quinta-feira, 14 de novembro de 2013

O SENHOR DE LUTO - "Vinte e Seis"

- VIOLÊNCIA -
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VIOLÊNCIA
A chuva era intensa por toda aquela estrada de barro ou de nada. Poças de lama eram comuns ao longo do caminhar. Ninguém se aventurava sair de casa, salvo a garotada a aproveitar o banho ao natural. Crianças brincavam de canga-pé umas com as outras a atirar a lama para ver o que sucedia. Uma menina pequena e suja jogava uma espécie de montaria com um menino, fazendo dele o seu cavalo de brincadeira. Pouca ou nenhuma importância prestavam os carros de Edgar Penteado e do delegado. Esse alugou o carro, provavelmente de praça para seguir o outro, da frente dirigido por Edgar e levando a mulher de Carrapicho, a dona Deodora, sofrida demais por causa do seu companheiro. Em tempos passados, era o cangaço. Depois veio o sossego. Carrapicho trabalhava como nunca até o ponto em que foi aprisionado, sem nenhuma dúvida a mando de algum coronel de fazenda. E a prisão veio por fim sob o comando do tal capitão Tororomba, homem parrudo, feio e forte como um cão. De repente, um trovão cheio de rancor sacudiu no alto da colina. O advogado Edgar ainda teve a impressão de observar o relampear insistente a cobrir a mata densa da região. A conduzir o seu automóvel nada mais do desaparecer de Carrapicho ele podia pensar. Tororomba era um feitor e se julgava capitão. Até podia ser, pois naquele tempo havia os capitães da mata e esse bem podia ter angariado o tal empenho. Ouvia-se falar ser ele um homem rancoroso, truculento e animalesco. Houve tempo de o perverso capitão prestar ajuda ao governo do Estado. Teria morto um bando de assassinos levados por avião para o alto mar. E assim se deu o emprego do capitão. Quando atingiu milhas de percurso ele deu ordens para soltar o bando assassino em pleno mar, longe da costa. Nenhum dos bandoleiros teve a graça de voltar a terra. Essa foi uma aventura desumana do capitão. Apenas quem soube do sacrifício da corja bateu palmas porque esses eram criminosos de aluguel. Matadores profissionais, como se aventava naqueles tempos. Tororomba era de um tipo gigante e usava capa de chapéu de massa com abas largas a cobrir a vista. Perneiras e uma camisa de linho bem feita. Por baixo da capa, ele trajava um paletó além de usar rifle e parabelo. Esses revolveres ela trazia escondido no cós de sua cintura. 
O temporal com ventania, relâmpagos e trovões não se aquietava um só instante. O veículo de Edgar Penteado seguia como podia já nas proximidades de Mangabeira. Logo atrás o automóvel de praça com a turma da Polícia vinha segundo a toda velocidade para ficar mais próximo de carro do advogado. Em uma curva, Edgar notou a presença de um jipe da Polícia. O carro policial estava ao que parecia, com problemas na ignição. O homem brecou de repente e ouviu de Deodora a palavra:
Deodora:
--- São eles! Eu reconheço! São eles! – falou a mulher com repentina ânsia.
Do carro desceram o advogado, a mulher e sua filha e em seguida veio o carro de praça com o delegado, sargento Santos e mais três soldados. Foi num ímpeto que os fugitivos tomaram alerta da prisão. A ordem do delegado Cornélio Santos foi taxativa. Com o revolver apontado para os meliantes ele ordenou a todos os outros o desarmar de imediato. Até mesmo o sargento da Policia que fazia companhia aos seus comandados. Outro militar que voltava da cena de imediato parou. E o Sargento Cornélio ordenou que se detivesse ou ela atirava. O soldado em busca de refugio se voltou e correu de volta. Um tiro se ouviu. O sargento mirou o fugitivo e deflagrou violento disparo. Foi um só. O militar foi atingido na nuca. E soltou um grito de agouro, se voltando para trás, com os braços levantados para o alto e caindo já quase sem vida. Outros militares faziam o desarmar da tropa. Um deles gritou:
Militar:
--- Esse já era! Tá fedendo a merda! E fedeu a merda é morte certa! – argumentou o militar.
A mulher Deodora correu em seguida à procura do seu homem. Esse estava semicoberto com folhagens e bem morto matado. Um tiro da testa. A confusão era total. Os criminosos militares desarmados não queriam obedecer à ordem de se algemar. Mas a ordem fora cumprida. Cada qual era algemado dos pés as mãos. O sargento detido dizia:
