quinta-feira, 8 de agosto de 2013

"DEUS" - 33 -

- DEUS -
- 33 -
VIAGEM
Todo atrapalhado de modo a procurar a bendita chave, o Monge Euclides nem prestou atenção quando o outro Monge se aproximou. Quando o viu, esse Monge ainda estava distante de sua Cela. Ele estava por demais com pressa a olhar para cima da porta onde a santificada chave poderia se encontrar. O melancólico cantochão se podia ouvir de muito longe onde os Monges beneditinos declamavam a uníssono as preces monofóbicas utilizadas nas liturgias cristãs. Era um cantar de origem pagã ligada a um deus grego. Historicamente, diversas formas de ritos cristãos, como o gregoriano, organizaram a música utilizada em repertórios a partir de qual fizessem parte. Formadas principalmente por intervalos próximos as melodias do cantochão se desenvolviam suavemente. O cantochão é sem dúvidas o principal fundamento da chamada música ocidental. E em sua melancólica procura o Monge Euclides nem deu por perceber a figura aparentemente magra do outro Monge. Ao se acercar da porta fechada da Cela, o Monge magro, piedosamente perguntou a Euclides:
Monge-1
--- Deus seja louvado. Procuras a tua chave? – indagou o monge-um com a sua voz delicada e rouca.
Euclides:
--- Bom tarde Senhor Monge. Deus seja louvado. Pois é. Eu busco a chave e não a encontro. – recitou
Monge-1
--- Vos estavas a viajar. Eu fiquei com a chave. Durante todo esse tempo muitos noviços  usaram o teu aposento. Eles chegavam e saíam. Quanta lamúria. Deixa me ver qual destas. – e buscou no monte de chave a adequada.
Após um longo instante o Monge-1 a encontrou entre molhos. Euclides, o também Monge, ficou admirado com o ancião, pois a sua debilidade não dificultava a ele enxergar, uma vez não ter nem óculos. Euclides olhou bem para o rosto do Monge e pode ter certeza de que ele não usava óculos como era habito dos demais ter a marca nas narinas.  E se pôs a agradecer de verdade.  O monge debilitado indagou por vez.
Monge-1
--- Como vos fostes na viagem? – indagou com voz debilitada.
Euclides:
--- Foi normal. – disse Euclides sem saber do que falar.
Monge-1
--- Fostes a Roma? – indagou o Monge a guardar no bolço o molho de chaves.
Euclides:
--- Não. Não fui. Fiz meus estudos em Madrid. – suava como nunca ao dizer tal fato.
Monge-1
--- Ah! Madrid. Eu nunca tive a oportunidade de conhecer. Mas, algum dia, talvez eu esteja a visitar a velha metrópole.
Euclides:
--- É de um sossego colossal. – relatou envergonhado com tanta mentira junta.
E o velho Monge saiu com vagar a recitar o nome da cidade.
Monge-1
--- Madrid, Madrid! Velha cidade. – dizia o ancião como se estivesse contando o tempo para viajar à acabada Cidade.
Euclides, o Monge, fincou a chave e abriu sua Cela. Aparentemente, tudo normal. A não ser um aviso posto no birô de estudos do Mosteiro. Era um aviso sem grande importância de algum aluno de tempos remotos. Outro aviso era o de não deixar a vela acesa. E mais outro. Dizia: “O tempo é imenso”. Ele ficou a imaginar.
Euclides:
--- Quem teria posto este aviso? Imenso? Por quê? – indagou sem jeito o Monge novo.
Ele folheou mais uns documentos sem alguma importância. E teve um o qual definia: “O Princípio”. E ele pôs-se a ler com mais tranquilidade. O Sol já estava a cair no horizonte. Era o inicio do fim do dia. As árvores frondosas do parque do Mosteiro deixavam o seu inebriante e acalentador perfume. Pássaros canoros já procuravam os seus ninhos de dormidas para o seu sossego da noite. Esquilos volteavam as grandes e formosas árvores a um só espaço. Um gato se soergueu de leve como a espichar o corpo peludo e enegrecido. Um cão ladrou intermitente para alguém a passar junto ao seu habitat. Nuvens esvoaçantes mergulhavam à tarde no domínio da solidão silente. Os acordes da serra em brumas eram um calar enegrecido e dorido. A paz não tardava a chegar. E nesse instante de angustiante oração, Euclides, o monge, passou a verificar por todos os locais do maciço documento onde estava algo a identificar a estranha frase. Após averiguar de todas as formas o envelope o Monge se agachou para ver se tinha deixado cair algo no chão. Nada não. E com isso Euclides, o Monge, desistiu de se aventurar da procura e deu de mão.
Euclides:
--- Deve ter sido de alguém a pernoitar nesse cômodo. – disse o Monge ao desengano.
