quarta-feira, 29 de junho de 2011

DESEJO - 60 -

- Kate Winslet -
- 60 -
No dia seguinte, terça-feira, Armando Viana estava no café do povo do Mercado da Cidade quando chegou com aquele jeito cambaleante o seu amigo Canindé. Nada conversou e nada lhe foi perguntado então. Ele verificou o relógio de pulso e viu as horas. Sentiu que havia atrasado um pouco do costume. A turma conversava animadamente sobre preços das comidas. Elas estavam sempre a subir cada vez mais. Para os assíduos frequentadores aquilo não passava de um roubo uma vez não se ter notícia de baixa. Os homens da venda de carne verde continuavam a oferecer o seu produto pelo mesmo preço do dia anterior. A mulher da tapioca também oferecia o seu produto por igual preço. O sapateiro manco chegava por àquela hora lembrando ter o preço do sapato sido mantido da mesma forma. Mas os homens da venda de peixe já não mantinham a mesma conversa. Na banca, o preço subira. E quem perguntasse o motivo, logo eles diziam ter sido consequência de um “vulcão”.
--- Vulcão? Onde? – perguntava um consumidor.
--- Está no Jornal A IMPRENSA. É só olhar. – argumentava o vendedor de peixe.
Pura mania para se aumentar o preço. Inventar ter sido um vulcão a morte do peixe. Um rapaz entrou no café e logo pediu um café para Armando Viana. A questão é que Armando pagaria. E esse não fez questão. Pediu a dona Glória um café a mais para o rapaz pedinte. Esse agradeceu o favor. Ele estava todo de braços cruzados sobre os peitos de como sentisse um imenso frio. A sua cara mostrava um sorriso de desprazer. Seu porte era de um rapaz ligeiramente gordo ou inchado por tomar cachaça. Ninguém notava a sua presença no recinto do Mercado. Ele era mais um dos que costumavam aparecer de repente e sair de repente também. Dona Glória trouxe o café e Armando lhe ofereceu pão ou mugunzá. E o rapaz aceitou a oferta do mugunzá para bem forrar o seu estomago. Canindé apenas observava de revés o rapaz como se estivesse preparado para fazer uma foto. Armando não observava Canindé. Entre goles de café e um pouco de mugunzá, o rapaz, de imediato, fez a pergunta:
--- O senhor sabe o que é o Santo Graal? – o comeu mais um pouco de mugunzá.
Armando Viana, todo atento disse:
--- Não. Do que se trata? Santo? – fez de conta que não sabia do caso o homem.
--- É. Mas não é um Santo. Ela é uma Santa. Já visitou o Convento? -  indagou o rapaz.
--- Já estive no Convento, mas não vi a tal Santa. – argumentou Armando.
--- Ah. Bom. Mas não se vê a Santa. É que no convento tem uma biblioteca. E na biblioteca o senhor encontra livros do Santo Graal. – respondeu o rapaz aparentemente sujo de roupa.
--- E o que falam esses livros? – perguntou Armando ao rapaz.
--- Toda a estória do Santo Graal. É só procurar. – respondeu o rapaz comendo o seu mugunzá.
--- Ah bom. Qualquer dia desse eu vou. Como é o teu nome? – perguntou Armando Viana.
--- Não tenho nome. Todos me chamam de Maluco. – sorriu o demente sorvendo o café.
--- Nossa! Mas isso não é nome. De certo você um nome de batismo. – retorquiu Armando.
--- Não. Minha mãe me dizia que eu era Maluco. Só isso. – sorriu o débil mental
--- Sua mãe? E o seu pai? – indagou de repente em cima da hora Armando Viana.
--- Não tenho pai. Nunca tive. Minha mãe morreu. – respondeu Maluco emborcando o prato de mugunzá na boca.
--- E se você não tem parente como sabe da história do Convento? – perguntou Armando.
--- Eu morei no Convento. Era quem varria o chão. Até mesmo da Biblioteca. E vi todos os livros existentes naquele lugar. – pontificou o Maluco.
--- E como te chamavam no Convento? – perguntou Armando para sabe a verdade da história.
--- Maluco mesmo. – sorriu o rapaz e se despediu do homem que lhe prestou ajuda.
--- Maluco! Ora merda! – destacou Armando olhando o rapaz se perder por entre as pessoas que faziam feira no Mercado.
--- Eu fiz a foto dele. – respondeu Canindé a seu amigo Armando.
O rapaz nem notou a principio por estar observando o rumo tomado por Maluco. Porém, em seguida observou Canindé e deu por encerrada a questão. Contudo ficou em sua mente consultar a Biblioteca do Convento qualquer dia desses. No momento ele tinha que sair para visitar a noiva, logo as primeiras horas da manhã e saber de seu estado emocional. O dia passado foi demais para Norma, caso de não passar de uma só vez. Ele olhou para o seu relógio de pulso e viu ser ainda muito cedo para procurar a noiva. Com certeza seria prudente ir até ao Cartório, quando o relógio marcasse as oito horas. Então, Armando observou Canindé como fosse uma figura estranha. Ele olhou bem para Canindé e voltou a perguntar:
