quarta-feira, 14 de setembro de 2011

VENUS ESCARLATE - 50 -

- VESTES DE NOIVA -
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 Dona Santa, mãe de Walquiria, esposa do fazendeiro Valdomiro Timbó, estava em Natal para fazer bateria de exames. Coisa comum na sua idade. Ela estava na sua casa onde também moravam Getúlio e Walquiria. Getúlio já estava de casamento marcado com uma moça do interior chamada Maria da Cruz. Dona Santa gozava de uma casa na Fazenda “Sossego” e de outra casa no bairro do Tirol, na capital do Estado. A sua família era de Caicó. Dentre tantos tinha o homem de meia idade, Sebastião Lucena, irmão de dona Santa. Quando alguém da família de dona Santa vinha à Natal ficava em casa de Walquiria ou mesmo de dona Santa e de seu marido, o fazendeiro Valdomiro Timbó. Isso dava uma confusão medonha isso porque Walquiria dividia o seu lar com os demais “convidados”. No entanto, a moça não metia a colher no bedelho dos “outros”, ou seja, nos assuntos dos seus parentes de Caicó. Quando estava “só”, Walquiria era a “dona” da casa não prestando informação nem mesmo a seu irmão o rapaz Getúlio. Apenas a amizade ficava mais “colorida” quando todo mundo estava na fazenda do seu avô, Coronel Fabriciano, falecido há alguns dias. Mesmo assim, com Dona Santa a estória já era bem diferente: a mãe de Walquiria, de quando em quando estava na capital. Porém, dessa vez era fazer uma bateria de exames. E a mulher reclamava por si só:
--- Eu não vejo a necessidade de tanta coisa. - reclamava dona Santa a filha.
O nome completo da mulher era Maria do Socorro Augusto Timbó. Porém em casa todos a chamava de Santa. E por Santa ficou sendo chamada, isso desde criança. Quando a mulher esteva em sua casa de Natal ficou a reclamar de fazer tantos exames.
--- Tem exames disso, tem exames daquilo. Eu não vejo pra que razão. Se eu vou morrer, diga logo: “A senhora tem um mês de vida”. E pronto! -  dizia a mulher cheia de queixas.
--- Mas não é assim minha mãe. O médico quer saber de todo o diagnóstico da sua saúde! Tenha calma, pois tudo vai dar certo. – disse pacientemente a filha Walquiria.
--- Você é quem sabe. Estudou! É diretora de uma Escola! Está certo. – concluiu a mulher.
Por outro lado, Racilva Arantes contava nos dedos a festa do seu casamento. Ela apostava de não chegar por ultimo ao altar. Se bem que a formalidade mandava sempre “esperar”.
--- Não custa nada! – pensava Racilva a sorrir.
Nessa ocasião ela estava somente só. O Chefe ou Diretor da Recebedoria de Rendas do Estado tinha ido nesse dia para a Fazenda Maxixe onde o seu pai, Ahrtur Timbó tinha toda a preocupação da vida para vender o seu rebanho de gado leiteiro e de corte, isso contra a vontade do filho, Glauco Rodrigues. A confusão rendia no interior enquanto Racilva dormia no seu sonho de ser em breve uma esposa devotada. Na mesa de trabalho na repartição Ribeiro entrou depressa como sempre fazia e entregou a Racilva uns documentos deveras urgentes para ser encaminhado ao Diretor da Repartição, senhor Glauco Rodrigues. A moça, em seu canto estava a sonhar com o modelo do vestido quase pronto e acabado que ela encomendara há quase um mês a uma estilista da moda da cidade.  Ribeiro então sorriu e disse:
--- Acorda mulher! Tais dormindo? – e deixou os documentos no birô da moça tornando ao seu trabalho diário de pegar documentos ou atender pessoas.
E a moça parecia ter acordado de um profundo sonho agradecendo a Ribeiro a sua atenção. E enfim, Racilva sorriu. Era comum esse estado de coisas a ocorrer a uma noiva. Racilva nunca fora pedida em casamento e nem pensava tão cedo em se casar. Porém a casa caiu. E Racilva se lembrava de muito bem do tempo do trabalho exercido um uma loja de artigos domésticos quando um homem entrou para comprar um radio PYE. Ela nem ligou para tal fato como também não fez questão ao saber do seu patrão:
--- Ele é um homem rico. E a mulher que se casar com ele vai ser muito rica. – enfatizou o seu patrão Haroldo Doria naquele tempo já bem passado.
