- VIOLÊNCIA -
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VIOLÊNCIA
A chuva era intensa por toda aquela
estrada de barro ou de nada. Poças de lama eram comuns ao longo do caminhar.
Ninguém se aventurava sair de casa, salvo a garotada a aproveitar o banho ao
natural. Crianças brincavam de canga-pé umas com as outras a atirar a lama para
ver o que sucedia. Uma menina pequena e suja jogava uma espécie de montaria com
um menino, fazendo dele o seu cavalo de brincadeira. Pouca ou nenhuma importância
prestavam os carros de Edgar Penteado e do delegado. Esse alugou o carro,
provavelmente de praça para seguir o outro, da frente dirigido por Edgar e
levando a mulher de Carrapicho, a dona Deodora, sofrida demais por causa do seu
companheiro. Em tempos passados, era o cangaço. Depois veio o sossego.
Carrapicho trabalhava como nunca até o ponto em que foi aprisionado, sem
nenhuma dúvida a mando de algum coronel de fazenda. E a prisão veio por fim sob
o comando do tal capitão Tororomba, homem parrudo, feio e forte como um cão. De
repente, um trovão cheio de rancor sacudiu no alto da colina. O advogado Edgar
ainda teve a impressão de observar o relampear insistente a cobrir a mata densa
da região. A conduzir o seu automóvel nada mais do desaparecer de Carrapicho
ele podia pensar. Tororomba era um feitor e se julgava capitão. Até podia ser,
pois naquele tempo havia os capitães da mata e esse bem podia ter angariado o
tal empenho. Ouvia-se falar ser ele um homem rancoroso, truculento e
animalesco. Houve tempo de o perverso capitão prestar ajuda ao governo do
Estado. Teria morto um bando de assassinos levados por avião para o alto mar. E
assim se deu o emprego do capitão. Quando atingiu milhas de percurso ele deu
ordens para soltar o bando assassino em pleno mar, longe da costa. Nenhum dos
bandoleiros teve a graça de voltar a terra. Essa foi uma aventura desumana do
capitão. Apenas quem soube do sacrifício da corja bateu palmas porque esses
eram criminosos de aluguel. Matadores profissionais, como se aventava naqueles
tempos. Tororomba era de um tipo gigante e usava capa de chapéu de massa com
abas largas a cobrir a vista. Perneiras e uma camisa de linho bem feita. Por
baixo da capa, ele trajava um paletó além de usar rifle e parabelo. Esses
revolveres ela trazia escondido no cós de sua cintura.
O temporal com ventania, relâmpagos e
trovões não se aquietava um só instante. O veículo de Edgar Penteado seguia
como podia já nas proximidades de Mangabeira. Logo atrás o automóvel de praça
com a turma da Polícia vinha segundo a toda velocidade para ficar mais próximo
de carro do advogado. Em uma curva, Edgar notou a presença de um jipe da
Polícia. O carro policial estava ao que parecia, com problemas na ignição. O
homem brecou de repente e ouviu de Deodora a palavra:
Deodora:
--- São eles! Eu reconheço! São eles! –
falou a mulher com repentina ânsia.
Do carro desceram o advogado, a mulher e
sua filha e em seguida veio o carro de praça com o delegado, sargento Santos e
mais três soldados. Foi num ímpeto que os fugitivos tomaram alerta da prisão. A
ordem do delegado Cornélio Santos foi taxativa. Com o revolver apontado para os
meliantes ele ordenou a todos os outros o desarmar de imediato. Até mesmo o
sargento da Policia que fazia companhia aos seus comandados. Outro militar que
voltava da cena de imediato parou. E o Sargento Cornélio ordenou que se
detivesse ou ela atirava. O soldado em busca de refugio se voltou e correu de
volta. Um tiro se ouviu. O sargento mirou o fugitivo e deflagrou violento
disparo. Foi um só. O militar foi atingido na nuca. E soltou um grito de
agouro, se voltando para trás, com os braços levantados para o alto e caindo já
quase sem vida. Outros militares faziam o desarmar da tropa. Um deles gritou:
Militar:
--- Esse já era! Tá fedendo a merda! E
fedeu a merda é morte certa! – argumentou o militar.
A mulher Deodora correu em seguida à
procura do seu homem. Esse estava semicoberto com folhagens e bem morto matado.
Um tiro da testa. A confusão era total. Os criminosos militares desarmados não
queriam obedecer à ordem de se algemar. Mas a ordem fora cumprida. Cada qual
era algemado dos pés as mãos. O sargento detido dizia:
Sargento Meliante:
--- Eu não tive culpa com nada. Apenas
peguei carona no jipe! – relatava atordoado o meliante.
