segunda-feira, 12 de setembro de 2011

VENUS ESCARLATE - 48 -

- GADO -
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Na manhã daquela segunda-feira um vaqueiro voltou apressado e extenuado à Fazenda “Sossego” clamando mais que depressa a ajuda do criador Valdomiro Timbó, irmão do Coronel Ahrtur, pai de Walquiria Rodrigues e também herdeiro legitimo das Fazendas Tijuaçú, Alarmes e Pirilampo além da grande Fazenda Maxixe. O vaqueiro conhecido em toda parte do lugar por Boca Rica (seu principal nome era Jerônimo João José) corria em desespero deixando os demais vaqueiros da fazenda em atônita agonia. Boca Rica chegou ao alpendre da Fazenda Sossego com seus alarmes e tudo a dizer para o patrão Valdomiro ter a desgraça ocorrida na mata do Espinho.
--- Patrão! Patrão! Uma desgraça! O gado está morrendo! – relatou atormentado o homem todo afligido da vida.
--- Que foi homem? Que te angustia? – indagou Valdomiro balançando em uma cadeira feita de vime.
--- Tá pra mais de vinte cabeças que eu encontrei no campo do Espinho. Os bichos estavam todos molestados. É coisa enfadonho doutor. O gado anda manco aqui e acolá e findando caindo já morrendo. É uma loucura, patrão! – dizia o vaqueiro todo suado e neurastênico.
--- Quantas reses estão morrendo desse jeito? – cuspiu pra parede o fazendeiro ao perguntar a Boca Rica de tal situação.
--- Sei não patrão! Tem pra mais de vinte. Eu não vi todo o rebanho. Corri pra avisar o senhor! – clamou por tudo o vaqueiro com a cara cheia de espanto.
--- E danado! Além de queda, coice! Eu vou olhar. Mas prefiro chamar o homem que trata os bichos. É bem melhor assim! – reportou Valdomiro de uma vez por todas.
--- E o senhor quer que eu chame o homem? – indagou um tanto vexado Boca Rica.
--- É bom. É bom. Va chamar o veterinário. Enquanto isso eu vou até a Mata do Espinho pra ver de perto essa estória. – relatou por fim o fazendeiro.
--- Pois eu vou. E peço que o senhor não pegue nos bichos. É doenção! – clamou Boca Rica e partindo em seguida para a cidade.
Sem muita pressa, o criador Valdomiro Timbó correu o campo na companhia de outros três vaqueiros e chagar até a Mata do Espinho onde encontrou mais de vinte reses já mortas e outras tantas acometidas do mau.  Em cada uma das vacas o homem inspecionou com cuidado e chamando os vaqueiros foi até muito longe de onde ele estava a procura de mais rebanhos para ver se estava amofinado da doença. Valdomiro perambulou por todo o intrincado campo encontrando outras reses acometidas do mesmo mau. Por volta de onze horas ele tornou ao casarão do “Sossego” a cuspir de banda e dizer aos três vaqueiros.
--- Nunca vi doença desse modo. Suspende a carne de gado abatido na minha casa. Vamos ver o que diz o homem. – falou com altivez o dono do rebanho.
--- É pra já patrão! – respondeu intrincado um vaqueiro.
O veterinário que recebeu o recado partiu para a Fazenda “Sossego” a procura de Valdomiro Timbó. Contudo o fazendeiro já havia saído à procura das reses mortas ou por morrer na Mata do Espinho. Em seguida, em seu jeep velho caminhou com outro vaqueiro para a região onde deveria estar o criador a procura do seu rebanho acometido do mau. Os mosquitos da manhã tardia enveredavam pelo interior do jeep e atormentavam o veterinário. Essa não parava em espantar os insetos. Inclusive um marimbondo “Cavalo do Cão”. Esse entrou somente para morrer. O vaqueiro que acompanhava o veterinário meteu o pé e esbagaçou o marimbondo.
--- Arra diabo. Vá morder o cão. – relatou enfezado o vaqueiro acompanhante limpando a alpargata de rabicho.
--- Tem muitos deles por aqui. – sorriu o veterinário ao ver o inseto esmagado.
--- Tem de muito. Eles comem cobra, aranha, mata cavalo e sua após ferroar o outro ele come ou faz de alimento as suas larvas. Bicho danado. Pequeno e danado de ruim. – cuspiu e banda o vaqueiro.
O veterinário sorriu com a arenga o vaqueiro contra o bicho morto.
O veterinário não viu nem rastro do fazendeiro Valdomiro por onde andou. Mas examinou o gado afetado e teve uma conclusão:
--- Eita diabo. Síndrome da Vaca Louca! É doença terrível! Valdomiro vai que enterrar esse gado e separar os outros ainda não acometidos. Deixa o gado de quarentena! Isso vai dar em vasta região desse Estado! – comentou o veterinário a coçar a cabeça e franzindo a cara.
--- E isso é ruim, doutor! – perguntou o vaqueiro ao veterinário.
