sexta-feira, 16 de setembro de 2011

VENUS ESCARLATE - 52 -

- POMBOS -
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No dia seguinte Walquiria foi com a sua mãe, dona Santa (Maria do Socorro) para as consultas rotineiras com o médico cardiologista da paciente. O médico após breves conversas orientou dona Santa a fazer os costumeiros exames cardiovasculares para saber como estava o coração da mulher. Dona Santa não gostou nem um pouco do médico e foi fazer novos exames a contragosto, mordendo os dedos pelas unhas.
--- Esse “merda” não saber é de nada! Quando acabar a gente faz exames de qualquer besteira pra encher o bolso dele. Eu não gosto disso. Prefiro me consultar com José Enfermeiro. Alí é que é homem. Só diz na batata! – resmungava a mulher andando lento pela clinica.
--- Tenha calma minha mãe. Tenha calma! Isso é para conferir o seu estado atual com relação a de um ano atrás. Tenha calma! – falou moderado a sua filha.
--- E quando é esse exame? – quis saber dona Santa emburrada da vida.
--- Daqui a duas semanas. Tem gente na frente. Tenha calma! – voltou a dizer a filha.
--- Tenha calma coisa nenhuma! Se eu vou morrer amanhã, não tem quem empate! Ora! – relatou dona Santa ao querer se desprender do braço da filha enquanto caminhava.
--- PSSIU! As enfermeiras estão ouvindo tudo isso minha mãe! – alertou a sua filha falando de modo baixo.
--- E eu que tenho a ver com essas moças? – perguntou indignada dona Santa.
Nessa oportunidade passaram duas enfermeiras correndo em busca de uma cadeira de rodas para um paciente debilitado. E uma dizia a outra.
--- Onde está Mario, o maqueiro? – perguntou apressada uma enfermeira a outra.
--- Foi lá pra cima! – respondeu a outra.
--- Ave coisa! Só sobra pra gente! – resmungou a enfermeira a correr corredor a fora.
E dona Santa, prestando atenção ao que se passava, não temeu e declarou.
--- Tá vendo o que eu digo! Tá Vendo? – resmungou dona Santa a porta de entrada do virtual complexo de atendimento.
E a filha:
--- Ave mamãe. Hoje a senhora está demais! – reclamou Walquiria aos aborrecimentos da mãe
--- Então me solta que eu vou pra Fazenda. Lá é muito melhor! – relatou a mulher querendo se despregar de sua filha.
E a filha:
--- Fique aqui. Acabe com essa burrice! Ora! – reclamou Walquiria enquanto passava a porta.
Nesse mesmo dia, à tarde, após o almoço no Restaurante do Grande Hotel onde podia se servir de comidas de frutos do mar, como peixe, lagosta e camarão  Racilva declarou:
--- Hoje tenho que ir a modista para experimentar pela última vez o meu vestido. – falou bem devagar a moça olhando para a praça ao lado.
Os tradicionais meninos estavam a jogar bilocas, enquanto as suas mães ficavam a sentar em baixo de uns pés de pau. Duas meninas ainda pequenas olhavam para dentro do restaurante a espera de alguém para lhe dar algumas moedas. Racilva olhou para as meninas e se levantou de onde estaca. Ela retirou de sua bolsa uns trocados e deu às meninas tendo depois voltado ao seu lugar.
--- Meninas! – disse Racilva lamentando a sorte daqueles pequeninos seres.
--- São do interior. Provavelmente de Santa Cruz, terra do dono desse restaurante. Elas passam o dia na frente do hotel. – fez ver o namorado.
--- É. Pode ser. Mas dá pena! E o dono não faz nenhuma doação às mães na hora do almoço? – indagou Racilva a voltar o olhar para as meninas maltrapilhas.
--- Creio que faz. Mas as meninas ficam o tempo todo ali. – declarou Glauco a olhar para as infantes garotas.
--- Sujas! Vestidinhos rotos! Será que elas têm onde morar? – perguntou de modo choroso a moça ao seu noivo.