E naquela hora era ela quem estava nesse caminho de ser uma mulher bastante rica. Nesse meio tempo o telefone da repartição cotou insistente e Racilva teve que ir atender. Era de outra repartição do Estado. A pessoa indagou por seu Glauco Rodrigues, Diretor da repartição. Racilva teve a informar ele não está. A pessoa indagou:
--- Qual hora ele está de volta? – indagou a pessoa.
Racilva no momento perguntou:
--- Quem fala, por favor? – perguntou Racilva à voz estranha.
--- Aqui é do Gabinete do Governador. – respondeu a voz.
Então Racilva tremeu na base. Porém logo se posicionou com perfeição.
--- Seu Glauco Rodrigues está em viagem para ver os casos de uma peste bovina! – respondeu Racilva sem tremer.
E a voz:
--- Está muito bem. Quando o doutor Glauco voltar peça a ele para se comunicar com o Governador o mais breve possível. – falou a voz do outro lado da linha.
E Racilva:
--- Está bem. Com certeza ele não volta hoje. Talvez amanhã com certeza. Ele não deixou dito quando voltava, por certo. – relatou a moça ao seu interlocutor.
--- Está bem. O recado está dado. – disse a voz e desligou o telefone.
Racilva voltou a tremer nas bases:
--- O gado! – estremeceu Racilva ao sentir na pele ter o gado algo com a situação.
No sábado, Racilva convidou Walquiria para ir até a fazenda Maxixe, pois temia ter Glauco algo a informar ao Governador do Estado. A moça concordou em ir. Mesmo assim teve que pedir permissão a sua mãe, dona Santa para poder se ausentar de ter de ir à fazenda. A sua mãe não disse nada e pediu apenas que a filha chamasse alguém para fazer a refeição enquanto a moça teria de viajar.
--- Ô mãe! Do Carmo está aqui. Ela não deixa faltar coisa alguma! – respondeu de forma leve a filha.
E do Carmo ouviu de dentro da cozinha e respondeu para a moça na sala de vistas.
--- Pode deixar. Eu cuido de Santa. E ainda tem a arrumadeira para servir de amparo. – relatou da cozinha a mulher.
A situação no campo estava lamentável. O mercado da cidade parecia algo morto. A carne de gado desaparecera de vez. O que havia nas bancas era só galinha de criação. O preço da ave era exorbitante e ninguém poia sequer oferecer algum desconto. Sabia-se de um dono de gado a sacrificar os seus animais antes da peste chegar a sua terra. O homem vendia a carne de gado também por elevado preço. E tudo isso feito às escondidas para as autoridades sanitárias da região não saber. Porém, no sábado uma patrulha chegou até o “matadouro” particular o homem e apreendeu toda a carne ainda nova e levou o homem até a delegacia de policia. A venda de guiné, patos e outras aves eram permitidos, pois a doença da vaca louca apenas atacava o gado, e talvez ovinos causando a morte de ovelhas e carneiros. Mesmo assim, no campo de Serra Grande ninguém encontrou as ovelhas acometidas do mau.
--- E bodes não pegam? – indagou uma mulher cismada da vida.
--- Bem. É capaz de pegar. A senhora cria bode? – perguntou o home de forma suspeita.
A mulher se encolheu e respondeu com pressa.
--- Eu não! Quero lá esses bichos. Vivem desmunhecando! – relatou a mulher apavorada.
--- Tem guiné e pato ali! Quer comprar? – indagou outro homem a mulher desavisada.
--- Sei lá. O homem preço que fura os olhos da gente! Eu vou comer mesmo é ovo! – disse a mulher assombrada com a doença da vaca louca.
--- Que nada Sá dona! Ela só mata vaca. Não mata gente! – disse um homem a gargalhar.
A situação era braba no interior, principalmente da região do município de Serra Grande. Com o passar das horas veio a noticia: o mau já se alastrava para Caicó e outros municípios. Um homem vindo do agreste do Pernambuco veio a dizer ser a mortandade de vaca um caso aterrador. E outro homem vindo do Ceará disse a mesma coisa.
--- E Alagoas? – indagou alguém assustado.
--- Tá no caminho. Por lá só se vende carne de peixe! – disse alguém sabedor da situação.
--- É o mundo todo. Imagine o Piauí e a Paraíba! – sorriu alguém a cuspir de lado.
--- Sei não, até o céu tem vaca louca! – comentou um vaqueiro nem querendo de meter.


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