas. Certo dia, não fazia um mês de movimento, um rapaz reconheceu Otilia e veio para ela com propostas indecorosas. Ela não fez por menos. Foi para cima do gaiato, sacudiu café quente e lhe furou com um punhal. Esse punhal era de Isabel. Mas estava com Otilia. O rapaz se perdeu nas contas. Nem pensou e foi para cima de Otilia. Enquanto isso surgia outro rapaz. Esse agarrou pela camisa o desaforado e os dois entraram em luta corporal. Tudo isso, o rapaz fez em defesa de Otilia. O seu nome era Toré, pois assim os mecânicos das oficinas o chamavam.  Do bar, Otilia e Isabel olhavam a cena onde os dois homens se engalfinhavam numa briga feroz de cachorro de raça. Do lado de fora, mecânicos, prostitutas, comerciários e toda gente olhavam e assobiavam para esquentar mais a renhida luta entre as duas parecendo feras ao se atracarem por vez.
Alguns:
--- Bota pra ferver! – gritavam alguns dos assistentes da guerra infernal.
Do lado de dentro, mesmo com o furor do infernal combate, Isabel perguntava a Otilia porque começara aquela guerra de meio de rua.  E Otilia respondia.
Otilia;
--- Esse sujeito veio com propostas indecorosas! Então eu meti café quente nele! Ele se enraiveceu e quis partir para cima de mim! Eu espetei esse punhal em sua mão! Ele virou uma fera e quis pular o balcão do bar quando Toré chegou e se meteu na confusão! – relatou com deveras raiva a jovem Otilia.
Na rua:
--- Vamos ver quem vence!! – gritavam os mecânicos.
Anciã:
--- Isso é guerra? – perguntava uma anciã um tanto acorcovada ao passar pela rua e a sorrir.
A velha mulher passou tão devagar a caminhar lento, com o seu meio corpo quase a encostar-se ao ventre. Parecia mais um L ao contrário. Saias de um preto enfeitado de branco em rosas dessa cor seguia a anciã a olhar a luta desumana dos dois ensandecidos lutadores. Em determinado momento ouviu-se um estampido. Era uma arma de fogo. O agressor arrastou de sua cintura a arma de fogo e tento dispara a mesma contra o mecânico Toré. Esse em um ímpeto tresloucado reverteu à arma em direção ao agressor e esse, sem ter o certo e o errado acionou o gatilho. Foi tiro certo. A bala se cravou em sua cabeça. Na rua, o pessoal gritava:
Gente:
--- Ai meu Deus! – clamavam as mulheres com a mão a boca vendo o desfecho final.
Nesse ponto, Toré abandou a luta e viu a cena. O agressor disparou contra si próprio na ação do mecânico em se afastar da arma de fogo.  Toré era um tipo baixo, forte, entroncado ao contrario do agressor. Esse era alto e magro, porém bem disposto à luta. O impacto do tiro foi rápido.              Em um minuto a vitima sossegou de lutar. Era ela uma cruel vitima. E já sem jeito a dar, o homem estava morto. Nem sequer moribundo. Morto mesmo. A anciã a passar ao lado apenas fazia sorrir. Toré se precaveu e obedeceu aos seus amigos:
Mecânicos:
--- Foge! Foge! Foge! – gritavam seus amigos.
A duas mulheres se benziam todas e relatavam por ver o agressor abatido.
Isabel/Otilia:
--- Ai meu Deus! Matou o homem! – falaram as duas mulheres e olhar assustado com suas mãos à boca.
Em poucos minutos Toré escapuliu para local imprevisto. Era o mundo todo a querer ver o corpo da vítima ainda ensanguentada. Isabel correu com um lençol o cobriu o corpo do morto. Gonzaga não estava no local no instante da morte. A polícia foi chamada e chegou uma hora depois. O corpo jazia no chão escuro e quente. O transito de veículo foi depressa interrompido por uns assistentes do crime bárbaro e cruel. De longe se ouvia pessoas a indagar:
Pessoas:
--- Que foi aquilo lá? – perguntava alguém bastante assustada.