--- Devem ter. Eu sei de uma mulher que vive alí perto da Agência Pernambucana dormindo em um caixão de madeira. Ela e uma filha. – comentou o homem a observar os garotos.
--- Eu conheço essa mulher. De vista! Seu nome parece ser “Maria”. É uma com um defeito na coluna. Vive a vender bilhetes da loteria. – fomentou Racilva ainda a olhar para as meninas e a fazer gestos graciosos.
--- “Mula Manca”! É como se chama a mulher. – proferiu Glauco a sua noiva bem devagar.
--- Mula Manca! Que nome! Quem põe um apelido desses em uma mulher humilde não deve ter tido mãe. – reprovou a moça a olhar as garotas.
Glauco sorriu um pouco e depois declarou:
--- Parece-me que a mulher faz “trottoir”. – comentou Glauco olhando as garotas.
--- É. Cada qual com o seu destino. E eu penso agora: o que será o “amanhã” dessas crianças? – indagou pensativa Racilva Arantes.
--- O mesmo de tantas outras mocinhas que “fazem a vida” pela beira da estrada. – comentou o homem ao tomar mais um copo de vinho.
--- É. Deve ser. Eu não gosto nem de pensar! – reclamou Racilva ao ver as meninas a sorrir para a moça.
Após esse “drama” os dois saíram do restaurante e Glauco relatou ter nessa tarde uma reunião com o Governador do Estado sobre a questão do mal da vaca louca. A moça ouviu o declarar de Glauco e perguntou em seguida.
--- Não tem cura essa doença? – perguntou Racilva a seu noivo.
--- Até agora, não. Os laboratórios da Inglaterra, Alemanha, França e mesmo os Estados Unidos estão fazendo pesquisa para saber de onde vem a doença. – comentou Glauco ao atravessar a rua de um lado para outro.
--- E o Governador o que diz? – perguntou a moça ao seu noivo.
--- Está feito louco. Reclama que só das vacas dele. – sorriu suave Glauco ao se lembrar da última reunião com o Governador do Estado.
--- Imagino! Ele tem muito gado? – perguntou a moça de forma displicente.
--- Um bocado. A fazenda que ele tem fica para os lados de Caicó, Encanto e outros municípios daquela região. Faz um calor de rachar o cano nesse tempo. Coisa de louco. – explicou Glauco sem maiores alardes.
--- E as galinhas? – indagou a moça com surpresa.
--- Galinhas? Que galinhas? – indagou surpreso o homem.
--- Galinhas. Aves. Não pega esse mau? – quis saber a moça.
--- Ah bom. Galinhas. Não. Não. Nas aves aparece a cólera aviária. E costuma atacar galinhas, patos, perus, marrecos, gansos, angola. Enfim todas as aves de quintal. A cólera costuma aparecer de maneira explosiva algumas aves. Elas dormem a noite e no outro dia estão mortas. – fez ver Glauco a sua noiva.
--- Meu pai é criador de galinhas. Certa vez ele disse que a suas galinhas, durante o dia, estava esperta e de repente deu uns pulos para o ar e logo morreu! – sorriu a moça com o desatino do pai.
--- É. É assim mesmo. Elas ficam com a boca cheia de baba. Diarreia verde e amarela. Mas ainda assim há remédio a base de sulfa e antibióticos. – recomendou o fazendeiro Glauco.
--- Eu vou dizer ao meu pai. – reportou a moça.
--- A transmissão é através das moscas, pássaros ou pombos. – relatou Glauco a Racilva.
--- Nossa! E é pra matar os pombinhos? -  alertou a moça bem preocupada.
--- Pombos é uma aflição. A Prefeitura devia ter um esquema de controle dessas aves e não raro orientar a população  para os graves efeitos que os pombos produzem como salmonela, dermatites e outras enfermidades que homem pega. – orientou Glauco ao chegar à repartição.
Um vento forte fez a moça se apegar às suas vestes e a entrar depressa na Recebedoria de Rendas.

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