quarta-feira, 9 de novembro de 2011

CREPÚSCULO - 09 -

- Roberta Thaise -
- 09 -
A SECRETÁRIA
Às primeiras horas da tarde daquele mesmo dia o Coronel Juca reuniu em seu casarão o Prefeito da Cidade, Sebastião Salgado e mais alguns de seus auxiliares mais diretos e de total confiança para discutir o caso da invasão do prédio da Secretaria de Educação e o da Prefeitura da Cidade. Dessa reunião não estava presente o Secretário de Educação, Edvan Moura, como já era esperado. O Secretario mandou dizer não estar bem disposto desde o dia passado, o que deixou bastante irritado o Coronel Juca a fazer comentários deslavados para com o senhor Edvan Moura.
--- Aquele é um arroto choco. Nem se parece com o pai que tem. – exclamou o Coronel Juca.
João Catunda Moura era pai de Edvan Moura e fora há algum tempo também Secretario de Educação entre outros mandatos no cargo de Prefeitos do Município de Panelas.
--- Aquele sim era um homem forte. – relatou um dos que estavam com o Prefeito Salgado no casarão do velho Coronel em reunião na sala grande em torno de uma mesa gigante.
--- É. Mas não estamos aqui reunidos para discutir a beleza dos outros. Eu quero saber quem é que fica como titular da Secretaria! O seu Edvan não me serve mais. – destacou bastante irritado o velho Juca.
--- Coronel, eu não tinha pensado em outro nome. Hoje, logo cedo, veio uma comitiva do Sindicado para conversar. E, se bem que eu não estava presente, não se resolveu nada por sinal. – reclamou o Prefeito de Panelas naquele instante.
--- Mas o senhor também estar muito bem no seu cargo, não é Prefeito? – relatou o Coronel cheio de critica ao dizer o que acabou de falar.
--- Não é, coronel! Eu estava cuidando do meu gado! – fez vez o prefeito Salgado.
--- Certo! Certo! Morreu alguma vaquinha por lá? – indagou o velho Juca cheio de sarcasmo.
--- Não, coronel. A peste não atingiu o meu rebanho ainda. – fez ver o Prefeito acanhado.
--- Interessante! Se eu soubesse tinha mandado algumas das minhas vaquinhas para o seu terreiro, pois aqui, só de bicho grande morreu vinte e três. Mas eu não sabia que o senhor queria! – relatou o coronel para instigar o prefeito Salgado com seu jeito abusado.
--- Que é isso, Coronel! Eu soube! Meu Deus do céu! Foi gado até demais! Eu não sei como se deu uma coisa dessas! – comentou o prefeito tentando hipotecar solidariedade ao Coronel Juca e vendo que estava em desvantagem naquele ponto.
--- Está bom. Mas vamos o que interessa: o secretário de Educação. Como vai ser? – indagou o Coronel ao seu protegido Prefeito municipal, Sebastião Salgado.
--- Bem! Já que não tem mais jeito, o negocio e se arranjar outro Secretário. - - relatou o Prefeito todo acuado.
--- É. Isso é. Mas quem vai assumir o lugar? – perguntou o coronel sabendo que o prefeito não tinha jeito para dizer um nome naquela hora.
Nesse momento, um dos auxiliares do prefeito pediu licença para falar vendo que o negocio caminhava em banho Maria.
--- Com licença. Não é por nada não. Mas lá na secretaria tem uma moça que eu acho que dá para assumir o cargo, pelo menos por alguns tempos. Eu não sei se o Coronel a conhece. Mas ela é filha do doutor Orlando Martins. Ele até perdeu um gado nos dois últimos dias. E o nome da moça é Marina, se não me falha a memória. Marina Martins. – falou o auxiliar do Prefeito Salgado.
--- Quem? – perguntou meio assombrado o Prefeito.
--- Marina. Filha do doutor Orlando. – voltou a dizer o auxiliar.
--- É. Eu conheço a moça desde o tempo que andava de calcinhas. Era uma pirralha pequena. Eu aprovo o nome. Agora vocês vão embora e na Prefeitura chame a moça e converse com ela. Veja se não demora muito nesse caso. Estão despachados. – falou com ênfase o coronel Juca ao se levantar da poltrona onde estava metido há algumas horas.
E a turma toda se meteu no caminho da Prefeitura com o auxiliar do Prefeito Salgado feliz por ter sido o primeiro a falar de um nome que, com certeza teria a aprovação do Coronel João Tenório de Alencastro. O titular da Pasta não dizia coisa alguma temendo ainda as repreensões recebidas do seu chefe. No caminho parou a caminhonete para que o auxiliar fosse até a sede da Secretaria de Educação. A rua estava com pouca gente, salvo os biriteiros de todos os dias a dormir pela calçada do Mercado Público. Uma mulher saiu atrás do filho pequeno a gritar:
--- Olha o carro, peste! – e pegou o menino pela orelha o levando para dentro de casa outra vez.