--- Perigoso. Não se tem uma noção exata de se tratar dos animais doentes. Eles contraem dos ovinos e podem durar cinco anos até a manifestação do gado leiteiro ou não. É cuidar agora. – foi o diagnóstico do veterinário.
--- Ora merda! E minhas cabras? – falou o vaqueiro com o medo da morte do gado.
De volta à Fazenda “Sossego” o veterinário Joaquim Fragoso por fim se mostrava terrivelmente preocupado e já imaginava o que estava ocorrendo nas outras fazendas da região. A doença da vaca louca poderia afetar o comércio da região e de outros Estados, levando a importação a ser proibida por um bom tempo até se chegar a uma causa normal da morte dos animais. E ao chegar à Fazenda pelas primeiras horas da tarde o veterinário Joaquim Fragoso foi logo recebido pelo fazendeiro Valdomiro Timbó. Esse havia retornado da sua viagem à Mata do Espinho há poucas horas antes.  E quando o veterinário Joaquim Fragoso chegou o fazendeiro ainda estava suado por conta da viagem ao sol do meio dia.  Então o veterinário disse o que viu e deu o seu diagnóstico.
--- É problema. O gado está ameaçado do mal da vaca louca. É enterrar os mortos e separar os de saúde, apesar de não saber quais foram afetados. Isso é perigoso. Vem desde países como os da Europa e já está aqui. – amargou em dizer aquilo o veterinário.
--- E as minhas cabeças? Ainda faltam entregar três mil cabeças de gado bovino! – comentou assustado o criador Valdomiro Timbó ao contemplar e cerco formado pela mata extensa.
--- É preocupante. Eu não recebi nenhuma notificação de outro criador. Mas, certamente vai aparecer. Essa doença é derrubadora. Esse gado pode ter levado cinco anos para desenvolver o estágio e contágio. – relatou o veterinário se acercando da sombra providencial do alpendre.
Após um longo período de conversa, almoço e repouso, o veterinário Joaquim Fragoso voltou para a sua casa no centro município de Serra Grande onde outra noticia podia dar um rumo ao seu atendimento o qual era do seu feitio. A estória da Vaca Louca lhe deixou preocupado. Os criadores de gado da região importavam animais de Goiás, Mato Grosso e Minas Gerais os centros de maior reprodução do rebanho. No nordeste há também a criação de gado de corte e leiteiro. Entre tudo isso, era enfim preocupante a chamada doença da vaca louca, pois os animais vinham sempre de locais diversos. No seu escritório, o veterinário Joaquim Fragoso ainda não tinha recebido nova chamada para cuidar de reses doentes.
No dia seguinte, uma terça-feira, o veterinário recebeu em sua casa um criador de gado temendo por seu rebanho, pois surgiram umas reses vindas do centro-oeste um pouco magras com a pele tirada e mostrado a carne viva de tanto coçar. Esse gado estava adoentado e ele não sabia identificar o mau. E veterinário caiu em campo e diagnosticou de imediato ser o mau da vaca louca.
--- É grave doutor? – perguntou alarmado o fazendeiro.
--- E muito. Sepulte as vacas mortas e ponha em quarentena as sadias. – relatou Joaquim Fragoso ao temeroso criador.
Com esse segundo caso, o veterinário determinou urgência no rebanho do seu município e procurou de imediato a Secretaria de Agricultura do Estado apontando pela extrema carência de se fazer diagnóstico em todo o rebanho do Estado e, provavelmente de onde tinha vindo às reses mortas. O pânico tomou conta de todo o Estado e o consumo de carne de gado caiu vertiginosamente e nem leite havia nos mercados da capital. Mesmo se dizendo que era leite “sadio” o povo olhava de forma desconfiada e rejeitava a compra. O mau da vaca louca tomou conta dos noticiários nacionais e a situação em muito sacrificou o rebanho dos Estados do centro-sul do País. De vez, as exportações de carne bovina para o exterior ficou comprometida enquanto aves tomavam conta do mercado.
--- Isso é um horror! – relatavam os compradores nos açougues.
--- Veja como está esse açougue! Só se vendo para crer! – respondia outro extasiado.
E marcha tomou conta da capital com um punhado de gente a interferir na compra da carne bovina com os seus cartazes em punho e a gritar para todos os passantes.
--- Não comprem carne de gado! – relatava um enorme placar tendo a frente às pessoas quase sempre desavisadas do contágio da doença.
E a quarentena prosseguia por um bom tempo.

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