quinta-feira, 21 de novembro de 2013

O SENHOR DE LUTO - Capítulo Trinta e Quatro -

- JAPONESA -
- 34 -
- QUADRO -
As duas jovens a conversar assuntos sem causa. De súbito Lenira chamou a atenção de Nair para um retrato na parede. O quadro ostentava uma semideusa a mostrar em roupas de balé algo como encantamento oriental.  A sua cabeça moldada em enfeites a lhe descer pelo rosto e atar até o busto e mais em baixo, enfim. Assim era a Deusa ou menos. Roupas de cetim (vermelho) ambientadas por gola marrom em tom a estreitar todo o senhoril. Um manto por baixo da capa encarnada. Quadro tecido nobre e incolor a ser chamado de branco. Por baixo: manta cor suave branda, ambiental. Tal qual. Descendo o busto legado carmim, enfim.  Sua ingênua mão esquerda um gigantesco pacote adornado com fitas douradas, deitadas a cair por cima de outro artificio igualmente níveo. Puro alívio. Olhos negros matizados com mais elegante vívida cor púrpura. Sobrancelhas: arqueadas! Forma augusta tonalidade marrom. Rosas magistrais a descer de cima do alto de sua ingênua sinagoga em três tiras de cores negras ambientadas por formas azuis. Açucenas. Enfim, tudo o que se podia chamar a magia de: semideusa.
Lenira:
--- Vês? Não é ninguém! Apenas um retrato. O que eu posso chamar de uma dama, não sei se casta. Ela é apenas um retrato. Para não falar em uma simples dama de um salão de óperas. – decretou com ênfase a moça.
Nair piscou os olhos e procurou notar a figura de retrato pregada na parede da sala ao largo e pode pressentir todo o natural da ingênua nipônica delicadamente a descrever em certo pela núbia Lenira, apenas de costa para o enigmático quadro dito por detalhes a apontar com o dedo indicador da mão direita para trás.
Nair:
--- Eu ainda não entendo nada disso. O que é nipônica? – perguntou a estranhar.
Lenira:
--- Japonesa. Que nasce no Japão. Lembra-se da Guerra? – perguntou lhe a atraente moça.
Nair:
--- Ah! Os homens maus. Olhos estreitos. – sorriu a verificar bem a foto.
Lenira:
--- Nem tão maus assim. Ainda nem sei por que houve essa Guerra. Hitler, Mussolini, Hirohito. Ele assinou o pacto de paz. (Ele) era é moço. A assinatura foi em 1945. A Marinha Imperial Japonesa estava sem recursos. Os Estados Unidos lançaram duas bombas atômicas sobre o Japão. A primeira em Hiroshima. A segunda em Nagasaki. “Buuummm”. Nos dias 6 e 9 de agosto. Desgosto!  O Imperador Hirohito ordenou ao Conselho de Guerra a tentar negociar uma paz minimante honrosa com os aliados. Nossos! Pronto! – declarou a moça a conversar e tomar café com pães novos, leite e queijo.
Nair:
--- Guerra! O mundo só fala em Guerra! – articula desenganada a nova princesa da casa.
Após o café da manhã Lenira convidou Nair para as duas jovens terem que ir à praia distante de Natal, conhecida como Pirangí. Naquele recanto de encanto não existiam ladrões de bolsas e o máximo eram as jangadas a pescar camarões e lagostas. Por Pirangí, também se podia estrear os novos maiôs Catalina, raridade no Brasil colonial e tal. Quando certo: Natal. E tudo aquilo em termos de maiôs era apenas chique da moda para Lenira. Antes das nove (horas) as simpáticas amigas divinas saíram de casa, em Petrópolis rumo a direção de Pirangí passando antes por Capim Macio depois da “Corrente” da cidade, um posto aduaneiro onde caminhões estavam encostados a espera da inspeção do carregamento natural. Ao atingir Capim Macio, Lenira alegou ter naquele trecho apenas mato. Fruteiras, como caju, manga e jaca. Mas, era tudo mato.
Lenira:
--- Eita! Quando progresso! O dono das terras disse que aqui estava o “futuro de Natal”. Pudera porque aqui só tem mato!