Às seis horas da tarde era o tempo a oração para os Monges Beneditinos. Euclides, o Monge, abriu a porta de sua Cela, como todos os demais, e entrava no corredor estando presente na Sacristia de São Simplício a aguardar o inicio das orações. A Sacristia ficava próxima à Igreja onde os Monges se reuniam para então fazer as suas orações noturnas. O Canto por parte do grupo a entoar o Cantochão sinal de entrada de todos os demais no interior da Santa Igreja. Á frente de onde se encontrava o Monge Euclides estava também a Sala do Capítulo e ao seu lado esquerdo a própria Igreja onde o grupo de Monges entoava o Cantochão. Para o Monge tudo aquilo parecia uma novidade algo como de quem nunca tinha visto ou visitado. De momento algo esquisito se passou em sua mente como de estar à vez primeira em um Mosteiro. Pelo tempo passado, Euclides já era um Monge, com a precisa exatidão. De algum modo, o Monge de Astúrias nada percebeu de estranho em seus trajes. E se voltava para um e outro lado a conferir o seu vestir. Por fim ele logo prestou atenção ser um Monge “branco” com certeza. Suas vestes estavam de acordo. No final da Hora Santa o Monge entrava no refeitório dos demais Monges. E tudo aquilo era um pouco diferente. O refeitório dos Monges ficava bem adiante do refeitório dos Conversos, algo que Euclides nunca percebera. Esses tais conversos eram os Cristãos-Novos, judeus e mulçumanos convertidos ao Cristianismo. Eles faziam a diferença dos Cristãos-Velhos ou Cristão-Puros, um conceito meramente ideológico. O monge lembrou por instantes do velho amigo Ambrósio. Esteve atarantado durante algumas horas e de Ambrósio se esquecera. A essas horas da tarde/noite a cabeça de Euclides girou forte. O Monge morrera há cinco anos e ele soube apenas a algumas horas passadas. De Astúrias não queria acreditar naquele impasse da vida. Para ele era tudo um sonho. A morte do seu tutor não devia ter ocorrido. De Astúrias passara alguns minutos de viagem a Madrid. Minutos a se estender em anos. A Sacerdotisa levou meia hora apenas para Euclides conhecer Madrid. Meia hora e duraram cinco anos. Uma tristeza vagou por seu espirito. Ele não mais acreditava na verdade. Ambrósio não morrera, talvez. Aquilo era apenas ficção, invenção, torvelinho do pensar. O Monge Ambrósio devia estar mais à frente dos demais. Era o que Euclides pensava então. O vento morno quase frio começava a sopra do leste com uma lufada de colher, com efeito, tudo em sua volta. Os Monges entoavam cânticos de gloria onde todos começavam a penetrar no recinto do Templo. Santuário para Euclides muito estranho por demais. No interior do silencioso Templo havia apenas os monges beneditinos, os noviços e os Conversos. E os cantores juntos na entrada onde havia o órgão, uma obra prima com seus 628 tubos. Órgão da antiga Ermida de um templo cristão. Seus foles de ar eram movidos a um motor recentemente adquirido. Antes, o órgão funcionava a força braçal. Seus tubos eram de fabricação francesa. Sua estrutura era feita de jacarandá, madeira própria para o feitio do instrumento. Arcos ogivais adornavam sua frente e se erguiam até a altura da rosácea frontal como exigiam as regras da arte. O Santuário de São Simplício tinha vários altares, além do altar principal e do altar da Celebração Eucarística. Além do mais, dois altares barrocos, ricamente pintados. Esses altares ficavam logo na entrada do Santuário. Em um deles, à direita, encontrava-se a imagem de Nossa Senhora dos Anjos. No outro, à esquerda, estava à imagem do Sagrado Coração de Jesus. Ao longo da Igreja, encontravam-se outros dez altares, cinco de cada lado. Mereciam destaque, no interior do Templo, os vitrais franceses do presbitério. Nele se percebe abaixo o Menino Jesus. Da esquerda para a direita, os vitrais retratavam o nascimento de Jesus, a apresentação do Menino Jesus no Templo por seus pais, o Menino Jesus com 12 anos no Templo discutindo com os doutores da Lei, o Menino Jesus e seus pais trabalhando em Nazaré e as Bodas de Caná.
Simplício nasceu em Tivoli e governou a Igreja de Roma como o seu 47º Papa. No oitavo ano do seu pontificado ocorreu a queda do Império Romano. A bela imagem barroca de São Simplício era uma peça única, talhada em madeira, tendo suas roupas ricamente pintadas. Quando todo o Templo estava repleto com os seus Monges,  - alguns convidados – deu-se o inesperado com Euclides. Ajoelhado em seu banco à direita, ele enxergou de uma parte do lado esquerdo a figura de um Noviço o qual algo de horas o avistara em algum lugar. Parecia uma imagem duplicada de um noviço conhecido em alguma parte do Santuário ou mesmo em outro local. Temeroso com a estúpida visão Euclides de Astúrias procurou a desviar a visão e se encolher mais ainda em seu banco de madeira. Outros Monges passavam calados e orando pelo centro do Templo, todos de mãos postas, orando, e ele aproveitava para enxergar o noviço, rapaz que não o conhecera antes, no Mosteiro. Com muita precaução o Monge se soergueu do seu banco e, com muita cautela, atravessou para o outro lado até se por pelo lado de trás do noviço e a ele perguntar:
Euclides:
--- De onde está vindo irmão? – indagou o monge o noviço.
O noviço se assustou e de momento compenetrou-se de cabeça abaixada para então responder a indagação feita:
Noviço:
--- Tramuntana, senhor Monge. – respondeu acanhado o noviço.

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