Cornélio:
--- Vamos todos para o quartel de Natal.
Quem era o outro? - indagou severo o
militar Cornélio
Meliante:
--- Quem estava era o capitão Tororomba.
– relatou o presidiário.
Cornélio:
--- E quem atirou no homem? – perguntou
irritado o comandante da patrulha.
Meliante:
--- Quem fez o estrago foi o capitão. –
disse mais o prisioneiro.
Cornélio:
--- No Comando a gente sabe de tudo. Seu
Edgar, onde está a mulher? – indagou menos severo
Edgar:
--- Foi com a filha ver o seu homem. Eu
vou até o cercado. Tenho que verificar se o morto é mesmo Carrapicho. – falou
abusado.
Cornélio:
--- Dois soldados dos meus ficam
guardando a carcaça. – relatou o delegado.
Edgar:
--- Carcaça não! Ele é gente! – falou
aos gritos.
Cornélio:
--- Tá bem. Desculpe. É o modo de se
falar. – pediu arrego o delegado
Em quase uma hora o comboio estava já no
Quartel de Polícia com três presidiários militares vistos ter havido morte de
um soldado no campo do assassinato de Manoel Carrapicho, do bando de Lampião em
tempos passados, coisa de 12 anos. No quartel o advogado Edgar Penteado pediu
ajuda para prender o assassino, capitão Tororomba, pois pelo dito o bandoleiro
militar estaria nessa hora em um Café do Mercado Público da Cidade. Houve
conversa e mais conversa até o ponto de ser destacado um Major para buscar o
condenado. Em instantes a equipe da Polícia ao comando do policial Major Elias
Caldeiras em companhia do advogado Edgar Penteado e do Sargento Cornélio Santos
e mais três policiais chegara ao Café onde estava o capitão Tororomba e seu
auxiliar a tomar café com tapioca e mugunzá e soltar conversa fora aos risos da
extasiada plateia. Foi num instante em que o major Caldeiras indagou:
Caldeiras:
--- Capitão? – com voz firme e brava.
O capitão Tororomba notou de imediato
ter sido a sua missão desfeita naquele instante. E foi então ter ele puxado o
seu parabelo ante a ameaça de ser preso. O Sargento Cornélio foi mais rápido e
ostensivamente declarou.
Cornélio:
--- Eu não faria tal reação seu
capitão!. O major também está armado! – rosnou o delegado
De imediato, o capitão Tororomba tentou
fazer o disparo contra o sargento. Porém não teve sucesso. O sargento foi mais
rápido e detonou primeiro. Foi um tiro certeiro na testa do capitão Ernesto
Tororomba. Atingido mortal, o capitão caiu para trás ainda desferido três tiros
para o chão como se tivesse o impulso de disparar. O seu auxiliar sacou da arma
e também foi fuzilado pelo Major Caldeira sem temor de arrependimento. Dois
tiros de fuzil. O auxiliar caiu sobre a mesa de café e se estatelou como um
verme de braços abertos e a cara num prato de massa de fazer mungunzá. A
confusão se formou no interior do Café com gente a correr o se amparar para
todos os lados. Um balaeiro gritou:
Balaeiro:
--- Mataram Tororomba! – gritou
assombrado o homem a escapar.
Gente de toda parte acorreu para
enxergar a morte do facínora intitulado capitão. Houve gente a declarar pelo
crime atroz:
Ambulante:
--- Bem feito! Já estava na hora! –
relatou um homem à distância.
Vendedor:
--- Matou quem? – indagou assustado um
vendedor de bugigangas.
Dois policiais foram incumbidos de
guardar o local até a equipe de Inspetores chegarem para demarcar o local e
retirar os corpos dos dois meliantes. Nessa hora, as bancas de Café se fecharam
com mais presa sob o temor de se matar mais gente. Com o cerco formado, foram
retirados os demais frequentadores do local. A Polícia ficou a guarnecer os
corpos e tudo o que havia naquele ponto. Já passava às duas horas da tarde
quando o advogado Edgar Penteado chegou a sua casa para mudar de roupa. Chovia
a cântaros e barris com as ruas desertas da cidade. Portas fechadas a meia
banda onde quase ninguém se aventurava a sair.
Nair:
--- Chegou? – indagou preocupada a moça.
Edgar:
--- Vim trocar de roupa. Essa está
encharcada. – relatou com descuido.
Nair:
--- Dona Odiléia vem na segunda. -
relatou a moça
Edgar:
--- Odiléia? – estranhou o nome.
Nair:
--- A outra doméstica. – relatou sem se
preocupar.
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