terça-feira, 27 de agosto de 2013

"DEUS" - 41 -

- O DIABO -
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O DIABO
À tarde daquele mesmo dia, o Abade Euclides de Astúrias já estava em seu gabinete onde então ele costumava passar a maior parte do tempo a ler os estudos mais profundos de teologia. De momento, o Prior esquecera-se de passar na Biblioteca, onde havia um monte de livros antigos, alguns dos quais já bastante desgastados pelo tempo e pelo mau uso dos outros Monges ou Monjas, por certo. Das monjas ele pouco se lembrava, a não ser de uma muito bela e de um encanto terno e copioso. De todas as Monjas era essa que ele se lembrava de quando em quando por sua forma esguia de ser. Porém o seu pensar era momentâneo, pois não queria ele nutrir aforismos vãos por aquela boneca sensual como parecia demonstrar. E por tal motivo, não raro estava o Abade a fazer o seu suplício quando só por se lembrar de algo impróprio para o mesmo. Chovia a cântaros aquela hora da tarde como se o tempo mudara de repente. Pelos cálculos do Abade já era tempo de inverno. E, portanto já era tempo de chuva por um pedaço de tempo durante o ano. Três meses eram mais o certo. Esse período fez lembrar o Prior seus ternos tempos de aconchego nos braços de sua mãe quanto ainda era criança dos seus cinco a seis anos. Se não podia sair de casa, então ele dormia de forma confortável ao colo de sua amada genitora. Lembranças, lembranças, lembranças.
A ouvir o canto solene dos Monges o Abade então buscou de imediato a brochura a qual ele mesmo guardara horas antes, quando próximo do almoço. E a rebuscar a chave verdadeira no molho em seu bolso, o Abade viu cair uma nota onde o mesmo lembrava ter de buscar certo livro sobre o enigma de bruxaria. O abade pôs o aviso novamente no bolso e catou o seu verdadeiro Grande Livro do Diabo. Após retirá-lo do compartimento secreto da estante e buscou assento na sua mesa de trabalho onde se espojou como pode. E devorou como pode A Bíblia do Diabo. Aquele era o maior manuscrito medieval existente. O livro que já foi considerado a oitava maravilha do mundo. Com noventa centímetros de comprimento e setenta e cinco quilos e, dentro dele, histórias antigas, curas medicinais e feitiços.
Depoimento:
--- Ele contém uns textos grandes de nenhum outro lugar. É o objeto mais peculiar, mais estranho, mais fascinante, mais bizarro e inexplicável.
Mais o livro é bem mais do que isso. O Códice exerce uma atração quase sobrenatural. Cobiçado pelos poderosos, roubado como espólio de guerra, mantido em segredo por um Santo Imperador romano durante toda a sua história o Códice inspirou medo e uma obsessão por sua posse. Hoje, o magnetismo do livro continua tão forte quanto antes. Embora ele seja mantido permanentemente na Suécia em 2007, pela primeira vez em quase quatrocentos anos, o Códice voltou para a sua terra natal: a República Checa. Milhares de pessoas foram até lá para vê-lo. O evento ganhou as manchetes internacionais. Poucos livros já causaram tamanha sensação.
Depoimento:
--- Não há dúvidas de quem ler esse livro não pode deixar de perceber que ele tem um certo poder.