O homem deitado à sombra de um cajueiro com uma estaca enfiada na barriga! Era um morto de morte matada. Nem arquejava nem nada. Nair se apavorou e gritou para a amiga a dirigir seu carro.
Nair:
--- Tem um homem morto ali! – falou com exatidão.
Lenira;
--- E tem as testemunhas! – mostrou com simplicidade a moça. Os urubus esperando a hora de trinchar a carcaça do desumano homem errante.
Nair:
--- E a gente não vai chamar a polícia? – indagou alarmada.
Lenira:
--- Você é besta?! Eu vou lá me meter com defunto! Eles que venham! – respondeu de modo truculento ao falar polícia.
Nair:
--- Mas o homem está morto! – alegou apavorada a noiva.
Lenira:
--- E vai ficar por muitas horas! – respondeu com raiva a jovem.
Nair começou a chorar e a moça a dirigir seu carro a toda pressa. Ao atingir a vila de Ponta Negra Lenira dobrou em direção a Pirangí percorrendo uma estrada de sulcos fundos, profundos por onde rodavam caminhões, tratores, automóveis (alguns) e jericos puxando suas carroças com o seu dono sempre a chicotear os mansos animais vegetais. Tais quais. Pé no mato, pé no caminho, o veiculou passou por um mal encarado trator de esteira a ser conduzido por seu único tratorista. Com certeza um rapaz de menor idade.
Nair:
--- Aquele menino não tem quinze anos! – comentou a moça com muito assombro.
Lenira:
--- Era do pai, com certeza! – respondeu a moça que o tratorista fazia a vez do seu pai.
Mais a frente, Lenira passou por um caminhão. Esse estava encostado à beira do cercado. O seu proprietário, certamente, estava a consertar algo no motor, pois o caminhão mantinha o capuz aberto. Um macaco esteira suspendia pela frente o monstro dorminhoco. O motorista estava dentro do cercado a conduzir umas peças do motor, talvez. Lenira sorriu como a disfarçar com todo o avistado.
Nair:
--- Mais um. – relatou a moça.
O seu automóvel corria célere como podia. À frente um caminhão de cargas de coco. Ela puxou seu carro para a direita, tirando da reta do percurso e o motorista do carro grande a estar desavisado continuou com o seu “brabo” pelo mesmo sulco confuso. Da carroceria caíram uns poucos cocos na estrada. O motorista freou, e veio buscar a restante da carga. Lenira intrigada se revoltou e parrou. Deu-lhe uma “banana”  depois seguiu toda atrapalhada. Azucrinada!
Lenira:
--- Bruto! Ignorante! Pau d’água! – esgoelava a moça.
E após um tempo e tanto de corrida e tanto sem parar, Lenira alcançou uns poucos casebres. Moças e rapazes conversavam bastante animados. Um menino defecava à beira da caída cerca e olhava para baixo a verificar se já estava concluído o serviço. Nair quase morria de rir tampando a boca com a mão direita.
Nair:
--- Não dá pra esquecer! – dizia a moça de forma hilária.
Lenira:
--- É o mau do mundo! – dizia a moça a dar arranco no automóvel.
Nair:
--- Que é isso? – indagou preocupada.
Lenira:
--- Cotovelo. Só tem gente pobre. Os ricaços ficam para longe da estrada. – respondeu
Nair:
--- Quanta miséria. – reclamou a noiva.
Lenira:
--- Isso, talvez, um dia acabe. Depois da Guerra vem o progresso – adiantou a virgem.
Nair ficou a pensar em seus vizinhos da Rua do Motor, onde as crianças também defecavam no oitão da casa. Logo após gritavam.   
Crianças:
--- Mãe! Vem me limpar! – e saiam devagar, de pernas abertas, para um tanque onde a mãe já esperava o rebento.
Após passar por Cotovelo, Lenira ainda encontrou uma casa perdida pelo tempo, onde morava um senhor de meia idade. Ela, de imediato, avistou o homem. Então indagou:
Lenira:
--- Zé. Qual a melhor estrada para Pirangí? – indagou ao homem.
Zé:
--- Siga em frente. – sorriu o homem elevando seu braço.

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