Sargento Meliante:
--- Eu não tive culpa com nada. Apenas peguei carona no jipe! – relatava atordoado o meliante.
Cornélio:
--- Vamos todos para o quartel de Natal. Quem era o outro? -  indagou severo o militar Cornélio
Meliante:
--- Quem estava era o capitão Tororomba. – relatou o presidiário.
Cornélio:
--- E quem atirou no homem? – perguntou irritado o comandante da patrulha.
Meliante:
--- Quem fez o estrago foi o capitão. – disse mais o prisioneiro.
Cornélio:
--- No Comando a gente sabe de tudo. Seu Edgar, onde está a mulher? – indagou menos severo
Edgar:
--- Foi com a filha ver o seu homem. Eu vou até o cercado. Tenho que verificar se o morto é mesmo Carrapicho. – falou abusado.
Cornélio:
--- Dois soldados dos meus ficam guardando a carcaça. – relatou o delegado.
Edgar:
--- Carcaça não! Ele é gente! – falou aos gritos.
Cornélio:
--- Tá bem. Desculpe. É o modo de se falar. – pediu arrego o delegado
Em quase uma hora o comboio estava já no Quartel de Polícia com três presidiários militares vistos ter havido morte de um soldado no campo do assassinato de Manoel Carrapicho, do bando de Lampião em tempos passados, coisa de 12 anos. No quartel o advogado Edgar Penteado pediu ajuda para prender o assassino, capitão Tororomba, pois pelo dito o bandoleiro militar estaria nessa hora em um Café do Mercado Público da Cidade. Houve conversa e mais conversa até o ponto de ser destacado um Major para buscar o condenado. Em instantes a equipe da Polícia ao comando do policial Major Elias Caldeiras em companhia do advogado Edgar Penteado e do Sargento Cornélio Santos e mais três policiais chegara ao Café onde estava o capitão Tororomba e seu auxiliar a tomar café com tapioca e mugunzá e soltar conversa fora aos risos da extasiada plateia. Foi num instante em que o major Caldeiras indagou:
Caldeiras:
--- Capitão? – com voz firme e brava.
O capitão Tororomba notou de imediato ter sido a sua missão desfeita naquele instante. E foi então ter ele puxado o seu parabelo ante a ameaça de ser preso. O Sargento Cornélio foi mais rápido e ostensivamente declarou.
Cornélio:
--- Eu não faria tal reação seu capitão!. O major também está armado! – rosnou o delegado
De imediato, o capitão Tororomba tentou fazer o disparo contra o sargento. Porém não teve sucesso. O sargento foi mais rápido e detonou primeiro. Foi um tiro certeiro na testa do capitão Ernesto Tororomba. Atingido mortal, o capitão caiu para trás ainda desferido três tiros para o chão como se tivesse o impulso de disparar. O seu auxiliar sacou da arma e também foi fuzilado pelo Major Caldeira sem temor de arrependimento. Dois tiros de fuzil. O auxiliar caiu sobre a mesa de café e se estatelou como um verme de braços abertos e a cara num prato de massa de fazer mungunzá. A confusão se formou no interior do Café com gente a correr o se amparar para todos os lados. Um balaeiro gritou:
Balaeiro:
--- Mataram Tororomba! – gritou assombrado o homem a escapar.
Gente de toda parte acorreu para enxergar a morte do facínora intitulado capitão. Houve gente a declarar pelo crime atroz:
Ambulante:
--- Bem feito! Já estava na hora! – relatou um homem à distância.
Vendedor:
--- Matou quem? – indagou assustado um vendedor de bugigangas.
Dois policiais foram incumbidos de guardar o local até a equipe de Inspetores chegarem para demarcar o local e retirar os corpos dos dois meliantes. Nessa hora, as bancas de Café se fecharam com mais presa sob o temor de se matar mais gente. Com o cerco formado, foram retirados os demais frequentadores do local. A Polícia ficou a guarnecer os corpos e tudo o que havia naquele ponto. Já passava às duas horas da tarde quando o advogado Edgar Penteado chegou a sua casa para mudar de roupa. Chovia a cântaros e barris com as ruas desertas da cidade. Portas fechadas a meia banda onde quase ninguém se aventurava a sair.
Nair:
--- Chegou? – indagou preocupada a moça.
Edgar:
--- Vim trocar de roupa. Essa está encharcada. – relatou com descuido.
Nair:
--- Dona Odiléia vem na segunda. - relatou a moça
Edgar:
--- Odiléia? – estranhou o nome.
Nair:
--- A outra doméstica. – relatou sem se preocupar.
 

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