E por trás disso tudo existe uma força diabólica. Uma figura única e sinistra: Satã. O Códice sustenta uma figura do Diabo numa página inteira. Nenhuma outra Bíblia no mundo trás uma imagem tão bizarra do mal encarnado. Ninguém sabe quem a criou. Nem porque ela está no exemplar do livro. É uma figura extraordinária e incomum. É inesquecível e assustadora. Talvez intencional. E não é só isso. Sombras inexplicáveis envolvem apenas as páginas ao redor da figura satânica. E o Códice é o único livro que coloca o Antigo e o Novo Testamento ao lado de encantamentos sagrados e violentos. Feitiços e exorcismos demoníacos. Embora ninguém siba sua idade exata, uma citação, no livro, revela a data provável do seu término: 1230. Desde então durante oito séculos duas perguntas importantes tem perseguido o Códice: Quem o criou? E por quê?. A caligrafia do livro é surpreendentemente consistente. Poderia vários escribas trabalhados juntos? Ou o livro teria exercido o trabalho de um único autor? A maior parte de um livro foi escrita por uma pessoa. Duas ou três também trabalhando juntas. Mas a Bíblia do Diabo parece ter sido escrita pelas mãos de um único escriba. Mesmo se o Códice tivesse sido trabalhado por uma só pessoa dá a impressão de um problema ainda maior: TEMPO. O livro de tal magnitude levaria décadas para ser escrito. O único autor envelheceria, ficaria doente, perderia parte da visão e da coordenação. Pós pagina após pagina o livro se apresenta perfeito e os estudiosos observam que ele não tem erros nem omissões dignos de nota. Quem poderia completar uma tarefa tão formidável? Os especialistas acreditam que o manuscrito detenha as pistas para revelar seu misterioso criador ou criadores. Mas séculos atrás os primeiros a verem o Códice acreditaram que havia apenas uma explicação. Eles deram início a uma lenda que existe até hoje: a de que o Códice foi escrito por um monge condenado que vendeu a alma ao DEMONIO.
1230. A história começa num remoto Monastério, na Bohemia. Em uma Cela escura um Monge implora por sua vida. Ele está em sérios apuros. Seu pecado violou uma regra monástica sagrada. Algo tão ofensivo que foi mantido em segredo. Ele é um beneditino chamado de: “Os Monges Negros”. Seus trajes funérios simbolizam morte a o mundo terreno. Eles fazem voto de pobreza, castidade, obediência e suportam cruéis sacrifícios físicos como roupas infestadas de pulgas. Jejum, privação de sono e a autoflagelação. Mas os fracos acabam caindo em tentação. Gula, Inveja, depravações sexuais. As punições são extremas: confinamento em solitária, ódio, excomunhão ou pior: em algum lugar do Monastério os mais velhos decidem se o Monge que cedeu às tentações deve viver ou morrer. As notícias são terríveis dessa vez. O monge será condenado a uma morte lenta.  Tijolo após tijolo, ele será emparedado vivo. O condenado teme a tortura que está por vir. Mas ele tem uma inspiração divina: Ele escreverá o maior livro daquela época que conterá a Bíblia e todo o conhecimento humano e então irá glorificar seu monastério para sempre. E para provar seu martírio, ele escreverá essa coleção colossal numa só noite. Os mais velhos zombam dele. Mas como o Monge é insistente eles concordam em deixa-lo tentar. Mas seu decreto é claro. Se o livro não terminado pela manhã, o Monge enfrentará a morte certa.
Página após página o Monge escreve até sua mão ficar dormente. Mas, a meia-noite a morte começa a se aproximar, pois ainda falta muita coisa. Então, na mais escura das horas ele faz um pacto profano. Pede ajuda do anjo caído: SATÃ. A lenda conta que o anjo respondeu ao chamado do Monge. Assim como os Evangelhos foram criados pela mão de Deus, o Códice Giga foi criado pela mão do Diabo.
 Em Estocolmo, Suécia:
 A Biblioteca Nacional Real. - O lar moderno do Códice Giga. - Qualquer exposição prolongada à luz, ao calor e a umidade poderá causar danos irreparáveis ao livro. Ele esteve sempre coberto por um pano. Pela primeira vez na história uma equipe internacional planeja desvendar o Códice Giga. A equipe esteve reunida fazendo análise do texto, ilustrações, manuscritos e testes com pigmento de papel. Eles procuram desvendar a história por trás da Bíblia do Diabo. Agora, a equipe sueca se prepara ver o códice como poucos o viram. A Biblioteca submete a uma regra rígida e uma segurança severa no local. A equipe só dispõe de alguns dias. Um acesso como esse é raro. Mas para identificar o criador do Códice a equipe precisa encontrar evidencias concretas no livro propriamente dito. Um suporte de noventa centímetros trançado à mão enquanto sustentam os setenta e cinco quilos do livro. Os Monges costumavam misturar suas próprias tintas usando materiais e técnicas específicas. Procura-se observar uma assinatura química no Códice. A mistura de tintas comuns a avaliações normais nas fórmulas dos pigmentos. Um identificador de tinta pode ser utilizado para descobrir o principal ingrediente. Tintas medievais se decompunham em dois tipos principais: as feitas de metal e as feitas de ninhos esmagados de insetos. Se o Códice for a um trabalho de um só escriba ele deve ter feito em um só tipo de tinta. O escaneamento com a luz ultravioleta é como ter uma visão de raios-X. Posicionando a luz ultravioleta sobre o Códice os cientistas procuram o brilho fosforescente. As tintas com base de metal brilham intensamente no escuro enquanto que as tintas de ninhos de insetos são muito menos intensas. O que se observa é uma tinta meio marrom que não brilha tanto. A evidência é clara: o Códice foi escrito totalmente com tinta de inseto. Dado o consistente acesso de um Monge aos mesmos materiais é altamente improvável que um escriba usaria dois tipos diferentes de tinta. Essa consistência na tinta ajuda a sustentar a teoria de um único autor para o Códice. Mesmo assim a descoberta surpreende. Com um escriba pode ter sido capaz de completar um trabalho tão colossal? A análise forense apenas começou.