Os cientistas já estavam a sair da casa do doutor Orlando Martins em torno das três horas da tarde quando chegou a casa o auxiliar do Prefeito Salgado a procura da moça Marina Martins. Na Secretaria não havia expediente vespertino. Por isso, o auxiliar teve que ir à casa da moça para lhe dar o recado de que o Prefeito queria lhe falar. Um tanto preocupada, pondo os livros de estudo na mesa Marina indagou ao rapaz o que devia querer o senhor Prefeito Sebastião Salgado. E o rapaz respondeu:
--- Assunto da repartição! – disse o rapaz auxiliar do Prefeito.
--- Bosta! Vou já! Querendo ir, pode sair. Se não espere um pouco! – relatou a moça enfezada da vida.
E com alguns minutos ela estava já pronta para sair e pediu o carro do seu pai enquanto seguia para a Prefeitura de Panelas. Cheia de desaforos, a moça pegou o carro e saiu em disparada estrada afora para poder ser atendida pelo Prefeito Salgado àquela hora da tarde. O rapaz já havia saído, com certeza a pé. Era tanto que no meio do caminho ela brecou o carro para dar carona ao rapaz que lhe foi levar o recado. E aproveitou para puxar conversa e procurar saber o que o chefe do executivo queria com a moça a tantas horas da tarde. O auxiliar do prefeito se comportou reservado e respondeu não saber ao certo.
--- Ele não me disse. Apenas mandou chamar à senhora. – respondeu o auxiliar do prefeito.
--- Isso é uma verdadeira bosta. Demitir ele não vai. Se fosse o caso, ele nem se preocupava em me chamar. Esperava que o Secretário o fizesse. Que bosta! – falou exaltada a moça.
--- E tem a greve. – sorriu o auxiliar apontando para a paralisação dos professores.
--- É. Se ele está pensando que pode me pedir para ser a interlocutora do meio, está muito enganado. Estou farta com essa turma. Mandaram o sujeito de bem dois metros de tamanho só para amedrontar. O homem mais parece um bicho. Barba por fazer. Chega até ao busto. Coisa horrorosa aquela. – falou irritada a jovem Marina cuspindo brasa para todos os lados.
Antes de passar a porteira da casa grande, Marina se deparou com um vaqueiro. O homem com sua cortesia a cumprimentou tirando-lhe o chapéu. Logo atrás caminhavam mais dois vaqueiros vindos, com certeza, do centro da cidade. Marina agradeceu o cumprimento e ainda indagou:
--- E as vacas? – perguntou a moça ao vaqueiro.
--- Nós estamos procurando para ver se ainda estão morrendo. – falou manso o vaqueiro com seu traje coberto de espinhos.
--- Tá bom. Espero que essa doença não tenha progresso. Isso não é febre? Aftosa? – indagou a moça ao vaqueiro completamente suado.
--- É. Pode ser. Os médicos é quem devem dizer. – falou baixo o vaqueiro sem saber de coisa alguma.
--- É. Aliás, eles hoje estiveram aqui. E não disseram nada. Entraram calados e saíram sem sorrir. – falou Marina muito mal informada pela morte das vacas.
--- É Mas se eles não disserem o que matou as vacas, então....Sei não...Achou que isso é uma febre braba que mata as vaquinhas num triscar de olhos. – respondeu o vaqueiro cuspindo fumo para outro lado.
--- Sã morreram vacas? – perguntou a moça cismada com a notícia.
--- Não senhora. Um vaqueiro trouxe um urubu também. – relatou mais o vaqueiro.
--- Nossa! Até urubu? Que coisa!!! – se espantou Marina.
--- O pior foi na fazenda do velho Juca. Por lá morreram vinte e três vacas e uma danação de urubus! – fez ver por seu lado o auxiliar do prefeito.
Marina ainda mais se espantou com a notícia dada pelo auxiliar do prefeito e quase não tinha palavras para falar atormentada de medo. De olhos esbugalhados, mãos na direção, Marina só teve a falar o que se pronunciou:
--- Virgem Maria! Será que foi algum bicho? – falou alarmada a moça.
--- Por lá foi pior. Levaram três homens. O povo esta achando que foi gente do outro mundo. E os que foram e voltaram não souberam nem dizer que tinha saído daqui. – cuspiu forte o fumo de corda que mascava o vaqueiro ao dizer a novidade a moça.
--- Virgem!!! Nave do outro mundo? – gritou alarmada a moça quando o vaqueiro contou o incidente.
--- Parece! É o que estão dizendo. Sei não. Acho que isso é o fim o mundo! – relatou o vaqueiro assombrado com o que sucedera na Serra do Monte Sagrado.
E a moça se despediu e tocou de vez o carro em direção a Prefeitura do Município de Panelas. Ao seu lado, o auxiliar do Prefeito estava mudo e temendo o pior.

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