sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

"NARA" - 05 -

- Marjorie Estiano -
- 05 -
NETO
Na tarde daquele dia Nara seguiu o conselho de sua vizinha e foi levar o bebê Sisenando, ele e a sua mãe Ceci, para o médico auscultar a criança e lhe receitar algum medicamento se fora necessário. O avô da criança cuidou logo do registro e deu o certificado de ‘filho legítimo’ à criança. Tudo era orgulho na casa de Neto, pois assim passa o garoto a ser chamado, pois o pai de Nara era igualmente chamado Sisenando, apesar de ser esse um segundo nome, uma vez ser Sisenando chamado de Antônio. Então o querido filho de Nara foi ser chamado Sisenando de Almeida Neto, retirando-se qualquer nome da sua avó. Como a amiga de Nara não deu mais notícias e a tal Socorro não se sabia ao certo quem era Neto ficou como filho legitimo da moça, mesmo sem ter nome de pai.  No registro dava-se por desconhecido o nome do pai.
À tarde daquele dia Nara já estava na sala de recepções do médico doutor José Ivo para consultar o rebento. Ao saber do nome da criança, doutor José Ivo disse ter ele o nome significativo,  pois sua origem era teutônica.
Doutor Ivo:
--- O rebento tem nome significativo. É de origem teutônica. Significa: “protetor vitorioso”. – relatou o médico ao auscultar o neném.
A ‘mãe’ do recém-nascido sorriu um pouco acanhada, uma vez não saber aquele nome ser ‘teutônico’.  O médico notou o acanhamento da mãe e voltou a dizer ser o nome de origem alemã. Então a moça sorriu e se sentiu compensada. Em continuação o médico indagou quem era o pai da criança. A moça de recolheu alguns segundos e logo falou:
Nara:
--- Ele não tem pai. Somente mãe. Sou eu. – confessou a moça de um só jeito.
Doutor Ivo:
--- Ah bom. Mas já foi registrado? – indagou o médico de cabeça abaixada.
Ceci:
--- Sim. O avô da criança já o fez. – falou com pressa dona Ceci.
Doutor Ivo;
--- A senhora tem religião? – indagou ainda escrevendo o médico.
Nara:
--- Católica. – falou com pressa a moça.
Doutor Ivo:
--- Já batizou a criança? – perguntou solene o médico.
Nara;
--- Sábado que vem. Eu vou a Catedral. – falou com pressa a moça.
Doutor Ivo;
--- Ótimo. (sorriu o homem). A criança está ótima. Vamos receitar um remédio para cólicas. A senhora deve dar sempre que a criança chorar. Claros que não vai ministrar quando criança estiver com “fome” ou querendo braço, ou esteva com calor, ou ouvindo zoada. Apenas por questão de dores intestinais. .... Pronto. Nobre “seu” Sisenando! – sorriu outra vez o médico dando a receita à mãe do menino.
Logo à noite, seis horas, as “beatas” chegaram à residência de Nara para cantar a ladainha e rezar o terço de modo a espantar “olhados” e outros males. Com pouco de tempo chegava a sua residência o senhor Sisenando, molhado de suor e teve de ouvir as preces das “beatas”, caso a não dar deveras importância. Mesmo assim, se era para o neto, tudo era bem vindo. Ele se ajuntou ao bebê quando a sua mulher Ceci o repreendeu a dizer:
Ceci:
--- Vai lavar as mãos! Não estas vendo todo molhado de suor? – beliscou de leve a mulher com o rosto rude.
Sisenando:
--- Verdade! – e depôs o bebê no seu “balanço” seguindo depressa para tomar seu banho.
Entre conversas e outras, Sisenando contou ter ouvido dizer de um Yate abatido por um navio durante a madrugada. Fazia serração no Oceano Atlântico  e o navio não percebeu o barco de tão pequeno que era.
Ceci:
--- Morreu alguém? – indagou a mulher sem muito alarde.
Sisenando:
--- Não sei. Encontrou-se o capitão pela manhã, em uma boia. Os pescadores recolheram o homem e o trouxeram para a praia de Areia Preta. – discorreu o homem com angustia.
Ceci:
--- Ele sozinho? – indagou a sua esposa.
Sisenando:
--- Sim. Porém não se falou em ter mais sobreviventes. Ele não podia estar sozinho. É o diabo. – comentou com angustia o homem.
Ceci:
--- O jornal deve trazer matéria amanhã. – falou a mulher arranjando a mesa do jantar.
No sábado à tarde, por volta das quatro horas, Nara já estava na Catedral acompanhada do seu pupilo, Neto, de sua mãe Ceci, do pai Sisenando, dois padrinhos e madrinha e pouca gente presente, comum em frequentar a Igreja àquela hora da tarde, principalmente nos sábados. O padre cumpriu a cerimônia tão rápido como começou. Ao ser indagado da saúde o coroinha, o sacerdote respondeu estar bem.
Sacerdote:
--- Foi apenas um susto. Nada de mais. Ele é esse. – apontando a cara do garoto com um curativo ainda na cabeça feito no hospital.
Ceci:
--- Fico feliz por não ter havido sequelas. – sorriu a mulher e abraçando o garoto com afago.
Sacerdote:
--- Essa senhora foi quem te salvou. – revelou o sacerdote ao coroinha.
Ceci:
--- Não, padre Mario. Eu apenas socorri o garoto. Ele é um garoto de sorte. – sorriu Ceci abraçada ao menino.
Sisenando:
--- Garoto de sorte. Duro na queda. – sorriu o marido de Ceci.
Todos os presentes sorriram e Nara caminhou para a saída da Igreja a levar seu filho nos braços com as vestes apropriadas para um dia importante da vida de um cristão católico. Na Catedral, presente estava entre pilares, Laura, a moça. Ela foi quem deu o menino para criar a sua amiga Nara.  Em determinado instante Laura saiu furtiva sem as pessoas notarem. Desta forma Laura resolveu um caso interrompido. As pessoas presentes ao batizado de Neto passado a ser chamado Sisenando de Almeida Neto, acompanharam a pequena porção de gente indo até a residência de Nara onde a moça já havia preparado uma simples recepção. Algo como ponche e bolos. Os bolos, alguns pequenos, foram adquiridos com certeza a uma senhora moradora perto da residência de Nara. A senhora fazia bolos de encomenda. A festinha de Neto durou até às seis horas da tarde quando as “beatas” foram rezar o terço e fazer as cantorias de forma. A noite desceu rápida e o sereno começou a fluir sobre os tetos das casas da Rua Santo Antônio, a mais antiga rua existente da Cidade Alta, também conhecida como Rua da Água. Um touro mugiu sereno,  pois era a vez da matança do gado no açougue da Rua Salgadeira, por onde andavam as mulheres a fazer o salgado das vísceras do gado morto. Logo abaixo, o trem apitou anunciando sua vinda a Estação da Estrada de Ferro. Dia de sábado, muita cachaça na Feira do Paço para os bêbados da noite. Bem acima, ficava o velho Quartel da Polícia. Antes, muito antes, naquele local funcionou o Hospital da Caridade. Mulheres de vida alegre faziam a festa nos salões de um casarão existente logo no início da Rua Padre Pinto, uma depois da Rua Santo Antônio. A cidade dormia tranquila na noite do batizado de Sisenando Neto.

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