--- Crime! – respondia outra a meter carreira para ver de perto.
Os carros a buzinar com insistência por não poder atravessar a rua. O corpo sujo sem vida jazia no calçamento abrasador. Um homem de religião qualquer rezava em uma Bíblia ao som de hinos cantados por duas moças. Eles estavam a passar quando se deu o enlutado fato.
Com o passar do tempo, ainda no mesmo dia, Isabel foi convidada a prestar depoimento sobre o homicídio. A vítima não tinha parentes naquela hora para prestar tais esclarecimentos. Um advogado foi com Isabel e Otilia para ouvir as palavras do delegado. Elas deveras não podiam dizer nada,  pois houve uma briga do lado de fora do bar. Foi o que argumentou o advogado. O delegado se conteve com a declaração do advogado e deu o caso por encerrado para as duas mulheres. Com relação ao criminoso ele seria intimado a depor caso não fosse encontrado nas horas previstas. O bar permaneceu fechado durante o tempo da ausência de Isabel e Otilia. O corpo da vitima permaneceu no local por varias horas até ser verificado pelo médico legista. As pessoas a passar fechavam seus narizes para não sentir odor de coisa nenhuma. Era uma espécie:
Povo: 
--- Se feder?! – pensava quem passasse pelo local do assassinato.
No restante do dia, quando o bar voltou a funcionar, os comentários eram gerais. Cada qual tivesse a sua opinião sob o desfecho fatal do homem. Uns diziam isso, outros diziam aquilo. E a conversa se demorou até a noite quando o bar já estava a fechar as portas. Isabel e Otilia eram as que não gostavam de toda essa história. Otilia chegou a se estremecer por varias vezes e Isabel sempre a perguntar:
Isabel:
--- Que foi? Tá passando mal? Por que é isso? – perguntava a jovem mulher.
Otilia:
--- Nada não. É que o caso me assombra toda vez que se fala nele! – respondeu a moça.
Isabel:
--- E essa gente só sabe falar nesse caso! – declarou Isabel a fazer cara feia.
Nesse tempo Gonzaga estava no Teatro onde cumpria seu normal expediente. De qualquer forma o homem também pensava no caso, principalmente quando outro colega de repartição vinha lhe lembrar de  perguntar se havia algo para descrever. Gonzaga apenas dizia:
Gonzaga:
--- Nada não. Quem morre acaba. Só isso. – respondia o homem para desviar da conversa.
Colega:
--- Mas o negocio foi duro. Logo agora. O negócio parecia ir tão bem! – conclama outro.
Gonzaga:
--- A vida é assim mesmo. Nada não! – procurava Gonzaga encerrar o assunto de vez.
Nos dias seguintes os negócios seguiram o mesmo de outros dias passados. Isabel estava feliz por ver o negócio prosperar quando não era chuva. Em tais situações as mulheres deixavam as portas fechadas abrindo apenas a banca do barraco. Esse era mais a frente e podia atender aos clientes sem maiores transtornos. Algumas vezes, a anciã passava pelo largo do barraco de bengala e uma cesta com tralhas. Ela seguia vagarosamente por onde andava e dava seu bom dia a quem estivesse no caminho. A cabeça coberta com um pano e a roupa longa sempre escura, era a forma de se vestir e caminhar para o largo de onde ninguém podia saber. A anciã era de seus oitenta anos e caminhava muito lenta como se tivesse mais longa idade. Se alguém lhe dirigia a palavra a chamava de minha vó. E nada mais. Se fosse tempo de chuva a pobre anciã caminhava sem pedir abrigo a quem pudesse dar. Não raro, a anciã parava e olhava em volta a procura de alguma coisa ou de alguém. O pessoal a olhava e alguém dia apenas:
Gente:
--- Lá vai minha vó. – dizia-se isso com uma voz dolente como de pena.

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