--- O que você disse? – indagou Armando ao fotógrafo.
--- Nada. – respondeu Canindé.
Com isso, ambos saíram no Café de dona Glória a procuram de um destino incerto. Canindé foi quem disse ter de passar no Palácio e depois seguir para o Jornal.
Ao bater as oito horas no campanário da Catedral, Armando já estava no Cartório de Norma. O pessoal já estava atento ao serviço e Norma não aparecera logo cedo do dia. Após indagar sobre a moça ele ficou ciente de Norma estar em casa, certamente. O rapaz agradeceu e saiu para a residência de Norma. Ao chegar à residência da noiva, ele então foi recebido por uma doméstica. A doméstica sorriu e abriu a porta para que ele entrasse mando aguardar um momento. O rapaz estava nervoso por tudo o que acontecera no dia passado. E sempre olhava o relógio para ver as horas, sem precisão. E veio a sua mente o quadro de destroços como ficou a mansão “Mundo Velho”. Quase nada sobrou da mansão como também das demais casas da vizinhança. Ele refletia no texto do Jornal apontando as ondas gigantes como a causa principal do acidente com um meteorito. Um jornal foi posto na porta por um gazeteiro, naquele momento. Ele, depressa, pegou o exemplar do Jornal A IMPRENSA. O fato importante do jornal era o incidente ocorrido na vila de Três Bocas. Armando não folheou mais o matutino como o que tudo impresso era vazio para ele. 
Em instantes surgiu à porta da sala pelo corredor da casa a senhora mãe de Norma com a cara de desalento. Ela não tinha nada a contar sobre a mansão. Apenas deu bom dia ao rapaz e fez o obséquio para que ele se sentasse. O rapaz esperou pela mulher se sentar e em seguida tomou assento em um sofá.
--- Norma ainda dorme a esta hora. – falou a senhora Maria Helena, mãe de Norma.
--- Ele sofreu o grave revés com o acidente. Agora, não sei se fiz bem ou se fiz mal em leva-la – argumentou o jovem Armando Viana.
--- Creio que fez bem. De qualquer jeito ela saberia e teria que ir a mansão. – relatou mulher.
--- É. Eu sei disso. Mass, nunca se sabe o que vai acontecer com a pessoa ao ver o seu mundo destroçado. – falou Armando com a cabeça baixa.
--- Mas não sobrou nada? – perguntou Maria Helena.
--- Quase nada. Quase nada! – recompôs o rapaz.
--- Teodomiro também sofreu bastante quando soube do acidente. – descreveu Maria Helena.
--- Ele está em casa? – perguntou Armando.
--- Lá dentro. Sentado. Com a mão na cabeça. Pensando. Coitado. – respondeu Maria Helena após verificar o estado do seu marido.
--- E as outras filhas? – indagou Armando.
--- Foi um pranto só. – respondeu a mulher começando a lacrimejar.
--- Estou para ver. – relatou Armando a se conformar com a sorte.
--- Norma aguentou bem. Ao que parece. Passou quase a noite toda acordada. Pegou no sono já de manhã, quando o dia clareava. – disse por mais uma vez Maria Helena.
O silencio emudeceu aos dois. Ele ouviu lá de dentro as domesticas fazendo a arrumação dos pratos, xicaras e bule como se tudo estivesse desorganizado. Uma chaleira fervia no fogo. As panelas eram postas para cozinhar o almoço. De repente, um arrastar de pés se fez ouvir. Era Teodomiro Vidigal a caminhar sonolento e entorpecido vindo até a sala de visita. Ao chegar, o homem cumprimentou o rapaz. Esse recebeu o abraço do homem em recíproca verdadeira.
--- Que trabalho nós estamos dando ao senhor. – relatou em certo pranto o homem.
--- Não seja por isso. Trabalho tem o senhor ao ver destruída a mansão do seu avô. – lamentou profundamente Armando Viana.
--- O que Deus dá, Deus tira. – fez ver Maria Helena.
--- É verdade. – relatou Armando.
--- Norma está inconsolável. – respondeu Teodomiro a assuar o nariz.
--- Nós estivemos no domingo. E nada tinha ocorrido. Veio a segunda e o céu se abriu por completo despejando um meteoro em pleno mar fazendo vagas enormes, destruindo tudo pela sua frente. Ondas gigantes. Descomunal mesmo. – relatou Armando ao casal.
Ao passar do tempo Armando Viana notou as horas passadas e, enfim, com Norma a dormir, ele resolveu sair por ter de ir ao Palácio transferir o cargo de Secretario ao seu sucessor, pois não queria mais saber de desaforos propalados pelo Governado, como foi capaz de ouvir no dia anterior. Armando não pensava nem mesmo em falar para o seu sucessor e apenas lhe entregaria o Gabinete são e salvo. Após esse passo, ele voltaria a escrever no Jornal como sempre fez. E ajudaria a Paulo Barra na feitura do matutino, se fosse preciso. Em outros momento faria matérias especiais como qualquer repórter.

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