À medida que o mistério do Códice Giga se intensifica a equipe fica mais determinada a descobrir a verdade e revelar o criador do único livro sagrado já atribuído ao Demônio. Para começar a entender o Códice Giga – A Bíblia do Diabo – é preciso explorar o mundo que o criou. Antes da Ciência, antes do esclarecimento, a alta Idade Média foi atingida por terríveis fenômenos. Desastres naturais, Guerras, doenças mortais e superstições. As pessoas eram vítimas de mitos perturbadores. Traçar a verdadeira história do Códice trás uma visão arrepiante para dentro de um dos capítulos mais volátil da história humana. Outras pessoas em épocas tão turbulentas que possuíam o livro geralmente enfrentavam alguma tragédia. E essa começa com o Mosteiro condenado e com uma epidemia letal.
Bohemia, final do século XIII. Várias décadas haviam se passado desde que a lenda sobre o Monge que venderia a sua alma para escrever a Bíblia do Diabo foi contada. Agora esse enorme Livro é famoso. Mas o Monastério que o possui está em péssima situação financeira. Para evitar a falência os Abades concordaram em vender o Códice para outra Ordem Monástica. Ser o dono de um Livro como aquele trazia uma posição de status honra e prestígio. Ironicamente, o manuscrito passa dos chamados Monges beneditinos ou “Monges Negros” para uma Ordem que vestia branco chamado “Os Monges Brancos”. O Códice vai para o seu novo lar: o Monastério na cidade de Sedlec aos Cistercienses. Os Monges Brancos colocam o famoso Códice no lugar de ordem, perto de um cemitério consagrado como a Pedra do Calvário, o local de crucificação de Jesus. Mas, não por muito tempo. Veio à tragédia. Os que cuidavam da Bíblia do Diabo ficaram na ruína. Um poderoso Bispo ordenou que os Monges Brancos devolvessem o Códice ao seu lar original e, logo depois, o Mosteiro foi devastado por uma epidemia mortal: a peste bubônica. A Morte Negra arrasou a região matando dezenas de milhares de pessoas. O cemitério ficou lotado de corpos. No fim da epidemia mais de trinta mil cadáveres haviam transformado o local em uma catacumba.
Hoje, o Monastério se tornou um museu macabro. A Capela dos Ossos. Uma das sepulturas mais famosas de toda a Europa com escultura de ossos, um candelabro de ossos e até uma taça de ossos. O abominável lembrete do segundo capítulo na história da Bíblia do Diabo. E as investigações continuam sobre o autor do Códice. Um busca por pista leva os cientistas diretamente ao famoso retrato do Diabo. A figura do Satã no Códice é examinada. Metade homem, metade monstro chifrudo com uma língua vermelha assustadora e punhos erguidos. Ele veste uma pele como símbolo ostentoso de poder supremo. Os que acreditavam na terrível lenda devem ter imaginado que foi esta entidade quem levou a alma  do escriba condenado.
Abade:
--- Que horror! Chega a dar arrepios! – falou assustado o abade.
E de imediato se levantou da sua escrivaninha para lacra a única veneziana ainda a estar aberta para fora, onde o temporal se tornara mais assustador. O Abade tremia todo e aos poucos se lembrou da mortandade havida um cemitério da vila onde ele, nesse tempo não estava. Ouvia contar pelos Monges idosos do Mosteiro.

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