segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

O CAÇADOR - Capítulo Quatro -

- INVERNADA -
- 04 -
SAÍDA
A saída dos agricultores para as suas casas no mato foi a maior tristeza do que podia a haver. Ninguém esperava tamanha balburdia entre os agricultores e os jagunços do coronel Malveira, senhor das terras do sertão do Rio Grande. Na verdade, apenas dois agricultores entraram da contenda. Mesmo assim, todos os demais tomaram para si no tumulto havido. Ninguém aguentava mais viver em uma terra onde não se podia ter nada além de morrer e se enterrar, se pudesse. Entre os demais agricultores seguia Miguel Palhano, sua mulher, Dalva, na carroça da frente, ele e ela sentados na bancada. E logo atrás, estavam o filho e o amigo de Palhano, o caçador Joel a conversar com o garoto sobre o fato havido na bodega. O  garoto estava curioso pela fúria do seu pai na contenda havida na mercearia.
Nando:
--- Era soco pra todo o lado. E o meu pai fazia com todos os jagunços! – dizia alegre o menino fazendo a vez de se socar a cara dos estremados.
Joel:
--- Sim. Seu pai é valente que nem touro. – respondeu o caçador.
Antes de se ir para as suas casas, o caçador procurou comprar duas parelhas de roupas, cinturão, botas e algo mais. Os atrativos para o garoto ele havia entregado quando logo começou a procura dos trajes. E por isso mesmo, sentado na traseira da carroça ele ouvia o garoto a mastigar os pirulitos e socar com força como seu pai fizera com os jagunços. A mãe do garoto estava destemida a lutar com seu marido, se fosse o caso, e não abrir mão dos seus direitos em proteger a sua família.
Dalva:
--- Eu estou do seu lado. Seja lá o que der e vier. – alertou a mulher
Palhano:
--- Quando viemos para a fazenda o Governo prometeu ajuda a todos nós. Mas até hoje essa ajuda não passou de um papel. E o Governo não disse ter um coronel a disputar esse punhado de terra. E nem se prestou a declarar na seca imensa a assolar toda a região. Se o Governo fizesse um açude aqui, até que era bem feito. Mas não tem açude. Nós temos água porque estamos em uma reserva onde o rio nasce. Não fosse o rio, nós morreríamos de sede e de fome. O gado morre sem ter o que comer ou beber. – relatou o homem a pensar no futuro.
Dalva:
--- Os índios dizem que a terra é boa. Eles vivem lutando com as águas das nascentes. E nada lhes falta. O povo, este que veio de fora, procura terras das melhores marcas, mas não sabia da seca a afligir por sete anos a fio cada um dos quais. – reclamou à senhora.
Palhano:
--- Vai precisar de muito esforço para se viver nessas terras. E nossos ossos vão ser enterrados até que tenha bom tempo- -  relatou o homem.
Enquanto isso Nando conversava com Joel em um ponto quase a cair da carroça, pois os dois estavam sentados na parte extrema e, no meio, estava o que se aventava para o consumo durante todo o mês ou a semana. E conversa prosseguia:
Nando:
--- Mas o senhor também é forte. E quem era aquele grandalhão? – indagou espantado.
Joel.
--- Um lutador. Homem de aguentar pancada. Apenas foi derrubado pela paulada que levou no pescoço. Do contrario eu esta “frito” – sorriu sem formas.
Nando:
--- Mas o senhor o surrou bem forte. Pena que ele aguentou! – disse o garoo fazendo com as mãos as tapas de Caçador.
Joel:
--- Ele nem se importava. – sorriu o caçador.
Nando:
--- O senhor aprendeu a lutar com homens fortes? – indagou assustado
Joel:
--- Não. Eu vivo da caça. E se aprendi foi com as feras. Tamanduá, jacaré, onça e bicho pequeno. No mato tem bichou pequeno que luta mais que bicho grande. – salientou.
Nando:
--- Bicho pequeno assim, desse tamanho? – indagou assustado fazendo com os dedos o tamanho.
Joel:
--- Sim. Tem bicho que luta com cobra grande ou mesmo com onça pintada. Um pica-pau luta contra uma serpente quando a encontra em seu habitat natural. – respondeu.
Nando:
--- Virgem! Uma serpente grandona? – se admirou o garoto.
E a conversa progredia a todo custo. E não teve tempo de acabar. Quando seu Palhano chegou a sua casa foi o tempo de terminar as trocas de histórias entre Joel e Nando. E assim foi a conversa durante todo o percurso na velha estava de barro feita pelos próprios animais. Um relâmpago despontou no céu e assustou sobremaneira o senhor Miguel Palhano. De imediato descarregou toda a troçada e ele viu chegar nuvem carregada com chuva. Uma torrencial chuva começou a cair antes do meio dia e demorou a noite toda. Antes das oito horas da noite alguém bateu à porta de Palhano. Ainda com suspeita da briga da manhã daquele dia, na vila de São Miguel, o homem cuidou de empunhar a sua arma e, antes de abrir aporta, foi logo a indagar.
Palhano:
--- Quem bate? – perguntou a se escorar a parte longe da porta.
Voz:
--- Socorro! Acuda-me. Eu estou completamente molhada! Acuda-me! – chorava uma voz feminina.
Palhano:
--- Quem está mais a senhora? – indagou desconfiado.
Voz:
--- Eu estou só. Eu e Deus. Estou toda molhada “mode” a chuva. – destacou a voz de mulher.
Do outro lado, com o revolver suspenso e escorado na parede, estava Joel. A mulher, Dalva se postava em pé junto à mesa. O menino já estava a dormir em seu quarto. A noite de inverno nada permitia a vislumbrar de quem estava a bater a porta. Palhano fez um sinal e Dalva apagou o candeeiro, única chama a alumiar toda a entrada do casebre. Nesse ponto, Joel abriu a porta e se escondeu por trás. Uma mulher, toda molhada, adentrou com o maior medo possível. Ela não enxergava ninguém pela escuridão formada pela falta de iluminação. Já dentro da casa, toda molhada e encolhida feito um gato com as mãos a segurar suas vestes perto da garganta. Nesse ponto a mulher respondeu.
Mulher:
--- Estou só. Eu e Deus. É chuva muita. Eu vim da Paraíba, a pé. Desde que está chovendo por volta do meio dia eu corro de um lado para outro. Sem comida e sem mais nada. - respondeu suplicando.
Nesse ponto, dona Dalva acendeu o candeeiro após verifica o homem Palhano não haver mais ninguém a entrar em sua tapera. A mulher tremia por todo o franzino corpo. Não dava para verificar se era moça ou não. Após Dalva acender o candeeiro, se pode notar um frágil corpo de uma moça quase sem mostrar a idade. Joel se recompôs e se acercou da porta a olhar bem para frente, verificando também se não havia nada por falar.
Joel:
--- Está só. – falou Joel para o dono da casa.  

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