domingo, 11 de setembro de 2011

VENUS ESCARLATE - 47 -

- AVENIDA GETÚLIO VARGAS -
- 47 -
Ao entrar no chalé Glauco mostrou a Racilva o que ela havia feito com os arrumadores da casa uns dias passados. Uma coisa alí outra acolá. Tudo ao gosto e modo da terna moça toda alegre quando fez a arrumação disso e daquilo. O chalé era amplo e não deu tempo de se ver tudo naquela hora do almoço. Por sinal Glauco Rodrigues já estava a par dos lances arrumados, pois foi ele a comprar todo móvel, alguns até trazidos de ouras partes do Brasil, como os tapetes, acolchoados, candelabros, luminárias e mesmo os armários de guardar comidas e bebidas vindas do Rio de Janeiro. A parte de fora, a entrada propriamente dita era de um esmero acabado. O chalé amplo ficava afastado da entrada do portão da casa. E o domicílio era bem afastado das outras habitações da avenida. Uma calçada tinha em todo o redor do chalé e a entrada de carros era feita pelo lado direito, já no final do muro do chalé. Tudo era magnífico com árvores na frente e dos lados do chalé ocupando todo o quintal onde estava construído o chalé. Esse caso ficaria para se conhecer tempos depois. No momento, era a vez do lauto almoço preparado pela governanta Elizabete Peres, conhecida no local onde trabalhava até aquela data de apenas por Bete. O título de Governanta foi posto por Glauco no momento que a contratou para ser a moça de servir a todos. Com a continuação, Bete teria a ajuda de outros serviçais, como arrumadeiras, gente da limpeza e de um homem a funcionar como Mordomo. Disso ela estava ao par.
--- Mordomo? – disse Bete na hora que foi contratada para o chalé.
--- É. Uma espécie de homem a atender a porta. – respondeu Glauco a sorrir.
--- Mas Mordomo? – quis saber Bete que tipo de homem era aquele.
--- É. Mordomo. E você é a Governanta. Depois da esposa quem manda é você. – sorriu Glauco.
A moça ficou revirando os olhos como quem não advinha o que era um Mordomo. Aliás, ela não sabia de coisa alguma a não ser lavar pratos. O homem orientou a moça para trajar roupas mais decentes, como uma roupa longa, sapatos de meia altura, meias, os cabelos de modo a sempre penteados, luvas, e algumas bijuterias discretas.
Porém, naquela hora, Bete apenas estava a servir o almoço feito de peixe. Isso ela sabia fazer muito bem. E também não ouvir a conversa dos patrões quando esse tivesse a almoçar. Por isso, Bete se afastava do local. Ao soar da sineta ela voltava para servir algo diferente.
--- Chateação!  Eu heim! – respondia a moça em tonalidade baixa. E completava:
--- Sineta pra cá! Sineta pra lá! Até parece que sou um cachorro! Besteira! – concluiu a moça no seu resmungar.
E ainda dava um “tuco” para completar o seu desaforo.
Na sala de refeição estavam os noivos a comentar coisas e causos. E a sorrir também. Logo a seguir Glauco indagou a Racilva sobre os Passaportes.
--- Eu pedi há uns vinte dias. – respondeu Racilva.
--- E os documentos levados? – indagou Glauco enquanto almoçava.
--- Identidade, carteira funcional, identidade militar, carteira da policia. Ora vejam só. Carteira de motorista que eu não tenho. Carteira de trabalho, certidão de viuvez. Essa e com você. – (sorriu a moça) – certidão de nascimento – E eu estou morta? – sorriu Racilva. Foi tanta coisa que nem sei mais. – sorriu a moça.
--- Deve estar chegando. – respondeu o homem sempre com a boca cheia de farofa.
--- Deve. Deve. Eu espero que despachem. A Polícia Federal é um amor. Faz tudo isso como se a gente não fizesse nada. Nossa! – replicou Racilva.
--- Segunda feira eu mando Ribeiro saber se teve algum empecilho! – retrucou Glauco.
--- Rio de Janeiro! Que sonho! – aludiu Racilva a olhar para cima e a sonhar.
--- Paris, Roma e tantas outras! – sorriu Glauco ao sentir a paixão da moça em conhecer o Rio.
Na manhã de segunda feira, Walquiria Rodrigues chegou à Prefeitura e logo foi recebida por uma recepcionista. A moça magra estava sentada à frente de um birô de mogno já um tanto acanhado pelos anos de serviço. E logo foi dizendo:
