- Monica Vitti -
- 28 -
SUPRESA
Por volta de duas horas da tarde,
Renovato Alvarenga e a sua companheira de vagar, Ludmila se apearam de suas
montarias em frente à estrebaria e por lá deixaram os cavalos aos vigiados de
um cuidador de equinos. Os animais estavam exaustos e Renovato deu uma tapa nas
ancas do seu animal como forma de carinho. Ludmila fez por igual. Ao percorrem
o espaço para a casa grande, depressa estava a moça Emília a correr e declarar
a Renovato:
Emília:
--- Tem visita para o senhor! –
falou sorrindo a moça.
Renovato:
--- Para mim? Quem diabo pode
ser? – e olhou depressa para Ludmila com forma desconfiada.
Emília:
--- Vá lá! Vá lá! Está bem à
frente do casarão. Venha! – e puxou Renovato pelo braço.
O homem se inquietou e quis logo
saber de quem se tratava. A moça sorriu e falou:
Emília:
--- Corra homem! É surpresa! –
sorriu a donzela de forma angustiada por tão demora.
O pistoleiro não era acostumado a
visitas de surpresa e até mesmo ainda pegou nas suas cartucheiras para
verificar o estado das mesmas. O empurrado da garota era mais atrevido e
Renovato fazia todo o possível para se largar de Emília a qualquer custo. Mas,
isso era em vão. A tarde estava quente por demais e o suor nas costas dava a
impressão a Renovato de menos chuva e mais calor no correr do dia. Além do
mais, a garota tinha o dizer para ele de:
Emília:
--- O senhor precisa de um banho!
Ora! – enquanto seguia pelo o alpendre em busca da frente da casa.
Isso provocava mais zanga no
pistoleiro. Até o momento derradeiro quanto Renovato viu em meio das sombras do
Jaboticabal a figura da Irmã Josefina a colher frutos da árvore. De imediato
ele não a reconheceu. Porém, em poucos segundos o homem gritou sem dúvidas:
Renovato:
--- Josefina? Você aqui? – gritou
o homem para a sua irmã.
E Josefina, tomada de
sobressalto, largou as frutas e correu para o colo de Renovato. Foi um abraço
terno e de plena simpatia. A Noviça Isabel sorria de modo calado. E a moça
Emília colocava as mãos da boca enquanto lágrimas rolavam por sua face. Foi um
eterno encontro talvez de alguns anos. Renovato chorou de emoção ao sentir em
si a presença da irmã de carne e de tantos anos. Aquela presença entre os dois
abraçados demorou por alguns minutos com o pistoleiro a sentir forte
arrependimento por tudo o que fizera. O mundo rolou em sua mente como se a vida
parasse naquele instante. Do mundo nada se leva, era o pensamento de Renovato.
Mesmo assim, aquele mundo era apenas seu e de Josefina. Ela, uma Freira, Irmã
vivendo confinada em um Convento onde nada de fora poderia incomodar. E naquele
instante as duas almas separadas se uniam pela sagrada coroação do ser irmãos.
Triste, combalido, o homem saía tão somente da sua altivez para apenas chorar.
Um choro de criação, talvez. Doce e dor de recordação de tempos infindos. A sua
irmã também chorava agarrada a Renovato igual um pato pequenino a voar para o
ninho da sua eterna e terna mãe. As frutas caíam ao seu redor e eles nada
podiam sentir. Aquele era apenas o momento de união e afago. A doce e real
surpresa daquela tarde de verão.
Após certo tempo, o casal de
irmão voltara para a varanda a procura de um assento onde pudesse conversar. Ao
subir os degraus Renovato encontrou Emília a quem apresentou a sua irmã e vice
versa. A dizer tal fato, ele acrescentou para a sua irmã:
Renovato;
--- Essa é a braba da corte. Ela
me obriga a tomar dois banhos por dia. E tem uma cabeça dura que nem Deus
duvida. – fez vez o pistoleiro.
Emília:
--- Pra ver! Ele passa um mês sem
tomar banho e ainda bota queixo! – respondeu Emília meio zangada a mostrar o
queixo duro que rapaz costumava fazer.
Josefina:
--- Ô. Também não é assim meu
adorado irmão! Um mês? – quis saber a freira assombrada.
Renovato afinal desconversou e
pôs a culpa na mocinha Emília tirando de fora a seringa de injeção bem
preparada para ser aplicada em seu atlético músculo.
Renovato:
--- É tudo conversa da oposição.
Eu tomo banho sim. – refez o rapaz.
E Emília logo advertiu com força.
Emília:
--- Conversa, não. Pode tirar seu
cavalinho da chuva. Eu não estou para mentiras! Ora! – rechaçou a moça com
ênfase de escândalo.
Josefina:
--- Calma gente! Calma! Tudo se
ajeita. Eu não quero namoro desfeito por uma bobagem! – refez a irmã para
contornar a situação.
Renovato:
--- E eu estou a namorar a
ninguém! – rebateu Renovato todo abusado.
Emília:
--- Quem? Eu? A senhora está
louca! – fez ver a moça com muita aparente raiva.
Josefina:
--- Sei que não está, Emília! É
força de expressão. Mesmo assim, ele é um bom partido! – resolveu a irmã de
Renovato.
Emília bateu de leve com a ponta
dos pés no assoalho e virada para outro lado com os braços cruzados fez ainda
um:
Emília:
--- Thuc! – fez a moça com a boca
fechada.
Então, Josefina com todo jeito,
fez os dois se abraçarem como amigos e talvez namorados.
Josefina:
--- Cheguem aqui vocês! Abracem-se
para não guardar mágoa um do outro! – resolveu o intricado problema a Irmã.
E os dois pombinhos se abraçaram
com Emília temerosa, mas mesmo assim satisfeita. Renovato não tinha jeito de
abraçar uma moça e fez de conta em dar mesmo um aperto com Emília ao seu peito.
Era um calor tremendo aquele a fazer ao inicio da tarde. Nem mesmo assim a moça
se importou em sentir o azedo perfume do suor do rapaz. O que mais perturbava a
moça era a coronha do revolver a lhe tocar a barriga. De qualquer modo não
tardou em esquecer a arma e se deleitou no abraço acochado daquele tao profundo
ser. As aves de arribação passaram em bandos a procura do sul daquela terra
íngreme e calcinada com apenas o vento brando a cortar.
Após esse angustiado momento
Renovato foi sentar junto a Josefina e com Emília sou das noticias de fora. A sua
mãe ainda era viva e o seu pai também, como informara a Irmã ao seu perdido
irmão. Por algum momento Renovato chorou. Ele nem sabia se era de remorso ou de
vergonha. Já fazia um bom tempo aquele momento de felicidade. Junto à irmã
Josefina ele queria apenas saber de casos de alegria e nada mais. O tempo se
foi e as duas Irmãs tiveram de ir a prometer a Noviça voltar em breve para
novos convívios de emoção. Aquele era o momento de paz para Renovato. Uma paz
tao distante por sinal. A Freira Josefina estava a morar no Mosteiro próximo a
cidade. E sentiu demais a falta de Renovato, homem perdido em suas andanças
pelas caatingas do sertão, outrora um profundo oceano.
Josefina:
--- Até breve, meu querido irmão.
– voltou-se a Freira para a despedida.
Um cavalo relinchou na cocheira
como se desse também um até breve. Os dois namorados se abraçaram de vez.
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