segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

"NARA" - 03 -

- Katie Holmes -
- 03 -
PEIXE
Quando terminou o expediente às cinco horas da tarde e todos os funcionários começaram deixar a repartição onde trabalhavam, seu Antônio Sisenando, marido de dona Ceci, também saiu tomando a direção do Canto do Mangue onde a peixaria era franca para se vender e comprar. Ao transitar pela rua encontrou um velho amigo. Esse disse ter naquele dia Reunião na Maçonaria, como se Antônio Sisenando não soubesse. Mesmo assim Sisenando agradeceu o lembrete e passou a frente. No momento o homem perguntou a Sisenando:
Homem:
--- Pra onde vai? – indagou de forma sem entender o cavalheiro.
Sisenando:
--- Canto do Mangue! – respondeu com pressa o senhor.
O homem perguntador então sorriu e disse ainda:
Homem:
--- Xarias! – falou bem alto o arteiro homem.
Porém Sisenando nem deu importância e seguiu em frente atravessando ruas e becos, até mesmo a Rua 15 de Novembro onde a “matança” já tomara conta do ambiente. Naquela rua era o reduto das prostitutas da cidade. Damas da Noite. E Sisenando se lembrou do seu tempo de mocidade e da feira da Tatajuba, ambiente singular. A Tatajubeira era uma árvore frondosa onde as mulheres colocavam à venda cuscuz, munguzá, bolos de milho e de outras espécies. Tudo era servido acompanhado do café. Eram seus habituês os homens das Docas e empregados das lojas da Ribeira além das próprias prostitutas do Beco e da Rua 15.  Um carro passou bem rápido a sacudir lama nas calças de Sisenando. Esse se virou e soltou um grito desaforado para o motorista. Um magarefe a passar apena sorriu e disse a Sisenando:
Magarefe:
--- É assim o dia todo. – sorriu o magarefe enquanto Sisenando limpava com o lenço o abainhado da calça.   
Sisenando:
--- Puto que ele é! – revidou o homem a limpar a calça. Ele bem mal humorado.
Um carregador passava pelo mesmo local de gritava para se ouvir:
Carregador:
--- Olha o Melado! Olha o Melado! Olha o Melado! – gritava o carregador conduzindo na cabeça um balaio cheio de frutas.
As Damas da Noite já transitavam pelo ambiente da Rua Duque de Caxias. Essa rua cortava a Rua 15 onde mecânicos fechavam suas oficinas ainda a funcionar na artéria das mulheres damas. O Banco do Brasil já estava fechado. Alguns magros servidores ainda estavam no local concluindo o serviço da tarde. Na rua à frente Sisenando pegou destino do Canto do Mangue, local infestado de mau cheiro provocado pela lama da redondeza. E isso fez o homem lembrar ser o local do pé de pau no meio da rua e a lama a tomar conta de tudo. Ele atravessava a passos rápidos a Esplanada Silva Jardim, outrora local de porto. E ele lembrou assim mesmo de um barco atolado à margem da rua onde se erguia a Alfandega. Os Carteiros deixavam a Repartição dos Correios e uns moços começavam a entrar no seu novo emprego. Eram os estafetas. Esses assumiam o trabalho às seis horas da tarde. Um boteco estava aberto para atender aos velhos e novos funcionários a servir refresco com pão doce e coisa mais.
Ao chegar ao Canto do Mangue, bem distante da Repartição dos Correios, o homem passou a examinar a peixaria alí posta. Peixe de toda a classe. Guaiuba, cação, galo do alto, dentuço, arabaiana, xarel e mesmo a cioba, peixe de segunda classe. Porém, para Sisenando era um bom pescado, quase sem espinhas. Após examinar uns e outros, ele preferiu a cioba e indagou o preço. Ao saber de tanto custo o homem se alarmou:
Sisenando:
--- Caro! Você vai enriquecer! – largou o homem com olhos esbugalhados.
Vendedor:
--- É a carestia patrão. – sorriu o vendedor com um facão na mão a despachar para outros.
De um modo ou de outro, o homem escolheu duas ciobas deixando de lado os serigados, guaiubas, cangulos e outros tipos cujo estilo não lhe faziam fé. Tudo isso era feito à beira do rio onde meninos colhiam as ovas e peixes miúdos. O dia já era quase noite quando Sisenando se largou em busca do bonde a trafegar na Esplanada Silva Jardim e dali tomar a direção da Cidade Alta a passar pela Rua Frei Miguelinho e coisas mais.
Em casa, a moça Nara estava a cuidar do recém-nascido e a ouvir a sua mãe lhe contar da tragédia ocorrida quando dona Ceci saiu de casa para rezar um terço na Catedral. A mulher contava tudo sem receios esperando ter o garoto tratamento mais adequado e se salvar do calamitoso acidente. Dona Ceci reclama do calor e olhou a criança aos braços da filha. Quis saber dona Ceci de quem era a criança. Nara não sabia ao certo. E disse apenas ser de uma moça. A sua amiga tinha saído a procura de fraudas na bodega próxima, pois a mãe da criança não tinha nada para cobrir o bebê.
Ceci:
--- Socorro? – perguntou desconfiada a mulher.
Nara:
--- Parece. Laura me disse ser Socorro. A mocinha não tem nada. A mãe é abusada. O pai dessa menina só vive embriagado. E de qualquer forma, eles não querem ver nem de perto a criança. Coitada! – disse Nara a olhar criança em seus braços a ninar para um lado e outro.
Ceci:
--- Essa mãe não é uma que andava a pedir roupinhas para seu filho? – indagou a mulher.
Nara:
--- Não sei. Quem é a menina que pedia roupas? – indagou a moça a acalentar a criança.
Ceci.
--- Não sei. Apenas ela procurava roupas. – respondeu a mulher a olhar por mais uma vez a criança.
O tempo passava e Nara cuidada da criança. De Laura não se ouviu mais falar por àquelas horas. O pai de Nara chegou apressado pedindo o café enquanto ele se cuidava para ir a Maçonaria. Calça, camisa, paletó, gravata, meias, sapatos e uns trocados. Tudo estava sobre a cama no quarto de casal. Na mesa, os peixes e a recomendação.
Sisenando;
--- Almoço de amanhã. – relatou o homem.
Nara estava em seu quarto tomando conta do bebê. Ela não saíra até àquela hora a espera de Laura, sua amiga. Mas a moça não retornara da bodega onde fora. A criança fez um choro curto enquanto Nara afagava. Esse miado o pai ouviu. E de imediato perguntou:
Sisenando:
--- Gato? Tem gato novo aqui? – indagou com espanto o homem.
Ceci:
--- Menino! – respondeu a mulher.
Sisenando:
--- Que? Menino? De quem? – perguntou outra vez de modo estranho.
Ceci:
--- Está com Nara. É um menino. Uma amiga deixou aqui. – fez ver a mulher.
Sisenando:
--- Amiga? Deixou? Ora! Mas por que você não disse? – arrematou por cima o homem
Ceci:
--- Foi mais tarde. E eu nem estava em casa. Eu vi a criança quando eu cheguei da Igreja. – falou a mulher a guardar o pescado dentro da geladeira.
 

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