--- Pois não! – disse a moça a assuar o nariz por estar gripada.
--- Carlos Gardel, por favor! – respondeu Walquiria sem temer contagiar a gripe da moça.
--- É lá em cima. Pode subir. – sorriu a moça um pouco descorada.
E Walquiria, diretora de um colégio municipal, o Colégio João de Deus,  subiu a escadaria para o primeiro andar, o único existente, e se topou com nova recepcionista a quem indagou:
--- Carlos Gardel! – falou sem entremeios a moça.
--- Assunto? – indagou a recepcionista querendo ser dona da verdade.
--- Sou a diretora do Colégio Municipal João de Deus. Quero falar com Carlos! É só! – falou de modo ríspido a moça.
A recepcionista não sabia o que dizer. Se ele estava ou não. Afinal ao cabo de um curto tempo decidiu falar.
--- Ele está em audiência com o Prefeito. – respondeu a atendente.
--- Pois é até melhor. Eu falo com os dois. É assunto particular. – rosnou Walquiria querendo apagar a situação da atendente..
A atendente sentiu frio nos pés diante da impetuosidade de Walquiria. E disse afinal:
--- Pode entrar. É nessa porta. – ao se voltar para a porta de acesso ao Gabinete.
Walquiria se dirigiu ao Gabinete do Prefeito ainda a olhar por mais uma vez a cara da moça. E ao querer entrar no Gabinete, eis que parta se abriu. Era mesmo Carlos Gardel o homem que Walquiria procurava.
--- Desculpe. Quem. ...Olá! Você? Que novidade! – falou Carlos ao ver a sua frente a moça.
--- Pois é. E eu vim falar com você mesmo. Podemos? – indagou Walquiria sem mais nem menos.
--- Mas claro. – relatou Carlos e olhou para a moça atendente.
A atendente deu um “tuc” e voltou a cabeça para ver a rua. Com certeza, entre os dois devia haver algum caso de amor nem que fosse platônico. O certo foi Walquiria se dirigir para outra sala do lado esquerdo do Palácio Municipal e ao entrar ainda fez careta para a atendente. A atendente ficou irada com a expressão de Walquiria.
--- Pensa que toma? Tá aqui, ó! – disse Walquiria para a atendente ainda em surdina.
O rapaz ia à sua frente e ainda perguntou.
--- O que foi? – indagou Carlos a Walquiria a sorrir.
--- Nada. Reclamo do calor. – respondeu Walquiria entrado na sala de despachos de Carlos onde havia mais duas funcionárias.
--- Tá demais, hoje. Eu não tenho nem calor por causa do ar condicionado. – respondeu Carlos e pediu a moça que batia à maquina.
--- Veja dois cafés. – falou Carlos para a datilógrafa enquanto levava Walquiria até a sala e a mandou sentar em uma poltrona.
--- Hum! Que chique! – sorriu Walquiria a se sentar na poltrona.
Ao redor ela observou uma galeria de fotos de ex-prefeitos, dos mais antigos ao ultimo. Ela olhou e fez de conta não ter visto a galeria.
--- Bem! O que você quer? – perguntou Carlos Gardel a pegar as mãos de Walquiria.
Walquiria sorriu e deixou as mãos com ternura a ser pegas pelo homem forte do Prefeito. E depois de um curto espaço de tempo ela falou como quem procurava a ver se tinha mais alguém na sala. E entrou a datilógrafa com duas xicaras de café. Ela suspendeu a carícia feita e aceitou o café que Carlos havia pedido. Ao tomar o café Walquiria disse:
--- Agora aqui está frio. Parece ter mudado da água para o vinho. – fez ver Walquiria a sorrir.
--- São os segredos da vida moderna. Frio e calor. Na verdade, quando está chovendo por demais eu peço para reduzir o clima aqui dentro. Mas é o costume. A gente fica tão viciada com a temperatura que, quando falta, nós queremos mesmo a usar o ar sem condições de fazer o negócio esfriar. É a vida! – sorriu Carlos a contemplar a exuberante beleza de Walquiria
--- No Colégio onde eu estou ainda não tem essa gostosura de ar. – refletiu a moça a sorrir.
--- Isso é. Mas a Municipalidade está fazendo um levantamento de custos e o seu Colégio está na vez. – sorriu Carlos a se debruçar na mesa em sentido contrário a Walquiria.

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